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1 FEDERALISMO E REGIME DE COLABORAÇÃO – CONDIÇÕES ESSENCIAIS PARA A MELHORIA DA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL

1.5 O FEDERALISMO BRASILEIRO E A REPERCUSSÃO NO CAMPO EDUCACIONAL (1995-2002)

A partir do movimento da reforma, se observa que os posicionamentos políticos de países como o Brasil revelam um deslocamento no seu sistema político, em que a direita61 ou a nova direita se apresenta para o social sob a premissa da cidadania

ativa62. Com um novo padrão de sociabilidade e repolitização da política no Brasil temos a inserção, a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), de uma convencionada pedagogia da hegemonia63 em termos educacionais.

Encontramos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9.394/96 princípios da nova gestão pública como a flexibilização, e o estabelecimento do federalismo administrativo preconizado nas Emendas Constitucionais (EC) nº 14/96 e nº 19/98. O governo de Fernando Henrique Cardoso cumpriu a normativa constitucional ao promulgar a nova LDBEN no ano de 1996.

O regime de colaboração passou a ser prioritário a partir da Constituição Federal de 1988. O governo federal, no período em análise, disponibilizou instrumentos

60 Modelo explicitado no início do capítulo a partir das ideias de Riker (1964). Podemos dizer também que

é um modelo dependente nos moldes de Wright (1978).

61 Conforme Neves e Martins (2010) a política hoje em dia está localizada em um plano que vai além das

formas clássicas direita e esquerda, visto que a nova social democracia apresenta seu projeto político a partir da chamada Terceira Via. Deste modo, cada vez mais a “direita” se apresenta para o social e a “esquerda” para o capital, como produto da repolitização da política que cria um novo padrão de sociabilidade que reduz o nível de consciência política coletiva.

62 A cidadania ativa é uma premissa da Terceira Via, que responsabiliza os sujeitos na resolução dos

problemas coletivos que eram de responsabilidade do Estado. O indivíduo é responsabilizado pela questão social.

63 Segundo Neves e Martins (2010, p.24) a nova pedagogia da hegemonia é “[...] uma nova dimensão

educativa do Estado capitalista. Sua principal característica é assegurar que o exercício da dominação de classe seja viabilizado por meio de processos educativos positivos”.

normativos para que sua efetivação fosse garantida: a LDBEN nº 9.394/96, Lei do FUNDEF nº 9.424/96, Plano Nacional de Educação (PNE) - Lei nº 10.172/2001.

O processo que deu origem a LDBEN nº 9.394/96 é anterior ao governo de Fernando Henrique Cardoso, por meio do Projeto de Lei (PL) nº 1.258 de 1988 do Deputado Otávio Elísio. O projeto original de 1988 deu lugar ao substitutivo proposto pelo Senador Darcy Ribeiro de nº 101/93, originário da Câmara Federal e com modificações feitas pelo referido Senador.

O PL nº 1.258 de 1988, constituído a partir das discussões com a sociedade, afirma que: “[...] o projeto está fundamentado no estudo elaborado pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), apresentado durante a XI Reunião Anual da Instituição realizada em Porto Alegre, de 25 a 29 de abril do corrente ano” (BRASIL, 1988, p.4270, Diário do Congresso Nacional, Seção I).

No PL nº 1.258 de 1988 o fundamento basilar é atender ao disposto na Constituição de 1988, e fixar as diretrizes e bases da educação nacional. Neste sentido, em termos de regime de colaboração encontramos:

Art. 5º Haverá no país um sistema nacional de educação constituído pelos vários serviços educacionais desenvolvidos no território nacional, intencionalmente reunidos de modo a formar um conjunto coerente, conforme o disposto na presente lei.

Art. 6º O sistema nacional de educação articulará as redes federal, estadual, municipal e particular nos diferentes graus, modalidades e tipos de educação. Art. 7º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, organizarão em regime de colaboração, a educação pública, com observância da presente lei (BRASIL, 1988, p.4267).

