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A topografia atual da zona costeira do Estado da Bahia resulta dos efeitos integrados dos pro- cessos de deposi¸c˜ao, eros˜ao e dos esfor¸cos tectˆonicos que a Forma¸c˜ao Barreiras vem sofrendo ao longo de sua hist´oria geol´ogica.

Rosseti et al.(2013) sugerem que a sedimenta¸c˜ao miocˆenica se relaciona com a eros˜ao de relevos criados a partir do Cenoz´oico M´edio, tal como o platˆo da Borborema, que soergueu no Mioceno (Oliveira, 2008) e proveu sedimentos tanto para a margem equatorial como a margem nordeste do Brasil.

A queda no n´ıvel do mar a 16-17 Ma (Rosseti et al., 2013) encerrou a sedimenta¸c˜ao miocˆenica, levando ao desenvolvimento de uma inconformidade no topo do Barreiras, que posteriormente foi recoberta por dep´ositos quatern´arios.

Anteriormente a linha de p´aleo-fal´esias, resultado da eros˜ao na por¸c˜ao mais externa da Forma¸c˜ao Barreiras, era interpretada como o efeito erosivo do m´aximo transgressivo ocorrido a 123.000 anos (Martin et al., 1980). As interpreta¸c˜oes recentes de Dominguez e Bittencourt (2012) sugerem que as fal´esias foram esculpidas n˜ao apenas nesse per´ıodo de mar alto, mas tamb´em pela a¸c˜ao das ondas nos per´ıodos de mar alto dos Est´agios Isot´opicos Marinhos MIS1, MIS5, MIS9 e MIS11.

Praticamente toda as fei¸c˜oes presentes na linha de costa da ´area de estudo est˜ao contem- pladas nos modelos evolutivos descritos por Martin et al. (1980), e que atualmente foram revistos por Dominguez e Bittencourt (2012). Por´em, devido as dificuldades de aplicar as t´ecnicas de mapeamento de superf´ıcie em uma regi˜ao praticamente toda recoberta pelos sedimentos da Forma¸c˜ao Barreiras, algumas peculiaridades est˜ao presentes na zona costeira do litoral norte do Estado da Bahia que n˜ao est˜ao contempladas nestes modelos.

As dimens˜oes avantajadas do vale do Itapicuru, o recuo da linha de paleo-fal´esias e o aumento do tamanho das incis˜oes fluviais a partir do rio Itapicuru em dire¸c˜ao ao estado de Sergipe s˜ao algumas peculiaridades encontradas que n˜ao est˜ao contempladas nestes modelos evolutivos.

Provavelmente, um controle geol´ogico soterrado pela cobertura sedimentar da Forma¸c˜ao Barreiras ´e a chave que conecta essas peculiaridades com os modelos geol´ogicos existentes.

O processo de rifteamento e posterior invers˜ao, da antiga bacia de margem passiva Ser- gipana* gerou grandes falhamentos que seguem os contornos do Cr´aton do S˜ao Francisco (Almeida, 1977). Ap´os o choque entre o Cr´aton do S˜ao Francisco e a Prov´ıncia Borborema, os sedimentos dessa antiga bacia foram invertidos e metamorfizados, dando origem a Faixa de Dobramentos Sergipana (D’el-Rey Silva, 1999).

Colis˜oes continentais desse porte colocam lado a lado blocos continentais com diferentes densidades, unidos por zonas de suturas profundas (Kosin, 2009), que posteriormente atuam como zona de fraqueza no embasamento (Magnavita, 1992)(Figura 6.1).

A gravimetria sugere a presen¸ca de uma zona de sutura profunda, orientada segundo os contornos cratˆonicos(Figuras 5.6, 5.7 e 5.8). Esta descontinuidade, denominada Linea- mento do Itapicuru, ´e paralela ao Lineamento de Vaza-Barris e controla parte das bacias do Recˆoncavo, Tucano e Jacu´ıpe.

Ambos os lineamentos parecem ter influenciado na abertura do rifte Mesoz´oico, atu- ando como barreiras `a propaga¸c˜ao do rifte, segmentando a Bacia de Tucano, deslocando os depocentros e atuando como falhas de borda.

A configura¸c˜ao das bacia do Recˆoncavo e de Tucano sugerem que o Lineamento do Ita- picuru atuou como um ”anteparo”, interrompendo a propaga¸c˜ao do rifte do Recˆoncavo para NE e desviando a propaga¸c˜ao do rifte do Tucano pra NW (Figura 6.1).

Figura 6.1: O rifte Recˆoncavo-Tucano-Jatob´a e sua resposta gravim´etrica (resi- dual ). Notar o controle estrutural que os lineamentos do Itapicuru e Vaza-Barris exercem sobre este rifte. Modificado de Magnavita (1992).

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Em um rifte que evolui para uma bacia de margem passiva, as falhas transformantes (ou zonas de fraturas oceˆanicas) desempenham o papel de acomodar diferentes taxas de abertura nas dorsais.

