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O corpo espinosano

No documento Atividade física e saúde (páginas 54-61)

Baruch de Espinosa nasceu em 1632 em um bairro judeu de Amsterdã, em uma família de comerciantes de origem portuguesa. Teve a mesma formação que tinham os rabinos da sua época: sabia hebraico, conhecia latim, falava português. Era fi lósofo e artesão, polia lentes para telescópios e microscópios e desenhava também. Interessou-se por questões de natureza científi ca e política, defendendo a liberdade de pensamento e expressão. Também estudava literatura, holandês, teologia e participou de peças no teatro.

Espinosa tem um legítimo lugar na história entre os grandes fi lósofos. Ele certamente foi o pensador mais original, radical e controverso de seu tempo, e suas ideias fi losófi cas, políticas e religiosas fi ncaram as bases para muito daquilo que hoje consideramos como ‘moderno’ (NADLER, 2013, p. 15).

Foi um judeu que recusou o cristianismo e o judaísmo. Foi excomun- gado em 1656 porque repudiava penitenciar-se e almejava a ruptura com os rabinos. Era afi rmativo e propositivo ainda que estivesse diante da guerra, da tirania e da excomunhão. Para Espinosa a vida era um modo de existir, não era uma ideia. Acreditava na alegria para vencer as “paixões tristes”. Teve uma vida austera e um corpo frágil consumido pela doença respiratória: em 1677 ele morre de uma infecção pulmonar.

O “príncipe dos fi losófos” (Deleuze) nos apresenta um conjunto de teses que nos faz pensar, entre elas: o homem é “efeito imanente da atividade de uma potencia absoluta, Deus, que engendra a Natureza sem separar-se dela” (Chaui, 2018, p.14). Espinosa discorda da ideia de livre-arbítrio as- sociado à vontade. O homem, de acordo com ele, é dotado de força para pensar e agir por si mesmo. A religião é uma relação espiritual direta e imediata entre indivíduo e divindade que não precisaria de mediadores e nem de mediação. Desarma a ideia do bem e do mal já que para ele não são

valores em si e nem qualidades das coisas; no lugar propõe a ideia do bom - tudo que aumenta a nossa potencia de agir - e do mau - tudo que a dimi- nui. Corpo e mens-espírito3 são ativos ou passivos simultaneamente e por inteiro: a mens-espírito não comanda o corpo e o corpo não é instrumento da mens-espírito. E para Espinosa uma ideia adequada jamais vence uma pai- xão, somente uma paixão vence outra, se equivalente ou mais forte que ela.

E uma das perguntas primordiais da Ética, considerada sua prin- cipal obra, é justamente “O que pode o corpo?”. E ele mesmo responde que quase sempre temos ideias obscuras e inadequadas a respeito do nosso próprio corpo. O trecho que segue pode ajudar o leitor a entender porque é necessário revisitarmos a própria ideia de corpo que orientou os últimos três séculos de pensamento e até hoje infl uencia a formação em saúde e revermos nossas práticas:

O fato é que ninguém determinou, até agora, o que pode o corpo, isto é, a experiência a ninguém ensinou, até agora, o que o corpo – exclusi- vamente pelas leis da natureza enquanto considerada apenas corporal- mente, sem que seja determinado pela mente – pode e o que não pode fazer. Pois, ninguém conseguiu, até agora, conhecer tão precisamente a estrutura do corpo que fosse capaz de explicar todas as suas funções, sem falar que se observam, nos animais, muitas coisas que superam em muito a sagacidade humana, e que os sonâmbulos fazem muitas coisas, nos sonhos, que não ousariam fazer acordados. Isso basta para mostrar que o corpo, por si só, em virtude exclusivamente das leis da natureza, é capaz de muitas coisas que surpreendem a sua própria mente. Além disso, ninguém sabe por qual método, nem por quais meios, a mente move o corpo, nem que quantidade de movimento ela pode imprimir-lhe, nem com que velocidade ela pode movê-lo. Disso se segue que, quando os homens dizem que esta ou aquela ação provém da mente, que ela tem domínio sobre o corpo, não sabem o que dizem, e não fazem mais do que confessar, com palavras enganosas, que ignoram, sem nenhum es- panto, a verdadeira causa da ação. Mas, dirão, saiba-se ou não por quais meios a mente move o corpo, a experiência mostra, entretanto, que se a mente não fosse capaz de pensar, o corpo fi caria inerte. Dirão também que a experiência mostra que estão sob o poder exclusivo da mente coisas tais como o falar e o calar, bem como muitas outras, acreditando, assim, que elas dependem da decisão da mente. Mas quanto ao primeiro ponto, pergunto-lhes: não é verdade que a experiência igualmente ensina

