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O debate filosófico e a sistematização do pensamento geográfico

2. DESCOBRINDO O CAMINHO

2.3. Questões teórico-metodológicas da ciência geográfica

2.3.1. O debate filosófico e a sistematização do pensamento geográfico

Por conseguinte, para que possamos melhor compreender, na Geografia, essa herança filosófica que oscila basicamente entre dois extremos, idealismo e marxismo, passando principalmente pelo positivismo e pelo historicismo, destacaremos de forma sintética os principais pressupostos destas correntes para, na seqüência, situá-los na sistematização do pensamento geográfico.

Primeiramente, a corrente filosófica conhecida por idealismo, que, embora tenha seus primeiros pressupostos em Kant, deve mesmo a sua construção teórica ao filósofo alemão Friedrich Hegel que, radicalizando a importância dada por Kant à razão, acabou eliminando a distinção entre a idéia e o real. E mais, colocou o real como reflexo da idéia/conceito/pensamento.

A idéia é, pois, o real em geral e só o real. O real começa por aparecer como possuidor de uma existência externa, como senhor de uma realidade sensível; mas o real sensível só é verídico ou verdadeiramente real quando corresponde ao conceito (HEGEL, 1996, p. 128).

Sua principal premissa, “a vida espiritual da sociedade determina a vida material”, criou uma posição filosófica calcada na suposição de que a razão é uma força histórica autônoma, não determinada pela situação material. Contra tal posição, Marx e Engels (1982, p. 37-38) escreveram que a história não é produzida pelo movimento da consciência, ela depende da ação concreta dos homens:

[...] não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência... Esta maneira de considerar as coisas não é desprovida de pressupostos. Parte de pressupostos reais e não os abandona um só instante. Estes pressupostos são os homens, não em qualquer fixação ou isolamento

fantásticos, mas em seu processo de desenvolvimento real, em condições determinadas, empiricamente visíveis. Desde que se apresente este processo ativo de vida, a história deixa de ser uma coleção de fatos mortos, como para os empiristas ainda abstratos, ou uma ação imaginária de sujeitos imaginários, como para os idealistas.

Por sua vez, o positivismo de Augusto Comte é uma das correntes filosóficas que mais influenciou, desde o século XIX até os nossos dias, o desenvolvimento das ciências humanas. Apropriando-se da idéia otimista de progresso, como algo inerente às sociedades, passou a defender uma concepção de história na qual os seres humanos “históricos” tendem a progredir com o passar do tempo. As evidências e o aprofundamento deste progresso seriam alcançados por uma ciência neutra, na qual o conhecimento verdadeiro, real, era aquele que podia ser verificado/observado. Daí a supremacia do método das ciências da natureza.

Não é difícil notar que a crença no progresso constitui o fundamento desta evolução que Comte crê constatar. Com efeito, ao lado da ordem, a idéia de

progresso apresenta-se como noção fundamental para a compreensão do

positivismo. Entretanto, a idéia de progresso em Comte não é obrigatoriamente solidária da criação e da investigação ilimitadas... O que Comte procura sempre são leis invariáveis, de acordo com o modelo da física e da matemática, paradigmas da ordem. Por isto, a história é pensada como a sucessão ordenada que vemos na lei dos três estados, e a sociedade será pensada como uma totalidade orgânica dividida em segmentos ou classes que se relacionam de maneira estática, ainda segundo uma ordem fixa, susceptível de ser apreendida pela sociologia, que Comte concebe como uma física social (SILVA, 1986, p. 113-114, grifo do autor).

Essa concepção de que o homem tem história porque é um herdeiro, e que dentro da ordem, e somente a partir do legado recebido, é capaz de experimentar o progresso,

propõe uma história entendida a partir da tríade tradição-ordem-progresso, em que o passado governa o futuro, bloqueando o devir revolucionário.

[...] Os vivos são sempre, e cada vez mais, governados necessariamente pelos mortos: tal é a lei fundamental da ordem humana... Literalmente dotados pelos nossos predecessores, nós transmitimos de graça aos nossos sucessores o conjunto do domínio humano [...] (COMTE, 1996, p.135).

