• Nenhum resultado encontrado

3.2 – O conto e a novela

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 38-49)

Thierry Oswald, refletindo acerca das definições de conto e novela, assinala que a novela, na verdade, “nasce e procede do conto, que, pouco a pouco, mas em troca de muitas hesitações, retrogradações, reiterações, dá à luz laboriosamente a uma forma nova que ele carregava como corpo embrionário.”51

A problemática desses dois gêneros empenha ainda hoje o interesse de estudiosos, que perseveram na busca de uma conceituação. Entre divergências e oscilações, a questão permanece aberta. Assim, diante da

50“Je désire rétablir et maintenir un de neutralité pacifique. Une sorte de paix de

Platon. L +M Mais j'entre en des détails qui ne vous intéressent pas.” 7 . Disponível em [http://maupassant.free.fr/theatre/paix/piece.html] Acesso em 23 de junho de 2008.

51 « La nouvelle en vérité naît et procède du conte, qui, peu à peu, mais au prix de bien

d’hésitations, des rétrogradations, des réitérations, accouche laborieusement d’une forme neuve qu’il portait comme un corps embryonnaire. » OSWALD, Thierry. " . Paris: Hachette, 1966, p. 14.

complexidade de se fixar, portanto, uma fronteira entre essas noções, e de não ser esse o propósito nesse estudo, seguem algumas informações acerca das novelas e dos contos escritos por Maupassant.

Assim como os poemas, Maupassant começou publicando de modo disperso seus contos – assinados com pseudônimos – em jornais e revistas literários.52 Em 1875, publicou “La main d´écorché”, seu primeiro conto. De

1881 até 1890, Maupassant lançou quinze volumes de contos53, deixando

ainda esparsos muitos outros. As edições mais completas perseguem hoje critérios diversos. A mais especializada, a da 5 , com notas e variantes, adotou o método cronológico de organização.

Ao se pensar no gênero conto, não raro se pensa no nome de Maupassant. A maioria de seus contos caracteriza&se por uma denúncia realista e risível da sociedade burguesa, como será visto adiante. Talvez, a originalidade de Maupassant resida, portanto, no fato de ele fundar suas narrativas em acontecimentos cotidianos, aparentemente sem importância.

No que concerne seus contos e novelas, nota&se que sua composição é caracterizada por uma estrutura que aparece regularmente e que se compõe dos seguintes elementos: exposição, apresentação dos personagens, introdução de uma situação banal, aparecimento de um fato inesperado e o desenlace. Avento a hipótese de que é a introdução de um fato inesperado que constitui o cerne dessa estrutura, uma vez que é ele o responsável por

52 Como, por exemplo, em A. - ?F?( "

$ ) ( E com os pseudônimos Guy de Valmont e Joseph Prunier.

53 ( 9 (1881), ( $ 6 (1882), ' 5 (1883), '

A (1883), ( J (1884), (1884), N" (1884), ' O

(1885), 9 (1885), ( (1886), (1886), J

dinamizar a ação e conduzi&la ao fim. Este fato dinâmico é a causa da mudança brusca de uma situação literária cotidiana comum para uma situação inesperada, tendo uma finalização dramática. Assim, em $ (1883), por exemplo, o fato inesperado é a perda de um porta&moedas: em Goderville, no país de Caux, os camponeses tinham o hábito de irem a uma feira, na praça. Econômico, o senhor Hauchecorne recolheu do chão um pequeno pedaço de barbante, quando de repente, se deu conta que seu inimigo, senhor Malandain, o observava. Envergonhado de seu gesto, ele fingiu que estava procurando algo e depois seguiu para a feira e foi almoçar no albergue. O tambor ressoou: um guarda anunciava a perda de um porta& moedas. Pouco depois, um oficial foi procurá&lo afirmando que o tinham visto, pela manhã, pegar um porta&moedas. Ao questionar o oficial da procedência da queixa, soube que havia sido o senhor Malandain, que o acusara. Ele negou a acusação com veemência. Uma busca em sua roupa mostrou apenas o barbante, mas a calúnia contra ele o perturbara tanto que ficou obcecado com isso e morreu no início de janeiro, jurando inocência, em delírio, no seu leito de morte.

Segundo Otto Maria Carpeaux, trezentas narrativas sobre um assunto qualquer poderiam ter levado Maupassant a cair na repetição do mecanismo da técnica.54 No entanto, Maupassant continuou sendo lido com interesse.

