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1 O ESPECTADOR DE TEATRO

1.2 O ESPECTADOR EM NÚMEROS

Os dados quantitativos apresentados a seguir, ao tomarem em conta o público enquanto um conjunto numérico, para não incorrerem em generalizações descontextualizadas que algumas vezes se tornam estéreis por serem exclusivamente estatísticas, pretendem contribuir com a reflexão sobre as motivações que levam o espectador ao teatro. De todo modo, como já alertou Pavis,

[...] Não é fácil apreender todas as implicações pelo fato de que não se poderia separar o espectador, enquanto indivíduo, do público, enquanto agente coletivo. No espectador-indivíduo passam os códigos ideológicos e psicológicos de vários grupos, ao passo que a sala forma por vezes uma entidade, um corpo que reage em bloco [...] (2005, p. 140).

No Brasil, o crescente esvaziamento das salas teatrais, que coloca em risco a existência dessa arte milenar, vem sendo percebido desde o início da década de 1970 (DESGRANGES, 2010). A professora brasileira Silvana Garcia, avaliando a produção, difusão e público dos espetáculos em São Paulo no final da década de 1990, afirmou o seguinte: “[...] Na verdade, se queixa atualmente a grave crise do público: é frequente que alguns espetáculos cancelem sessões por falta de público e raras são as peças que conseguem ter sua sala ‘cheia’."39 (1998, p. 70, tradução nossa). Atualmente, em pleno século XXI, os resultados das estatísticas oficiais referentes ao consumo cultural dos brasileiros não apontam a superação dessa crise. A pesquisa

Sistema de Indicadores de Percepção Social – Cultura, por exemplo, efetuada pelo Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA em 2010, em que foram entrevistadas 2.770 pessoas em todos os estados do Brasil, com grau de confiança dos números 95%, revela que 59,2% da população nunca vai ao teatro, circo e shows, e 25,6% frequenta raramente. No que diz respeito à frequência de práticas culturais por faixa de idade, 0,6 dos jovens frequentam todos os dias, 19,3 pelo menos uma vez por mês, e 79,4 raramente ou nunca.

39 “[...] En fait, on crie aujord'hui à la grave crise du public : il est fréquent que certains spectacles

suppriment des séances par manque de public et rares sont les spectacles qui réussissent à avoir leur salle "au grand complet".

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Em Porto Alegre, cidade onde está sediada a EEPA, uma pesquisa realizada pela Assessoria de Estudo e Pesquisa da Prefeitura Municipal de Porto Alegre mostra que apenas 17,2% costuma frequentar espetáculos de teatro ou de dança (2001, p. 22); sendo a justificativa recorrente para a baixa frequência foi “teatro é chato” (2001, p. 24). Tal pesquisa revela ainda que somente 10,3% dos porto-alegrenses entrevistados com renda até dois salários mínimos têm o hábito de frequentar o teatro, contra 51,5% que possuem renda entre dez e vinte salários mínimos.

Muitos podem ser os causadores dessa crise, como: a violência urbana, que muitas vezes inibe o espectador de sair de casa, especialmente de noite; a precariedade do transporte público coletivo; a televisão e a internet que influenciaram a mudança das práticas sociais dos brasileiros, no caso; a escassez de teatros na maioria dos municípios brasileiros, visto que, segundo dados de 2014 divulgados pelo IBGE, apenas 23,4% dos nossos municípios têm teatro ou sala de espetáculos (PENNAFORT, 2015). Portanto, o aspecto da familiaridade que culmina no hábito de frequentar o teatro também deve ser levado em conta. A pesquisa Cultura no

Brasil, efetuada pela Fecomércio-RJ, mostrou que “o brasileiro não se aventura em atividades

que não conhece – o nível de desconhecimento cultural da população é elevado – e dentro do quadro de opções o cinema é o que lhe parece mais confortável, devido à semelhança com a televisão.” (2007, p. 11). Segundo o coordenador da EEPA, “[...] O público tem medo de se arriscar num espetáculo local ou ser exposto a um teatro contemporâneo que ele tem receio de não entender.” (MENDONÇA, 2015)40

Como alerta o pesquisador e professor Flávio Desgranges,

O prazer de assistir a espetáculos teatrais advém justamente do domínio da linguagem, que amplia o interesse pelo teatro à proporção que possibilita uma compreensão mais aguda, uma percepção cada vez mais apurada das encenações. [...] Ir ao teatro ou gostar de teatro, também se aprende. E ninguém gosta de algo sem conhecê-lo. (2010, p. 33)

