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PARTE 1: ELEMENTOS HISTÓRICOS DA CONFORMAÇÃO SÓCIAL

4.2 O café local no contexto nacional e internacional

No final do século XIX e início do século XX, segundo Saes (1997), o café brasileiro mostrava-se mais rentável aos produtores do que o algodão, que predominara na pauta de exportação por um longo tempo. A demanda e cotação internacionais que o café adquiria, aliado aos incentivos por parte do Governo brasileiro, estimulavam cada vez mais produtores nacionais a trocar investimentos em suas plantações anteriores (algodão, milho, feijão, etc.) pelo cultivo do café.

Este, contudo, não foi o caso de Guaramiranga, que tinha a grande maioria de suas terras ainda virgens, conservando a vegetação original, antes da implantação do café. Na Freguesia de Conceição (Guaramiranga), diversos autores (LIMA,1946; LIMA, 2000; BRASIL,1861; ALEMÃO, 1861) relatam que a terra de matas recém descobertas apresentavam um solo extremamente fértil e estimulava a alta procura pela aquisição de sítios com mata nativa para derrubada das mesmas visando a produção cafeeira em sistema de monocultura. O café produzido em Conceição, entretanto, não estaria imune às oscilações internas e externas das políticas cambiais - apontadas por Saes (1997) -, influenciadas pela oferta e demandas internacionais, e susceptíveis às inconstâncias (botânicas e climáticas ou políticas) que incidiam sobre as plantações nacionais ou estrangeiras.

Em se tratando da questão botânica, a espécie Coffea Arábica - predominante em Conceição em todo o Maciço de Baturité - possuía um ciclo de desenvolvimento comercial de até nove anos, sendo os quatro primeiros anos

voltados para o crescimento da planta (MOREIRA, 1873; SAES, 1997, p. 50), e os outros cinco anos até que esta lavoura atingisse a maturidade produtiva (SAES, 1997, p. 50-51). Com a lentidão neste desenvolvimento, conforme a autora, o mercado que em um ano obtivesse altos valores de cotação, estimularia a migração de vários produtores nacionais e estrangeiros a se inserir no mercado cafeeiro através de novas plantações, que viriam mostrar seus resultados de forma retardada, ocasionando inusitados anos de superprodução, derrubando cotações, impregnando o comércio cafeeiro de constantes crises e especulações no mercado cafeeiro mundial.

A autora apresenta-nos, ainda, que no século XIX, as dez maiores firmas exportadoras de café respondiam por 60% das transações mundiais, o que lhes permitia um alto volume de estocagem de produtos em épocas de superprodução e baixo valor, visando, um alto lucro com a venda a preços melhores em anos seguintes, de baixa oferta e muita procura. Em 1906, o governo brasileiro interferiria nesta mecânica dos exportadores internacionais, e passaria a comprar o excedente produzido por agricultores brasileiros criando os próprios estoques e se beneficiando com a mesma estratégia anteriormente praticada pelas firmas exportadoras.

Esta garantia de aquisição do excedente nacional pelo governo brasileiro, ainda segundo a autora, estimularia mais ainda uma adesão de produtores nacionais, que deixariam suas culturas anteriores e passariam a cultivar café, por um lado e, por outro, o governo brasileiro promoveria a insatisfação das firmas exportadoras que passariam a investir na produção de café em outros países que não só o Brasil, fragilizando as estruturas do mercado nacional.

Nesta mesma virada dos séculos XIX-XX, Lima (1946, p. 226) relata que o café produzido em Conceição sofre uma estagnação provocada pelo empobrecimento do solo após meio século de cultivo intensivo e sem adubação para reposição de seus nutrientes. As terras desmatadas que, num primeiro momento tiveram mais valor em virtude do menor investimento para plantio agrícola, se viram com sua cotação depreciada em comparação às terras virgens. O preço das terras que ainda estavam com sua mata preservada, elevar-se-iam rapidamente promovendo uma investida dos produtores locais pela derrubada das matas restantes que se tornavam cada vez mais escassas.

Entretanto, este autor aponta, ainda, outra solução que foi encontrada pelos produtores locais após a busca incessante de alternativa para revigorar a produção em Guaramiranga: a introdução da árvore Ingazeira (Ingá Edulis Mart) em

plantio consorciado com o cafeeiro. Esta medida, bem sucedida, ocasionou praticamente um reflorestamento de boa parte do topo da serra protegendo os cafezais do sol intenso ao mesmo tempo que a ingazeira promovia, através de suas folhas secas, uma adubação biológica no solo pauperizado das plantações. Esta estratégia conseguiu revigorar a produção cafeeira local sem novas devastações ou replantio de cafezais exauridos e os cafezais antigos, após sombreados, mostraram vigor por mais décadas ainda.

Segundo Farias6, este ciclo cafeeiro, desde o início de sua implantação, proporcionou diversas mudanças do status político e econômico da localidade de Conceição, sendo a primeira delas, a elevação deste povoado à categoria de Vila em 1890. Em 1899, entretanto, um decreto do Governador Pinto Acioli, atendendo as normativas que qualificaria de “vila” apenas os povoados com mais de dez mil habitantes, anexou a Vila de Conceição ao município de Baturité.

Devido ao prestígio cafeeiro, contudo, este autor informa outras mudanças sucessivas do status político local. No Governo de Justiniano de Serpa, por exemplo,seria criado o município de Guaramiranga – não mais se chamando Conceição -, através da Lei nº 1887 de 25.10.1921. A Revolução de 1930, porém, promoveria intervenções diretas na política nacional e em 25.05.1931, em razão de uma reforma administrativa que anulava as eleições municipais, seria também extinto o município de Guaramiranga (entre muitos outros), reanexando-o ao município de Baturité. Decisão esta que não durou muito, sendo Guaramiranga desmembrada de Baturité para ser anexada na condição de distrito do município de Pacoti, pelo Decreto Estadual nº 1.156 de 04 de dezembro de 1931.

Em 1945, com a queda do Estado Novo, o então ministro José Linhares, natural de Guaramiranga, assume a Presidência da República de forma interina, mas apenas em 11.07.1957 seria restaurado definitivamente o município de Guaramiranga.

6Obra não impressa, de autoria de Francisco Marcélio de Almeida Farias, intitulada “Nossa história de conceição a Guaramiranga disponibilizada em meio virtual pelo site http://www.iaulas.com.br/site/ arquivo/14645/livros-e-apostilas-digitais/literatura/nossa-historia-de-conceicao-a-guaramiranga.html.

5 - A ORGANIZAÇÃO SOCIAL AGRÍCOLA-CAFEEIRA: RELAÇÕES PRIMÁRIAS