Quanto ao historicismo, desenvolvido pelo filósofo alemão Dilthey, o seu período de formulação e debate localizava-se também na fase de formação das ciências humanas, isto é, no século XIX. Essa concepção tem forte influência do idealismo de Hegel, o qual acredita que o ideal (o processo de pensamento) é autônomo, portanto separado do real (CHAUÍ, 1994).

O historicismo não possui um princípio materialista dialético no tocante ao entendimento da história, ele “se contenta com estabelecer um nexo causal entre os diversos momentos da história. Mas nenhuma situação de fato já é, só por isso, uma causa histórica” (BENJAMIN, 1991, p. 163).

Ansiosos para distinguir o método de investigação das ciências humanas (que seria o da explicação dos fenômenos a partir da sua historicidade/causa geral) e o das ciências naturais (método da experimentação), os historicistas aprofundaram a dicotomia entre a sociedade e a natureza, oscilando assim da concepção mecanicista, na qual o homem podia tudo, inclusive dominar a natureza porque só ele combinava espírito e matéria, para uma concepção em que o homem é considerado antinatural. Desta feita, a conhecida teoria do “espírito do povo”, que visa explicar a individualidade (por meio da tradição, língua, costume) de cada uma das épocas históricas, bem como situá-las como etapas do desenvolvimento geral da humanidade (causa geral), acaba tendo um significado extremamente conservador, pois...

Negando à ação política a possibilidade de transformar, segundo planos racionais, indicadores de fins determinados e das respectivas instituições necessárias para os alcançar; as relações econômicas, sociais e políticas inconscientemente criadas pela misteriosa alma popular, essa corrente de pensamento forneceu os instrumentos ideológicos das instituições absolutístico - feudais contra as tendências reformadoras, desencadeadas por toda a Europa pela Revolução Francesa e pelas guerras revolucionárias... esta forma de historicismo conservador manteve sempre, até os nossos dias, uma certa vitalidade na esfera da praxe e da cultura política, revelando-se continuamente como desconfiança mais ou menos clara em face da tendência a racionalizar as instituições sociais e políticas e como preferência por um desenvolvimento lento, sem rupturas bruscas e as mais espontâneas possíveis (BOBBIO, 1992, p. 582).

Por fim, o materialismo histórico dialético inverte o método de Hegel ao proclamar que são as condições históricas que determinam as idéias e não o seu contrário. Assim, Marx e Engels (1982, p. 37) procuram distinguir o idealismo do marxismo histórico dialético, salientando que:

Totalmente ao contrário do que ocorre na filosofia alemã, que desce do céu a terra, aqui se ascende da terra ao céu. Ou, em outras palavras: não se parte daquilo que os homens dizem, imaginam ou representam, e tampouco dos homens pensados, imaginados e representados para, a partir daí, chegar aos homens em carne e osso; parte-se dos homens realmente ativos e, a partir de seu processo de vida real, expõe-se também o desenvolvimento dos reflexos ideológicos e dos ecos desse processo de vida.

O marxismo histórico dialético introduz a concepção do desenvolvimento histórico como processo que revoluciona a vida, rompendo, desse modo, com a história vista como processo linear, etapista, comandada por uma razão/pensamento autônomo, independente das ações do homem. Nesta perspectiva, a razão passa a ser condicionada pela sociedade (relações sociais), enfim, ela deixa de ser a história como anteriormente se

postulava. Por conseguinte, como dizia Marx (1986, p. 19), a história da sociedade passa a se confundir com a história das lutas de classe.

Todavia, embora Marx tenha afirmado que são os homens que fazem a história por meio do conflito entre as classes, ele ressaltou que, em função do processo de alienação a qual faz com que a aparência dos fatos não coincida com a sua essência, os homens acabam não fazendo a história como querem. Desta forma, somente através de uma racionalidade advinda da práxis, os homens poderão emancipar-se, e essa libertação da ideologia será produto da ação dos trabalhadores, pois “a libertação é um ato histórico e não um ato de pensamento”. Destarte, ninguém fará isso por eles, daí sua assertiva “proletários de todos os paises, uni-vos!”.

Os elementos materiais de uma subversão total são, de um lado, as forças produtivas existentes e, de outro, a formação de uma massa revolucionária que se revolte, não só contra as condições particulares da sociedade existente até então, mas também contra a própria produção da vida vigente, contra a atividade total sobre a qual se baseia. Se tais elementos materiais não existem, então no que se refere ao desenvolvimento prático, é absolutamente indiferente que a idéia desta subversão tenha sido já proclamada uma centena de vezes como demonstra a história do comunismo13 (MARX e ENGELS, 1982, p. 57, grifo nosso).