O projeto estabelecia as competências de cada nível de governo para cumprimento do regime de colaboração preceituado no Art. 211 da Constituição Federal. O PL, em seu Art. 58, reafirmava o texto constitucional em que a União aplicaria na educação nunca menos de 18% (dezoito por cento), estados, municípios e distrito federal nunca valor menor ao de 25% (vinte e cinco por cento), cumprindo o disposto no Art. 212 da CF. A normativa do regime de colaboração no PL nº 1.258 de 1988 é tímida, se configurando apenas nos Arts. 5, 6, 7, 61 e 62, não esclarecendo como se daria a forma de colaboração entre os subgovernos nacionais.

O PL nº 1.258 de 1988 recebeu várias emendas e seguiu sem aprovação até o ano de 1993, quando o Senador Darcy Ribeiro, em uma manobra que visou aprovar um texto mais propício aos anseios da reforma, o substituiu pelo PL nº 101/93 do então relator Deputado Cid Sabóia. Apesar de manter o número originário da Câmara, o PL nº 101/93

trazia nova redação dada pelo Senador Darcy Ribeiro, cujo resultado foi a aprovação em 17 de dezembro de 1996, sendo convertido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9.394/96, sancionada em 20 de dezembro de 1996 pelo presidente da República Fernando Henrique Cardoso.

A LDBEN nº 9.394/96 no Art. 3º fala da garantia do padrão de qualidade do ensino público que só seria possível dentro de uma coordenação federativa cooperativa. Para sua efetivação estabelece por meio das normativas dos Arts. 9, 10 e 11 as funções prioritárias de atuação em cada esfera de governo, tentando atender ao Art. 211 da Constituição Federal. Os artigos em tela trazem:

Art. 9º A União incumbir-se-á de:

I - elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

[...]

III - prestar assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento prioritário à escolaridade obrigatória, exercendo sua função redistributiva e supletiva;

IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum;

Art. Art. 10º. Os Estados incumbir-se-ão de:

II - definir, com os Municípios, formas de colaboração na oferta do ensino fundamental, as quais devem assegurar a distribuição proporcional das responsabilidades, de acordo com a população a ser atendida e os recursos financeiros disponíveis em cada uma dessas esferas do Poder Público; Art. 11º. Os Municípios incumbir-se-ão de:

I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados; (BRASIL, 1996a).

Para efetivação da colaboração a LDBEN nº 9.394/96 propõe, nos Arts. 5 e 8, a organização dos sistemas de ensino em regime de colaboração:

Art. 5º O acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder Público para exigi-lo64.

§ 1º Compete aos Estados e aos Municípios, em regime de colaboração, e com a assistência da União:

I - recensear a população em idade escolar para o ensino fundamental, e os jovens e adultos que a ele não tiveram acesso65;

64 Recentemente este artigo teve sua redação alterada pela Lei nº 12.796 de 2013 retirando a legalidade do

regime de colaboração entre os entes, o que se considera um retrocesso em virtude da colaboração ser condição para a melhoria da educação no Brasil.

65 Esta é a antiga redação que estabelecia o regime de colaboração entre os entes federados para a garantia

[...]

Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.

§ 1º Caberá à União a coordenação da política nacional de educação, articulando os diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa, redistributiva e supletiva em relação às demais instâncias educacionais. § 2º Os sistemas de ensino terão liberdade de organização nos termos desta Lei (BRASIL, 1996a, grifos nossos).

A ação supletiva da União, a partir da reforma de Estado em 1990, com base nos Arts. 75 e 76 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9.394/96, constitui uma intervenção reguladora com intenção de “equalizar” as oportunidades de educação no país. Os artigos que atendem às preocupações liberal-progressista da sociedade brasileira aludem a questão:

Art. 75. A ação supletiva e redistributiva da União e dos Estados será exercida de modo a corrigir, progressivamente, as disparidades de acesso e garantir o padrão mínimo de qualidade de ensino.

§ 1º A ação a que se refere este artigo obedecerá a fórmula de domínio público que inclua a capacidade de atendimento e a medida do esforço fiscal do respectivo Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios em favor da manutenção e do desenvolvimento do ensino.

§ 2º A capacidade de atendimento de cada governo será definida pela razão entre os recursos de uso constitucionalmente obrigatório na manutenção e desenvolvimento do ensino e o custo anual do aluno, relativo ao padrão mínimo de qualidade.

