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E NTREVISTAS EM P ROFUNDIDADE

1. I NTRODUÇÃO

5.1 E NTREVISTAS EM P ROFUNDIDADE

Na etapa preliminar de pesquisa, buscou-se, através de 16 entrevistas em profundidade, aumentar a familiaridade com o objeto de estudo e com os conceitos envolvidos. Esta etapa teve como principal finalidade proporcionar um maior entendimento sobre o processo de insatisfação e seus diferentes mecanismos de desenvolvimento, e, mais especificamente, ajudar a melhor manipulação das variáveis controladas nos cenários, bem como, a operacionalização adequada dos construtos presentes na estrutura teórica.

Buscou-se verificar se a percepção dos clientes sobre as demais empresas, os concorrentes daquela que determinado serviço insatisfatório ocorreu, influencia as ações posteriores à insatisfação em dois sentidos. Este foi um elemento importante a ser investigado, pois representava uma dúvida do pesquisador para a inclusão de mais uma variável (atitude frente à concorrência) à estrutura teórica. Em primeiro lugar, se os clientes insatisfeitos avaliam as ofertas dos concorrentes, e obtendo mais valor na concorrência exigem uma resposta da empresa atual, ou simplesmente trocam. Em segundo lugar, se os clientes avaliam se a concorrência fa ria o mesmo naquela situação. Alguns comentários surgiram do tipo, “outros restaurantes fariam o mesmo nesse caso, por isso ainda freqüento o local”. O contrário é menos freqüente, porém, também existe, “tenho certeza que o restaurante X não faria a mesma coisa, lá eu sou tratado de forma diferenciada”.

Porém a relação entre as avaliações sobre a concorrência e as ações pós- insatisfação mostrou ser insuficiente para ser adicionada ao modelo. Isso parece ocorrer, pois no setor de alimentação e de restaurantes existem muitos players no mercado e a diferenciação entre eles e suas ofertas é gritante, dificultando a avaliação do cliente sobre a concorrência. Estima-se

que no Brasil, haja 750 mil restaurantes, bares, lanchonetes, pizzarias e outros operando forma lmente e informalmente segundo Maricato (2000). Além disso, a praticamente não existência de barreiras à saída e à troca de fornecedor favorece o descarte e a experimentação de outros restaurantes antes mesmo de uma completa avaliação das ofertas e das atitudes das outras empresas frente a essas situações. A atitude, portanto, do consumidor frente à concorrência nesse setor parece exercer menor influência sobre a tomada de decisão pós- insatisfação do que no setor de telefonia móvel, por exemplo.

Outra observação foi que os estudantes costumam freqüentar restaurantes. Obviamente, eles preferem ambientes de menor formalidade, nos quais é possível conversar em grupo, mas esses locais devem oferecer sortimento similar ou igual dos locais mais formais. Suspeitava-se que os jovens freqüentavam apenas os barzinhos com pouco consumo de alimentos. Porém essa suspeita foi desconfirmada. Restaurantes menos formais são freqüentemente utilizados para encontros entre amigos e casais de namorados. Alguns até preferem esses locais, argumentando que nos barzinhos o sortimento é pequeno e, após certo período, sente-se fome.

Algumas pessoas indicaram receio em reclamar e a chegar numa situação estressante com algum restaurante, principalmente, pois têm medo de ter sua comida intencionalmente estragada. Essas pessoas dão ênfase aos aspectos de higiene dos alimentos e do ambiente. Esse receio identificado em algumas pessoas (de que o garçom possa cuspir na comida, que os alimentos possam ser intencionalmente sujos, etc.) pareceu restringir momentos de tensão entre alguns clientes e funcionários pelo medo de ter sua comida burlada. Esse aspecto ressalta a importância da confiança na relação entre o cliente e a empresa e que práticas que evidenciem comportamento íntegro e confiável são valorizadas.

Como fatores geradores de insatisfação o atendimento do garçom, a demora ao servir, a comida abaixo das expectativas, a falta de limpeza do ambiente e o preço abusivo por um serviço pouco descente foram os fatores mais indicados nessa ordem. Quando solicitados a informar um único fator que os provoca indignação, o atendimento pouco solícito do garçom foi o mais lembrado. Os entrevistados ainda demonstraram que um tempo de até 30 minutos é razoável num restaurante e que 40 minutos, embora aceitável, já provoca certa insatisfação. O tempo de uma hora foi indicado como excessivo e determinante de alta insatisfação.

Com base nessas informações, pode-se desenvolver um cenário mais parcimonioso que instigasse a insatisfação. Não foi incluída explicação sobre a falha do serviço na história. Nas entrevistas em profundidade, os entrevistados mostraram-se pouco interessados em receber

explicações sobre quem era responsável pelo problema, ou porque a falha ocorreu e mais em como o problema seria contornado. Os clientes sabem que falhas na indústria de serviços são bastante comuns devido a erros humanos (p. ex. o garçom entrega a ordem errada numa mesa, a cozinha prepara a ordem, etc.). Além disso, os efeitos de uma explicação à falha de serviço não estão claros na literatura, eles podem ser percebidos como negativos, pois a empresa estaria negando a responsabilidade, e fomentando a insatisfação (Tax et al., 1998).

Com relação às influências das variáveis, o nível de insatisfação parece ser condição essencial às ações posteriores a esse estado. Todos os entrevistados, sem exceção, que relataram um caso em que um incidente grave ocorreu, indicaram ter trocado de empresa e divulgado o problema a outras pessoas. Porém, aqueles que relataram uma falha não geradora de indignação mostraram ser mais pacientes e dar uma outra chance ao restaurante em questão. A ação de reclamação parece ser menos dependente do nível de insatisfação e a receber a influência de outras variáveis. Quando o entrevistado percebe que a empresa é confiável e que a reclamação terá efeitos positivos, tanto em relação ao retorno oriundo do registro do problema, quanto sobre a consideração por parte da empresa da reclamação e a implementação de melhorias, a reclamação parece mais provável de ser efetivada. A atitude do cliente frente à reclamação parece ter alta influência na ação de reclamação. A autoconfiança também demonstrou ser um fator de influência a ser considerado. Aqueles entrevistados que se mostraram autoconfiantes em suas ações de consumo (p.ex., tomada de decisão de compra, interface com vendedores, análise de opções de compra) indicaram reclamar em praticamente todas as suas experiências insatisfatórias com restaurantes, independentemente da seriedade do problema. Os demais fatores apontados pela teoria, como: grau de relacionamento e alienação também parecem influenciar o comportamento de reclamação. Em relação ao grau de relacionamento a lógica é a de que, em restaurantes conhecidos, os clientes sentem-se mais à vontade de reclamar, além de esperarem por um retorno mais positivo da reclamação, do que em restaurantes que estão experimentando pela primeira vez. A alienação parece exercer influência sobre o comportamento de reclamação, porém, a maior parte dos entrevistados pareceu confiar nas práticas dos restaurantes em geral.

Após a realização destas entrevistas, os cenários foram criados e, então, testados qualitativamente com uma amostra de 20 estudantes. Nesta etapa algumas pequenas mudanças foram feitas e a manipulação pareceu atingir o objetivo proposto.