Por outro lado, quando diz que as condições materiais condicionam o ser social, Marx e Engels (1982, p. 107-108) escapam do pessimismo, do materialismo “vulgar”, explicando que o conhecimento das condições desta determinação por meio da práxis pode

13 Acreditamos ser essa passagem ímpar na elucidação do entendimento que Marx tinha da consciência de classe. Por conseguinte, a crítica feita por Bourdieu (2000) à tradição marxista, qual seja a existência de uma verdadeira “alquimia misteriosa” no tocante a “promoção” da classe em si para classe para si, bem como de uma lógica voluntarista-oportunista, alternando com uma determinista-mecanicista nas explicações disponíveis sobre o assunto, não deve ser estendida a Marx, talvez aos marxistas, uma vez que Marx sempre ensinou que a consciência de classe se adquire na luta, nas experiências de vitórias e derrotas da prática da própria classe.

levar os homens, seja por meio da evolução ou da ruptura, à superação do status quo, por conseguinte a ação da matéria sobre a idéia não é estática, nem linear.

No desenvolvimento das forças produtivas chega-se a uma fase onde surgem forças produtivas e meios de intercâmbio que no quadro das relações existentes, apenas causam estragos e não são mais forças produtivas, mas forças destrutivas (maquinário e dinheiro); e ligada a isso, surge uma classe que tem de suportar todos os encargos da sociedade sem usufruir de suas vantagens; que, expulsa da sociedade, é forçada à mais decidida oposição a todas as outras classes – uma classe que engloba a maioria dos membros da sociedade e da qual emana a consciência comunista, que pode se formar, naturalmente, também entre as outras classes, graças à percepção da situação dessa classe.

Em face da exposição das correntes filosóficas, faz-se pertinente discutirmos a influência delas na produção geográfica para, a partir daí, refletirmos sobre o nosso objeto específico, no momento oportuno. Todavia, não é nossa pretensão classificar o pensamento geográfico, nem criar rótulos para seus pensadores, até porque há casos de influência múltipla que levam a imbricamentos, como salienta Santos (1990, p. 29):

A influência de Hegel pode ser reconhecida na obra de Ratzel e mesmo nos trabalhos de Ritter. Marx teria igualmente influenciado em muitos pontos o trabalho de Ratzel, de Vidal de La Blache, de Jean Brunhes. Todavia, e por múltiplas razões, foi a herança idealista e positivista que, afinal de contas, acabou por se impor à geografia, isto é, à geografia oficial: o cartesianismo, o comtismo e o kantismo eram freqüentemente apoiados e misturados aos princípios de Newton e também ao darwinismo e ao spencerismo.

O intuito é explicitar contextos nos quais a presença das diferentes bases filosóficas é sentida de forma mais contundente. Desta maneira, cabe destacar os conceitos de “espaço vital” e “gênero de vida”, respectivamente, do determinismo e do possibilismo. Estas

escolas, ao tratarem os atos humanos como uma seqüência de causas e efeitos, nos quais o comportamento humano apenas responde a fatores determinantes, inexistindo possibilidades de ruptura, superação, retiram dos homens a sua historicidade e tem no princípio positivista de que “a sociedade é regida por leis naturais”, a sua base de sustentação.

Com isso, Ratzel, grande defensor das idéias naturalistas, construiu um entendimento do homem como simples produto do meio. Logo, os conceitos de espaço vital, região natural, condições geográficas, etc., eram os instrumentos científicos da Geografia que se fazia. É também no determinismo que a Geografia inaugura o caráter ideológico por meio do conceito de espaço vital. Este conceito legitima a expansão territorial como processo natural, fruto da busca de equilíbrio entre território e sociedade, no qual o Estado tem papel de ordenador.

Mas, certamente, foi com o gênero de vida e a idéia de criar “possibilidades” (“a natureza dá as cartas, o homem faz o jogo”) que La Blache ruma ao encontro do historicismo e leva o processo de construção da Geografia a assumir uma concepção conservadora da história.