§ 3º Com base nos critérios estabelecidos nos § 1º e 2º, a União poderá fazer a transferência direta de recursos a cada estabelecimento de ensino, considerado o número de alunos que efetivamente frequentam a escola.

§ 4º A ação supletiva e redistributiva não poderá ser exercida em favor do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios se estes oferecerem vagas, na área de ensino de sua responsabilidade, conforme o inciso VI do art. 10 e o inciso V do art. 11 desta Lei, em número inferior à sua capacidade de atendimento.

Art. 76. A ação supletiva e redistributiva prevista no artigo anterior ficará condicionada ao efetivo cumprimento pelos Estados, Distrito Federal e Municípios do disposto nesta Lei, sem prejuízo de outras prescrições legais (BRASIL, 1996a).

No federalismo brasileiro, o regime de colaboração é entendido como possibilitador da qualidade da educação básica. A Constituição de 1988 reluta em criar um Sistema Nacional de Educação e acaba pluralizando os sistemas a partir do Art. 211, deixando a LDBEN nº 9.394/96 normatizar esta questão. No tangente aos dilemas advindos dos recursos orçamentários, a Constituição ao incorporar o município à federação enquanto ente federado mostrou o descompasso dos recursos disponibilizados para os governos subnacionais e suas responsabilidades de oferta, mesmo tendo como base as transferências intergovernamentais.

Encontra-se no texto da LDBEN nº 9.394/96 competências relativas à União em que há o reconhecimento de uma ação coordenada e cooperativa com os demais níveis de governo, atendendo aos dispositivos estabelecidos constitucionalmente quando propõe:

Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público:

[...]

§ 3º A União prestará assistência técnica aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios na elaboração de concursos públicos para provimento de cargos dos profissionais da educação.

[...]

Art. 74. A União, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, estabelecerá padrão mínimo de oportunidades educacionais para o ensino fundamental, baseado no cálculo do custo mínimo por aluno, capaz de assegurar ensino de qualidade.

Parágrafo único. O custo mínimo de que trata este artigo será calculado pela União ao final de cada ano, com validade para o ano subsequente, considerando variações regionais no custo dos insumos e as diversas modalidades de ensino (BRASIL, 1996a).

A falta de coesão entre os subgovernos nacionais é latente quando se observa a não instituição do sistema nacional de educação pretendido na Constituição de 1988 e presente no PL nº 1.258 de 1988, que já apontava enquanto condição preliminar para o bom funcionamento da educação no Brasil a criação de um sistema único de educação que se pautasse na colaboração e na ação coordenativa entre os níveis de governo. A não instituição de um real sistema nacional de educação se deu, para Abrucio (2010, p.61) em virtude da:

[...] falta de um modelo intergovernamental que organizasse o processo de descentralização na educação. A municipalização ficou vinculada às negociações políticas entre os estados e municípios, sem que houvesse uma arena institucional para isto e/ou critérios claros de repasse de funções, de modo que este processo dependeu muito mais do jogo de poder federativo para além da política educacional em si. Dito de outro modo, não houve incentivos financeiros, gerenciais ou de democratização que guiassem a relação entre os níveis de governo e sua necessária colaboração.

Para atendimento ao dispositivo do regime de colaboração foi criado no governo de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) o Fundo de Manutenção e Valorização do Magistério (FUNDEF), Lei nº 9.424/96. Previsto no Art.60, § 4º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), com redação alterada pela Emenda Constitucional nº 14/96 e ignorado por muito tempo, in verbis:

Art.60, § 4º. A União, os Estados e o Distrito Federal e os Municípios ajustarão progressivamente, em um prazo de cinco anos, suas contribuições ao Fundo, de forma a garantir um valor por aluno correspondente a um padrão mínimo de qualidade de ensino, definido nacionalmente (BRASIL, 2005, p.185).

O Projeto de Emenda Constitucional (PEC) nº 223/95 que deu origem ao FUNDEF foi apresentada no plenário da Câmara dos Deputados no dia 23 de outubro de 1995 com autoria do poder Executivo, que alegou:

A questão da educação nacional, especialmente a da educação básica, constitui um dos grandes desafios a serem enfrentados por uma política responsável que tenha por objetivo o desenvolvimento social e econômico do País (sic), com justiça e equidade. O reconhecimento dessa questão faz com que Vossa Excelência elegesse a Educação como uma das cinco grandes prioridades de seu Governo.

