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2. REVISÃO DA LITERATURA

2.3 Resolução de problemas e a Educação Matemática

2.3.3 O ensino e a aprendizagem da matemática por meio da resolução de

A matemática, como normalmente é entendida, lida, basicamente com símbolos, algoritmos, fórmulas e figuras. Seria desnecessário dizer que a atividade de resolução de problemas tem estado no próprio coração da elaboração da ciência Matemática. “Fazer matemática, portanto, é resolver problemas”, é o que freqüentemente as pessoas não se hesitam em afirmar.

Esta relação entre matemática e a resolução de problemas parece estar implícita tanto nas crenças populares como em determinadas abordagens psicológicas, filosóficas e em determinados modelos pedagógicos. Entretanto, ela torna-se particularmente emergente, a partir da década de oitenta. Nesse período, segundo a literatura, (POZO,1998; SCHOENFELD,1985 e 1997; POLYA, 1995 e 1997; BRANCA, 1997; ONUCHIC, 1999 e 2004; DANTE, 2002; ALDANA, 1990), o objetivo principal do ensino de Matemática na maioria dos currículos de países do ocidente é de orientação para que transforme o educando em “um solucionador competente de problemas”. Porém, o significado deste objetivo varia em função da pessoa que propõe e do contexto ao qual for aplicado.

Branca (1997) discute a resolução e problemas na perspectiva de meta, processo e habilidade básica e suas implicações para o ensino da matemática. Chama- nos à atenção sobre a necessidade de compreendermos essas três interpretações.

As intensas transformações e os desafios ora em curso neste século consumirão, segundo Branca (1997, p. 10) “boa parte da vida produtiva dos indivíduos”. Como não há respostas particulares de imediato a essas questões

emergentes, considerar as diferentes interpretações desses padrões de resolução de problema é um dos mecanismos acessíveis e apropriados, nesse contexto, aos nossos alunos para a busca de soluções de possíveis problemas.

Segundo Branca (1997, p.10), ao considerarmos essas três interpretações no processo de resolução de problemas pode nos ajudar na medida em que a habilidade básica possibilita organizar as especificações para o dia-a-dia de nosso ensino de habilidades, conceitos e resolução de problemas. O processo pode nos ajudar a perceber como lidamos com as habilidades e conceitos, como eles se relacionam entre si e que papel ocupa na resolução de vários problemas. A meta pode influenciar tudo o que fazemos no ensino da matemática, mostrando-nos uma outra proposta para o ensino- aprendizagem.

Tratando das finalidades relativas ao ensino da matemática, quando do estudo acerca da formação de professores Paiva e Carvalho (1998, p.44) afirmam que

é necessário que o ensino se concentre [...] na resolução de problemas, em que o aluno vê o saber matemático constituir-se como ferramenta essencial e tem a oportunidade de validar e refutar soluções para desenvolver seu espírito crítico e sua criatividade. Além desses componentes essenciais, acrescentam ainda que o saber matemático hoje significa [...] saber utilizar conhecimentos para aplicá-los em diversas situações para resolver problemas e gerar novos conhecimentos.

Para Onuchic (1999, p. 208) o eixo central do processo de ensino- aprendizagem através de resolução de problemas é ajudar os alunos a compreender os conceitos, os processos e as técnicas operatórias necessárias dentro do trabalho feito em cada unidade temática.

No entanto, Onuchic (1999, p. 208) salienta a importância da compreensão de matemática por parte dos alunos. Assim, conforme as palavras da autora “envolve a idéia de que entender é essencialmente relacionar”. De acordo com a autora a

compreensão aumenta quando: o aluno é capaz de relacionar uma determinada idéia matemática a um grande número ou a uma variedade de contextos; o aluno consegue relacionar um dado problema a um grande número de idéias matemáticas implícitas nele; o aluno consegue construir relações entre as várias idéias matemáticas contidas no problema.

Assim, acreditamos que o momento da dúvida, do não entendimento de conceitos e procedimentos matemáticos pontuais aparece quando da realização de atividades envolvendo processos de resolução de problemas reais por parte de nossos alunos.

