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transformadas para a construção histórica de uma sociedade não antagônica

4. O C AMINHO T EÓRICO PARA O D ESVELAMENTO DO

COTIDIANO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL

Para resgatarmos a historicidade da análise do exercício profissional do assistente social em seu cotidiano, partimos do pressuposto de que na centralidade destas relações, na sociedade capitalista, está a necessidade de reprodução ampliada dos lucros dos capitalistas – em detrimento das necessidades humanas – através da exploração do trabalho, também ampliada. Entendemos, então, que se faz necessário um esforço para situarmos brevemente o assistente social no tempo e na história - na sociedade capitalista contemporânea – e neste contexto, compreender os elementos que compõem o seu exercício profissional:

Sendo o trabalho a categoria fundante do ser social, são as características do estranhamento do trabalho humano (trabalho alienado) na sociedade capitalista – calcada na propriedade privada dos meios fundamentais de produção - que constitui a base social humana da sociedade capitalista: um trabalho que, em vez de auto-atividade humana, restringe-se a um meio empobrecido de se prover uma vida material e espiritualmente empobrecida; em que o trabalhador é reduzido a mais desvalorizada das mercadorias, a força de trabalho, a qual é obrigado a vender para sobreviver, sendo a única que, contrariamente a todas as demais, é a mercadoria que quanto mais barata é vendida, mais lucro traz ao capital – seu explorador, o dono dos meios necessários de produção para que a força de trabalho possa ser colocada em atividade e gerar a riqueza necessária para a reprodução da espécie humana.

Por isso, Pereira (2009) ressalta a centralidade da categoria trabalho para podermos compreender a atuação profissional do assistente social e, mais que isso (e pré-requisito para tal), entendermos a forma como funciona a sociedade capitalista na qual está inserida a atuação profissional do assistente social.

Mas esta categoria não é exclusiva da sociabilidade capitalista. Defendemos que o trabalho é “categoria fundante” do homem, ou seja, é o que permitiu que aquele homem animalizado dos primórdios se tornasse este ser humano “civilizado”, passando a suprir suas necessidades através de sua intervenção na realidade mediante seu trabalho (concreto), criando objetos cujas peculiaridades satisfazem suas

necessidades (ele tem, portanto, um valor-de-uso) que o homem, paulatinamente, saiu das cavernas e construiu casas, deixou de caçar e passou a comprar alimentos no mercado, ou seja, foi se sociabilizando e se tornando o homem que é hoje – um ser social (LUKÁCS, 2011).

Partindo deste entendimento, Pereira (2009) aponta outras categorias analíticas que se entrecruzam com o trabalho. A primeira dela refere-se a necessidades sociais, pois o que move o trabalho humano é o suprimento de necessidades. Quando o homem das cavernas estava com fome, abatia uma caça para suprir sua necessidade de comer. Assim, ele desempenha um trabalho concreto (caçar) para obter algo (caça) que tem uma utilidade (valor de uso) para suprir uma necessidade (comer). Inicialmente, trabalho útil, concreto. Contudo, conforme o homem vai saindo da sua base biológica ao ampliar sua base social (vai deixando de ser “homem das cavernas” e vai se tornando “homem civilizado”) ele vai suprindo necessidades cada vez mais complexas de formas igualmente cada vez mais complexas. Se nas cavernas o homem caçava para comer, hoje trabalha, recebe o salário, vai ao mercado e tem muitas opções para suprir sua fome.

Na sociedade capitalista, portanto, complexificamos a maneira de suprirmos nossas necessidades, sendo sempre mediado pelo mercado, obtido através do dinheiro, impondo-nos a condição de assalariados, o que nos submete a exploração sistemática.

Desta maneira, segundo Pereira (2008), a categoria “necessidade” na sociedade capitalista está atrelada a “exploração” que também se integra à categoria trabalho (já que a sociedade capitalista pauta-se na exploração do trabalho). É a exploração que dá origem a luta de classes (entre os explorados e explorador) que, no século XIX fez surgir a chamada “questão social”, criando a demanda de implementar políticas sociais para garantir direitos conquistados pela classe trabalhadora, emergindo do real, desta forma, a necessidade da profissão do Serviço Social. Desta maneira:

[...] necessidades sociais, exploração, questão social, políticas sociais e direitos formam uma cadeia de categorias-chave que estão no contexto da relação entre Serviço Social e trabalho (PEREIRA, 2009, p.26)

Tais categorias são as mais rentes ao locus do exercício profissional cotidiano e possuem origem no campo histórico, situadas na sociedade capitalista, a qual entendemos ser importante ser desveladas algumas leis fundamentais de seu funcionamento para podermos compreender o real.

