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O Corredor da Beira: entre o carvão e o caminhão

CAPÍTULO 2 – A persistência da extraversão na circulação de mercadorias em

2.2 Divisão territorial do trabalho a serviço do mercado externo

2.3.2 O Corredor da Beira: entre o carvão e o caminhão

Quando comparado ao Corredor de Maputo, o Corredor da Beira possui números mais modestos. Com o porto da Beira movimentando cerca de 6,6 milhões de toneladas em 2013, existem apenas 2 (duas) linhas ferroviárias principais (Sena e Machipanda) e mais dois ramais complementares, além da Estrada Nacional nº 6 (EN6), que liga a cidade da Beira à fronteira com o Zimbabwe, mas a grande diferença está no número muito mais reduzido de terminais no porto da Beira em relação ao porto de Maputo:

a) Terminal de Contêineres (concessionado à Cornelder de Moçambique); b) Terminal Frigorífico (concessionado à Watertight Investments);

c) Terminal de Carvão (concessionado à New Coal Terminal Beira); d) Terminal de Cereais (concessionado à Beira Grain Terminal); e) Terminal de Carga Geral (sob gestão dos CFM);

f) Terminal de Combustíveis (sob gestão dos CFM).

Os principais produtos, de exportação e importação, movimentados nos terminais do porto da Beira entre 2013 e 2015, estão indicados na Tabela 7, onde é possível constatar a grande predominância do carvão quanto à exportações e um maior equilíbrio entre os produtos importados, ainda que o recebimento de contêineres se destaque nos números indicados.

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Tabela 7: As principais exportações e importações do porto da Beira (2013-2015)

Produtos

Volume movimentado (106 Ton/Km)

2013 2014 (até setembro) 2015 Exportação Carvão 4.085 5.045 3.705 Contêineres 659 935 671 Açúcar e Melaço 61 43 28 Importação Contêineres 1.041 1.084 743 Klinker 303 505 424 Combustível 388 456 310 Trigo 147 145 127 Cimento 66 60 0

Fonte: Portos e Caminhos de Ferro de Moçambique (CFM)

O terminal de contêineres, conforme visto no capítulo 1, foi a primeira experiência de concessão no sistema ferro-portuário moçambicano, e desde 1998 é gerido pela empresa Cornelder de Moçambique51, subsidiária da holandesa Cornelder, e que detém 70% das ações do negócio, enquanto os CFM ficam com 30%. Representativo da inserção da circulação moçambicana no período técnico-científico- informacional52, o terminal possui 2 guindastes tipo “pórtico” e 2 armazéns com uma área de cerca de 11.000 metros quadrados (CARGO, 31/10/2014).

O terminal que mais evidencia, porém, o papel do Centro de Moçambique na nova divisão internacional do trabalho, é o terminal de carvão. Projetado na década de 1980, o terminal de carvão tem capacidade atual de operar 6 milhões de metros cúbicos de carvão, mas com a recente concessão à Sociedade Comercial New Coal Terminal Beira53 espera-se aumentar essa capacidade para 20 milhões de metros cúbicos (CARGO, 03/08/2014). Ainda em relação à exploração de carvão mineral, já foi licitada ao consórcio Thai Moçambique Logística, formado pela empresa tailandesa Italthai Industrial Company Limited(com uma participação de 60%), pelos CFM (com 20%), e pelo grupo empresarial Corredor de Desenvolvimento da Zambézia (Codiza), também com 20%, a construção e modernização de um porto de águas profundas em Macuse, na província da Zambézia, e de uma ferrovia de 525 km que ligará esse porto à bacia

51 A concessão tem vigência de 25 anos.

52 Transplantando para a realidade moçambicana o que CONTEL (2011) afirmou sobre o advento dos

contêineres nos portos brasileiros.

90 carbonífera de Moatize, em Tete (MACAUHUB, 26/11/2014). A entrada de uma transnacional tailandesa na exploração de carvão mineral em Moçambique somente ratifica o novo desenho da divisão internacional do trabalho, levada a cabo por grandes conglomerados oriundos de países que até então não participavam desse tipo de empreendimento.

Em relação aos outros terminais do porto da Beira, parece-nos importante uma pequena menção ao Terminal Frigorífico, destinado ao manuseamento de frutas, e que evidencia o papel da integração regional na África Austral, uma vez que o terminal é uma joint venture entre o CFM e a empresa zimbabweana Watertight Investiments.

Se o carvão mineral é o tipo de carga mais movimentada no sistema ferro- portuário do centro de Moçambique, um estudo muito interessante de PÉREZ-NIÑO (2013) indica que, excluindo essa commodity, cerca de 95% da carga que circula no Corredor da Beira é transportada pelo modal rodoviário, e 80% dos veículos que realizam esse transporte são caminhões. Segundo a autora, tal atividade é basicamente realizada por meio de empresas transportadoras essencialmente nacionais, criadas durante o período pós-guerra onde faziam o transporte da ajuda humanitária, com caminhões comprados com economias familiares e geridas pela mesma família, e que hoje são responsáveis pela geração de empregos e pela acumulação de capital por parte do setor privado nacional.

Em relação à diversidade da frota de caminhões, PÉREZ-NIÑO (2013) diz que

“As actuais frotas são consideravelmente grandes e variadas. As empresas especializadas detêm camiões-tanque para combustíveis, camiões basculantes, cisternas para cimento e camiões plataforma para transportar materiais de construção e equipamento, assim como gruas especializadas para transportar carga a granel e contentores. Os principais activos das empresas são os camiões, os seus gabinetes e parques de estacionamento; as maiores empresas ou detêm ou estão a construir terminais logísticos na Beira para optimizar o armazenamento e a movimentação fora dos terminais do porto (p. 215)”.

Já em relação à diversidade das cargas transportadas, um quadro interessante da circulação no Corredor da Beira é fornecido no mesmoestudo:

“A carga contentorizada transportada através do porto da Beira inclui, entre outros, madeira, tabaco, sementes, sésamo (exportações moçambicanas); crómio, tabaco, algodão, chá, milho, cobre, manganésio, cobalto (em trânsito). A carga geral típica que passa pela Beira consiste em: clínquer, carvão, cimento, açúcar, trigo (importações e exportações moçambicanas) e granito, fertilizante, arroz, açúcar (em trânsito) (p. 217)”.

91 Essa predominância do modal rodoviário no transporte de cargas no Corredor da Beira é, para a autora, consequência da incapacidade do sistema ferro-portuário em processar essa variada quantidade de carga. Assim, “[...] o transporte rodoviário de mercadorias prosperou num nicho de oportunidade criado pelos défices e limitações do desenvolvimento, manutenção e funcionamento dos serviços de caminho-de-ferro (PÉREZ-NIÑO, 2013, p. 222)”. Mais uma vez, como no caso do Corredor de Maputo, e apesar da importância da ferrovia para o transporte de cargas (principalmente de carvão), o modal rodoviário ainda responde por grande parte da carga que circula no Corredor da Beira, sendo, portanto, o principal vetor da circulação extravertida de mercadorias no Centro de Moçambique.