Do ponto de vista do ensino da matemática, esse propósito, a compreensão, deve ser um referencial que oriente professores, autores de livros didáticos, formuladores de currículos e avaliadores dos processos de aprendizagem, o seu foco central, ou seja, seu objeto (ONUCHIC, 1999). Para a mencionada autora, fazendo isso, esses profissionais da educação “mudariam a visão estreita de que a matemática é apenas uma ferramenta para resolver problemas”.

Assim, entender o processo de resolução de problemas abertos no ensino da matemática na perspectiva da compreensão possibilita, segundo (ONUCHIC, 1999, p. 208) “uma visão mais ampla de que a matemática é um caminho de pensar e um organizador de experiências”.

O ensino da matemática por meio da didática da resolução de problemas abertos são aqueles os quais não existem uma estratégia única para resolvê-los. Visto dessa forma, o ensino da matemática no contexto da Educação de Jovens e Adultos emerge práticas educativas de dimensões críticas. Críticas estas suscitadas pela emergência das demandas sociais desse público na busca pela ampliação do nível de

escolaridade, pelo acesso aos bens culturais como direito do cidadão e dever do Estado e, também, pela inserção no mundo do trabalho.

Atualmente estas demandas estão cada vez mais presentes no dia-a-dia da maioria da população brasileira e sendo vinculadas de diferentes maneiras. Neste sentido, a didática da resolução de problema deve estar cada vez mais calcada em processos de solução de problemas reais na perspectiva do pensamento crítico (FREIRE, 1982, 1987, 1996; SKOVSMOSE, 1996, 2000, 2001 e D’AMBRÓSIO 1999, 2002). Nesse contexto, práticas educativas caracterizadas pela interação social envolverão, portanto, “a identificação dos elementos culturais que precisam ser assimilados e a descoberta de formas adequadas de desenvolvimento do trabalho pedagógico” (SAVIANI, 1991, p.21). Nesta perspectiva, devem-se desenvolver atividades em sala de aula com problemas significativos no contexto sociocultural do educando e, como ponto de partida a situação-problema, que requer dos professores, entre outros, novos, profundos e complexos conhecimentos matemáticos, uma vez que externo ao processo didático, por natureza, as situações são mais intensas, complexas, articuladas e significativas.

Seguindo esse raciocínio, exigiria em relação às práticas educativas desenvolvidas pelos educadores a diversificação do conteúdo matemático, o exercício de (re) significação desse conhecimento, a criação das condições de oportunidade de relatos, a organização de discussões através das quais vão se institucionalizando, em sala de aula da Educação de Jovens e Adultos, conhecimentos matemáticos compatíveis com as demandas da sociedade contemporânea.

Entretanto, diferentemente do que ocorre nas abordagens tradicionais da própria Matemática, faz-se necessário destacar que para ensinar matemática por meio da metodologia de resolução de problemas abertos é preciso fazer frente a desafios

consideráveis. Isto porque educadores e educandos não têm acesso a interpretações subjetivas de cada ator social. Significa dizer que em lugar do paradigma da certeza sobre a aprendizagem do aluno, “há uma intersubjetividade pressuposta”, ou seja, educador e educandos agem na suposição de que as suas interpretações pessoais são compartilhadas pelos outros atores na sala de aula. Assim, na medida em que surgem questionamentos, indagações, estratégias de solução diferentes mais e melhores serão as oportunidades de alargamento, de diversificação, apropriação e segurança de novas formas de representação; quer pela capacidade de organizar, ordenar, testar e relacionar informações, particularmente àquelas oriundas de dados estatísticos em que a inferência e a utilização de heurísticas e de algoritmos são necessárias; quer seja ainda pela mobilização de uma determinada situação-problema em que esta esteja permeada por tipos de raciocínios próprios, conceitual e/ou procedimental da Matemática, instigando uma linha de argumentação crítica ou a inserção dos educandos em contextos socioculturais em que o conhecimento matemático, enquanto expressão maior da valorização cultural, faz de seu contato permanente às formas de construção e expressão desse conhecimento, requisito essencial para o processo de inclusão social.

