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O direito à indenização por prisão injusta e/ou irrazoável

3.5 RAZOÁVEL DURAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA

3.5.3 O direito à indenização por prisão injusta e/ou irrazoável

Entendemos que a melhor solução para os casos de demora irrazoável do Processo Penal – havendo ou não prisão cautelar – deveria ser a extinção do feito (a exemplo do sistema processual paraguaio), reconhecendo-se, desta maneira, a ilegitimidade do poder punitivo pela própria desídia do Estado. As soluções processuais poderiam também versar sobre a possibilidade de suspensão da execução ou sobre a dispensabilidade da pena, do indulto e da comutação − embora estas encontrem sérias resistências em nosso ordenamento vigente. Entretanto, as soluções compensatórias ou sancionatórias não podem ser esquecidas, devendo ser aplicadas sempre que for verificada a lesão ao princípio constitucional.391

Cientes de que o tempo perdido no cárcere jamais será restituído é que a maioria dos países, atualmente reconhece, um direito à indenização pela prisão provisória sofrida injustamente. Em nível internacional, a CEDH regulou esta matéria em seu art.5-5. Todavia, o direito de reparação previsto possui um alcance restrito, pois somente é aplicável às pessoas que foram vítimas de uma privação de liberdade quando:

a) a detenção não for regular e não tenham sido respeitadas as regras do procedimento estabelecidas pela lei;

b) não se tratar de um dos casos enumerados taxativamente pelo art. 5-1392;

c) quando a pessoa privada de sua liberdade não possa gozar dos direitos reconhecidos ao preso, previstos no art. 5º.393

Comprovada a infração denunciada pelo injustiçado, a sentença firmada pelo órgão de Direito Internacional determinará que o Estado compense os prejuízos causados, seja através de quantia em dinheiro, seja através de algum tipo de indulto ou de perdão, total ou parcial, da

391

LOPES JUNIOR, 2007, op. cit., p. 177-178.

392

Artigo 5-1. Toda a pessoa tem direito à liberdade e segurança. Ninguém pode ser privado da sua liberdade, salvo nos casos seguintes e de acordo com o procedimento legal: a) Se for preso em conseqüência de condenação por tribunal competente; b) Se for preso ou detido legalmente, por desobediência a uma decisão tomada, em conformidade com a lei, por um tribunal, ou para garantir o cumprimento de uma obrigação prescrita pela lei; c) Se for preso e detido a fim de comparecer perante a autoridade judicial competente, quando houver suspeita razoável de ter cometido uma infração, ou quando houver motivos razoáveis para crer que é necessário impedi-lo de cometer uma infração ou de se pôr em fuga depois de a ter cometido; d) Se se tratar da detenção legal de um menor, feita com o propósito de o educar sob vigilância, ou da sua detenção legal com o fim de o fazer comparecer perante a autoridade competente; e) Se se tratar da detenção legal de uma pessoa susceptível de propagar uma doença contagiosa, de um alienado mental, de um alcoólico, de um toxicômano ou de um vagabundo; f) Se se tratar de prisão ou detenção legal de uma pessoa para lhe impedir a entrada ilegal no território ou contra a qual está em curso um processo de expulsão ou de extradição.

393

pena aplicada,394 ou ainda que acarrete a nulidade do processo com a conseqüente absolvição do indivíduo.

Na verdade, Daniel Pastor reconhece que tratar o problema da excessiva duração do Processo Penal com critérios compensatórios é uma falácia, que acaba se constituindo apenas em uma “reparação simbólica”, uma vez que não pode restabelecer o statu quo ante, mas tão- somente compensar no futuro. Sobretudo, a restituição não abrange a dignidade atingida, apenas reconhece o erro e o compensa de forma simbólica. O Estado apresenta a obrigação de evitar a violação das garantias judiciais fundamentais dos acusados e não possui, ao contrário, a faculdade de violá-las para depois compensar os danos causados.395

O certo é que o fato de haver uma sanção estabelecida tanto para o erro judicial quanto para o excesso no cumprimento dos prazos representa um avanço na legislação para se efetivar a proteção aos direitos fundamentais em decorrência lesionados, conforme foi verificado nos sistemas de alguns países abaixo descritos.

