• Nenhum resultado encontrado

O FBES: experiência de gestão e organização do movimento de economia solidária

2 A ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL

2.2 O FBES: experiência de gestão e organização do movimento de economia solidária

O Fórum Brasileiro de Economia Solidária nasceu ao mesmo tempo em que a SENAES foi inaugurada e congrega um grande número de movimentos sociais, empreendimentos solidários, agências de fomento e de assessoria da economia solidária no Brasil.

Em seus documentos, o FBES diz que tem se estruturado de forma a garantir a articulação entre os três segmentos do movimento: empreendimentos solidários, entidades de assessoria e fomento e gestores públicos.

O segmento dos empreendimentos solidários é formado pelas cooperativas (de produção, de serviços, de consumo, de comercialização e de créditos solidários); associações populares; grupos informais de produção ou serviços; empresas recuperadas de autogestão; fundos solidários e rotativos de créditos; clubes e grupos de intercâmbio solidários; redes e articulação de cadeias produtivas solidárias; agências de turismo solidário, entre outros. O segmento das entidades de assessoria e fomento se organiza normalmente sob a forma de ONGs ou Universidades (incubadoras tecnológicas ou grupos de extensão) e presta serviços de apoio e fomento aos empreendimentos solidários através de ações de formação (tanto técnica como econômica e política) e/ou apoio direto (em estrutura, consultoria, elaboração de projetos e/ou oferecimento de créditos) para a incubação e promoção de empreendimentos. O terceiro segmento da economia solidária é formado por gestores públicos; representantes de governos municipais e estaduais que tenham em sua gestão programas explicitamente dedicados à economia solidária. Este segmento tem assento na Coordenação Nacional do FBES como uma das entidade/redes nacionais (FBES, 2006).

O FBES nasce “com as tarefas de articular, mobilizar as bases da Economia Solidária em todo país e realizar a interlocução junto ao governo federal, a outros movimentos sociais e a organizações internacionais, em nome da Economia Solidária” (MANETTI, et al, 2008, p. 12). A partir daí, continuam os autores,

O FBES passa a fomentar e apoiar a criação e o fortalecimento dos Fóruns Estaduais de Economia Solidária. Este processo, desenvolvido com forte apoio e parceria da Secretaria Nacional de Economia Solidária, foi decisivo para a constituição de Fóruns Estaduais nas 27 unidades da federação. Em alguns Estados, onde já havia um processo maior de organização, os Fóruns Estaduais estimularam e apoiaram a construção de fóruns regionais e municipais de Economia Solidária. Esses fóruns são hoje espaços de discussão e articulação, unindo empreendimentos, entidades de apoio e gestores públicos para fortalecimento da Economia Solidária, possibilitando o debate sobre as suas demandas e perspectivas.

A principal instância de decisão do FBES é a Coordenação Nacional que consiste nos representantes das entidades e redes nacionais de fomento além de três representantes por Estado que tenha um Fórum ou Rede Estadual de Economia Solidária. Destes três representantes por Estado, dois são empreendimentos e um é assessor ou gestor público. A Coordenação Nacional tem, portanto, 97 participantes e reúne-se duas vezes ao ano. Para a gestão política cotidiana, interlocução com outros movimentos e com o governo federal, e acompanhamento da Secretaria Executiva Nacional, há uma Coordenação Executiva Nacional, composta por treze pessoas, sendo sete representantes de empreendimentos (dois do norte, dois do nordeste, e um representante para cada uma das demais regiões), cinco representantes das Entidades e Redes Nacionais de promoção à Economia Solidária, e um representante da Rede Nacional de Gestores Públicos. Por fim, para dar suporte aos trabalhos do FBES, propiciar a comunicação entre as instâncias e operacionalizar reuniões e eventos, há a Secretaria Executiva Nacional (FBES, 2006). A figura a seguir explicita a estrutura do FBES.

Ilustração 01 - Fórum de Economia Solidária

Fonte: FBES, 2006

Para direcionar as suas ações, o FBES elaborou uma Carta de Princípios da Economia Solidária que, além de proporcionar elementos de fundamentação para o movimento, tem servido como documento de base para a interlocução com a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES). De acordo com documentos do Fórum, a Plataforma de Economia Solidária tem sido integralmente acolhida pela SENAES em seu plano de ação plurianual (FBES, 2006).

Durante a I Plenária Nacional da Economia Solidária ocorrida em São Paulo em dezembro de 2002, a Plataforma da Economia Solidária foi iniciada. Essa plataforma, que chega à versão final após a III Plenária Nacional ocorrida em 2003 e após o I Encontro Nacional de Empreendedores Solidários ocorrido em agosto de 2004, se desdobra em 07 eixos: finanças solidárias; marco legal; educação; comunicação; redes de produção; comercialização e consumo; democratização do conhecimento e tecnologia e organização

social da economia solidária. Vale destacar que o eixo organização da economia solidária previa a criação da SENAES. Em documento do FBES, assim aparece a preocupação de ser criada uma Secretaria em estreita consonância com o FBES.

Criar uma Secretaria Nacional de Economia Solidária, responsável por – em diálogo com o Fórum Brasileiro de Economia Solidária – elaborar políticas de forma interdisciplinar, transversal, intersetorial, adequadas à expansão e fortalecimento da Economia Solidária no país e executá-las de maneira estratégica, particularmente no que se refere ao marco legal, finanças solidárias, redes de produção, comercialização e consumo, democratização do conhecimento e tecnologia, educação e comunicação (FBES, 2006, p. 23).

