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3. O PERCURSO HISTÓRICO POLÍTICO DO 13 DE MAIO NEP

3.3. Inicia-se a transição para uma nova etapa do 13 de Maio NEP

3.3.2. O desligamento das entidades financiadoras

No início dos anos noventa140, a Equipe do 13 de Maio NEP precebeu uma mudança na direção das entidades financiadoras. Enquanto no início da década de oitenta, elas tomavam a iniciativa, buscavam, procuravam trabalhos e projetos para investir nos países do “Terceiro Mundo”, agora elas iniciavam um processo de avaliação141 para definirem se haveria ou não a renovação de financiamentos. A linha política adotada pela Equipe do 13 de Maio NEP começava a ser questionada e cobrava-se a adoção de outras políticas, tais como, de gênero, de trabalho com meninos e meninas de rua, e diferentes ações de inclusão social.

Ao analisar a conjuntura da época, a Equipe constata uma mudança no contexto político das entidades financiadores. Mudavam os governos na Europa; a social-democracia começava a perder as eleições; assumiam governos conservadores que as pressionavam para saber mais sobre a destinação do dinheiro investido, uma vez que eram seus financiadores diretos. A cobrança aumentava, comenta Iasi (2007): “ ‘por que essa grana tá indo pro 3º mundo? Por que essa grana tá indo pro Brasil? Financiando o quê?’. Então a gente começa a sentir no ar o cheiro de mudança de orientação dessas entidades”.

Scapi (2007) lembra que o início dos anos noventa foi o período no qual a Teologia da

Libertação, à qual os dirigentes dessas entidades internacionais eram ligados, começou a

perder força junto ao trabalho da Igreja Católica. Nesse contexto, também começavam a aparecer as ONGs142, “que estavam à toda [...] fazendo exatamente o que nós não fizemos”, comenta. “Estavam seguindo a linha política dada pelas entidades financiadoras”.

A mudança de orientação de tais entidades internacionais, avalia Iasi (2007), foi dada pela lógica de quem as financiava. Assim, as entidades brasileiras que atuavam contra a ditadura, passaram a trabalhar para a construção da cidadania, com meninos de rua, mulheres, projetos de geração de renda, entre outros temas. O apoio financeiro internacional ao 13 de Maio NEP, reconhece Iasi (2007), era movido pela questão de solidariedade internacional, pelo apoio político numa conjuntura de ditadura militar no Brasil e de defesa das liberdades democráticas: “Eles sabiam o que a gente fazia”. Mas essa situação internacional favorável começava a sofrer mudanças, conta:

Os governos tomam um outro rumo, [...] mudam os responsáveis dessas agências, mudam as políticas dessas agências. Mudam os “chefes dos caras” e, às vezes, os caras que vêm pra cá. Daí o espanto desses novos representantes: “Mas isto é marxismo?” “Você queria o quê? Claro, a gente gosta muito dos alemães; os

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Após a definição de saída do trabalho direto e priorização da formação política.

141

A exemplo da avaliação realizada em 1991, mencionada anteriormente.

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alemães que vocês jogaram fora, nós pegamos”[...] “e o que vocês lêem pra fazer isso?” “A gente lê uns alemães que vocês jogaram fora: Marx, Rosa143 (IASI, 2007).

Nessa época, também, várias das entidades irmãs144 começavam a entrar em crise. Boa parte delas tinha investido pesadamente em grandes estruturas: casas, equipamentos e liberação de militantes.

Os representantes das entidades financiadoras, com quem a Equipe do 13 de Maio NEP mantinha contato, anunciavam, lembra Iasi:

“Nós temos linhas de financiamento [...]. Vai acabar o projeto. Vocês querem renovar? Então eu vou dizer o que nós estamos aprovando”. Eram projetos que tratavam dos temas: geração de renda, ecologia, mulheres, meninos e meninas de rua e outros de caráter de inclusão social. “Façam projetos nessas áreas que têm chance”. Mas alertavam: “Se vocês mandarem de novo esse seu projeto de organização de oposição metalúrgica, de formação política com esse conteúdo que vocês mandam, História das Revoluções... [...]. Olha, eu conheço vocês, eu sei o que é isso, mas isso bate lá como uma bomba, pra isso não vai ter mais grana (IASI, 2007).

A partir da análise de que haveria uma “queda tendencial da taxa de financiamento”, abriu-se na Equipe o debate em torno da seguinte questão: “Para manter a grana, mudamos o que fazemos? Ou para fazer o que fazemos, mudamos a forma de existência para não depender da grana?”(IASI, 2007).