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A pesquisa do IPEA aponta, no que se refere à intensidade das práticas por escolaridade, que “[...] a maior frequência de prática ou de ida ao teatro, circo e apresentações de dança se dá entre aqueles que chegaram ao nível superior: 25,8% frequentam esses eventos pelo menos uma vez por mês. [...].” (IPEA, 2010, p. 13)

Para Bourdieu,

O privilégio cultural torna-se patente quando se trata da familiaridade com obras de arte, a qual só pode advir da frequência regular ao teatro, ao museu ou a concertos (frequência que não é organizada pela escola, ou o é somente de maneira esporádica). Em todos os domínios da cultura, teatro, música, pintura, jazz, cinema, os conhecimentos dos estudantes são tão mais ricos e extensos quanto mais elevada é sua origem social. [...]. (1998, p. 45)

Os dados gerais da pesquisa realizada pela Organización de Estados Iberoamericanos

para la Educación, la Ciencia y la Cultura, mostram que “67% dos latino-americanos

entrevistados nunca foi ao teatro [...]. Entre aqueles que afirmaram ter ido ao teatro, a maioria assinalou que o fez há mais de um ano (18%), 5% faz um ano, 3% faz seis meses e 4% faz três meses” (2014, p. 24). A porcentagem de respostas por país desta pesquisa indica que, em 2013, na Argentina, 49% dos entrevistados nunca foram ao teatro e, no Brasil, este percentual sobe para 62% (2014, p. 24). A pesquisa (2014, p. 30) esclarece ainda que a não frequência no teatro, tanto na Argentina como no Brasil, está associada ao baixo nível de escolaridade e socioeconômico. Sendo que, as justificativas mais recorrentes para não ir ao teatro são a falta de tempo e de interesse.

O Informe 2014 do OIC, aponta que em 2013, em Buenos Aires, os circuitos oficial e comercial somaram 3.935.562 espectadores, sendo o teatro comercial responsável por 79,4% desses números. A matéria Buenos Aires, capital del teatro (2013), de Carolina Amoroso, sintetiza alguns dados do Ministério da Cultura, da Asociación Argentina De Empresarios

Teatrales y Musicales (AADET) e da Asociación Argentina del Teatro Independiente (ARTEI)

que ilustram a proliferação teatral profícua da cena portenha e informa que o circuito independente convocou cerca de 600.000 espectadores. Deve-se ter em conta que o censo de 2010 estimou a população da Cidade Autônoma de Buenos Aires em 2.890.151 habitantes e a

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Grande Buenos Aires em 12.801.364 habitantes.

As salas teatrais de Buenos Aires, pelo menos as salas onde estive durante as etapas do trabalho de campo em 2015 e 2017, com raras exceções, estavam cheias constantemente. E isso é um fator encantador que forma um espetáculo à parte, o espetáculo do espectador. Como disse a encenadora francesa Ariane Mnouchkine, numa aula da EEBA vinculada ao VI Festival

Internacional de Buenos Aires (FIBA), em setembro de 2007:

Nas grandes cidades como Paris ou Buenos Aires é incrível que as pessoas vão ao teatro, porque elas saem do trabalho cansadas e ao invés de irem para casa assistir às bobagens na televisão, elas vêm nos ver e pagam. Acredito que o teatro é uma espécie de milagre. Nesse momento compartilhado conosco, os atores colocam a máscara e os espectadores a tiram. [...] Creio que o teatro é, durante algumas horas, uma utopia. 600 pessoas que respiram juntas, que não se matam, que não brigam todo o tempo, que se olham, que se falam. O teatro é um reflexo do que o mundo poderia ser. (apud DUBATTI, 2008, tradução nossa)41

Na EEBA, em 11 maio 2015, uma senhora muito simpática da área de direito que estava ao meu lado, além de me recomendar vários espetáculos teatrais e me contar algumas fofocas breves sobre a vida amorosa de alguns convidados, me disse (informação verbal) que eles, os portenhos, são gente de teatro, no sentido de que frequentam habitualmente, pois estão rodeados de teatros na cidade. A perspectiva dessa senhora é compatível com o depoimento do empresário Carlos Rottemberg a Cora Roca (2016, p. 260, tradução nossa): “[....] o vigor e a paixão do teatro independente são indiscutíveis, o argentino é teatrista, e é notável observar que é o único país no mundo que tem mais espaços cênicos que telas de cinema.”42

Segundo a explicação de Dubatti,

41 “En las grandes ciudades como París o Buenos Aires es increíble que la gente vaya al teatro, porque

las personas salen del trabajo cansadas y en vez de ir a ver tonterías a la televisión, vienen a vernos y pagan. Creo que el teatro es una especie de milagro. En ese momento compartido con nosotros, los actores se ponen la máscara y los espectadores se la sacan. […] Creo que el teatro es, durante algunas horas, una utopía. 600 personas que respiran juntas, que no se matan, que no se pelean todo el tiempo, que se miran, que se hablan. El teatro es un reflejo de lo que el mundo podría ser.”