Foi ainda em Junho de 2003, durante a III Plenária Nacional da Economia Solidária, que o Fórum Brasileiro da Economia Solidária, criado nessa mesma ocasião, aprovou sua Carta de Princípios. Esses princípios pretendem ser a identidade do FBES e são divididos em três partes distintas que se complementam: a história e o momento atual; os princípios gerais e específicos e o que a economia solidária não é.

A Carta de Princípios destaca que, apesar da diversidade de origem e da dinâmica cultural, são pontos de convergência no que se refere à economia solidária

• a valorização social do trabalho humano;

• a satisfação plena das necessidades de todos como eixo da criatividade tecnológica e

da atividade econômica;

• o reconhecimento do lugar fundamental da mulher e do feminino numa economia

fundada na solidariedade;

• a busca de uma relação de intercâmbio respeitoso com a natureza e

• os valores da cooperação e da solidariedade.

De acordo com documentos do FBES, “a Economia Solidária constitui o fundamento de uma globalização humanizadora, de um desenvolvimento sustentável, socialmente justo e voltado para a satisfação racional das necessidades de cada um e de todos os cidadãos da Terra seguindo um caminho intergeracional de desenvolvimento na qualidade de sua vida” (p. 17).

A economia solidária, de acordo com a Carta de Princípios elaborada pelo FBES, representa práticas fundadas em relações de colaboração solidária, inspiradas por valores culturais que colocam o ser humano como sujeito e finalidade da atividade econômica. Busca, portanto, outra qualidade de vida e de consumo. Na economia solidária, a eficiência dos empreendimentos se define também como eficiência social, em função da qualidade de

vida e da felicidade de seus membros e, ao mesmo tempo, de todo o ecossistema; não se limita, portanto, aos benefícios materiais de um empreendimento. Trata-se, ainda, de instrumento de combate à exclusão social e alternativa viável para a geração de trabalho e renda e para a satisfação direta das necessidades de todos. Para o FBES, através da economia solidária é possível organizar a produção e a reprodução da sociedade de modo a eliminar as desigualdades materiais e difundir os valores da solidariedade humana.

Existe consenso, tanto na SENAES quanto no FBES, de que o fortalecimento do movimento de economia solidária no país depende da existência de Fóruns Estaduais fortes, ativos e mobilizados em seus Estados. Os Fóruns Estaduais são importantes por garantirem a capilaridade e organicidade do movimento de Economia Solidária no Brasil. São espaços de articulação dos três segmentos: empreendimentos, entidades de assessoria e gestores públicos. Esses Fóruns Estaduais, dependendo da especificidade de cada Estado, funcionam de formas diferenciadas do ponto de vista da organização interna e estruturação. Normalmente contam com o apoio de entidades de assessoria estaduais para garantir infra-estrutura e possibilitar reuniões e uma rede de comunicação dentro do Estado.

No Brasil, os Fóruns Estaduais de economia solidária estão organizados nos 27 Estados e são responsáveis pela organização de eventos de economia solidária no Estado, como as Feiras Estaduais de Economia Solidária. Atuam, ainda, junto ao poder público estadual e junto a outros movimentos da sociedade civil, e são a principal porta de entrada para empreendimentos, assessorias e gestores ao movimento de economia solidária. O site do FBES disponibiliza informações sobre os Fóruns Estaduais: histórico, notícias, agenda e contatos, dentre outras.

O FBES, após a realização da I Conferência Nacional de Economia Solidária, e a implantação do Conselho Nacional de Economia Solidária, se articulou, desde o final de 2006, para a IV Plenária de Economia Solidária que foi realizada em março de 2008. O processo de mobilização e os debates tiveram início nos Encontros Regionais (chamados de Encontros Regionais de Reestruturação) nas cinco macrorregiões do país. Após a realização destes Encontros Regionais, ocorreu a segunda fase, que consistiu na sistematização dos resultados e no lançamento da IV Plenária durante a VII Reunião da Coordenação Nacional do FBES, em maio de 2007. A terceira fase consistiu na realização das Plenárias Estaduais, que culminaram na IV Plenária Nacional de Economia Solidária (FBES, 2007).

A discussão sobre o FBES, enquanto movimento, tem estado presente em documentos divulgados pelo próprio FBES em sua página na rede. Vale destacar alguns trechos da

avaliação que um dos integrantes faz sobre o FBES após seu retorno do II Encontro Latino- Americano de Comércio Justo e Economia Solidária e divulgada em 12 de março de 2007.

Penso que o FBES enquanto movimento precisa avançar mais na sua radicalidade de militância...falamos de autogestão e participação igualitária, mas temos um modus operandus que sempre precisa de recursos... numa dependência violenta do capital do estado, para fazer funcionar a nossa engenharia.... Hoje no FBES, para qualquer coisa temos que esperar pelos recursos do estado...hoje praticamente 90% de todo recurso de funcionamento do FBES vem do Governo... Outra questão conflituosa, o fato de termos (FBES e SENAES) sido criados juntos... às vezes confundimos o que somos e qual é o nosso papel na construção da economia solidária no Brasil. Enquanto Fórum de economia solidária devemos nos afirmar enquanto movimento e trabalhar em sintonia nesta construção.... às vezes nos achamos governo, outras vezes somos radicalmente contra qualquer iniciativa e falamos que temos o papel de controle social?.... E que agora se complica com a criação do CNES que de fato é o “espaço” onde compete o controle social e a gestão partilhada da política pública... Portanto considero que estamos num momento fundamental de reflexão sobre a atuação do FBES

Assim, constata-se que o FBES tem debatido sua identidade e buscado, ainda, ser um espaço nacional de articulação, debate, elaboração de estratégias e mobilização do movimento de economia solidária no Brasil.

A seguir destacaremos a importância da criação da SENAES para a implantação de uma política pública de economia solidária no Brasil.