As obrigações do Estado para com o setor educacional foram consideravelmente ampliadas pela Cana Magna promulgada em 1988. Acolhendo aspirações e interesses de diversos segmentos da sociedade, sem a necessária avaliação da efetiva possibilidade da ação governamental, a Constituição gerou compromissos que ampliam em muito a complexidade da gestão da Educação, nas três esferas do poder público.

Por outro lado, a mesma Carta não explicita de forma coerente as responsabilidades e competências de cada uma das esferas, de forma que o cidadão comum saiba a quem cobrar o cumprimento das garantias constitucionais (BRASIL, 1995d, p.02604).

Segundo o documento, a indefinição dos papéis de cada subgoverno nacional na Constituição Federal de 1988 trouxe como consequência um sistema esfacelado em vários outros sistemas que deixam a desejar a qualidade da educação ofertada no país, visto que a distribuição dos recursos não é compatível com as responsabilidades atribuídas a cada subgoverno. A PEC nº 223/95 destaca que os recursos repassados aos municípios por meio das transferências constitucionais não se faziam segundo critérios que levassem em conta as necessidades específicas dos subgovernos na educação.

Segundo a PEC nº 223/95, o papel do Governo Federal é evitar o desequilíbrio na repartição de responsabilidades e recursos:

A concepção federativa do Estado nacional, na Constituição em vigor, aponta para a desconcentração das ações em favor dos Estados e Municípios e, consequentemente, para a função redistributiva dos recursos fiscais disponíveis, de sorte a promover maior equidade na capacidade de atendimento das demandas sociais em cada Unidade da Federação (sic). Estes princípios precisam ser observados também na área da educação, na qual, mais do que uma ação supletiva não claramente definida, a União deve atentar para sua função redistributiva (BRASIL, 1995d, p.02604).

O documento esclarece o tipo de regime de colaboração a ser adotado: a desconcentração em detrimento da descentralização, enfatizando os aportes da reforma do Estado que prevê aos governos nacionais maior responsabilização aos subgovernos sob a premissa da boa governança e centralização da política educacional, em um claro modelo de federalismo de coalizão.

Com esta normativa, a PEC nº 223/95 foi aprovada e convertida na EC nº 14 de 1996, instituindo o FUNDEF como garantia de distribuição de recursos e de responsabilidade entre os estados e seus municípios. O FUNDEF se configurou como política de financiamento, conseguindo unir dois instrumentos que antes pareciam estar separados na Constituição de 1934: a vinculação dos recursos e a política de fundos (MARTINS, 2010).

A partir do FUNDEF há um intenso processo de municipalização da educação no Brasil como parte de uma política de desconcentração, responsabilização e performatividade que tinha por discurso a eficiência dos sistemas municipais de ensino. Este fundo contábil não conseguiu resolver os problemas da educação brasileira em virtude de contemplar apenas o ensino fundamental, deixando parcela da sociedade descoberta de recursos nos outros níveis de ensino.

O primeiro passo para que a educação brasileira fosse objeto de capitais mundiais foi a centralização das políticas educacionais por parte do Ministério da Educação (MEC). A EC nº 19/98, ao enxugar o Estado, abriu espaço para a retirada deste em áreas prioritárias sob o julgo de abertura aos consórcios públicos. Esta proposta foi formulada no ano de 1995, cujo projeto apontava a característica de personalidade jurídica, com a previsão dos subgovernos nacionais executarem em cooperação a gestão associada de serviços públicos, o que daria maior eficiência aos serviços prestados e um custo menor.

Na exposição de Motivos Interministerial nº 49 de 18 de agosto de 1995, que acompanha a Mensagem nº 886 de 23 de agosto de 1995 do presidente da República Fernando Henrique Cardoso, verificamos que o objetivo da proposta de reforma foi a modificação do Capítulo Constitucional da Administração Pública e acréscimo de normas ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADTC), bem como o estabelecimento de normas de transição (BRASIL, 1995b).