É, desse modo, que o possibilismo defende uma ciência geográfica neutra e chama a atenção para as obras do homem sobre o espaço como reflexo de uma herança histórica. Situação que, em última instância, abre caminho para a “missão civilizatória européia”, no caso francesa, na Ásia e África, sob o signo do progresso dos povos a partir da interação de gêneros de vida diferentes. Por sua vez, os gêneros de vida, com suas singularidades de formas, costumes, hábitos, próprios de sua época, representam uma etapa do desenvolvimento da sociedade, isto é, tem uma causa geral/universal e, por isso, condicionam o desenvolvimento da sociedade. Daí o significado conservador, porque entende o conceito de gêneros de vida como uma força autônoma, cumulativa e espontânea; conseqüentemente, esse

“espírito do povo” espontâneo não se presta à ação política transformadora com vistas à ruptura, a superação do status quo orientada por planos racionais.

A separação Geografia Clássica e Nova Geografia também mascarou a matriz do desencontro, que não estava na sofisticação das técnicas, na mudança da linguagem, mas na migração da segunda em direção ao neopositivismo ou empirismo lógico.

Embora o neopositivismo mantenha o princípio Comtiano (positivista) de que somente são reais os conhecimentos observáveis/experimentados e que a sociedade também é regida por uma ordem invariável, havia naquele contexto, em especial na Geografia quantitativa, um esforço maior de abstração pelo uso da lógica e da matemática. Através destes instrumentos seria possível identificar, recortar e mensurar o real na busca das evidências empíricas da verdade, provando ser ele uma experiência lógica.

Os representantes da Nova Geografia, segundo Santos (1990), perseguiam, acima de tudo, a cientificidade da Geografia tendo em vista a sua concepção de ciência. Para tanto, acreditavam que deviam afastar-se daquilo que consideram uma Geografia obsoleta e buscar uma linguagem matemática, lógica, alicerçada no uso de modelos e no uso de estatísticas. Os defensores desta corrente objetivavam dar caráter de veracidade a teoria por meio de sua mensuração. Com isso, ela ficou conhecida por Geografia quantitativa ou teorética, entretanto o uso da quantificação por esta corrente não é o fator mais importante, pois representa apenas o instrumento que, por si só, não revela a construção teórica deste período.

Assim, o grande (des)serviço da Geografia quantitativa reside na sua base neopositivista refletida na construção de modelos abstratos, nos quais somente a lógica matemática permitiria a verificabilidade das relações entre os fenômenos, à descoberta das leis invariáveis que os determinam e, portanto, sua veracidade. Conseqüentemente, pensando

a partir dessa concepção de conhecimento, em última instância, ela decreta o fim da filosofia, por considerá-la incapaz de “mensurar”, portanto, de conhecer o real.

De fato, a expressão ‘geografia quantitativa’ utilizada para exprimir a existência de uma geografia nova, introduziu um certo mal - estar e confusão. A expressão ‘geografia matemática’ ou quantitativa pode, na realidade, aplicar-se a qualquer dos paradigmas da geografia, novos ou antigos, mesmos aos que hoje não são mais válidos para nenhuma escola. A quantificação representa apenas um instrumento ou, no máximo, o instrumento. Seria melhor chamar a atenção sobre os aspectos mais teóricos ou conceituais, quer dizer, sobre os próprios paradigmas. O que continua fundamental é a construção teórica (SANTOS, 1990, p. 52).

A presença do materialismo histórico dialético como corrente filosófica na Geografia vem de longa data, mas de forma marginal, ou seja, não era o paradigma da Geografia oficial. Conseqüentemente, ele nasce nas obras dos anarquistas do final do século XIX e começo do século XX, especificamente de Elisée Reclus, o que fez com que a corrente marxista ficasse meio que restrita a esse movimento. É na ala mais crítica da Geografia regional francesa, na década de 1940, que os questionamentos referentes ao empobrecimento filosófico da Geografia vão ser retomados a partir de uma concepção dialética.

Esse debate foi retomado depois, no final da década de 30 e início da década de 40, por um grupo de geógrafos franceses (Pierre George, Yves Lacoste, Raymond Guglielmo, Bernand Kayser, Jean Dresch, Jean Tricart, entre outros). Muitas vezes, a influência historicista mesclava também os trabalhos dessa corrente [...].

