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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.4 O Controle Interno como Instrumento de Accountability

O objetivo principal do controle interno é o de possuir ação preventiva antes que ações ilícitas, incorretas ou impróprias possam atentar contra os princípios da Constituição da

República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988), principalmente o art. 37, seus incisos e parágrafos.

Segundo Gomes e Salas (1999), um sistema de controle compreende a estrutura e o processo de controle. A estrutura de controle deve ser desenhada em função das variáveis- chave que derivam do contexto social e da estratégia da organização, além de levar em consideração as responsabilidades de cada administrador ou encarregado por centros de competência. A estrutura contém, ainda, o sistema de indicadores de informações e de incentivos.

Para Gomes e Salas (1999), sem controle não há nem poderia haver, em termos realistas, responsabilidade pública. A responsabilidade pública depende de uma fiscalização eficaz dos atos do Estado. Dessa forma, o controle interno opera na organização, compreendendo o planejamento e a orçamentação dos meios, a execução das atividades planejadas e a avaliação periódica da atuação.

O controle é instrumento eficaz de gestão e não é novidade do ordenamento jurídico brasileiro. Seu principal embasamento legal encontra-se na Constituição Federal Brasileira (BRASIL, 1988) que assim dispõe sobre o assunto:

Art. 70: A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta, indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação de subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada poder.

Art. 71: O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União.

Art. 74: Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno [...].

Outro fundamento do controle interno na administração pública está no art. 76 da Lei n° 4.320 (BRASIL, 1964), o qual estabelece que o Poder Executivo exercerá os três tipos de controle da execução orçamentária: 1) legalidade dos atos que resultem arrecadação da receita ou a realização da despesa, o nascimento ou a extinção de direitos e obrigações; 2) a fidelidade funcional dos agentes da administração responsáveis por bens e valores públicos;

3) o cumprimento do programa de trabalho expresso em termos monetários e em termos de realização de obras e prestação de serviços. A Lei n° 4.320/64 inovou ao consagrar os princípios de planejamento, do orçamento e do controle, estabelecendo novas técnicas orçamentárias para a eficácia dos gastos públicos.

Com relação aos custos dos bens e serviços, tanto a Lei 4.320/64 (art. 85), quanto o Decreto-Lei 200 (BRASIL, 1967), no art. 25, IX e no art. 79, estabeleceram que a contabilidade deveria apurá-los, a fim de buscar uma prestação de serviços econômica e evidenciar os resultados da gestão. Contudo, mais de 30 anos se passaram sem aplicação prática desse dispositivo. A recente LRF (BRASIL, 2000) voltou a exigir a apuração dos custos no âmbito da administração pública, entretanto, salvo algumas iniciativas pontuais, tal medida ainda não foi introduzida nas práticas e sistemas de contabilidade e controle utilizados no setor público.

Por centrar atenção à ética na condução da

res publica,

o controle interno na administração pública caracteriza-se como um instrumento fundamental de

accountability.

Deve, sobretudo, possibilitar ao cidadão informações que confiram transparência à gestão da coisa pública. Dessa forma, o sistema integrado de controle interno deve servir como agência

de

accountability

, agência de transparência, de responsividade e prestação de contas de

recursos públicos.

De acordo com Gomes e Salas (1999), os mecanismos de controle se situam em duas esferas interdependentes de ação: os mecanismos de

accountability

verticais — da sociedade em relação ao Estado — e os de

accountability

horizontais, isto é, de um setor a outro da esfera pública. Para esses autores, a

accountability

vertical é, principalmente, embora de forma não exclusiva, a dimensão eleitoral, o que significa premiar ou punir um governante nas eleições. Essa dimensão requer a existência de liberdade de opinião, de associação e de imprensa, assim como de diversos mecanismos que permitam tanto reivindicar demandas

diversas como denunciar certos atos das autoridades públicas. Já a

accountability

horizontal, afirmam os mesmos autores, implica a existência de agências e instituições estatais possuidoras de poder legal e de fato para realizar ações que vão desde a supervisão de rotina até sanções legais contra atos delituosos de seus congêneres do Estado.

Os controles horizontais, que são considerados mecanismos essenciais de transparência e promoção da ética na gestão pública, podem ser classificados, segundo Gomes e Salas (1999), em quatro tipos principais: 1) os controles administrativos, caracterizados como autocontrole, vez que exercidos pelos próprios poderes sobre seus atos e agentes; 2) os controles legislativos, que são representados pelo apoio ou rejeição às iniciativas do poder executivo (trata-se aqui de um controle político); 3) os controles de contas, que são essencialmente técnicos, pois têm a função de controlar as contas públicas, subsidiando os legislativos; 4) os controles judiciários, que objetivam coibir abusos do patrimônio público e do exercício do poder por parte das autoridades.

