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1. UM ESTALO NAS FACULDADES DE DIREITO: fundamentos para uma análise

1.2. AJUP: UM CONCEITO , UM MOVIMENTO

1.2.3. O ADJETIVO POPULAR

A palavra “popular” possui uma significativa elasticidade semântica, a propósito da qual

não discorrerei34. Cabe discutir neste trabalho o modo como ela se adjetiva à prática da

assessoria jurídica. Nesse caso, a identificação com o “popular” implica numa opção ideológica por estar ao lado do “povo” explorado, analiticamente compreendido aqui como a

classe trabalhadora e os demais sujeitos subalternizados na sociedade de classes. No léxico das esquerdas e nas formulações ligadas à AJUP, esses sujeitos passaram a ser identificados nas últimas décadas como movimentos sociais populares. Desse modo, o apoio às lutas dos

movimentos sociais é o principal elemento que costuma caracterizar a prática da assessoria jurídica popular. Nas palavras de Luiz Otávio Ribas:

A assessoria jurídica popular, amplamente concebida, consiste no trabalho desenvolvido por advogados populares, estudantes, educadores, militantes dos direitos humanos em geral, entre outros, de assistência, orientação jurídica e/ou educação popular com movimentos sociais, com o objetivo de viabilizar um diálogo sobre os principais problemas enfrentados pelo povo para a realização de direitos fundamentais para uma vida com dignidade, seja por meio dos mecanismos oficiais, institucionais, jurídicos, seja por meios extrajurídicos, políticos e de conscientização (RIBAS, 2009, p.48. Meus grifos).

Desde a sua origem, no contexto do enfrentamento à ditadura militar, a AJP esteve comprometida com as lutas sociais. Mais tarde, as movimentações que resultaram na criação da RENAP foram fundamentalmente provocadas por movimentações de trabalhadores rurais na luta pela terra. O Primeiro Encontro Nacional da RENAP, em dezembro de 1995, no Seminário em Defesa dos Povos da Terra, em São Paulo (MAIA: 2007; TAVARES: 2007), ocorreu num contexto de extrema criminalização destes sujeitos, como comenta Jacques Alfonsin:

Um grupo de advogados que já vinham servindo ao MST, à CPT, e a grupos de sem- teto, tanto na esfera criminal como na cível, se reuniram em São Paulo, em 1995, um ano em que a escalada de violência policial contra o MST pedia urgente apoio jurídico. Por sugestão do Dr. Plínio de Arruda Sampaio, ali foi criada de maneira muito informal a RENAP, então denominada de Rede Nacional de Advogados Populares (ALFONSIN, 2005, p. 356).

A RENAP foi criada, portanto, com o intuito de organizar advogados para a defesa dos trabalhadores rurais contra as violentas forças do capital, movimentação que já vinha ocorrendo de modo espontâneo desde a ditadura militar. De acordo com Ana Cláudia Tavares

(2007, p. 69), “essa articulação de advogados possui íntima relação com o processo de

organização política dos movimentos ou grupos populares”. Em entrevista concedida para a

34 A respeito das diferentes compreensões acerca do termo “popular”, conferir a pesquisa de José Francisco de

Melo Neto (2006) junto “a militantes de movimentos sociais populares e/ou partidários de uma alternativa

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sua dissertação de mestrado, um dos fundadores da RENAP comenta que, no período de criação da rede, muitos advogados estavam saindo do PT e dos sindicatos em que trabalhavam para abrir escritórios próprios, de modo que havia certa desilusão dos advogados com os partidos e o sindicalismo rural e urbano. A RENAP nasceu, segundo ele, como uma demanda

dos “movimentos sociais”, sobretudo do MST, por advogados que defendessem os

trabalhadores rurais numa época de forte criminalização da luta pela terra. Dez anos depois de sua criação, os sujeitos que a RENAP defendia continuavam os mesmos (como continuam ainda hoje):

Organizações informais e formais, movimentos populares como o MST (Movimento de Sem Terra), MMTR (Movimento das Mulheres Trabalhadoras Rurais), MPA (Movimento de Pequenos Agricultores), MAB (Movimento de Atingidos por Barragens), MNLM (Movimento Nacional de Luta por Moradia), CPT (Comissão Pastoral da Terra), CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), MTD (Movimento de Trabalhadores Desempregados), Movimentos e Comissões de Direitos Humanos, Sindicatos rurais e urbanos, pastorais, grupos de pessoas dedicadas à defesa de direitos humanos violados pela tortura, pelo racismo, pelas prisões ilegais, à defesa de crianças e adolescentes, de homossexuais, do direito à livre expressão através das rádios comunitárias, entre outros, têm procurado apoio nos serviços da RENAP (ALFONSIN, 2005, p.84).