3 Espinosa não usa a palavra alma na Ética. Ele a substitui pela expressão mens-espírito que agrega:

a natureza do espírito que “consiste em ser uma idéia, e ideia de alguma coisa”; o corpo, objeto da ideia; a eternidade; e o espírito que “possui tantas partes quanto faculdades” (DELEUZE, 2002, p. 73).

Capítulo 3 – Correndo da atividade física e seguindo os gestos… para pensar uma educação física mais propositiva…

que se, inversamente, o corpo está inerte, a mente não se torna também incapaz de pensar? Pois quando o corpo repousa durante o sono, tam- bém a mente, ao mesmo tempo que ele, permanece adormecida, não tendo, como quando está acordada, a capacidade de pensar. Acredito, além disso, que todos sabem, por experiência, que a mente não é capaz de pensar, a cada vez, de maneira igual, sobre um mesmo objeto; em vez disso, a mente é tanto mais capaz de considerar este ou aquele objeto, quanto mais o corpo é capaz de ser estimulado pela imagem deste ou daquele objeto. Dirão, entretanto, não ser possível deduzir, em virtude exclusivamente das leis da natureza, enquanto considerada apenas sob seu aspecto corporal, as causas dos edifícios, dos quadros e de objetos similares, que são produzidos exclusivamente pelo engenho humano, e que o corpo humano, se não fosse determinado e conduzido pela mente, não seria capaz de edifi car um templo. Já demonstrei, porém, que eles não sabem o que pode um corpo, nem o que pode ser deduzido exclusivamente da consideração de sua natureza, e que a experiência lhes mostra que se fazem, em virtude exclusivamente das leis da natureza, muitas coisas que eles nunca acreditariam poder ter sido feitas sem a di- reção da mente, como as que fazem os sonâmbulos durante o sono e das quais eles próprios se surpreendem quando acordados. Acrescento, aqui, a própria estrutura do corpo humano, que, em engenhosidade, supera, em muito, todas as coisas que são construídas pela arte humana, para não falar do que mostrei anteriormente: que da natureza, considerada sob qualquer um de seus atributos, seguem-se infi nitas coisas. Quanto ao segundo ponto, certamente as coisas humanas estariam numa situa- ção bem melhor se tanto o calar quanto o falar também estivessem sob o poder do homem. A experiência, entretanto, ensina, sobejamente, que nada está menos sob o poder dos homens do que a sua língua, e que não há nada de que sejam menos capazes do que de regular seus apetites. Disso decorre que muitos acreditam que só fazemos livremente aquelas coisas que perseguimos sem muito empenho, pois o apetite por essas coi- sas pode ser facilmente mitigado pela recordação de alguma outra coisa de que nos lembramos com freqüência, mas que fazemos muito pouco livremente aquelas coisas que perseguimos com um afeto intenso, o que não pode ser atenuado pela recordação de outra coisa. Se a experiência, entretanto, não mostrasse aos homens que fazemos muitas coisas das quais, depois, nos arrependemos, e que, freqüentemente, quando somos afl igidos por afetos opostos, percebemos o que é melhor, mas fazemos o que é pior, nada os impediria de acreditar que fazemos tudo livremente. (...) a própria experiência ensina, não menos claramente que a razão, que os homens se julgam livres apenas porque estão conscientes de suas ações, mas desconhecem as causas pelas quais são determinados. Ensina também que as decisões da mente nada mais são do que os próprios apetites: elas variam, portanto, de acordo com a variável disposição do