Podemos observar que o art.121 da Constituição Espanhola de 1978 prevê indenização a cargo do Estado, pelos danos causados por erro judicial, assim como os conseqüentes do funcionamento anormal da Administração da Justiça. A legislação ordinária espanhola traz, em seu art. 294 da Ley Orgânica del Poder Judicial que terá direito à indenização quem, depois de haver sofrido prisão preventiva, seja absolvido por inexistência do fato imputado, de modo que a quantificação da indenização se dará em função do tempo de privação de liberdade e das conseqüências pessoais e familiares que tenha produzido.396

Na Alemanha existe também uma regulação expressa sobre o tema da indenização a que tem direito o sujeito que tenha padecido a uma situação jurídica injusta de prisão provisória. A Lei de 1971, StrEG, admite, em caso de desistência ou de arquivamento da investigação ou de decisão denegatória pelo tribunal em receber a ação penal ajuizada, a reparação do dano material e o pagamento de indenização diária pelos dias nos quais a pessoa esteve presa, de acordo com o dano moral suportado (§7, StrEG).397

A reparação pela injusta prisão na Itália foi imposta pelo legislador ordinário, assegurando não só os casos de pessoas vítimas de detenções ilegais, mas também violações em que haja proibição expressa, como no caso, de indivíduo que já tenha cumprido uma pena

394

PASTOR, 2002, op. cit., p. 505.

395

Ibid., p. 523-525.

396

BARONA VILAR, 1988, op.cit., p. 143, 147.

397

JUY-BIRMANN, Rudolphe. O sistema alemão. In: DELMAS-MARTY, Mireille (Org.). Processos Penais

em virtude de sentença definitiva, posteriormente anulada, porque um fato novo ou descoberto após a condenação demonstrou a ocorrência de um erro judiciário.398

A Constituição brasileira, visando evitar as ocorrências de falhas e excessos, prescreveu em seu artigo 5º, inciso LXXV, que: “O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”. Ainda, em seu artigo 93, II, e, prevê a Carta Magna: “não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão”.

Nesse sentido, a violação de um prazo razoável na duração da prisão preventiva também constitui uma violação que deve ser reparada. Deste modo, uma vez estabelecida a responsabilidade estatal derivada da demora jurisdicional, surge a obrigação de se indenizar o dano. É certo que o reconhecimento da responsabilidade estatal por danos materiais e/ou morais produzidos devem ser satisfeitas ainda que não haja prisão preventiva, tendo em vista a mera submissão a um Processo Penal. Contudo, não há ainda em nosso País previsão adequada que trate do ressarcimento derivado do não-cumprimento do prazo razoável; nem mesmo as novas legislações − embora pautadas no princípio da celeridade e na agilização dos procedimentos − deram ênfase na questão da sanção por descumprimento do excesso de prazo.399

Além disso, como sugere Aury Lopes Jr. a própria atenuante genérica do artigo 66 do Código Penal brasileiro poderia ser aplicada para compensar a demora do processo – conforme decisão da 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, na Apelação n. 70007100902, julgada em 17/12/2003400 −, reduzindo-se, assim, a pena de prisão ao final aplicada (além da detração em caso de prisão cautelar), pois o excesso do tempo também serve de punição. Para isso é preciso certa dose de coragem aos juízes e aos tribunais brasileiros, lançando mão de medidas de natureza compensatória e sancionatória, até porque o tempo em que o Estado indevidamente se apropriou jamais será restituído.401

398

DALIA; FERRAIOLI, 2001, op. cit., p. 247.

399

LOPES JÚNIOR; BADARÓ, 2006, op. cit., p. 119-123.

400

“Penal. Estupro e Atentado violento ao pudor. Autoria e materialidade suficientemente comprovadas. Condenação confirmada. Redimensionamento da pena. Atenuante inominada do artigo 66 do Código Penal caracterizada pelo longo e injustificado tempo de tramitação do processo (quase oito anos) associado ao não- cometimento de novos delitos pelo apelante. Hediondez afastada. Provimento parcial. Unânime”.

401

4 CRITÉRIOS UTILIZADOS PELOS TRIBUNAIS SUPERIORES NA DETERMINAÇÃO DO PRAZO RAZOÁVEL NA DURAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA