• Nenhum resultado encontrado

efeito direto perante terceiros, mas que, segundo o autor, é o resultado da aplicação da própria teoria dos efeitos indiretos.

1.6 O DEBATE BRASILEIRO ACERCA DA EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Na Alemanha existe posicionamento francamente favorável de que os direitos fundamentais produzem efeitos indiretos nas relações entre particulares.110

No Brasil, diversamente do que ocorreu na Alemanha, prevalece doutrinariamente a eficácia imediata dos direitos fundamentais nas relações entre particulares, ou, quando não, um apelo à teoria principiológica de Robert Alexy, dentre as quais destacam-se as teses de quatro autores: Ingo Wolfgang Sarlet, Daniel Sarmento, Virgílio Afonso da Silva e Wilson Steinmetz.111 No cerne do debate está a compatibilidade dos direitos fundamentais com a autonomia privada e na elaboração de parâmetros para a solução das tensões entre estes.

Assim, Daniel Sarmento propõe tal solução partindo do exame de simetria entre as partes e do tipo de questão envolvida (se existencial ou patrimonial). Para o autor, “quanto maior for a desigualdade (fática entre os envolvidos), mais intensa será a proteção ao direito

109 “Existem os três níveis. Cada um deles abarca um aspecto da mesma questão. Decidir qual deles será escolhido

na fundamentação jurídica é uma questão de conveniência. Mas nenhum deles pode pretender uma primazia sobre os outros.” (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 540).

110 Dimoulis e Martins evidenciam a (possibilidade de) compatibilidade teórica entre os ordenamentos alemão e

brasileiro, de uma maneira geral em: DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos

fundamentais. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

111 As obras de referências dos autores citados acerca do tema são: SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos

direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11. ed. Porto

Alegre: Livraria do Advogado, 2012; SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004; SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2005; STEINMETZ, Wilson. A vinculação

fundamental em jogo, e menor a tutela da autonomia privada. Ao inverso, numa situação de tendencial igualdade entre as partes, a autonomia privada vai receber uma proteção mais intensa, abrindo espaço para restrições mais profundas ao direito fundamental com ela em conflito”.112 Quanto ao tipo de questão envolvida, sustenta que, nos casos envolvendo questões existenciais, a autonomia privada terá um peso maior do que nos casos concernentes a questões econômico-patrimoniais; e, que nesses últimos casos, a proteção da autonomia privada em face de um eventual direito fundamental restringido deverá variar em função da essencialidade do bem envolvido.113

Para Wilson Steinmetz a compatibilização entre autonomia e direitos fundamentais pode ser resolvida pelo princípio da proporcionalidade. Sua tese parte do pressuposto alexyano de que tantos os direitos fundamentais quanto a autonomia privada têm estrutura principiológica, são mandados de otimização, e que, portanto, a compatibilização entre ambos deve seguir os parâmetros de compatibilização dos direitos fundamentais em caso de colisão entre eles, conforme proposto por Alexy. Após distinguir as situações de igualdade fática das situações de desigualdade fática e as situações de direito fundamental de conteúdo pessoal das de conteúdo patrimonial, o autor estabelece, em relação à liberdade contratual, quatro regras de precedência condicionada: em uma relação contratual de particulares em situação de igualdade fática há precedência prima facie do princípio da autonomia privada ante o direito individual de conteúdo patrimonial; em todas as demais há prevalência do princípio colidente sobre o princípio da autonomia privada. A tese de Steinmetz invoca a aplicação da proporcionalidade ao âmbito das relações privadas.

Virgílio Afonso da Silva, direcionando-se exatamente a esta invocação, defende que a autonomia privada é um princípio formal garantidor do respeito às decisões privadas, mas insuscetível de sopesamento com princípios colidentes. O peso do princípio formal é dado por duas regras: o princípio formal será mais pesado quando maior for a autonomia real; ele terá um peso menor quanto maior a intensidade da limitação ao direito fundamental envolvido. O autor afirma a impertinência de se examinar a adequação e a necessidade da medida escolhida pelo particular. A tese do autor parte da influente concepção de Robert Alexy, apresentado um modelo em dois níveis, que, com base na teoria dos princípios, aceita um estágio e efeitos indiretos, através da mediação legislativa, bem como uma fase de aplicabilidade direta, por meio do sopesamento e valoração.

112 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 303. 113 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 309.

A proposta de Ingo Wolfgang Sarlet, apesar de se referir à teoria da eficácia mediata adotada pelos alemães, se coloca muito próxima às de Daniel Sarmento e Wilson Steinmetz. O autor vislumbra, no âmbito da problemática da eficácia privada dos direitos fundamentais, que as hipótese de um conflito entre os direitos fundamentais e o princípio da autonomia privada “pressupõem uma análise tópica, calcada nas circunstâncias específicas do caso concreto, devendo ser tratada de forma similar às hipóteses de colisão entre direitos fundamentais de diversos titulares, isto é, buscando-se uma solução norteada pela ponderação dos valores em pauta, almejando obter um equilíbrio e concordância prática, caracterizada, em última análise, pelo não sacrifício completo de um dos direitos fundamentais, bem como pela preservação, na medida do possível, da essência de cada um.”114

1.7 CONTRAPONTO ÀS TEORIAS SOBRE A VINCULAÇÃO DOS PARTICULARES