Os vínculos estabelecidos pelos grupos que compõem a RENAJU também se enlaçam aos mesmos sujeitos. Como escreveram os estudantes do NAJUP num artigo intitulado Sobre a atuação das assessoria s jurídica s popula res junto aos movimentos sociais e à s organizações populares, “não há a menor dificuldade em apontar os sujeitos com os quais as

AJUPs lidam: são os movimentos sociais da cidade e do campo, as organizações populares,

comunitárias, as redes populares”, enfim, todas as formas de organização dos “homens e mulheres oprimidos e oprimidas de nossa sociedade” (ANDRADE; AZEVEDO; VALENÇA,

2008, p.04).

No entanto, a conformação da RENAJU percorreu um longo percurso até estabelecer a identidade com as lutas sociais de uma forma mais consolidada. Os estudantes se articularam inicialmente nesta rede de modo mais distante das organizações populares. Na verdade, houve certa polêmica quanto aos termos em que estavam dispostos a apoiar os movimentos sociais

num dado momento histórico dessa organização.

Em meados dos anos 2000, houve um amplo debate na RENAJU a respeito das relações entre os núcleos e os movimentos sociais35 motivado pela ocorrência de certas manifestações controversamente avaliadas pelos integrantes da AJUP, em muito influenciados pela

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Os relatos que se seguem estão fundamentalmente baseados na memória coletiva resgatada com a colaboração de antigos integrantes da RENAJU, sistematizada por meio de diálogos ao longo da pesquisa. Agradeço especialmente a Ornela Fortes, Luaní Melo, Diana Melo, Roberto Efrem Filho, Thiago Arruda, Cláudio Silva Filho e Homero Bezerra pelo resgate dessa história. Alguns aspectos dela, com olhares diversos, já haviam sido sistematizados em outros trabalhos, especialmente no de Sumaya Pereira e Assis Costa (2009).

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repercussão negativa com que a mídia as noticiava. Uma dessas movimentações teve como protagonista o Movimento de Mulheres Camponesas em março de 2006, no Rio Grande do Sul. Para marcar a passagem do dia 08 de março, o Dia Internacional da Mulher, as trabalhadoras adentraram um laboratório da empresa Aracruz Celulose36 e destruíram sementes e pés de eucalipto, buscando chamar atenção para os problemas socioambientais ligados ao monocultivo desta planta pelo agronegócio.

Logo após este protesto, aconteceu um Encontro da Rede nacional de Assessoria Jurídica Universitária em Fortaleza (abril de 2006). Para definir a “atuação da rede”, ali se

discutiu, entre outras coisas, “o relacionamento com os Movimentos Sociais”. Eis o primeiro

dos encaminhamentos registrados na relatoria da Plenária Final daquele ERENAJU, contando com o apoio de oito dos dez núcleos presentes no encontro:

Por oito votos favoráveis, dois votos contrários e uma abstenção, a RENAJU decidiu que deve apoiar criticamente os movimentos sociais que lutam contra as formas de opressão. O apoio pode se dar de formas múltiplas, com atuação em conjunto, manifestação pública através de notas e cartas abertas etc. Diante de uma situação concreta, o projeto mais envolvido propõe a forma de apoio (RENAJU, 2006, meus grifos).

Neste mesmo documento, o registro de algumas dessas iniciativas de “apoio crítico” merecem destaque. Em primeiro lugar, os estudantes aprovaram a elaboração de nota de apoio ao MST em função do contexto nacional de repressão a este movimento, cuja atuação vinha

sendo constantemente questionada como “ilegal”, na época, sobretudo por parte do Ministério

Público. Em virtude desse contexto de criminalização, o MST havia ocupado o INCRA em Fortaleza, na mesma época desse ERENAJU de 2006. Daí a proposta de a RENAJU assinar uma nota de apoio a esta ocupação e ao movimento, de uma forma geral. A aprovação desta nota foi objeto de intensa polêmica, por conta do questionamento de muitos estudantes a

respeito da “radicalidade” das ações do MST. A segunda proposta mencionada consistia numa

nota de apoio ao Movimento Passe Livre (MPL)37, assim “batizado” no ano anterior (em janeiro de 2005), no V Fórum Social Mundial em Porto Alegre (BARROS, 2015, p.82). No mesmo ano do ERENAJU em questão, 2006, o MPL promoveria seu terceiro encontro, com a participação de coletivos que representavam o movimento em mais de 10 cidades do país38.