No caso das zonas de fraturas oceˆanicas presentes nas bacias de margem passiva que bordejam o Cr´aton do S˜ao Francisco, as liga¸c˜oes entre elas e a Dorsal Meso-Atlˆantica parecem ter sido nucleadas nas antigas zonas de suturas cratˆonicas (Figura 6.2).

A poss´ıvel nuclea¸c˜ao das zonas de fraturas oceˆanicas em antigas cicatrizes do cr´aton estabelece uma rela¸c˜ao importante entre as antigas estruturas do cr´aton e a segmenta¸c˜ao do rifte implantado posteriormente. Mais ainda, explica parte das diferen¸cas encontradas na evolu¸c˜ao p´os-miocˆenica experimentada pela zona costeira do litoral norte da Bahia.

Figura 6.2: O rifte Recˆoncavo-Tucano-Jatob´a e sua resposta gravim´etrica. Notar a liga¸c˜ao entre os lineamentos do Itapicuru e Vaza-Barris e as zonas de fraturas oceˆanicas. De 1 a 5: zonas de fraturas oceˆanicas. Modificado de Magnavita (1992).

Rosseti el al.,(2013) mostram que, da mesma forma que na margem equatorial, a maioria das falhas na margem nordeste reativam estruturas preexistentes.

O paralelismo destas falhas com degraus aeromagn´eticos e gradientes gravim´etricos asso- ciados com as zonas de cisalhamento precambrianas, indicam que essas falhas atingem n´ıveis crustais profundos (Bezerra et al., 2001; Brito Neves et al., 2004; Nogueira et al., 2006; de Castro et al., 2012).

Ap´os a abertura de um rifte convencional, quanto mais a falha de borda (ou charneira) aumenta de rejeito mais a ombreira do rifte soergue, gerando grandes eros˜oes no bloco alto. Na Bacia de Jacu´ıpe, devido ao fato da mesma ter sido implantada sobre uma regi˜ao cratˆonica, n˜ao ´e esperado grandes soerguimentos das ombreiras do rifte (Alkimim, 2004). Desta forma, na fase p´os-rifte de um rifte implantado em um ambiente cratˆonico, o aporte sedimentar ´e controlado por soerguimentos de outra natureza.

A fase rifte da Bacia do Rio Muni-Guin´e Equatorial (conjugada africana com a de Sergipe- Alagoas) se completou no Turoniano (89 Ma), sendo marcada por uma discordˆancia que a separa da fase drifte (Jobe et al., 2011). No in´ıcio do Cret´aceo esta margem continental foi dominada por cˆanions submarinos erosivos, preenchidos por material silicicl´astico. Esta rede de cˆanions submarinos bem desenvolvida, cont´em o maior n´umero de reservat´orios de petr´oleo neste pa´ıs.

Este sistema foi abandonado durante o Paleoceno, quando o decr´escimo no suprimento de sedimentos causou uma dr´astica transforma¸c˜ao na morfologia dos cˆanions, resultando em cˆanions (n˜ao t´ıpicos) que mais agradam do que erodem (Jobe et al., 2011). Com o soerguimento tectˆonico do Mioceno esta margem passou a contar com uma nova fonte de sedimentos, que possibilitou a reativa¸c˜ao dos cˆanions e a gera¸c˜ao de novas incis˜oes

Ou seja, se utilizarmos o exemplo da costa africana, na qual a bacia de margem passiva correlata `a Bacia de Jacu´ıpe/Sergipe-Alagoas tamb´em foi implantada sobre um cr´aton, pode- se supor que o suprimento sedimentar, proveniente dos soerguimentos que ocorreram em nossa margem, seriam os respons´aveis pela implanta¸c˜ao dos cˆanions, tais como os cˆanions de Japaratuba e do S˜ao Francisco.

Os dados el´etricos e magn´eticos apontam que um cˆanion, mais antigo do que a Fm. Barreiras, parece estar ancorado no Lineamento do Itapicuru. Esta fei¸c˜ao se prolonga na dire¸c˜ao offshore conectando o Lineamento do Itapicuru `a um zona de fratura oceˆanica, denominada de Zona de Fratura do Itapicuru (Figuras 5.10 e 5.3).

Provavelmente este cˆanion mais antigo est´a associado a um dos soerguimentos da zona costeira da Bahia (Japsen et al., 2012), e devido `a sua localiza¸c˜ao, foi implantado na zona de fraqueza resultante do falhamento que deu origem ao Lineamento do Itapicuru.

Sobram exemplos mundiais de cˆanions submarinos controlados e escavados em zonas de falhas. Algan et al. (2002) correlacionam o deslocamento lateral, entre a cabeceira de um cˆanion e seu eixo, com uma zona de falha. J´a Ridente et al. (2007) relacionam os cˆanions do Mediterrˆaneo central `a estruturas tectˆonicas, ativas pelo menos desde o Mioceno.

