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CAPÍTULO IV – A COLISÃO DE FUNÇÕES DOS ADMINISTRADORES COM OS

12. O conselho de administração do modelo monista e a absorção de funções do

Tendo em conta o que anteriormente foi exposto no que concerne aos administradores executivos e não executivos, deparamo-nos com “a necessidade de fazer incluir no conselho de administração membros não executivos em número que «garanta efectiva capacidade de supervisão, fiscalização e avaliação da acividade dos membros executivos» ”377.

O que quer dizer “fiscalização”, neste contexto? Será que se trata de uma fiscalização própria, ou será uma fiscalização semelhante à do conselho fiscal, por exemplo. Os administradores não executivos são responsáveis pelo incumprimento dos seus deveres, não por força do art.º 73.º, mas sim do art.º 81.º, cuja epígrafe é «Responsabilidade dos membros de órgãos de fiscalização». Será que se abre caminho para se enquadrar o dever de vigilância geral dos administradores não delegados no dever de fiscalização do conselho fiscal?

CALVÃO DA SILVA enuncia que fora as hipóteses de dever de provocar a

intervenção do conselho, previstas no final do n.º 8 do artigo 407.º, “os administradores não executivos ficam obrigados tão-somente à vigilância geral (e não de todo e qualquer ato concreto) da atuação do administrador ou administradores delegados ou da comissão executiva (art. 407.º, n.º 8) – a vigilância (mais) específica e analítica permanece no conselho fiscal”378. Retiramos daqui que os administradores não delegados, porque a delegação lhes retirou o dever de gestão corrente da sociedade, apenas têm um dever de vigilância e fiscalização geral e que ao conselho fiscal cabe a fiscalização mais minuciosa da atividade da comissão executiva ou dos administradores executivos, nos termos do artigo 420.º e seguintes.

377 Cfr. ALEXANDRE DE SOVERAL MARTINS, Administradores Delegados …, op. cit., 9. 378 Cfr. JOÃO CALVÃO DA SILVA, «Responsabilidade Civil …, op. cit.

A responsabilidade por culpa própria in vigilando tem por base o artigo 81.º, n.º 2, logo, poderá ser semelhante à responsabilidade do conselho fiscal. Aliás, o dever de vigilância constante no n.º 8 do artigo 407.º tem como propósito um dever de fiscalização, pelo que existe proximidades nas duas figuras.

PEDRO MAIA refere mesmo que, devido à utilização frequente da delegação de

poderes, transformou-se “o conselho de administração em verdadeiro órgão de fiscalização ou de controlo da atuação dos administradores delegados”379. Este Autor vai mais longe, admitindo mesmo que “o conselho de administração, na prática, equivale quase inteiramente ao conselho geral”380.

Ora, à semelhança do que existe no conselho fiscal, existe também no conselho geral e de supervisão uma grande importância da independência e profissionalismo dos seus membros, já que existe um paralelismo entre as suas competências381 e as suas responsabilidades são análogas, aplicando-se o artigo 81.º.

PEDRO MAIA defende que o conselho de administração da estrutura monista

identifica-se tanto com o conselho geral e de supervisão que as suas competências são praticamente as mesmas (no que respeita ao conselho de administração, e no que se refere às matérias indelegáveis por lei) e o seu modo de funcionamento idêntico. Desta forma, o Autor escreve que “como o conselho de administração é equiparável ao conselho geral, os administradores delegados ou comissão executiva correspondem, na referida estrutura dualista, à direcção”382.

MENEZES CORDEIRO acrescenta que ““fiscalizar” exprime a ideia de constatar o

efetivo cumprimento de determinadas regras”383.

Se assim é, porque não se pode considerar que os deveres de fiscalização do conselho de administração, na verdade, dos administradores não executivos, são

379 Cfr. PEDRO MAIA, Studia Iuridica 62 …, op. cit, 255.

380 Com a reforma de 2006, o artigo 278.º recebeu uma nova redação, sendo a “direcção”, agora o

“conselho de administração executivo” e o “conselho geral”, agora, o “conselho geral e de supervisão”.

381 Apesar de as competências do conselho geral e de supervisão serem praticamente todas de

fiscalização, podemos, também, encontrar algumas funções executivas.

382 Cfr. PEDRO MAIA, Studia Iuridica 62 …, op. cit.,525 e 526.

idênticos aos deveres de fiscalização do conselho fiscal? Apesar das semelhanças que aqui foram enunciadas, não parece possível estabelecer esta comparação384.

É certo que o dever geral de vigilância e a culpa in vigilando em que incorrem os administradores não executivos resulta do artigo 81.º, n.º 2, e não do artigo 73.º, mas não será certo afirmar que a delegação de poderes transforme o conselho de administração num verdadeiro órgão de fiscalização, porque, precisamente como já se escreveu anteriormente, o dever dos administradores não delegados é um dever geral, ao passo que o dever do conselho fiscal é um dever específico.

Seria de estranhar que se pudesse considerar o conselho de administração idêntico ao conselho fiscal, já que os seus interesses são diversos porque “o conselho de administração, fiscalizando embora a atividade social, não substitui o conselho fiscal. Digamos que a fiscalização que um e outro órgão desenvolvem beneficiam sujeitos distintos ou, se se preferir, a fiscalização vai dirigida à realização de interesses diversos: a fiscalização pelo conselho de administração é feita diretamente no interesse dos próprios acionistas que têm assento nesse órgão – uma fiscalização “egoísta”, ou “interessada”, dir-se-ia; ao passo que a intervenção do conselho fiscal visa tutelar interesses de todos os acionistas e, até, interesses mais gerais, de credores ou públicos.”385.

Poder-se-á dizer que a vigilância dos administradores tem um carácter genérico, e baseia-se na informação prestada pelos administradores delegados e pelos canais de informação estabelecidos com os restantes órgãos sociais. No entanto, se surgirem sinais de alarme para a sociedade386, o conselho de administração e os seus membros devem intensificar a sua vigilância387, atuando sempre com o horizonte numa vigilância preventiva. Esta obrigação de vigilância deve ser dogmaticamente reconduzida à “obrigação de administração diligente no

384 Neste sentido, também, vide PEDRO MAIA, Studia Iuridica 62 …, op. cit., 257: “Note-se que afirmar

que a delegação de poderes converte o conselho de administração num órgão de fiscalização não é afirmar que essa é a sua única função, nem sequer sugerir que o conselho de administração equivale ao conselho fiscal.”.

385 Cfr. PEDRO MAIA, Studia Iuridica 62 …, op. cit., 257 e 258. 386 Ou red flags, como são conhecidos no meio empresarial.

387 Existe uma verdadeira obrigação dos administradores identificarem se um determinado ato se

interesse da sociedade”388, a concretizar mediante as circunstâncias do caso concreto.

13. A (in)existência de delegação no modelo dualista: as comissões