Partindo deste entendimento e, através de sucessivos movimentos de abstração, pretendemos sair de sua imediaticidade, característica da esfera cotidiana - concebendo que o ponto-chave para seu desvelamento é a análise ontológico-histórica das categorias principais que compõem a causalidade no qual incide o por teleológico do assistente social – desvelando sua essência histórica para retornar novamente ao cotidiano, vislumbrando-o agora como uma esfera rica em múltiplas determinações e conexões que hão de ser entendidos e utilizados na ação profissional, mediado por concessões históricas que jamais abandonam os princípios ético-políticos da profissão e a necessidade histórica que se coloca de construção da sociedade comunista.

De acordo com o posicionamento crítico que a profissão assumiu, faz-se necessária uma investigação ontológica, entendida, em conformidade com Lukács (apud LARA, p.02) “como um estudo do auto-desenvolvimento da vida material e espiritual da sociedade humana” tendo como ponto de partida o trabalho humano. Ao retomar a centralidade do trabalho na constituição do humano-genérico, retoma-se o pensamento autenticamente revolucionário “evidenciando a vitalidade dos fundamentos da teoria social de Marx como a crítica mais radical, a apresentar a proposta humanitária mais integral” (LARA, 2011, p.01).

Assim, nossa pesquisa, em conformidade com a perspectiva marxiana, parte e se finaliza no cotidiano do exercício profissional do assistente social e é preenchida com conjunto de categorias e mediações que explicam a profissão de Serviço Social, fruto do movimento da sociedade burguesa contemporânea em transição histórica. Em outros termos, parte da realidade concreta dos fenômenos singulares às mais altas abstrações, e destas à realidade concreta novamente.

[...] o processo do conhecimento transforma ininterruptamente as mais altas universalidades em particulares modos de apresentação de uma universalidade superior, cuja concretização conduz muito frequentemente, ao mesmo tempo, à descoberta de novas formas de particularidade, como mais próximas determinações, limitações e especificações da nova universalidade tornada mais concreta. (LUKÁCS, 1978, p. 103).

Este conjunto de categorias e mediações que “preenche”, ou seja, fundamenta e diferencia a primeira análise do cotidiano do exercício profissional (limitada a sua superficialidade) e a segunda análise (desveladas ontológico-historiamente) serão “garimpadas” do material a ser coletado na pesquisa bibliográfica, porém já norteados por uma

coluna dorsal: as categorias apontadas por Pereira (2009) como fundamentais para compreender a profissão (trabalho, luta de classes, necessidades sociais, exploração, questão social, políticas sociais e direitos), balizada por duas categorias centrais para a compreensão da sociabilidade capitalista: trabalho alienado e propriedade privada dos meios fundamentais de produção.

Para desvelar o cotidiano profissional, estas categorias serão abordadas numa perspectiva de totalidade, o que requer o movimento teórico do universal ao singular. Para tanto, pretendemos nos afastar das categorias que mais rentes ao locus do exercício profissional, buscando categorias que compõem o primeiro pólo (universalidade) e dizem respeito ao contexto mais geral da sociedade capitalista por meio de Marx (2002; 2011), Mészáros (2009) e Valência (2009): a lei geral de acumulação capitalista, a crise estrutural do capital, o mercado mundial, capitalismo monopolista, transição histórica, etc.; e a vinculação deste macro com a discussão mais aproximada da profissão através de Netto (2004 e 2007) e Iamamoto (2008). Por entendemos ser o trabalho a categoria que funda o homem, todas as categorias analisadas terão relação mais mediata ou imediata com o trabalho.

Quanto às questões particulares, referentes a América latina e ao Brasil, abordaremos o capitalismo dependente (Marini, 2000 e Fernandes, 2005), organizado a partir de uma forma específica de trabalho, o trabalho superexplorado, (Marini, 2000 e Valência, 2009), compreensível apenas se resgatada sua específica formação histórica, luta de classes e, consequentemente, modelos de Estado (Fernandes, 2005) e estrutura econômica (Marini, 2000 e Valência, 2009); e neste solo histórico, abordaremos também as categorias que envolvem nossa questão singular, a profissão propriamente dita, isto por meio da contribuição dos autores já citados além da discussão da emancipação humana e política (Marx, 2004), reflexões sobre cidadania e direito de Abreu (2008) e Sales (2007) para buscarmos dar pistas profícuas para uma intervenção crítica, apontada para a emancipação humana em tempos de transição histórica.

Portanto, esta é uma pesquisa teórica através da qual buscaremos elementos para apreender a profissão de assistente social e o entorno sócio-histórico que a constitui, buscando trazer maiores elementos para refletir o exercício profissional no cotidiano, buscando superar o sincretismo próprio desta profissão interventiva (NETTO, 2007).