O conteúdo da PEC nº 173/95, posteriormente convertida em Emenda Constitucional nº 19/98, parte da prerrogativa de um Estado em crise, cuja estagnação econômica já fazia quinze anos, apresentando-se sob múltiplas facetas: “como crise fiscal,

crise do modo de intervenção do Estado na economia e crise do próprio aparelho estatal” (BRASIL, 1995b, p.18852).

O documento expõe que a capacidade administrativa do Estado estava deteriorada, prevalecendo um enfoque equivocado que levou ao desmonte do aparelho estatal e de seu modelo de gestão burocrático. Sob este aspecto, o Brasil, entenda-se governo federal, vê a reforma administrativa enquanto um componente indissociável do conjunto de mudanças propostas à sociedade brasileira.

Estas mudanças, conforme a PEC nº 173/95, iriam conduzir a reestruturação do Estado, a redefinição de seu papel e de sua forma de atuação para que o Brasil pudesse alcançar o equacionamento consistente e duradouro para a crise em ascensão. Justifica que:

O revigoramento da capacidade de gestão, de formulação e implementação de políticas nos aparatos estatais será determinante para a retomada do desenvolvimento econômico e o atendimento às demandas da cidadania por um serviço de melhor qualidade. Além disso o aumento da eficiência do aparelho do Estado é essencial para a superação definitiva da crise fiscal. A revisão de dispositivos constitucionais não esgota a reforma administrativa, mas representa etapa imprescindível ao seu sucesso, promovendo a atualização de normas, cooperando à remoção de constrangimentos legais que hoje entravam a implementação de novos princípios, modelos e técnicas de gestão (BRASIL, 1995b, p.18852).

O texto faz alusão aos termos consagrados na reforma de 1990: eficiência, revigoramento da capacidade de gestão, dentre outros. Ao proclamar a necessidade de revigorar a capacidade de gestão, a PEC nº 173/95 mostra que o Estado iria se retirar de alguns setores para poder ser mais eficiente e eliminaria o modelo de gestão burocrático, se baseando em um gerencial. Para tanto, o federalismo contido na Carta de 1988 precisava ser revisionado, implementando novos princípios, modelos e técnicas de gestão, em detrimento dos que estavam contidos na legislação por estes serem causadores de certos “constrangimentos” legais.

Para o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), o modelo de gestão do federalismo brasileiro adotado pela Constituição de 1988 orientou-se por uma concepção de administração pública verticalizada, hierárquica e rígida que “favorece a proliferação de controles muitas vezes desnecessários” (BRASIL, 1995b). Se esperava a partir da reforma administrativa alcançar alguns objetivos “positivos” para o federalismo brasileiro:

• Incorporar a dimensão de eficiência na administração pública: o aparelho de Estado deverá se revelar apto a gerar mais benefícios, na forma de prestação de serviços à sociedade, com os recursos disponíveis, em respeito ao cidadão contribuinte;

• Contribuir para o equilíbrio das contas públicas: as esferas de Governo que enfrentam desequilíbrio das contas públicas disporão de maior liberdade para a adoção de medidas efetivas de redução de seus quadros de pessoal, obedecidos critérios que evitem a utilização abusiva [...] de tais dispositivos;

• Viabilizar o federalismo administrativo: a introdução de novos formatos institucionais para gestão em regime de cooperação dos serviços públicos, envolvendo a União, Estados Distrito Federal e Municípios e a remoção de obstáculos legais à transferência de bens e de pessoas, aprofundarão os preceitos do federalismo na administração pública, particularmente no que tange à descentralização dos serviços públicos;

• Romper com formatos jurídicos e institucionais rígidos e uniformizadores: a reforma constitucional permitirá a implantação de um novo desenho estrutural na Administração Pública brasileira que contemplará a diferenciação e a inovação no tratamento das estruturas, formas jurídicas e métodos de gestão e de controle, particularmente no que tange ao regime jurídico dos servidores, aos mecanismos de recrutamento de quadros e a política remuneratória;

• Enfatizar a qualidade e o desempenho nos serviços públicos: a assimilação pelo serviço público da centralidade do cidadão e a importância da continua superação de metas de desempenho conjugada com a retirada de controles e obstruções legais desnecessários, repercutirá na melhoria dos serviços públicos (BRASIL, 1995b, p.18852).