Nesse ponto do relato, Scapi lembrou-se de uma história, contada por um dirigente metalúrgico:

É a história de um guerrilheiro e a história do tanque. Era uma vez um guerrilheiro muito do letal, muito do mortal na sua forma de agir e tal, que um dia ganhou um tanque. À primeira impressão, aumentou seu poder de fogo sem discussão. Agora o cara é um “arrasa quarteirão”, não é? Então, imediatamente após isso, ele descobre que um tanque pode ser atacado e que, portanto, um tanque precisa de defesa, um tanque precisa de manutenção. Então, aquele cara ágil, leve, solto e mortal, agora, para algumas batalhas, é um “pé no saco”, porque é preciso ajudá-lo a defender o tanque, dar manutenção no tanque...Guardadas as proporções, a história caiu como uma luva.(SCAPI, 2007).

A discussão sobre as “enormes estruturas” das “entidades irmãs” se deu num contexto em que se fazia a comparação entre o 13 de Maio NEP, o CAJAMAR e o IBASE, contam. Chegaram à conclusão de que tinham feito a opção correta:

ao invés de investir numa sede própria, num carro [...] num “puta” de um equipamento de produção de vídeo [...], resolvemos investir numa Equipe de educadores. Nós decidimos por uma estrutura enxuta, com uma Equipe de monitores treinados, espalhar o programa de formação. Então, a opção pela formação também

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Rosa Luxemburgo.

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Como ‘entidades irmãs’, consideravam entidades com quem tinham mais afinidade e com quem trabalhavam mais de perto, como: o CPV (Centro de Documentação e Pesquisa Vergueiro), o IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas), a FASE (Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional, o CAJAMAR (Escola de formação sindical, ligada à corrente sindical da CUT, Articulação Sindical), o Nativo da Natividade (Escola de formação sindical, ligada à corrente sindical cutista CUT pela Base).

se deu, não porque faltava grana naquele momento, mas na perspectiva de que a gente “quebraria o pé”, “quebraria a cara” montando uma “puta” estrutura cara, pra depois chegar e ter que ficar cortando gente... Acho que a experiência da FASE pegou muito nesse momento (SCAPI, 2007).

Scapi (2007) lembra que a subutilização desses “monstrengões”145 começava a se mostrar evidente: investiu-se em equipamentos caros, numa Equipe grande, em sede – recursos que eram usados de vez em quando. O problema vivenciado pelas “entidades irmãs” para manter suas grandes estruturas, numa época em que os fartos recursos da solidariedade social-democrata começaram a minguar, criou, quase, “uma dependência química” com as entidades financiadoras, afirma ele.

A conclusão da Equipe foi que “a estrutura, ao invés de ajudar, atrapalharia o conteúdo”. E diante do quadro de que os financiamentos objetivamente cairiam, passaram a apostar no seguinte projeto, conta Iasi:

[...] Nós vamos nos antecipar e fazer um projeto de transição, que na época era pensado em três anos. Durante três anos a gente precisa fazer o seguinte caminho: Ir aumentando uma rede de monitores não contratados, que pudessem dar algumas datas da sua agenda para fazer cursos. Assim, intensificar a formação de monitores pra que essa rede [...] desse conta do programa básico e a gente [a Equipe do 13 de Maio NEP] ficasse apenas com os “cursões” e os “monitores” (IASI, 2007).

A idéia era completar, em três anos, a transição para uma nova forma, enxugando cada vez mais a estrutura. Seria cobrada uma “taxa” das organizações solicitantes, no caso dos educadores voluntários, para garantir o curso e formar um fundo comum para se manter uma mínima estrutura fixa.

Scapi e Iasi avaliam que essa decisão deu independência ao 13 de Maio NEP, que começou a recusar a renovação dos convênios internacionais. “As entidades financiadoras chegavam para discutir a renovação e a gente falava: ‘não vamos pedir’. ‘Como vocês não vão pedir a renovação? Mas tem dinheiro lá’. ‘Sim, mas nós não queremos’.” (SCAPI, 2007).

Enquanto algumas dessas entidades já sinalizavam que em breve haveria cortes (o que de fato aconteceu), outras, como a “Desenvolvimento e Paz”146 e a “CEBEMO147”, mantiveram-se até o final do projeto de transição. A Equipe solicitou cada vez menos dinheiro, até fazer o desligamento, primeiro da CEBEMO e por último da “Desenvolvimento e Paz”. A esta última, a Equipe agradeceu o apoio e declarou que não queria mais renovar o projeto, conta Iasi (2007)148.

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Referindo-se às grandes estruturas das “entidades irmãs”, tais como o CAJAMAR.

146

Agência canadense.

147

Agência holandesa.

148

Partiram, então, para a busca da auto-sustentação financeira, para o enxugamento da Equipe e para a construção do que se pode chamar, de uma rede nacional de formadores.

3.3.3. Transição para o fim da Equipe do 13 de Maio NEP rumo a uma nova