Wigley e Compton (2006) mostram que o soerguimento miocˆenico, e a consequente regress˜ao marinha, combinado com o sistema de falhas, proporcionaram a entrada de material terr´ıgeno e a incis˜ao da cabeceira do cˆanion Cape, Africa do Sul.

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Oliveira (2008) sugere, a partir de tomografia s´ısmica, que uma anomalia de velocidade s´ısmicas em n´ıveis crustais profundos teria se concentrado na por¸c˜ao nordeste do Brasil desde o Eoceno.

Atrav´es da correla¸c˜ao com os cˆanions da margem africana (Ridente et al., 2007; Jobe et al., 2011) e com os soerguimentos experimentados pela margem continental baiana (Japsen et al., 2012), pode-se supor que o Cˆanion de Conde foi escavado durante o Cret´aceo. Devido `

a sua expressividade na margem brasileira (Almeida et al., 1996; Freire et al., 2012), o per´ıodo Eoceno ´e a idade mais prov´avel desta escava¸c˜ao.

Os cˆanions do Cret´aceo na margem africana correlata `as bacias de Jacu´ıpe e de Sergipe- Alagoas est˜ao ancorados em falhas paralelas aos eixos dos cˆanions. Ap´os um per´ıodo de quiescˆencia, todos os cˆanions do Cret´aceo foram reativados (Jobe et al., 2011). Apesar de terem sido preenchidos, os antigos locais continuaram sendo zonas prop´ıcias a implanta¸c˜ao dos cˆanions mais jovens.

O controle/heran¸ca geol´ogica do Lineamento do Itapicuru, em tese, deveria ter sido obli- terado da zona costeira do nordeste da Bahia ap´os as transgress˜oes marinhas ocorridas no Mioceno. Por´em, a dire¸c˜ao das incis˜oes fluviais escavadas na Forma¸c˜ao Barreiras no litoral norte do Estado da Bahia, e no sul de Sergipe, mostra que o controle geol´ogico do Lineamento do Itapicuru tamb´em esteve atuante durante o soerguimento miocˆenico.

Nogueira et al. (2006) confirmaram, atrav´es de dados de resistividade e gravimetria, que a deposi¸c˜ao da Forma¸c˜ao Barreiras ´e controlada pela estrutura de hosts e grabens, onde ´e poss´ıvel observar espessamento nos blocos baixos. Na Bacia do Parna´ıba a estrutura de horst e graben aparentemente controla a morfologia dos tabuleiros costeiros, gerando desn´ıveis topogr´aficos (Bezerra et al., 2001; Nogueira et al., 2006).

A Forma¸c˜ao Barreiras depositou-se durante o Oligo-Mioceno, em um momento em que a costa brasileira experimentou transgress˜oes marinhas de grandes propor¸c˜oes (Zachos et al., 2001; Rosseti et al., 2013).

Antes da queda eust´atica ocorrida a 16-17 Ma (Rosseti et al., 2013) a topografia da zona costeira se assemelhava `a um platˆo, que recobria o embasamento cratˆonico e outros dep´ositos, associados `a Faixa Sergipana e aos riftes mesoz´oicos.

Posteriomente, durante as quedas eust´aticas ocorridas no Quatern´ario, uma rede de dre- nagem e vales incisos foram esculpidos na Forma¸c˜ao Barreiras e na plataforma continental, que na maior parte do tempo permaneceu exposta (Dominguez et al., 2012).

Mas os efeitos desta queda eust´atica n˜ao foram uniformes em todo o litoral norte do Es- tado da Bahia, pois as incis˜oes fluviais s˜ao maiores e mais retil´ıneas a partir do rio Itapicuru, indicando que a partir deste ponto, ocorreu um soerguimento diferencial da zona costeira, que aumenta em magnitude no sentido do estado de Sergipe.

Durante os per´ıodos de n´ıvel de mar alto foram esculpidas fal´esias na Forma¸c˜ao Barrei- ras (Dominguez e Bittencourt, 2012). Quanto maior eram as incis˜oes fluviais provocadas durantes os rebaixamentos do n´ıvel de base, maiores eram os vales associados, possibilitando o surgimento de estu´arios e ba´ıas maiores durante as transgress˜oes.

Esta caracter´ıstica est´a expressa na linha de paleo-fal´esias presentes na Fm. Barreiras, que recua e forma vales mais amplos a partir do rio Itapicuru.

Associado `a presen¸ca de relevos mais pronunciados, tais como uma vasta ´area da Bacia de Tucano, soerguida no in´ıcio do Cret´aceo (Magnavita, 1992) e a extremidade sul do Platˆo da Borborema, soerguido no Mioceno (Oliveira, 2008), o suprimento sedimentar crescente no sentido N/NE, resultou em uma sequˆencia regressiva quatern´aria mais desenvolvida, tamb´em neste sentido.

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S´ıntese da Evolu¸c˜ao da Zona Costeira do Litoral Norte da