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Gràfico 2 Disciplina em que trabalha

3 A FORMAÇÃO DOCENTE COMO ATIVIDADE: NECESSIDADES

3.1 O conceito de necessidade: uma categoria polissêmica

“Necessidade” é um conceito polissêmico (ZABALZA, 1998): possui diferentes significados, segundo o contexto em que é utilizado. Aparecem, assim, na formação, maneiras diferentes de se compreender “necessidade” e, conseqüentemente, “necessidades formativas”.

A necessidade é, a princípio, algo que está ligado à natureza biológica do ser humano e às motivações destes. Pesquisadores referem-se a esse assunto argumentando que a sobrevivência, o bem-estar e o desenvolvimento do ser humano, quer seja biológico, psicológico ou social, dependem da satisfação de necessidades que se consideram fundamentais e autênticas.

No Minidicionário Houaiss da Língua Portuguesa, de Houaiss; Villar (2004), a definição de “necessidade” é dada como:

o que não se pode evitar (dormir é uma necessidade); o que é útil ou inevitável (sentiu necessidade de mais um casaco); compulsão física, psicológica ou moral (tem necessidade de aparecer); exigência (necessidades básicas para uma vida digna); pobreza; miséria (HOUAISS; VILLAR, 2004, p. 516).

Na opinião de McKillip (1987, apud SILVA, 2000, p. 43), as necessidades são juízos de valor relativos a um problema a resolver. Estão correlacionadas com valores e dependem de quem as define e de quem as sente. Ocorrem num determinado contexto e seu reconhecimento implica expectativas e juízos no que diz respeito à resolução do problema em causa, independentemente das várias soluções possíveis para ele.

Zabalza (1998) define necessidade como a desconexão que se produz entre a maneira como as coisas deveriam ser (exigências), poderiam ser (necessidades de desenvolvimento) ou gostaríamos que fossem (necessidades individualizadas) e a forma como elas realmente são.

De acordo com esse autor existem os seguintes tipos de necessidades:

a) prescritivas: são aquelas determinadas a partir da classificação das expectativas relacionadas ao que se pretende do projeto pedagógico;

b) individualizadas: associam-se à constatação das aspirações dos participantes; da reflexão sobre possíveis cursos que possam ajustar-se aos sujeitos, a partir de uma discussão reflexiva e de opções de caráter único, e opcional para os participantes;

c) de desenvolvimento: relacionadas com as opções sobre o que e como fazer para ir além dos objetivos mínimos previstos e sobre que tipo de ação poderá melhorar o processo e/ou o resultado.

Outra classificação é dada por Bradshaw (1972 apud ZABALZA, 1998, p.49):

a) necessidade normativa: faz referência às carências que um sujeito ou grupo tem, quando consideradas em relação a um determinado padrão. Exemplos: os que recebem menos calorias do que as necessárias ou os que recebem remuneração menor que o salário mínimo ou que o piso salarial de determinada categoria.

b) necessidade sentida: é a resposta às perguntas “Que necessitas?”, “Que desejarias ter?”

c) necessidade expressa ou procura: é a expressão comercial e objetiva da necessidade. Se o público vai sempre ao cinema, ou freqüenta muito certos cursos ou compra com freqüência determinados produtos, diz-se que o público necessita desses bens.

d) necessidade comparativa: é baseada na justiça distributiva. São convertidos em necessidades todos os tipos de benefícios que um determinado grupo ou setor não possui, enquanto outros grupos de características similares têm acesso a eles.

e) necessidade prospectiva: aquela que com toda a probabilidade se manifestará no futuro.

Na perspectiva de D’Hainaut (1979 apud RODRIGUES; ESTEVES, 1993, p. 23), as necessidades podem ser assim categorizadas:

a) necessidades das pessoas versus necessidades do sistema: aquelas que têm a ver com as condições não satisfeitas, mas que são indispensáveis à existência e ao funcionamento de um sistema.

b) necessidades particulares versus necessidades coletivas: são as necessidades de um indivíduo, grupo ou sistema (necessidades particulares) confrontadas com necessidades que envolvem uma quantidade considerável de indivíduos, grupos ou sistemas (necessidades coletivas), partindo-se da idéia de que as necessidades se diferenciam entre as pessoas, entre os grupos e entre os sistemas.

c) necessidades conscientes versus necessidades inconscientes: As necessidades conscientes, na visão do autor, são “precisas”, o que não ocorre com as necessidades inconscientes, uma vez que os sujeitos ou não têm consciência delas ou as sentem de forma difusa.

d) necessidades atuais versus necessidades potenciais: As necessidades relacionam-se ao momento presente (necessidades atuais) ou ao futuro (necessidades potenciais). As que incidem sobre a educação são, de forma geral, necessidades potenciais, uma vez que a ação educativa não tem efeito imediato. e) necessidades segundo o setor em que se manifestam: Nessa perspectiva, as

necessidades emergem dos diferentes quadros em que os indivíduos se deslocam durante sua existência: quadros de vida privada, familiar, social, política, cultural, profissional e desportiva.

Lafon (1979 apud SILVA, 2000, p. 42) refere-se a necessidades dos tipos vegetativo, sensório-motor, afetivo; sociais, intelectuais e culturais; coletivas, morais e espirituais; considerando, no entanto, entre essas necessidades fundamentais, nas quais insere a educação, as necessidades específicas de cada indivíduo e o caráter evolutivo.

De acordo com esse autor e com outros, como Rodrigues; Esteves (1993), além das necessidades fundamentais ou autênticas, existem também as necessidades específicas dos indivíduos, que

emergem em contextos histórico-sociais concretos, sendo determinadas exteriormente ao sujeito, podendo ser comuns a vários sujeitos ou definir-se

como necessidades estritamente individuais (RODRIGUES; ESTEVES, 1993, p. 14).

Segundo essas autoras, tais necessidades podem manifestar-se como necessidades- expectativa (as que se referem à situação ideal) ou como necessidades-preocupação (as que se referem à situação atual, como ela é vivida).

Phillips; Holton (1995 apud NIETO, 2000, p. 30) estabelecem que as necessidades estão em função de se o problema é conhecido ou não e de se as condições básicas em que se dá o problema são conhecidas ou não. Desse modo, cabe distinguir diferentes tipos de necessidades e, conseqüentemente, diferentes tipos de análises de necessidades. Segundo esses autores, os dois critérios permitem distinguir quatro tipos de necessidades: as corretivas (tanto o problema quanto as condições em que se dá o problema são conhecidos), as

adaptativas (o problema é conhecido, mas as condições em que se dá são desconhecidas), as de desenvolvimento (agora o problema é desconhecido e as condições em que ele se dá são

conhecidas) e, por último, as estratégicas (nas quais tanto o problema quanto as condições em que ele se dá são desconhecidos).

Boydell; Leary (1996 apud NIETO, 2000, p. 30) vão mais além, ao considerarem a necessidade não somente em termos de discrepâncias: eles contemplam o desempenho (de pessoas, sistemas, processos, equipes e organizações) em três níveis diferentes. Conseqüentemente, também são diferentes as necessidades derivadas dos três níveis de desempenho: nível se implementação (fazer as coisas bem, quer dizer, resolver as discrepâncias), nível de melhora (fazer as coisas melhor) e nível de inovação (fazer coisas novas e melhores).

Para os autores, esses três níveis têm um caráter aditivo, uma vez que, para se ter êxito em nível de melhoria, é necessário implementar. E, para se ter êxito na inovação, necessita-se implementar os novos métodos e melhorá-los continuamente.

Dessa forma, necessidade parece ser um termo sujeito a várias interpretações. Na opinião de Silva (2000),

Pode significar um desejo, uma vontade ou uma aspiração, ter uma conotação objetiva, na medida em que implica algo que tem de ser, que é imprescindível ou inevitável, ou ter uma conotação subjetiva, sendo assim qualquer coisa que apenas tem existência no sujeito que a sente (SILVA, 2000, p. 44).

Para Pennington (1985, apud SILVA, 2000, p. 43), uma necessidade, no âmbito da educação, é a discrepância que pode ser amortizada ou anulada através de uma intervenção

educativa esquematizada nesse sentido. As necessidades são infinitas, nem sempre são consciencializadas, e é difícil distinguir necessidades “sentidas” de necessidades “autênticas”. Em contrapartida, o autor chama a atenção para o fato de, por vezes, haver necessidades em conflito: a satisfação de umas pode anular outras.

3.2 As necessidades formativas: reflexões na perspectiva da teoria da atividade, de A. N.