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O DIÁLOGO ENTRE CULTURA ESCOLAR E CULTURA DA ESCOLA

6 PRÁTICAS E SABERES DA PROFESSORA POMERANA: A CULTURA

6.2 O DIÁLOGO ENTRE CULTURA ESCOLAR E CULTURA DA ESCOLA

Ao identificar os saberes experienciais e curriculares que se evidenciam nas práticas realizadas pela professora pomerana percebe-se que os aspectos culturais são bem explorados, conforme já destacado, e quase sempre estão vinculados ao conteúdo prescrito pelo currículo oficial da escola, possibilitando assim o acesso ao saber elaborado, mas em diálogo com os saberes locais. Forquin (2000) afirma que os professores podem fazer uma escolha na sua maneira de ensinar através do universo cultural presente no espaço escolar. Nesse sentido, o autor postula que

[...] Se o professor pode escolher seus exemplos pedagógicos neste ou naquele universo cultural, pode também destacar o que há de verdadeiramente humano em cada uma dessas manifestações culturais e apreciar o que é particular segundo os parâmetros do que é universal. (FORQUIN, 2000, p.63)

Essa escolha fica evidente quando a professora trabalha com as comidas típicas dos descendentes de pomeranos, que são preservadas até os dias atuais, vinculados ao conteúdo alimentação que foi introduzido a partir da história Muter Tilde (Vovó Tilde).

Figura 11 – Recorte da história Muter Tilde de autoria da Profª Marineuza Plaster Waiandt

Fonte: arquivo da pesquisadora.

No decorrer da história a professora faz inferências sobre as comidas típicas que as famílias pomeranas ainda preservam, fala da importância deles quando diz “Dat mijlchebroud dät stärke de ganse betmirdag. Wee dår moirgens air stük fon eet, däit kaine hunger aire forneeme.” (O pão de milho sustenta a manhã inteira. Quem come um pedaço de manhã não sente fome antes do almoço). “Wat mache jij geir eete wen jij ruuter gåe taum fristick?” (O que vocês gostam de comer quando saem para a merenda?) E as crianças responderam “suite rijs” (arroz doce), prato tipicamente pomerano. Dialogou sobre a necessidade de uma alimentação saudável e os malefícios de uma alimentação industrializada quando diz: “Wen jij denke dat jij koine ales eete wat getrecht forköft wart, den muite jij waite dat is ni sou gesund sou ais boune, rijs um gruinweesend.” Se vocês pensam em comer lanches então vocês tem que saber que isso não é saudável como feijão, arroz e salada.” (Diário de campo: 18/04/2013)

A abordagem da professora sobre uma alimentação saudável é um conhecimento produzido pela cultura escolar, mas esta não ignorou um elemento presente na cultura da escola, quando deu destaque também aos alimentos típicos das famílias pomeranas, possibilitando assim, o diálogo com a cultura da escola presente no espaço escolar.

Essas práticas remetem a abordagem de Forquin (1993) no que se refere a questão da cultura escolar que são conhecimentos transmitidos didaticamente no espaço escolar, e a cultura da escola que é o mundo social presente na escola. O autor alerta que não se pode valorizar em excesso o contexto cultural e perder de vista a dimensão formativa da escola.

Ainda no trabalho com a temática alimentação a professora usou como recurso uma trilha, a partir da qual aproveitou para explicar para as crianças o que são números pares e ímpares, e também as formas geométricas a partir do dado utilizado no jogo.

Figura 12 – Trilha sobre alimentação

Fonte: arquivo da pesquisadora.

no quadro e utilizou cartões que continham a figura dessas comidas com os respectivos nomes escritos em pomerano. (Diário de campo: 26/04/2013)

Nas aulas regulares, a professora estava trabalhando os dias da semana e os meses do ano, então aproveitou e ensinou estes também na língua pomerana (APÊNDICE G). Os dias da semana foram trabalhados a partir de uma música com movimentos. (Diário de campo: 26/04/2013)

Essas atividades realizadas pela professora pomerana envolvendo a escrita de palavras são atravessadas por informações que fazem parte do contexto familiar e comunitário das famílias pomeranas, pois as crianças citaram comidas que gostam e também alguns costumes dos descendentes de pomeranos conforme os dias da semana, como por exemplo, o sábado é o dia de fazer a faxina da casa e, no domingo costuma ter a sopa doce. Nota-se nessas práticas que o espaço escolar é constituído pela cultura da escola, pois os conhecimentos são construídos através dos saberes que emergem a partir do contexto vivenciado pelas crianças.