Os "controles administrativos", de acordo com Gomes e Salas (1999), são denominados genericamente de “controles internos”. Fazem parte da estrutura administrativa de cada poder, tendo por função acompanhar a execução dos seus atos, indicando, em caráter opinativo, preventivo ou corretivo, ações a serem desempenhadas com vistas ao atendimento da legislação. Já em relação ao poder executivo, os poderes que o controlam são os controles legislativos e de contas, denominados “controles externos”, ou seja, são órgãos independentes da administração, não participando, portanto, dos atos por ela praticados, pois cabe a eles exercer a fiscalização. Esse conjunto de controles horizontais, internos e externos, é formalmente institucionalizado por uma rede de órgãos autônomos.

Ainda conforme Gomes e Salas (1999), o sistema de controle interno da administração pública deve estar consolidado no compromisso do trinômio da moralidade, cidadania e justiça social ao atingir o processo de democratização do Poder ao verdadeiro cliente

(cidadão) que, como ressaltam os autores mencionados, já não suporta ver tanto desperdício e malversação de recursos públicos. Daí decorre a idéia de um sistema de controle interno, pautado nos fundamentos da

accountability,

o que reflete integridade e representa um passo importante no estabelecimento de uma política consistente de controle sustentável da corrupção.

Para os autores Schwartz e Sulitzeanu-Kenan (2002), a função de auditoria interna nas organizações do setor público parece deter o maior potencial para promover a

accountability

e aumentar o desempenho do Governo. Segundo esses autores, as normas profissionais de auditoria interna e os observadores acadêmicos enfatizam que a auditoria interna, além de ser uma ferramenta de administração que auxilia a administração superior, também funciona como uma ferramenta de

accountability

interna. Segundo os citados autores, com base em estudo realizado em Israel, a extensão em que as descobertas da auditoria interna são utilizadas para

accountability

externa tem sido uma questão central nas políticas adjacentes à institucionalização da auditoria interna.

Os principais problemas detectados pelos autores mencionados no parágrafo anterior, com base na análise das experiências dos Estados Unidos, Austrália e Canadá, incluem: cobertura inadequada da auditoria, particularmente de áreas de maior significância e alto risco; uma tendência a focalizar a auditoria sobre conformidade e regularidade em detrimento de auditoria de desempenho da economia, eficiência e eficácia; pouca atenção da alta administração para as descobertas dos auditores de dentro das agências. Os relatórios australianos e canadenses revelam, além disso, deficiências nas qualificações profissionais do

staff

de auditoria e no envolvimento da alta administração no planejamento de auditoria.

Já no caso específico de Israel, estudado com mais profundidade por Schwartz e Sulitzeanu-Kenan (2002), constatou-se que os representantes políticos, oficiais nomeados, administradores e trabalhadores têm boas razões para oferecer resistência às tentativas de

expor seu trabalho ao escrutínio. Seus interesses na estabilidade organizacional, na maximização do orçamento e na promoção de imagem favorável, contribuem para o desejo geral de opor-se aos mecanismos de

accountability

que podem retratar deficiências em seu trabalho. Autoridades políticas do Executivo, afirmam esses autores, tendem ser interessadas em caricaturas politicamente populares em vez de plataformas que atrelem seus nomes a programas fracassados. Para os autores, a preponderância de nomeações políticas nos altos níveis da agência e o curto mandato dos oficiais da alta administração desviam a atenção para oportunidades de curto prazo e prejudicam a evidenciação, na medida em que incentivam iniciativas que visam a evitar que as falhas da administração se tornem de conhecimento público. Isso parece sugerir, segundo esses autores, que as autoridades executivas eleitas representativamente e os oficiais da alta administração são quase que obrigados a desfavorecer políticas que apontem para o incremento de

accountability

.

No que se refere ao Poder Legislativo, os estudos de Schwartz e Sulitzeanu-Kenan (2002) indicam que esse Poder tende a dar baixa prioridade para a procura de

accountability

em geral e a prestar pouca atenção à auditoria e a relatórios de avaliação de programas em particular, isso porque, segundo eles, com algumas exceções para situações extremas, os legisladores perceberam que o investimento em trabalhos de

accountability

rende baixos retornos políticos. Os autores concluem, baseando-se também nas teorias de políticas de

accountability,

que as iniciativas de políticas de aumento de

accountability

encontrarão

resistência dentro do Executivo e provocarão um pequeno entusiasmo dentro do Legislativo. Por outro lado, para Schwartz e Sulitzeanu-Kenan (2002), as experiências recentes em alguns países, especialmente aqueles que integram o Reino Unido, indicam um incremento da utilização de mecanismos de

accountability

em relação a vários serviços públicos, decretando uma abundância de mecanismos de auditoria, métodos quase-mercado e sistemas de relatórios de desempenho.

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