Em sua época, alguns acreditavam que o aspecto regionalista de Maupassant faria perdurar o gosto por suas narrativas, idéia que ocupou

54 Cf. CARPEAUX, Otto Maria. Relendo Maupassant. Publicado no suplemento “Letras &

algumas das discussões apontadas pelos escritores entrevistados por Artine

Artinian, em ( .55

Diversas maneiras de classificação dos contos e das novelas foram já ensaiadas. Deve&se, no entanto, compreendê&las apenas como instrumento didático, uma vez que quaisquer tentativas de abordagem prevêem uma leitura parcial na riqueza representada por cada um dos textos em particular.

Albert&Marie Schmidt, biógrafo de Maupassant e organizador da edição das narrativas curtas para Albin&Michel56, seguiu uma divisão em onze

temas: “Drames et propos rustiques”, “Les confinés”, “Les séductions et l’art d’aimer”, “Le charme des liaisons”, “Le danger des liaisons” (o mais extenso, com 59 textos), “La cage aux filles”, “Scènes de la vie cléricale”, “Ironie et horreurs de la guerre”, “Le massacre des innocents”, “Les chemins de la démence” e “diverses créatures”. O organizador apenas propõe uma ordem de leitura, e o leitor, dispondo dos textos, tem a possibilidade de lê&los como preferir. Assim como Maupassant optou por apresentar o texto “La bécasse” na introdução do seu volume ' 5 , Albert&Marie Schmidt manteve o mesmo texto, na mesma posição: introduzindo a sua antologia, o que mostra a importância que o organizador dá, de certa maneira, ao aspecto estrutural das narrativas do escritor.

O crítico Otto Maria Carpeaux ocupa&se de Maupassant, sobretudo pelo seu vínculo com a tradição do conto popular medieval francês, os

55 ARTINIAN, Artine. ( / enquête internationale (147 témoignages

inédits). Paris: Nizet, 1955.

56 MAUPASSANT, Guy de. ' " + (Dir. de Albert&Marie Schmidt) Paris: Albin

6 , em que as marcas da oralidade e a função lúdica, de passatempo, eram centrais. Nesse sentido, os contos enquadrados de Maupassant – ou seja, aqueles em que há pelo menos dois narradores, um heterodiegético (externo ao evento relatado) e outro homodiegético (que testemunhou o evento) ou autodiegético (protagonista do evento), segundo a classificação greimasiana consagrada57 & correspondem a cerca de metade de sua

produção de contos, segundo informa Jaap Lintvelt58, que realizou uma

análise da relação entre os narradores externo e interno, da reação das personagens ouvintes e do leitor, nas narrativas de Maupassant, partindo do conceito de polifonia de Mikhail Bakhtin. Lintvelt cita o conto “Histoire vraie” em que, apesar de o relato do narrador autodiegético descaracterizar a personagem feminina em questão, Rose, o narrador heterodiegético, leva o leitor a compadecer&se dela. Assim sendo, o crítico conclui que essa estratégia formal complexa é um recurso que expressa o objetivo estético de Maupassant de sugerir, de compor dubiamente, de maneira que o leitor busque uma interpretação que não é dada diretamente pelo autor. Essa teoria está expressa no prefácio de Maupassant a , do qual algumas passagens vêm citadas no seguinte trecho do artigo de Lintvelt:

A imagem de mulher, fornecida pela narração feminina não difere, portanto, essencialmente da que é dada pelo homem, e a recepção feminina não mostra toda a complexidade de uma narrativa feminina. Cabe sempre ao leitor ter um papel ativo na interpretação ideológica. Este é o objetivo estético de

57Os termos empregados para a classificação dos narradores apresentam&se resumidos em:

REIS, Carlos; LOPES, Ana Cristina M. & % . 4ª ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1994, p. 257&274.

58 LINTVELT, Jaap. La polyphonie de l’encadrement dans les contes de Maupassant. In:

( A5 . Actes du colloque de Fécamp. (dir. de Louis Forestier) Paris : Nathan, 1993, p. 173. Nesse artigo, o estudioso afirma que há 144 narrativas enquadradas, dentre as 301 reunidas por Louis Forestier, na edição da Pléiade dos ' " +

Maupassant, que estima que o romancista deva ‘compor sua obra de uma maneira tão hábil, tão dissimulada’, que seja impossível ‘descobrir suas intenções’, ‘sua visão pessoal do mundo’. O objetivo do romancista é forçar o leitor a