corpo. Assim, cada um regula tudo de acordo com o seu próprio afeto e, além disso, aqueles que são afl igidos por afetos opostos não sabem o que querem, enquanto aqueles que não têm nenhum afeto são, pelo menor impulso, arrastados de um lado para o outro. Sem dúvida, tudo isso mostra claramente que tanto a decisão da mente, quanto o apetite e a determinação do corpo são, por natureza, coisas simultâneas, ou melhor, são uma só e mesma coisa, que chamamos decisão quando considerada sob o atributo do pensamento e explicada por si mesma, e determinação, quando considerada sob o atributo da extensão e deduzida das leis do movimento e do repouso, o que se verá mais claramente no que resta ainda a dizer. (...) Aqueles, portanto, que julgam que é pela livre decisão da mente que falam, calam, ou fazem qualquer outra coisa, sonham de olhos abertos (Escólio da Proposição 2 da Terceira Parte; SPINOZA, 2007, p. 167)4.

Citação extensa mas necessária porque seu conteúdo permite, para quem não é leitor da obra do fi lósofo, ter uma noção da riqueza e da com- plexidade do trabalho que Espinosa desenvolveu em tão pouco tempo de vida. O corpo espinosano é um corpo-mente porque são isonômicos, estão no mesmo plano ontológico. O que se passa na mente é o que se passa no corpo e vice-versa. Nada acontece no corpo que eu não tenha a percepção, mas isso não signifi ca que eu conheço a causa.

René Descartes foi uma referencia e um interlocutor para Espinosa. Descartes separa res cogitans e res extensa. Ao atribuir ao Cogito o estatuto de primeira certeza ontológica, Descartes defi niu a primazia da alma em detrimento do corpo:

[...] pelo próprio fato de que conheço com certeza que existo, e que, no entanto, noto que não pertence necessariamente nenhuma outra coisa à minha natureza ou à minha essência, a não ser que sou uma coisa que pensa, concluo efetivamente que minha essência consiste somente em que sou uma coisa que pensa ou uma substancia da qual toda a essência ou natureza consiste apenas em pensar. E, embora talvez (ou, antes, certamente, como direi logo mais) eu tenha um corpo ao qual estou muito estreitamente conjugado, todavia, já que, de um lado, tenho uma idéia clara e distinta de mim mesmo, na medida em que sou apenas uma coisa pensante e inextensa, e que, de outro, tenho uma idéia distinta do corpo, na medida em que é apenas uma coisa extensa e que não pensa,

4 Diante das inúmeras e distintas traduções da obra de Espinosa adotamos a de Tomaz Tadeu.

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é certo que este eu, isto é, minha alma, pela qual eu sou o que sou, é inteira e verdadeiramente distinta de meu corpo e que ela pode ser ou existir sem ele (Meditação Sexta, § 17; DESCARTES, 1973, p. 142).

Descartes se opunha ao paradigma naturalista, basicamente aristo- télico, caracterizado pelo animismo5 e vitalismo6 – a vida é fruto de uma

força vital, ou alma, diferente do corpo e da mente – e pelo fi nalismo7 e

teleonomia8 – a vida como um projeto pré-determinado existe para uma

fi nalidade. O lugar do signifi cado e do sentido está na alma, mas nunca é uma ideia verdadeira, semelhante à coisa. E é esse racionalismo que orientará o pensamento e as ciências. E essa infl uencia fi losófi ca será determinante no modo como “experimentamos” o corpo. E até hoje está presente nas salas de aula da educação física, seja na graduação ou na pós-graduação.

Descartes parte do pressuposto de que

há grande diferença entre espírito e corpo, pelo fato de ser o corpo por sua própria natureza, sempre divisível e o espírito inteiramente indivisí- vel. Pois, com efeito, quando considero meu espírito, isto é, eu mesmo, na medida em que sou apenas uma coisa que pensa, não posso aí distin- guir partes algumas, mas me concebo como uma coisa única e inteira. E, conquanto, o espírito todo pareça estar unido ao corpo todo, todavia um pé, um braço ou qualquer outra parte estando separada do meu corpo, é certo que nem por isso haverá aí algo de subtraído a meu espírito. E as faculdades de querer, sentir, conceber, etc., não podem propriamente ser chamadas suas partes: pois o mesmo espírito emprega-se todo em querer e também todo em sentir, em conceber, etc. Mas ocorre exatamente o contrário com as coisas corpóreas ou extensas: pois não há uma sequer

5 “Costuma signifi car a crença de que tudo está animado e vivifi cado, de que os objetos da Natureza

são, em sua singularidade e em sua totalidade, seres animados”. Pode ser compreendido em três sentidos: da equivalência à doutrina de que a alma é o verdadeiro princípio vital; do orgânico como sujeito material; ou ainda sob a forma de causa fi nal de todos os movimentos corporais (MORA, 2004, p. 142).