42 “[...] el vigor y la pasión del teatro independiente son indiscutibles, el argentino es teatrero, y es

notable observar que es el único país en el mundo que tiene más espacios escénicos que pantallas de cine. [...]”

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[...] Na Argentina o teatro é um espaço de construção de subjetividade alternativa, de socialização, de resistência e resiliência. Os convívios se fundam não em rotinas da atividade cultural senão no desejo e no interesse de saúde. Durante muitos anos os espectadores argentinos se agarraram aos convívios teatrais para não enlouquecer, para seguir acreditando em seu país, para suportar, continuar até o futuro e sobreviver. [...]43 (2007, p. 83, tradução

nossa)

Em relação às cifras, apesar da impressão de sucesso de público, a Encuesta Anual de

Hogares 2012 [Enquete Anual de Residências 2012] (DADAMIA, 2014), revela que só 3,7%

da população da Capital Federalde 14 anos ou mais afirma que "realizar e/ou presenciar atividades artísticas e culturais" ["realizar y / o presenciar actividades artísticas y culturales"] é a sua principal atividade em tempo livre, ou seja, a mais habitual. A categoria inclui oficinas e cursos extracurriculares de diferentes linguagens artísticas (como teatro, música e fotografia), assistir aos espetáculos de teatro, música ao vivo, cinema, exposições, feiras artesanais, assim como visitar museus, centros culturais, bibliotecas etc.

Para tentar compreender esse dado em relação ao público adolescente não frequentador das salas teatrais portenhas, vale lembrar que, segundo Ana Durán (2016, p. 23), no imaginário de grande parte dos jovens que participam do Programa Formación de Espectadores, o público de teatro de Buenos Aires é constituído por “[...] pessoas maiores de 45 anos, cultas e com alto poder aquisitivo. [...]”44, portanto, eles não se sentem pertencentes a esse universo e isso é uma das justificativas para eles não irem ao teatro.

A estudante secundarista francesa Sophie Raynaud, durante seu estágio em Buenos Aires no ano 2013/2014, realizou durante dois meses uma enquete estatística com 170 pessoas que compareceram aos espetáculos Fuera!, Delia, Viejo, Solo y Puto, 0800 Call Center, Hay que

apagar el fuego e Cinthia Interminable com o objetivo de averiguar as tendências do público

43 “[...] En la Argentina el teatro es un espacio de construcción de subjetividad alternativa, de

socialización, de resistencia y resiliencia. Los convivios se fundan no en rutinas de la actividad cultural sino en el en el deseo y en la vocación de salud. Durante muchos años los espectadores argentinos se han aferrado a los convivios teatrales para no enloquecer, para seguir creyendo en su país, para soportar, continuar hacia el futuro y sobrevivir.”

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do Teatro Beckett. Tal pesquisa revelou, como já era de se esperar, que a proporção de mulheres é maior do que a de homens. Sendo que, além dos casais, é muito mais frequente grupos de amigas irem ao teatro juntas ou se encontrarem na antessala do que os grupos de amigos. Apenas 19% da população estudada possui menos de 25 anos, o que evidencia que, para além das dificuldades financeiras - já que nessa faixa etária a maioria ainda é estudante, os jovens não se interessam de maneira significativa pelo teatro e/ou não se sentem pertencentes a esse universo. No entanto, discordo diametralmente da opinião da secundarista de que “o fenômeno da ‘escola de espectadores’ é muito interessante nesse sentido, como a necessidade de uma legitimação para poder entrar no mundo artístico, ainda que seja só como público”.45 (2014, p. 26, tradução nossa), pois os assistentes da EEBA são majoritariamente adultos, economicamente estáveis e frequentadores assíduos das salas teatrais dos diferentes circuitos portenhos. Certamente, por seu desconhecimento do perfil dos assistentes da EEBA, sua observação “o desenvolvimento da escola de espectadores é um exemplo da existência de uma ‘necessidade’ de algumas pessoas de se cultivarem para se sentirem legítimas vendo uma apresentação. Se estamos de acordo ou não com essa prática, revela sobretudo um sentimento de exclusão.”46 me parece bastante equivocada, uma vez que os integrantes da EEBA além de não demonstrarem qualquer sentimento de exclusão cultural ou incapacidade de apreciação de uma obra teatral, até porque, como observei durante o trabalho de campo, eles possuem níveis de leitura sofisticados. Além disso, o comentário da estudante francesa denota preconceito frente a incompreensão e/ou incapacidade de vislumbrar uma formação em teatro com foco na recepção e não na atuação ou na direção, por exemplo.