‘compreender o sentido profundo e secreto.59

Quanto aos temas mais discutidos que foram desenvolvidos pelo escritor em seus contos e novelas, destacam&se algumas questões sobre o amor. Nas relações amorosas, nem sempre acidentadas, não há apenas a visão pessimista de Schopenhauer sobre a mulher&armadilha, como discutiu

Besnard&Coursodon em C -5 A "

( / D . Esta autora estuda, nas obras ficcionais do escritor, as relações ardilosas impostas pela figura feminina por meio do amor, da natureza e de Deus. Faz um levantamento e analisa a recorrência das imagens da armadilha nos textos, o que contribui para sua argumentação em defesa da tese de que Maupassant se divertiu ao tratar de certa complacência entre o marido e o amante da mulher: desde os romances ? . (entre Duroy e M. de Marelle) e Mont&Oriol (entre Brétigny e Andermat) até os contos “Le gâteau” e “La porte”, bem como de certa malícia e sedução feminina, que nem sempre levavam à fatalidade, como em “Idylle” e “Le signe”, por exemplo.60

O determinismo e o fatalismo, freqüentes no romancista, se vêem nuançados pela arte do contista. M. Leras, o protagonista do conto

59« L’image de femme, fournie par la narration féminine ne diffère donc pas essentiellement

de celle donnée par l’homme, et la réception féminine ne rend pas forcément toute la complexité d’un récit féminin. C’est toujours au lecteur de jouer un rôle actif dans l’interprétation idéologique. C’est là justement l’objectif esthétique de Maupassant, qui estime que le romancier devra “composer son oeuvre d’une manière si adroite, si dissimulée”, qu’il soit impossible de “découvrir ses intentions”, sa “vision personnelle du monde”. Le but du romancier est de forcer le lecteur “à comprendre le sens profond et caché ”.» LINTVELT, + ., p. 180.

60 BESNARD&COURSODON, Micheline. C -5 A "

“Promenade” (1884), é um instrumento da ironia e da crítica a uma categoria profissional que Maupassant já desprestigiava na crônica “Les employés”. Nessa crônica de 1882, o autor traça o comodismo e a passividade do funcionário público que teve seu destino como resultado de sua própria escolha:

L'employé ne quitte point son bureau, cercueil de ce vivant ; et dans la même petite glace où il s'est regardé, jeune, avec sa moustache blonde, le jour de son arrivée, il se contemple, chauve, avec sa barbe blanche, le jour où il est mis à la retraite. Alors, c'est fini, la vie est fermée, l'avenir clos. Comment cela se fait&il qu'on en soit là, déjà ? Comment donc a&t&on pu vieillir ainsi sans qu'aucun événement se soit accompli, qu'aucune surprise de l'existence vous ait jamais secoué ? Cela est pourtant. Place aux jeunes, aux jeunes employés !

Alors on s'en va, plus misérable encore, avec l'infime pension de retraite. On se retire aux environs de Paris, dans un village à dépotoirs, où l'on meurt presque tout de suite de la brusque rupture de cette longue et acharnée habitude du bureau quotidien, des mêmes mouvements, des mêmes actions, des

mêmes besognes aux mêmes heures.61

Certa irreversibilidade das personagens romanescas, que pouco podem contra o acaso, flexibiliza&se nos contos e novelas: muitas vezes elas fazem as suas escolhas.

No que diz respeito ao gênero fantástico, nota&se que Maupassant, desde a sua primeira narrativa publicada, “La main d’écorché”, já era atraído pelo gênero, sobre o qual tinha as suas próprias teorias, conforme visto em “Le fantastique”. Enquanto Albert&Marie Schmidt62 atribui o fantástico à sua

doença nervosa, Marie&Claire Bancquart, entre outros críticos, destacou a

61MAUPASSANT, Guy de. « Les employés ». Disponível em

[http://www.maupassantiana.fr/Oeuvre/ChrLesEmployes.html] Acesso em 22 de julho de 2008.

importância em se deixar de observar o fantástico como um produto da doença terminal do escritor.63 No estudo “Maupassant, un homme

énigmatique”, ela argumenta sobre este ponto de vista:

Mas o leitor francês é tão desconfiado diante do irracional que ele gostaria, de toda maneira, de colocá&lo em uma categoria especial, deixá&lo inofensivo: veja, é um louco que escreve

histórias de loucura; nós podemos lê&las sem sermos

atingidos por elas! Tal asserção não resiste ao exame. Na curta e tão intensa carreira literária de Maupassant, os contos fantásticos estão presentes desde o início (“ Sur l’eau” faz

parte de 9 , “Fou ?” de ( $ 6 M e

conhecem um máximo de freqüência em 1885&1886, no

momento do J , para diminuir, em seguida, como se

Maupassant tivesse precisamente recuado diante de

narrativas que encenassem um destino que ele sentia que seria o seu. Ele não deu um lugar especial aos seus contos fantásticos, que fez aparecer em coletâneas nas quais eles estavam juntos com narrativas ditas “realistas”. E quando os escreveu, ele não estava “louco”. Ele dominava perfeitamente seu assunto e sua escrita; ele se distanciava. O momento em que Maupassant mergulha na loucura é precisamente aquele em que ele pára de interessar à literatura: ele hesita, começa romances que ficaram inacabados; depois não escreve mais nada, toda criação artística dependendo de um controle que ele não é mais capaz de ter. Os contos fantásticos são o

indício de um temperamento sensível, chegando ao

sofrimento; mas para explicar o talento deles, o talento, esse temperamento não saberia servir como fio condutor. Criado nas mesmas condições, atingido pelo mesmo mal, morto no asilo três anos antes de Maupassant, seu irmão Hervé nunca escreveu nada. […] Maupassant baseia suas narrativas

fantásticas nos riscos de alienação constantes de nosso ser.64

63BANCQUART, Marie&Claire. ( 6 + Paris: Minard, 1976.

64 « Mais le lecteur français est tellement méfiant devant l'irrationnel qu'il voudrait à toute

force le caser dans une catégorie spéciale, le rendre inoffensif : voyez, c'est un fou qui écrit des histoires de folie ; nous pouvons les lire sans être entamés par elles ! Pareille assertion ne résiste pas à l'examen. Dans la courte et si remplie carrière littéraire de Maupassant, les contes fantastiques sont présents dès le début (« Sur l'eau » fait partie de 9 « Fou ? » de ( $ 6 M et connaissent un maximum de fréquence en 1885&1886, le moment du J pour diminuer en nombre ensuite, comme si Maupassant avait précisément reculé devant des récits qui mettraient en scène un destin dont il sentait qu'il serait le sien. Il n'a pas donné de place spéciale à ses contes fantastiques, qu'il a fait paraître dans des recueils où ils avoisinaient des récits dits « réalistes ». Et quand il les a écrits, il n'était pas « fou ». Il maîtrisait parfaitement son sujet et son écriture ; il prenait distance. Le moment où Maupassant sombre dans la folie, c'est précisément celui où il cesse d'intéresser la littérature : il hésite, il commence des romans, restés inachevés ; puis il n'écrit plus rien, toute création artistique procédant d'un contrôle dont il est désormais incapable. Les contes fantastiques sont l'indice d'un tempérament sensible jusqu'à la souffrance ; mais pour expliquer leur talent, le talent, ce tempérament ne saurait servir de

A ilusão da arte do escritor realista trabalha as soluções racionalmente viáveis, mas impõe uma impressão do fantástico (uma hesitação) que se passa dentro de cada um, em que a própria identidade, mesmo que por alguns instantes, é posta em jogo. Em J , por exemplo, que apresentou duas versões65, é mostrada ao leitor a complicada relação eu&

outro (feita de oposição e identificação), a luta com o (seu) duplo, com a sociedade.

Em termos gerais, a primeira versão, de 1886, trata da história de um homem que vive bem, perto de Rouen, e que começa a ter sintomas diferentes como insônia, emagrecimento, mau humor. Com o tempo, acontecimentos estranhos, inexplicáveis, passam a ocorrer com ele e também com outras pessoas da redondeza. Ele, convictamente, anuncia que há um ser inserido na sociedade, a quem nomeia como “Horla”.66

Já na segunda versão67, de 1887, apresentada em forma de diário

(numa espécie de registro confessional), o narrador revela a mesma trama, porém com final aterrador: ateia fogo na casa na esperança de matar o Horla. Sem a certeza de ter matado o Horla, pensa em cometer o suicídio: «Mort? Peut&être? [...] Non...non...sans aucun doute, sans aucun doute… il

fil conducteur. Elevé dans les mêmes conditions, atteint du même mal, mort à l'asile trois ans avant Maupassant, son frère Hervé n'a jamais rien écrit.

[…] Maupassant fonde ses récits fantastiques sur les risques d'aliénation constants de notre être. » BANCQUART, ( ?' + ( - 5 . Paris: Ministère des Affaires étrangères, 1993, p. 15&17.