6 “Toda admissão de um ‘princípio vital’, de uma ‘força vital’ irredutível aos processos físico-químicos

dos organismos, é chamada ‘vitalismo’. Mas este termo às vezes adquiriu um signifi cado mais amplo. Pode-se qualifi car também de vitalismo a concepção organológica típica da maior parte das doutrinas fi losófi cas gregas. Neste caso, vitalismo designa uma concepção do mundo segundo a qual todo ser pode ser concebido por analogia com os seres vivos. Segundo esta concepção, enquanto o material se aproxima do espiritual no sentido de ser considerado como algo ‘animado’, o espiritual se aproxima do material no sentido de ser considerado como algo ‘corpóreo’” (MORA, 2004, p. 3.031).

7 “O fi nalismo supõe que na causa resida um fi m”. Segundo Bergson, o fi nalismo é uma concepção

da realidade segundo a qual esta já se encontra dada pelo futuro. (MORA, 2004, p. 1.116).

8 “Desde Pittendrigh, ‘teleonômico’ e ‘teleonomia’ foram usados por um número crescente de biólogos,

especialistas em teoria da evolução e fi lósofos da ciência (especialmente da biologia e das ciências do comportamento). Foi usado também na literatura sobre autômatos e sistemas que se regulam a si mesmos”. Mas até hoje há debates sobre se há, de fato, diferenças signifi cativas entre esse conceito e o clássico conceito aristotélico de ‘teleologia’ que acarreta conotações que procedem da ideia de causa fi nal tal como se supõe ter sido estabelecida por Aristóteles (MORA, 2004, p. 2.830).

que eu não faça facilmente em pedaços por meu pensamento, que meu espírito não divida mui facilmente em muitas partes e, por conseguinte, que eu não reconheça ser divisível. E isso bastaria para ensinar-me que o espírito ou a alma do homem é inteiramente diferente do corpo, se já não o tivesse sufi cientemente aprendido alhures (Meditação Sexta, § 33; DESCARTES, 1973, p. 147).

Desse modo, Descartes desloca todo o “sensível” a esquemas simples, distanciando-o da ideia e do pensamento. O sujeito racional não tem carne, desejos9, sentidos. Esse corpo sem sentidos movimenta-se, mas o movimento

é propriedade do objeto corporal, é representação de uma relação quanti- tativa, obedece ao princípio da inércia. É geométrico, físico e o parâmetro para o estudo do movimento será a mecânica:

Noto também que o espírito não recebe imediatamente a impressão de todas as partes do corpo, mas somente do cérebro, ou talvez mesmo de uma de suas menores partes, a saber, aquela onde se exerce a faculdade que chamam o senso comum, a qual, todas as vezes que está disposta da mesma maneira, faz o espírito sentir a mesma coisa... (Meditação Sexta, § 34; DESCARTES, 1973, p. 147).

A matéria cartesiana – o corpo – é um conceito!

Para Espinosa, distintivamente, o corpo é “energia universal ou ati- vidade infi nita”, um “sistema centrípeto e centrífugo de ações e reações”. O corpo não é uma “unidade isolada” que se relaciona com outra “unidade isolada”:

9 Recorro a Marilena Chaui para resgatar a origem da palavra “desejo”: “Deriva-se do verbo desidero

que, por sua vez, derviva-se do substantivo sidus (mais usado no plural, sidera), signifi cando a fi gura formada por um conjunto de estrelas, isto é, as constelações. Porque se diz dos astros, sidera é empregado como palavra de louvor – o alto – e, na teologia astral ou astrologia, é usado para indicar a infl uência dos astros sobre o destino humano, donde sideratus, siderado: atingido ou fulminado por um astro. De sidera, vem considerare – examinar com cuidado, respeito e veneração – e desiderare – cessar de olhar (os astros) (...) Pertencente ao campo das signifi cações da teologia astral ou astrologia, desiderium insere-se na trama dos intermediários entre Deus e o mundo dos entes materiais (corpos e almas habitantes de corpos). Os intermediários siderais, eternos e etéreos, exalam diáfanos envoltórios com que protegem nossa alma, dando-lhe um corpo astral que a preserva da destruição quando penetra na brutalidade da matéria, no momento da geração e do nascimento. Pelo corpo astral, nosso destino está inscrito e escrito nas estrelas e considerare é consultar o alto para nele encontrar o sentido e guia seguro de nossas vidas. Desiderare, ao contrário, é estar despojado dessa referência, abandonar o alto ou ser por ele abandonado. Cessando de olhar para os astros,

desiderium é a decisão de tomar nosso destino em nossas próprias mãos, e o desejo chama-se, então,

vontade consciente nascida da deliberação (...) Deixando de ver os astros, porém, desiderium signifi ca uma perda, privação do saber sobre o destino, queda na roda da fortuna incerta. O desejo chama-se, então, carência, vazio que tende para fora de si em busca de preenchimento...” (CHAUÍ, 1990, p. 22).

Capítulo 3 – Correndo da atividade física e seguindo os gestos… para pensar uma educação física mais propositiva…

é um ser originária e essencialmente relacional: é constituído por relações internas entre os corpúsculos que formam suas partes e seus órgãos e pelas relações entre eles, assim como por relações externas com outros corpos ou por afecções, isto é, pela capacidade de afetar outros corpos e ser por eles afetado sem se destruir, regenerando-se, transformando-se e conservando-se graças às relações com outros (CHAUI, 2011, p. 73).

O corpo é agregação de corpos e coexistência com outros corpos. E se é assim, “pode mais uma mente quanto mais pode um corpo”. A mente “é uma força pensante. Pensar é conhecer alguma coisa afi rmando ou negando sua ideia. Uma ideia é uma afi rmação ou uma negação” (Chaui, 2011, p. 77). A mente está voltada para os objetos que constituem os conteúdos de suas ideias. A mente é a atividade de pensar o objeto. Nesse sentido, a mente é ideia do corpo; ideia da ideia do corpo; e ainda ideia das afecções corporais. “A ligação entre a mente e o corpo não é algo que acontece a ambos, mas é o que ambos são quando são corpo e mente humanos” (Chaui, 2011, p. 79). Uma das implicações dessa concepção de corpo é que o concei- to de afeto opera, simultaneamente, na dimensão do corpo e da mente. Entretanto, alerta Espinosa, temos ideias imaginativas em relação às coisas. Imaginar, produzir imagens como efeitos de como afetamos e somos afeta- dos pelos outros corpos, é resultado do instantâneo, do momentâneo, do fugaz, do disperso, do volátil, da relação imediata com o mundo e por esse motivo é ideia imaginativa. Ideia imaginativa é ideia inadequada conside- rando que a característica da imagem é a abstração. Uma ideia que se orienta por sinais. Uma ideia que ignora sua causa.

“A ideia imaginativa é o esforço da mente para associar, diferenciar, generalizar e relacionar abstrações ou fragmentos, criando conexões ente imagens para com elas orientar-se no mundo”. Como fi cam registradas as imagens passadas e presentes, “as relações de movimento entre as partes fl uidas e moles de nosso corpo em contato com outros corpos gravam nele todos os vestígios dessas relações”, de modo que o corpo “alem de imagi- nante, é memorioso…” (CHAUI, 2011, p. 81).

Será aproximando e aprofundando a relação mente e corpo que che- garemos à ideia verdadeira. As afecções do corpo e as ideias das afecções na mente estão atreladas ao existir e a tudo que colabore para o existir. Nossa natureza é a causa do que se passa em nós e fora de nós e não agimos em vista de fi ns ou por causas fi nais.

Nesse sentido, se corpo e mente são passivos ou ativos juntos e por inteiro, sem hierarquia e em igualdade de condições, talvez os gestos possam nos dar mais pistas para inventarmos outros modos de pensar e propor

No documento Atividade física e saúde (páginas 54-61)