Como já alertou Marco de Marinis,

O espectador não é um ator fracassado, mas um dos protagonistas da relação teatral [...]. Assim, ver teatro é um dos muitos modos de fazê-lo, então ‘ter experiência em arte’ não significa unicamente praticá-lo diretamente, de

45 “El fenómeno de la “escuela de espectadores” es muy interesante en este sentido, como la necesitad

[sic] de una legitimación para poder entrar en el mundo artístico, aunque sea tan solo como público.”

46 “El desarrollo de la escuela de espectadores es un ejemplo de la existencia de una “necesitad” de

algunas personas de cultivarse para sentirse legítimos viendo una función. Que seamos de acuerdo o no con esta práctica, revela sobre todo un sentimiento de exclusión.”

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maneira ativa, senão também, justamente, contemplá-lo, estudá-lo, etc. [...]47

(2005, p. 132, tradução nossa).

Sophie Raynaud também questionou os frequentadores do Teatro Beckett sobre como eles se interam dos espetáculos. As respostas apontaram que o poder de convocatória do boca- a-boca teve destaque visível e mostraram que a recomendação de um amigo tem muito mais peso do que a imprensa ou as filipetas, por exemplo. Concordo em parte com a estudante francesa que o “[...] o setor teatral [portenho], pelo menos o independente, parece bastante fechado onde os espectadores usuais se recomendam entre eles as obras e teatros. [...]”48 (2014, p. 26, tradução nossa).

Segundo Ana Durán (2016), o espectador frequente de teatro em Buenos Aires pertence à “elite cênico-cultural da Cidade” [“élite escénico-cultural de la Ciudad”] e, como tal, a partir do trabalho de campo que efetuei na EEBA, ao que tudo indica, diferente da grande maioria dos jovens com os quais a jornalista argentina e Sonia Jaroslavsky trabalham no Programa

Formación de Espectadores, maneja os diferentes conhecimentos teatrais mencionados por

Marco De Marinis em seu livro En busca del actor y del espectador (2005). De acordo com o professor e semiólogo italiano, esses conhecimentos dizem respeito às questões gerais e particulares do teatro, aos interesses pessoais de cada espectador relativos ao teatro de maneira ampla e à determinado espetáculo, bem como às condições materiais de recepção, ou seja, espaciais e relacionais. Essas condições de recepção “[...] funcionam como determinantes dos processos receptivos e influenciam em seu desenvolvimento e seu resultado.”49 (MARINIS, 2005, p. 108, tradução nossa).

Ao lado dessas pré-condições de recepção, sobreditas, Marco De Marinis situa a “competência teatral”, entendida como: “[...] o conjunto de tudo aquilo (atitudes, habilidades, conhecimentos, motivações) que coloca o espectador em condições de compreender (no sentido

47 “El espectador no es un actor fracasado sino uno de los dos protagonistas de la relación teatral [...].

Pero si ver teatro es uno de los muchos modos de hacerlo, entonces ‘tener experiencia del arte’ no significa únicamente practicarlo directamente, de manera activa, sino también, justamente, contemplarlo, estudiarlo, etc. [...]”

48 “[...] el sector teatral, por lo menos independiente, aparece bastante cerrado donde los espectadores

usuales se recomiendan entre ellos las obras y teatros. [...]”