Trazida pela influência do pensamento marxista, a dialética como corrente do pensamento na geografia agrária está na base de um conjunto de trabalhos de Orlando Valverde, Manuel Correia de Andrade, Pasquale Petrone, Lea Goldenstein, Manuel Seabra, entre outros [...]. Com o marxismo, começa a batalha pelo demascaramento do discurso pretensamente neutro e objetivo

presente no positivismo e no empirismo lógico, e mesmo no historicismo (OLIVEIRA, 1999, p. 69).

O ápice brasileiro deste processo e a consolidação da Geografia “crítica” são vividos no 3º Encontro Nacional de Geografia, em Fortaleza, no ano de 1978. Embora a Geografia crítica envolvesse várias frentes de entendimento, ela postulava a luta pelo desmascaramento do conteúdo ideológico, contido na Geografia que se fazia naquele momento, bem como do ecletismo filosófico, que impedia o progresso da ciência geográfica. Doravante, passaram a defender que: “A filosofia da Geografia, seja qual for à direção que se prefira, não pode continuar sendo uma colcha de retalhos” (SANTOS, 1990, p. 37).

Enfim, como não poderia ser diferente, o desenvolvimento da Geografia Agrária também percorre esse labirinto filosófico e compartilha da angústia geral concernente à busca da produção de uma teoria que conheça e explique a realidade além do imediato sensível e seja capaz de contribuir, no ato histórico, para libertação dos homens a partir desse conhecimento.

Todavia, o dilema intelectual vivenciado pelo pensamento geográfico, qual seja o imbricamento de influências filosóficas paradoxais, será tardiamente sentido na produção em Geografia Agrária no Brasil, em função, talvez, da ausência de trabalhos clássicos sobre o assunto até a segunda grande guerra.

É, pois, a partir da década de 1950 que as contradições intelectuais do pensamento geográfico na Geografia Agrária são explicitados como produto do contexto histórico, qual seja, o período em que o debate a respeito da Reforma Agrária tomou contornos nacionais e de classe. Na obra de Orlando Valverde, “Geografia Agrária do Brasil”, há um exemplo notável14 sobre esta questão, quando o autor divide suas preocupações em

14 A respeito da contradição intelectual vivida nesta época por Orlando Valverde, ver o comentário feito por Oliveira, Ariovaldo U. “Geografia e território: desenvolvimento e contradições na agricultura”. Mesas Redondas. XII Encontro Nacional de Geografia Agrária. Rio Claro: Unesp, 1994, p.24-51.

duas vertentes que, na essência, refletem duas formas distintas de ciência: a primeira, voltada a preencher a lacuna existente na sistematização da produção intelectual em Geografia agrária, daí fazer um resgate histórico dos “agrogeógrafos”, bem como uma discussão envolvendo a gênese etimológica da palavra e a construção teórica do conceito, a qual evidencia uma visão historicista da ciência geográfica. “A Geografia agrária é, em última análise, a interpretação dos vestígios que o homem do campo deixa na paisagem, na sua luta pela vida, quotidiana e silenciosa” (VALVERDE, 1964, p. 37). A segunda, de cunho mais político, que, por visar à possível intervenção no objeto, expunha as contradições da concepção de ciência que fazia, analisava a questão agrária nacional, tendo como pressuposto, nas palavras de Valverde (1964, p. 05): “Aquilo que fora um compromisso moral com o meu mestre, passou a sê-lo com o povo brasileiro”.

O trabalho intitulado “Geografia da Agricultura”, de José Filizola Diniz, também pode ser considerado um marco na Geografia Agrária, principalmente por ensejar uma “renovação” da Geografia agrária brasileira, todavia, bem ao estilo neopositista, como conclui Fernandes (1998, p. 11) em análise sobre o assunto:

Um trabalho exemplar desta corrente teórica é ‘Geografia da Agricultura’ de José Filizola Diniz. Neste livro o leitor não encontrará uma discussão sobre as questões teóricas, que não é a principal preocupação do autor, mas sim uma apresentação da evolução do estudo da “Geografia da Agricultura” nos últimos trinta anos [...]. O que importa é a classificação de áreas através dos tipogramas. Os processos de transformação da agricultura são descritos em