Na análise das práticas realizadas pela professora pomerana percebe-se que os conteúdos estão constantemente atravessados nas temáticas, ou seja, ela não dá a aula de língua pomerana de forma dissociada, mas integrada aos conteúdos prescritos pelo currículo da instituição, o que favorece a prática pedagógica num contexto mais amplo.

No final de semana em que estava acontecendo a Festa Pomerana, a professora trabalhou uma atividade escrita com cruzadinha sobre o que teria na Festa Pomerana: menininha pomerana, menininho pomerano, etc (APÊNDICE H). Trabalhou também a temática da família, abordando os componentes que iriam à Festa Pomerana: pai, mãe, irmão, irmã, avô, avó, etc, e o que as pessoas vestiriam (APÊNDICE H) para ir à festa (Diário de campo: 03/05/2013).

Nessa atividade, apesar da relação com a emancipação histórica do município, e a composição da família, a professora valorizou mais a questão cultural, provavelmente pelo envolvimento da escola nessa festa em que participa no desfile

histórico que acontece anualmente e relembra a história dos pomeranos desde a imigração.

Figura 13 – Bonecos representando a Família Pomerana

Fonte: arquivo da pesquisadora

A professora também trabalhou o tema animais, focando os insetos, os animais domésticos e os animais aquáticos. A temática foi introduzida a partir de uma visita realizada a uma pessoa da comunidade que tinha vários animais. Essa questão foi observada quando fez uma lista em conjunto com os alunos dos animais vistos na visita. As crianças relataram o nome dos animais em pomerano que foram citados pela família que os recebeu.

Trabalhou também com várias histórias em língua pomerana: os animais, a metamorfose da borboleta (APÊNDICE I), e, a tartaruga (APÊNDICE J). O tema culminou em quebra-cabeças desses animais na língua-pomerana. (Diário de campo: 04/10/2013).

Figura 14 – Crianças montando quebra-cabeça

Fonte: arquivo da pesquisadora.

Ao observar a participação e o envolvimento das crianças pomeranas e, das não pomeranas durante as aulas, percebe-se que as práticas da professora pomerana possibilitam que as crianças pomeranas e as não pomeranas dialoguem através de saberes universais e, também com aqueles produzidos na comunidade local, promovendo assim, o diálogo intercultural, em que diferentes culturas em um espaço multicultural se conhecem e reconhecem a partir de vivências e experiências promovidas através de saberes experienciais e também curriculares. Percebe-se também que a aula de língua pomerana possibilita que as crianças não pomeranas tenham oportunidade de conhecer aspectos culturais e linguísticos do povo pomerano, pois participam e demonstram gostar dessas aulas.

Observa-se que a professora elabora suas aulas de língua pomerana interligadas a outros momentos de aula com os alunos, pois essa visita não aconteceu durante a aula de língua pomerana, em que o tempo não é suficiente para tal. Além disso, percebe-se que tem uma preocupação em estimular a aprendizagem dos alunos, pois usa de várias estratégias para envolvê-los na sua dinâmica de trabalho. Esse cuidado em envolver os alunos também é observado quando a professora usa de

dupla tradução em tudo o que é falado nas aulas de língua pomerana, tanto as atividades escritas como as orais. Essa dupla tradução ocorre pelo fato de haver na sala de aula crianças pomeranas e também as não pomeranas.

Ao se preocupar em realizar essa dupla tradução de todas as falas, a professora demonstra que respeita a diversidade presente na sala de aula, pois assim como tem crianças descendentes de pomeranos que são bilíngues, tem aquelas que não falam o pomerano, e também as não pomeranas. Dessa forma, a professora contribui para que haja a promoção do diálogo entre os conhecimentos e saberes que reconhecem e valorizam as diferenças culturais, permitindo que os diferentes sujeitos sócio culturais se reconheçam, rompendo assim, com o caráter monocultural da cultura escolar (CANDAU, 2012).

6.3 CONTRIBUIÇÕES DO PROEPO NAS PRÁTICAS DA PROFESSORA