49 “[...] funcionan como determinantes de los procesos receptivos y que influyen en su desarrollo y su

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mais rico do termo), uma representação teatral. [...]”50 (2005, p. 108, tradução nossa). Seguindo a linha de raciocínio do professor italiano, a “competência teatral” é um saber-fazer que possibilita o espectador realizar as múltiplas operações de recepção. Os participantes da EEBA, que, do ponto de vista de Dubatti (informação verbal, obtida no dia 04 maio 2015 na EEBA), a assistem porque encontram nela um vínculo existencial com o teatro e não por uma relação de consumo, conforme pude constatar em minha estada na capital argentina, possuem essa “competência teatral”, possivelmente, pela longevidade da EEBA e por serem espectadores assíduos e aficionados do teatro. Conforme notou Breno Ketzer Saul, em entrevista concedida em 30 de junho de 2015, “os participantes já possuem muitas referências, certamente pelo tempo de existência da escola, então tudo já tem um link e eles andam muito rápido.”51

Como já observou Pierre Bourdieu, os consumos culturais, dentre eles a frequência ao teatro, dependem da remuneração e do nível de instrução. Além disso, os estilos de vida e gostos são marcas de distinção social que interligam as pessoas pelas afinidades. O sociólogo francês, em relação ao valor distintivo ganho pelos intelectuais pela apropriação simbólica de uma obra teatral por exemplo, diz o seguinte:

Para os intelectuais, experientes ou aprendizes, determinadas práticas - como a frequência ao teatro, [...] cuja assiduidade e rotina quase profissional são suficientes para despojá-la de qualquer extracotidianidade - obedecem de alguma forma, à busca do máximo “rendimento cultural” pelo menor custo econômico, o que implica a renúncia a toda despesa ostentatória e a quaisquer gratificações além daquelas proporcionadas pela apropriação simbólica da obra [...]. Através da própria obra, de sua raridade e do comentário que hão de elaborar sobre o evento - desde a saída do espetáculo, em um bar “tomando uma bebida” ou em seus cursos, artigos ou livros - e por meio do qual esforçar- se-ão em se apropriarem de uma parcela de seu valor distintivo, é que esperam obter o rendimento simbólico de sua prática. [...]. (2013, p. 250).

Em Buenos Aires, a remuneração, no caso, pode ser percebida inclusive no bairro de residência dos frequentadores de teatro. De acordo com a Encuesta Anual de Hogares 2012 -

50 “[...] el conjunto de todo aquello (aptitudes, habilidades, conocimientos, motivaciones) que pone al

espectador en condiciones de comprender (en el sentido más rico del término), una representación teatral. [...]”

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Tabulados básicos del módulo especial: Hábitos y prácticas culturales [Enquete Anual de

Residências 2012 - Tabulados básicos do módulo especial: Hábitos e práticas culturais], mostra que 43,6% população da Zona Norte (Comunas 2, 13 e 14), que abarca os bairros Recoleta,

Belgrano, Núñez, Colegiales e Palermo, tem muito mais o hábito de assistir aos espetáculos de

teatro do que os 17,8% da população da Zona Sul (Comunas 4, 8, 9 e 10), que abarca os bairros

Boca, Barracas, Parque Patricios, Nueva Pompeya, Villa Soldati, Villa Riachuelo, Villa Lugano, Parque Avellaneda, Liniers, Mataderos, Villa Real, Monte Castro, Versalles, Floresta, Vélez Sársfield e Villa Luro.

Em relação aos hábitos segundo o nível educativo alcançado pela população de 25 anos ou mais, conforme mostra a Encuesta Anual de Hogares 2012, "para as práticas relacionadas com o estritamente cultural, a porcentagem de hábito do grupo com maior nível escolar formal é mais de cinco vezes maior que o mais desfavorecido"52. Isto é, 8,9% da população com até o primário completo, em seu tempo livre, realiza e/ou presencia atividades artísticas e culturais, enquanto que 46% da população com terciário ou universitário incompleto ou completo realiza e/ou presencia atividades artísticas e culturais. No ano de 2012, no tocante à assistência aos espetáculos de teatro, de acordo com o nível educativo alcançado pela população de 25 anos ou mais, só 7,9% dos entrevistados com até o primário completo assistiram às obras de teatro, enquanto que 48,7% dos entrevistados com terciário ou universitário incompleto ou completo assistiram aos espetáculos teatrais.

De acordo com a mesma pesquisa supracitada, em 2012, ao comparar as práticas que implicam sair de casa, a assistência ao cinema com 60% representa a atividade mais difundida entre a população, quase o dobro da frequência em recitais e/ou concertos e a assistência aos espetáculos de teatro (32,5% e 31,5% respectivamente). Ao redor de um quarto da população declarou que foi em lugares dançantes e a museus, enquanto apenas 13,5% foi em bibliotecas e 10% em espetáculos de dança.

Esses dados argentinos não são uma novidade e tampouco diferem muito da realidade brasileira. Mas, ajudam a pensar o público de teatro de forma mais precisa.

52 "[...] para las prácticas relacionadas con lo estrictamente cultural, el porcentaje de hábito del grupo