65MONGLOND, + + p. 151.

66MAUPASSANT, Guy de. Le Horla (1eversion). ' " + Gallimard, 1979, t.II, p.

822&830.

67

n'est pas mort…Alors…alors…il va donc falloir que je me tue, moi !...»68 A

dimensão espacial da narrativa é construída de maneira a informar que o suposto paciente vive em um lugar aprazível (na segunda versão, há uma preocupação narrativa ainda maior em dizê&lo) e privilegiado. Não há índices de ambiente ermo, mórbido, ao contrário: o Sena (rio adorado por Maupassant) corta sua propriedade. Até esse ponto, o insólito não se anuncia, mas sim o suspense: o homem internado vai explicar aos médicos o que o traz ali, embora pareça física e moralmente sadio. É importante que, também aqui, as personagens secundárias como o cocheiro e a vizinhança atuem como “confirmadores” daquilo que vive o personagem. Os sintomas estranhos evoluem na narrativa para acontecimentos estranhos: água e leite são tomados por alguém que não se identifica; vasos se quebram sozinhos; páginas viradas sem ação nenhuma, até que o homem atormentado pelo medo e pelo estranho, julga ver o “ser”: o sobrenatural é explicitado. A sua existência, e seus atos, é confundida (ou questionada) com a possibilidade de uma alucinação ou um sonho, mas a dúvida é rapidamente sanada quando é narrado que, além de seus vizinhos, habitantes da província de São Paulo também apresentam sintomas semelhantes. Pela memória, resgata o fato de que um navio brasileiro passara pelo Sena, próximo a sua casa, o que concatena as suas impressões. Assiste&se, então, a uma história do pavor, do medo, do suspense. A dúvida, a ambigüidade, nas duas versões, persiste: na primeira, há a angustiante pergunta do que é a realidade e do que é a ilusão; na segunda, a existência de um ser que resiste

ao fogo. Essa observação acerca do efeito produzido na trama narrativa parece estar em consonância com o que considera o próprio autor, no

prefácio do romance /

Le romancier qui transforme la vérité constante, brutale et déplaisante, pour en tirer une aventure exceptionnelle et séduisante, doit, sans souci exagéré de la vraisemblance, manipuler les événements à son gré, les préparer et les arranger pour plaire au lecteur, l'émouvoir ou l'attendrir. Le plan de son roman n'est qu'une série de combinaisons ingénieuses conduisant avec adresse au dénouement. Les incidents sont disposés et gradués vers le point culminant et l'effet de la fin, qui est un événement capital et décisif, satisfaisant toutes les curiosités éveillées au début, mettant une barrière à l'intérêt, et terminant si complètement l'histoire racontée qu'on ne désire plus savoir ce que deviendront, le lendemain, les personnages les plus attachants.69

Nas novelas, merece ainda destaque, além de J e 3 6,

- A , publicada postumamente, em que

aparece a fina ironia de Maupassant. O protagonista, M. de Patissot, é um funcionário público que se mantém no cargo devido à sua hábil capacidade de mudar de opinião e fazer os outros acreditarem nisso: em tempos do Império, veste&se como o imperador, durante a República, mostra sentimentos de republicano nato. Maupassant extrai humor das diversas peripécias dominicais desse burguês de Paris, nos dias preenchidos seja com as festas da República, seja com uma tarde de decepção com uma prostituta, seja com as sessões públicas de feministas, consideradas histéricas e inúteis, mas imperdíveis pelo bom burguês. Assim como nesse texto, em!La Lysistrata moderne”, crônica publicada no em 1880, Maupassant ridiculariza o movimento feminista:

69 MAUPASSANT, Guy de. . In : ___. " $ . Préface de Maurice

Voilà ! Oh ! oui votez. & Oh ! oui, nommez&nous des représentants. Oh oui ! soyez indépendantes, citoyennes, & car nous rirons, nous rirons, nous rirons & en dussions&nous mourir ; ce qui serait, du reste, la seule vengeance dont vous puissiez vous enorgueillir. Allons, levez vos boucliers, guerrières : ça ne sera jamais qu'une levée de jupes !70

No entanto, em diversos outros textos, Maupassant teve a oportunidade de defender, ao seu modo, a mulher marginalizada socialmente: a prostituta (em “Le lit 29”, “Mademoiselle Fifi”, “L’odyssée

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 38-49)