As tarefas, as demandas do mundo adulto e as diversas realidades nas quais jovens e adultos podem estar inseridos acabam por requisitar muito mais que simplesmente a capacidade de aplicar habilidades básicas de registro matemático. Assim, vão exigir a mobilização de conhecimentos matemáticos e a leitura crítica da realidade social.

Para tanto, vários estudiosos (ANASTÁCIO, 1991; FERREIRA, 1985; D’AMBRÓSIO, 1986; MONTEIRO, 1991) vêm propondo a Modelagem Matemática como estratégia de ação por ser um processo ainda maior, dinâmico, abrangente, pois nos permite fazer uma leitura da realidade em que estamos inseridos. Pois, “a

modelagem não apenas cria estratégias, mas também é, por si mesma, uma estratégia de ação sobre a realidade”. (GAZETA, 1989, p. 29).

Podemos compreender a Modelagem Matemática como a busca de caminhos para tornar o ensino da matemática de forma mais significativo para quem aprende. Portanto, o primeiro passo é conhecer a realidade que a escola está inserida e, em seguida passa-se a análise dos dados levantados da comunidade escolar. Geralmente, nesses casos, existe a necessidade de levantar novos dados. Isto ocorrendo, faz-se necessário voltar a campo. De posse desses dados busca-se a construção do modelo matemático para o problema levantado e analisado.

Acreditamos que formulações de problemas devem partir dos próprios educandos e não totalmente do professor(a) na medida em que aqueles estão inseridos na realidade social. Portanto, acreditamos que a modelagem matemática como estratégia de ensino tem como ponto de partida a observação da realidade do educando, pois face à observação e aos questionamentos do aluno, este se defronta com problemas que, num contínuo vão sendo resolvidos, devem diversificar suas ações como estratégias de criação de caminhos para a análise e crítica da realidade.

Percebemos então que, na perspectiva da Modelagem Matemática, o ensino da matemática pode viabilizar tal processo na medida em que seus propósitos passam a ser: um ensino da matemática com significado e de forma crítica e; propicie o desenvolvimento de “atitudes matemáticas” nos educandos que permita superar o fazer matemática por meio de técnicas sobreaprendidas e avance para processos de resolução de problemas que emergem de contextos integrados da realidade concreta – os fatos ou dados tomados em si mesmo – e as percepções que esses têm desses fatos .

Os diversos estudos ora em curso, entre eles o INAF – 2004 e o Programme for International Student Assessment – PISA 2003, este, divulgado pelo Gabinete de Avaliação Educacional- GAVE do Ministério da Educação de Portugal apontam para esse caminho. Segundo este documento, existe hoje uma preocupação geral por parte dos educadores e dos gestores das políticas educativas, em nível mundial, quanto à importância de desenvolver junto aos estudantes as competências básicas relativas à resolução de problemas em situações de vida real. Conforme expresso no relatório do (PORTUGAL, 2003, p.11) tais competências significam compreender a informação dada, identificar as características críticas e suas inter-relações, construir ou aplicar uma representação externa, resolver o problema, e avaliar, justificar e comunicar as suas relações. Para tanto, os processos de resolução de problemas abertos vão exigir de cada educando que se empenhe em processos mentais de nível cognitivo elevado como meio de propiciar respostas àqueles problemas reais que exijam a integração de competências e a participação ativa e efetiva do aluno na solução de problemas que o obrigue a criar estratégias de solução original. Desse modo, os contextos, domínios e situações na qual a resolução de problemas é aplicada vão exigir um conjunto de componentes peculiar e criterioso.

De acordo com o GAVE (PORTUGAL, 2003, p. 12) são eles: A Tipologia dos problemas, o contexto dos problemas, as disciplinas envolvidas, os processos de resolução de problemas e as competências de raciocínio.

Segundo o GAVE (PORTUGAL, 2003, p.13) cada um destes componentes remete não só para as bases de conhecimento do sujeito que está a resolver o problema como também para as suas competências de raciocínio. As heurísticas de compreender a informação dada, identificar as características críticas e suas inter-relações, construir ou aplicar uma representação externa, resolver o problema, e avaliar, justificar e comunicar

as suas relações são atividades que requerem o uso intensivo de competências de raciocínio analítico, de raciocínio quantitativo, de raciocínio analógico e de raciocínio combinatório. Estas competências de raciocínio formam o núcleo das competências de resolução de problemas. A seguir vejamos os tipos de competência de raciocínio (PORTUGAL, 2003):

O Raciocínio analítico é caracterizado por situações em que o indivíduo em aprendizagem tem de aplicar princípios da lógica formal quando determina as condições necessárias e as suficientes ou quando determina se a implicação de causalidade ocorre no âmbito dos constrangimentos e das condições fornecidas no estímulo do problema.

O Raciocínio quantitativo é caracterizado por situações em que o indivíduo em aprendizagem tem de aplicar propriedades e procedimentos relacionados com a percepção do número e com as operações numéricas da disciplina de Matemática, para resolve determinado problema.

O Raciocínio analógico é caracterizado por situações em que o indivíduo em aprendizagem tem de resolver um problema inserido num contexto semelhante ao contexto de um problema que lhe é familiar ou que inclui uma base problemática que o mesmo tenha resolvido no passado. Os parâmetros ou o contexto do novo material de estímulo foram modificados, mas os fatores de condução ou o mecanismo causal são os mesmos. O indivíduo deve ser capaz de resolver o novo problema, interpretando-o à luz da experiência passada, relativamente à situação análoga.

O Raciocínio combinatório é caracterizado por situações em que o indivíduo em aprendizagem tem de examinar vários fatores, considerar todas as combinações em que estes podem ocorrer, avaliar cada uma destas combinações

individuais, em relação a um constrangimento objetivo, e depois selecionar ou ordenar hierarquicamente as combinações.

Dessa forma, a atividade de resolver problemas é o eixo de diversos processos cognitivos diferentes, sistematizados de maneira que possam atingir certo propósito que não poderia ser alcançado, pelo menos de forma tão explícita, simplesmente executando um procedimento, uma rotina ou um algoritmo conhecido de determinada matéria que compõe a matriz curricular da Educação básica.

De acordo com o GAVE (PORTUGAL, 2003, p. 14) a competência de resolução de problemas pode ser descrita em termos das capacidades que permitem aos estudantes criarem e monitorarem certo número de processos no âmbito de uma determinada gama de tarefas e de situações.

A ênfase dada ao pensamento analítico-crítico fundamenta-se na prática educativa crítica, presente nos estudos de (FREIRE, 1982, 1987, 1996; SKOVSMOSE, 1996, 2000, 2001 e D’AMBRÓSIO 1999, 2002). Incluímos também nessa perspectiva de pensamento analítico os aspectos relativos à presença de insight e da reestruturação (EYSENCK, 1994).

Assim, o ensino da matemática por meio da metodologia de resolução de problemas abertos permite aos educandos refletirem sobre as suas conclusões, compreender, testar, explicar, analisar e comunicar a nossa prática social e propor alterações para essa prática na medida em que a Educação Matemática tem como uma de suas preocupações a transformação social (D’AMBRÓSIO, 2002).

Desta forma, devemos entender os processos de resolução de situação- problema na perspectiva da resolução de problemas abertos no ensino da matemática, além de seus aspectos peculiares que observamos acima, apresenta-se agora num

contexto pedagógico que conduz a um processo de consolidação na Educação Matemática frente à Modalidade de Educação de Jovens e Adultos. No entanto, os processos de resolução de problemas podem não atingir seus propósitos, uma vez que os problemas apresentados em sala de aula podem não estar relacionados a contextos socioculturais. Assim, significa dizer que, ao planejar as atividades, os docentes podem trazer limitações que estejam relacionadas às suas percepções e visões atribuídas aos problemas. Neste sentido, faz-se necessária uma reflexão conceitual de problema vs situação-problema na perspectiva de seu significado sociocultural.