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O protesto foi lembrado pelo MST, cinco anos depois (2011), como um ato paradigmático na luta contra o agronegócio do eucalipto. Disponível em: <http://www.mst.org.br/Protesto-das-mulheres-na-Aracruz- completa-5-anos>. Acesso em dezembro de 2014.

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Para um breve resgate da história do MPL e das lutas por transporte público no Brasil, conferir a monografia de Melka Germana Barros (2015), ex-integrante do NAJUC, intitulada Do direito à Cidade ao Direito ao Transporte: ensaio sobre a criação de um direito social.

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Esse encontro do MPL ocorreu na Escola Nacional Florestan Fernandes, ligada ao MST, contando com a participação de coletivos que representavam o movimento em mais de 10 cidades do país. Informações disponíveis em: < http://tarifazero.org/mpl/>. Acesso em dez/2014.

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Os estudantes também encaminharam a redação de uma carta à UNE posicionando-se quanto à concepção da RENAJU sobre extensão universitária. Tal concepção era fruto das discussões que os estudantes realizaram sobretudo a partir de 2005, com a controvertida participação da RENAJU no Seminário Emancipar do Governo Federal, sobre a qual voltarei adiante. Além desses documentos, decidiram que a RENAJU passaria a realizar campanhas anuais em prol de temáticas junto às quais os núcleos estivessem atuando. “Movimentos Sociais e Direito” era o tema escolhido para campanha do ano de 2006 até o próximo ERENAJU, em 2007.

É de se notar que a rede comprometeu-se em apoiar criticamente os movimentos sociais. A restrição se devia à rejeição da maioria dos estudantes ao que consideravam

inconsequências ou atos de violência, atribuídos a certas movimentações mais radicalizadas

desses sujeitos, como a das mulheres camponesas, acima mencionada. A “criticidade”

permitia certo distanciamento em relação às ações das quais os estudantes discordavam. Houve muita divergência, naquela plenária final, em relação ao teor crítico através do qual a RENAJU se comprometia com as lutas populares.

A questão se tornou ainda mais polêmica devido às discordantes avaliações dos estudantes sobre um acontecimento posterior ao ERENAJU, ocorrido em junho de 2006. Trata-se de um tumultuado protesto no Congresso Nacional organizado pelo Movimento de Libertação dos Trabalhadores Sem Terra (MLST), no qual os manifestantes entraram em conflito com a equipe de segurança que os impedia de acessar a Plenária da Câmara de Deputados.

O episódio foi amplamente noticiado pela mídia, com repercussão extremamente

negativa, como de costume, associando a mobilização à “baderna” e à “violência”. A edição

de 07 de junho daquele ano da Folha de São Paulo relatou que os manifestantes, pertencentes a

um grupo dissidente do MST, protagonizaram ontem um dos maiores atos de vandalismo contra o Congresso ao invadir e depredar parte da Câmara dos Deputados”. Os sem-terra,

após “romper o cerco” dos seguranças da Câmara que os impediam de adentrar o prédio, teriam destruído “tudo o que encontraram pela frente”. A Folha de São Paulo não deixou de inventariar o prejuízo causado pelos “vândalos”: “várias luminárias, quatro computadores,

três portas de vidro, um busto de bronze do ex-governador Mario Covas (1930-2001) e duas exposições - uma de pássaros e plantas e outra de fotos”39.

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Nesta ocasião, houve uma polarização na RENAJU sobre o significado daquele protesto e a forma de lidar com ele40. Circulavam fortes críticas sobre o modo “violento” com o qual o movimento havia procedido naquele ato. Em acaloradas discussões na lista de e-mails, alguns sustentavam que aqueles acontecimentos eram uma resposta para a violência a que eles estavam submetidos cotidianamente. Contrapondo-se a esta perspectiva, outros argumentavam que a violência gera mais violência, e que os movimentos sociais acabavam por perder a razão ao proceder daquele modo inconsequente. No âmago desse debate, foi sugerido que a RENAJU, já que havia decidido pelo apoio crítico aos movimentos sociais, deveria posicionar-se critica e publicamentequantoàqueles acontecimentos,por meio de uma carta de repúdio aos atos violentos praticados pelo MLST no Congresso Nacional. No outro polo, alguns estudantes rechaçavam a proposta, argumentando principalmente que eles, por mais que pudessem ter restrições ao ocorrido, não deveriam se colocar em público contra aqueles sujeitos, engrossando o coro com os setores mais conservadores da sociedade que repudiavam a luta pela terra. Convencidos disso ou não, o fato é que a tal proposta da nota de repúdio não caminhou adiante.

A RENAJU, portanto, mantinha até então frouxos vínculos com as lutas sociais mais acirradas. Tanto que, nessa mesma época, se conformava outra articulação buscando organizar os estudantes de direito para esse tipo de apoio: a Rede Popular dos Estudantes de Direito. A REPED configurava-se como uma organização demandada por determinados sujeitos políticos, especialmente os ligados à luta pela terra, próximos ao campo de influência do MST. Esta rede vinha se conformando desde 2006, mas com dificuldades de reunir sujeitos dispostos à sua construção. O Congresso Nacional do MST em 2007 foi um espaço importante para articular estudantes de direito em torno dessa proposta. A partir de então, em alguns estados se conseguiu uma organicidade maior, como no Paraná e em Pernambuco, mas no geral, a REPED não se consolidou. Avalio que parte significativa das motivações que impediram sua consolidação relaciona-se à impossibilidade de construir outra articulação de estudantes progressistas no direito, voltada ao apoio às lutas sociais, de modo independente da RENAJU. A bem da verdade, boa parte dos articuladores da REPED integravam núcleos de assessoria jurídica popular e/ou participavam de coletivos de esquerda do movimento estudantil tradicional. Estas pessoas, na época, já construíam a RENAJU e/ou organizações políticas estudantis como a FENED. Por mais que houvesse diversas orientações ideológicas

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Informações resgatadas dos debates travados pela lista de e-mails da RENAJU no período, acessados com o indispensável auxílio de Thiago Arruda, à época integrante do Núcleo de Assessoria Jurídica Comunitária (NAJUC - CE); hoje professor da Universidade Federal do Semi - Árido (UFERSA) em Mossoró/ RN.

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nestas movimentações dos estudantes de direito, não havia muitas pessoas com quem dialogar fora delas.

Os estudantes da AJUP, inclusive, apoiavam a conformação da REPED. Tanto que, no ERENAJU seguinte, em 2007 (Curitiba), aprovaram uma nota de apoio àquela entidade (RENAJU: 2007). Mas também estranhavam o modo como tal articulação se construía. Circulava a avaliação de que não encontravam o espaço desejável para pensar coletivamente a REPED, que havia certa rigidez e verticalidade no modo como ela estava sendo pautada. Na estrutura da REPED havia coordenações em vários níveis, uma estrutura mais centralizada com tarefas a cumprir de acordo com as prioridades políticas do campo das organizações que a demandavam. A forma horizontal com a qual os estudantes da RENAJU concebiam o

modelo organizativo “rede” causava certo estranhamento com um processo mais contundente

de direção política, o que em boa medida os afastava desta incipiente organização.

Atualmente, a RENAJU está mais próxima das expectativas que se projetaram com a tentativa de construção da REPED. De fato, os grupos pesquisados mantêm uma relação efetiva com diversos sujeitos protagonistas das lutas sociais no campo e na cidade. Em pesquisa sobre a AJUP desenvolvida em 2007, Luiz Otávio Ribas relata que os estudantes entrevistados (pertencentes a diversos núcleos de assessoria do Brasil) sentiam-se

“indignados” com a injustiça social, com a “exploração” e com a “miséria” e por isso

decidiam trabalhar junto ao “povo pobre”. Para eles, esta decisão não implicava em trabalhar diretamente com movimentos sociais, no dizer de Ribas, pois essa perspectiva poderia também se concretizar através de parcerias com o Estado ou com organizações não- governamentais, por exemplo. Entre os grupos que atuavam com organizações populares, os vínculos se estabeleciam principalmente junto a movimentos de moradia, acesso à cidade e reforma urbana como o Movimento Nacional de Luta por Moradia (MNLM); a Central de Movimentos Populares (CMP), o Fórum Nacional de Reforma Urbana, conselhos, associações de moradores etc; junto aos movimentos de luta pela terra como o Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB); com movimentos anti-capitalistas como o Movimento Resistência Popular e coletivos anarquistas; com o movimento estudantil simbolizado pelo Movimento Passe Livre; e junto a lutas por participação democrática como nas atuações em Conselhos do Orçamento Participativo, associação de moradores etc. (RIBAS: 2007, p. 58).

A minha pesquisa de campo, realizada em 2013, aponta para o fato de que todos os grupos de AJUP do Nordeste atuam e mantêm fortes vínculos com organizações populares. Esta atuação pode ser sistematizada em três principais âmbitos temáticos, como registrei em

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dois trabalhos anteriores (ALMEIDA: 2014a e 2014b): as lutas na cidade em apoio a movimentos de moradia como o Movimento de Luta em Defesa da Moradia (MLDM) e o Movimento de Trabalhadores Sem Teto (MTST); movimentações que reivindicam transporte público e mobilidade urbana; apoio a associações de bairro etc.; as lutas por terra e território em apoio a organizações como o MST, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), os indígenas e os quilombolas; e as lutas relativas às questões de gênero, sexualidade e feminismo em apoio aos movimentos de mulheres e LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros). Existem, ademais, outras movimentações apoiadas pelas AJUP da região Nordeste além dessas que se agrupam em torno dos três principais âmbitos elencados, como as lutas estudantis em geral, as ligadas à questão prisional, à matriz energética, ao direito de crianças e adolescentes, à reforma política, entre outras.

I – As Lutas na cidade

A totalidade dos grupos estudantis de assessoria jurídica popular universitária pesquisados, na região Norte-Nordeste, atualmente encontra-se envolvida com as lutas travadas na cidade pelas organizações populares. As principais pautas são, sem dúvida, a moradia e a mobilidade urbana (sobretudo quanto ao transporte público), e a centralidade dessas lutas para a AJUP consolidou-se ainda mais por conta da Copa do Mundo que o Brasil se propôs a sediar em 2014. Ainda que apenas três cidades na região tenham sido escolhidas para sediar os jogos – Salvador, Recife e Fortaleza -, o país, como um todo, passa por um momento de reordenamento do espaço urbano em atenção às demandas do grande capital, o que se acelerou com o evento. Essa conjuntura apresenta um acirramento dos conflitos no espaço urbano, o que se tornou emblemático nos protestos de Junho de 2013, dos quais os estudantes ligados à assessoria jurídica popular participaram ativamente, no país inteiro. Mas mesmo antes disso, alguns grupos já se encontravam ao lado das organizações de luta por moradia e transporte.

O CAJU e o NAJUC, em Fortaleza, estavam , à época da entrevista, envolvidos com as comunidades ameaçadas de despejo por conta das obras da Copa do Mundo (construção de estádios e do sistema de Veículos Leves sobre Trilhos (VLT). Neste trabalho, atuavam junto ao Comitê Popular da Copa (que reunia várias organizações, inclusive representantes de partidos políticos) e o Movimento de Luta em Defesa da Moradia. O SAJU-BA, em Salvador, atuava com o Movimento dos Sem Teto da Bahia (MSTB) e, entre outras questões,

problematiza o Programa “Minha Casa, Minha Vida” enquanto forma de buscar garantir o “direito à moradia”. Em João Pessoa, o NEP Flor de Mandacaru atuava junto à ocupação “Tijolinho Vermelho”, no coração do centro da cidade, ligada ao Movimento Terra Livre. Em

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São Luís do Maranhão, o NAJUP Negro Cosme acompanhava o Fórum de Comunidade Ameaçadas de Despejo. Em Teresina, o Cajuína tinha relações com o Movimento de Luta de Bairros, Vilas e Favelas (MLB); desenvolvendo também atividades junto à área das Lagoas do Norte (projeto de reordenação do espaço urbano para atender a uma demanda de turismo), além de ter iniciado articulações com o movimento de moradia para acompanhar ocupações rururbanas (áreas afastadas, com características rurais, mas em perímetro urbano). Em Natal, o Motyrum acompanhava o Movimento de Luta de Bairros e Favelas, assim como o Comitê Popular da Copa, incidindo sobre os processos de despejo em virtude da Copa do Mundo. No Recife, o NAJUP Direito nas Ruas desenvolvia atividades junto a uma ocupação urbana, o

“Casarão”; além de haver se envolvido num dos conflitos mais emblemáticos quanto ao

processo de reordenação do espaço urbano em função dos interesses do capital, o Projeto

“Novo Recife”, contra o qual se insurgiu o movimento #OcupeEstelita.

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