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Para uma abordagem sociológica da educação escolar

5.3 A "nova" sociologia da educação

As abordagens microssociológicas da educação, integradas no que ficou designado como a "nova" sociologia da educação, parecem surgir do impasse gerado pelas teorias macrossociológicas da reprodução, as quais ajudaram a criar e a reforçar um discurso que desculpabiliza a organização e seus intervenientes pelas desigualdades que gera, invocando quase exclusivamente a origem social dos alunos como causa do insucesso escolar.

As abordagens microintrepretativas, tradicionalmente situadas no domínio da psicossociologia da educação, desenvolvem-se sobretudo a partir da década de 70 e pretendem mostrar como os alunos e os professores participam na construção das situações onde vivem e interagem, o que abre portas ao estudo do conteúdo do processo educativo.

Se as escolas não ensinam essencialmente competências técnicas, mas culturas de

status, é importante identificar: o carácter destas culturas (a sua natureza e conteúdo) e

a forma como elas são transmitidas. Tal remete então para a abordagem microssociológica, estudando-se os currículos, o tempo, o espaço, a linguagem, as pedagogias, as formas de avaliação e os processos de interacção na sala de aula. Para o que se recorre fundamentalmente à análise qualitativa e à observação, tanto participante quanto não participante, o que levantou nos primeiros anos alguns problemas de reconhecimento social e científico.

Mas se o paradigma determinista não deixava qualquer espaço de manobra ao indivíduo, muitos destes autores são criticados por não tomarem suficientemente em consideração os constrangimentos a que os actores se encontram sujeitos, denotando alguma falta de articulação entre os níveis micro e macossociológicos.

Neste sentido, tem-se desenvolvido, mais recentemente, uma abordagem mesossociológica do processo educativo, constituindo o estudo da escola enquanto organização uma das mais recentes abordagens no domínio da sociologia da educação, mas também uma das que regista actualmente maior expansão. Exemplo deste tipo de

abordagem é o trabalho de R. Edmonds e, entre nós, de J. Arroteia, L. Pardal, A. Martins e E. Correia, António Nóvoa e Telmo Caria.

Trata-se no fundo de estudar a forma como a cultura organizacional, o clima organizacional e a liderança na escola produzem, ou não, efeitos sobre o comportamento dos actores sociais que a integram. Nomeadamente a forma como as políticas educativas são apropriadas em diferentes políticas de escola.

Retomando os termos de R. Boudon, a escola é, fundamentalmente, um sistema de interacção do tipo funcional. Se preferirmos a terminologia de M. Croizier e E. Friedberg, é um sistema de acção concreta. Para isso teremos de nos debruçar sobre o quadro teórico que permite compreender as acções entre pessoas que têm a desempenhar um conjunto de papéis associados ao seu estatuto, num quadro em que os jogos possíveis, tolerados ou censurados, estão regulados. (PINTO, 1995:110)

Este tipo de análise tem-se revelado, no entanto, especialmente difícil. Não só porque o estudo da interacção entre os vários actores sociais presentes na escola não pode limitar-se ao estudo da sala de aula, tem de abarcar todos os espaços onde as interacções acontecem, mas também porque a análise ao nível do estabelecimento não pode ficar-se pela organização escolar formal. A tudo isto acresce a necessidade de atender à especificidade de cada estabelecimento de ensino e do quadro organizacional dos diferentes níveis de ensino.

5.3.10 Interaccionismo Simbólico

O interaccionismo simbólico dá especial atenção ao indivíduo e à forma como este se relaciona com os padrões de organização social. Para George Mead, um autor fundamental desta corrente, a sociedade representa os padrões construídos de actividade coordenada, os quais são mantidos, mas também mudados, através da interacção entre actores sociais.

Nesta perspectiva, a sociedade é construída, e permanentemente reconstruída, com base nos processos de interacção. Neste processos, é fundamental o universo

simbólico, tido como conjunto de convenções que permitem a formação de consensos,

e através dos quais os indivíduos atribuem sentido à sua experiência como seres

individuals e relacionais. A aprendizagem da linguagem simbólica acontece através da socialização, mediante a qual os indivíduos adquirem as normas, regras e valores que lhes permitem viver em sociedade, pelo que o indivíduo se vai desenvolvendo à medida em que vai sendo capaz de assumir e compreender uma variedade de atitudes e papéis.

Erving Goffman, por sua vez, demonstra como aquilo que somos depende da forma como o outro nos percepciona, mas sublinha a espontaneidade e criatividade dos indivíduos nas interacções sociais, estando estes menos presos a constrangimentos e convenções. Neste sentido, é a capacidade interpretativa do universo simbólico em que o indivíduo se insere que lhe permite perverter as regras das diferentes situações sociais, preservando assim a sua identidade.

No âmbito da sociologia da educação, os trabalhos levados a cabo por Peter Woods, Lacey e Régine de Sirota são exemplos de estudos recentes sobre as estratégias de sobrevivência desenvolvidas, quer pelos alunos, quer pelos professores.

5.3.2 A Fenomenologia

Alguns autores distinguem o interaccionismo simbólico da abordagem fenomenológica pela ênfase que a última coloca no sentido que os indivíduos atribuem às suas acções, introduzindo novos conceitos na análise microsociológica.

A distinção entre sentido subjectivo e sentido objectivo, enunciada por Schultz permite compreender a diferença entre o sentido que aparece ao actor e o que se deixa apreender por outrem.

Na mesma linha, R. Laing distingue o comportamento da experiência:

O comportamento é aquilo que se pode observar do exterior, enquanto a experiência é aquilo que a pessoa integra no seu mundo interior. Isto significa que nunca podemos ter acesso à experiência dos outros. Aceitar esta distinção fundamental ê situarmo-nos no registo do estudo das pessoas, e não no estudo nem do organismo humano, nem do indivíduo. O estudo da pessoa pressupõe que o investigador a vê como responsável, capaz de escolhas, em resumo, como ser que age. (PINTO, 1995:108)

Compreender o mundo do outro, a sua forma de aí ser e estar, constitui o objecto da análise fenomenológica. Tal pressupõe o estudo do sujeito activo, em interacção, surgindo a intersubjectividade como um conceito central de uma sociologia que se assume como interpretativa.