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2 REVISÃO DE LITERATURA

2.2 FOGO

2.2.2 O fogo e o cerrado

O fogo foi identificado por Frost e Robertson (1987), como um dos quatro principais fatores responsáveis pela formação e manutenção dos padrões e processos das comunidades de savanas, juntamente com a água, os nutrientes e a herbivoria. Sarmiento e Monastério (1975) adicionaram ainda o clima e os eventos históricos aos principais fatores associados à dinâmica das savanas da região neotropical.

Salgado-Laboriau (2005) salienta que, de acordo com registros palinológicos, o fogo é um agente ecológico natural presente em áreas de cerrado há pelo menos 40.000 anos. Além disso, as datações existentes de povoamentos humanos nessa região são de cerca de 11 mil anos atrás. Portanto, a ocorrência do fogo em períodos anteriores, muito provavelmente foi de causa não antrópica, indicando que essa é uma formação vegetacional resiliente, que tem sido frequentemente queimada e sua origem não está relacionada com o corte e as queimas das florestas por ação antrópica, como sustentado por alguns pesquisadores como por exemplo no Plano de Manejo do Parque Nacional das Emas, em que se afirmou que incêndios naturais eram eventos raros ou ausentes nos cerrados (IBDF/FBCN, 1981). Nos cerrados, o fogo é um distúrbio frequente, onde exerce inúmeros e diversificados efeitos ecológicos e dessa forma, pode ser

identificado como o seu principal fator de formação (LIMA e BATISTA, 1993, RAMOS-NETO e PINHEIRO-MACHADO, 1996; COUTINHO, 2000).

O fogo é essencial para a manutenção da variabilidade da diversidade biológica, já que nos cerrados muitas espécies evoluíram com a sua presença cíclica no ambiente e dependem dele para a sua manutenção e regeneração (COUTINHO, 1982). Nesse ambiente, de acordo com Sato (1996), o fogo exerce forte ação modificadora da estrutura da vegetação e da paisagem. Pode ainda transformar a estratificação da vegetação e seu adensamento, modificar a composição de espécies da flora e formar clareiras. O fogo em áreas de cerrado estimula a floração, germinação e a dispersão de diversas espécies, acelera a ciclagem de nutrientes pela mineralização da biomassa acumulada e reduz o acúmulo de material combustível, reduzindo dessa forma, o risco de ocorrências de comportamentos extremos do fogo (COUTINHO, 1990; PIVELLO, 1992).

A vegetação do cerrado está adaptada ao fogo em função da frequência histórica em que ele ocorre no ambiente e mesmo em eventos severos, a vegetação não é totalmente destruída. Dessa forma, Eiten (1972) sugeriu que para que o fogo produzisse efeitos significativamente negativos sobre as fisionomias de cerrado seria necessária a ocorrência sucessiva de eventos diários, por um período de um a dois anos. No entanto, mesmo em ecossistemas adaptados e dependentes do fogo, como é o caso do cerrado, regimes alterados de fogo, tanto pelo aumento da sua intensidade, frequência e ocorrência, quanto pela sua ausência, podem causar sérios danos ao ambiente e impactos sobre a diversidade biológica e a saúde do ecossistema, colocando em risco os esforços de conservação (MUELLER- DOMBOIS e GOLDAMMER, 1990; SHLISKY et al., 2007; EFNCN, 2008).

De acordo com Mutch (2001), assim como os ecossistemas apresentam grandes variações do norte ao sul do Brasil, da mesma maneira variam os regimes de queima, que são determinados pelos padrões de ocorrência do fogo, extensão das áreas atingidas, severidade, frequência e efeitos ecológicos. No Brasil, os regimes de queima variam de intactos a degradados, dentro de um mesmo bioma, como no caso do Cerrado. De acordo com Shilisky et al.(2007), ainda não existem regimes de queima muito degradados no Brasil pois, apesar dos regimes estarem fora dos padrões esperados, eles ainda podem ser considerados como recuperáveis. Os efeitos negativos e positivos do fogo variam de acordo com o nível de degradação do ambiente. Sendo assim, na situação atual, em que os biomas

brasileiros se encontram em diferentes estados de degradação, mesmo regimes intactos do fogo podem, em certos níveis, ameaçar a diversidade biológica. Dessa forma, os regimes de queima devem ser determinados e implementados para a manutenção da diversidade biológica e da saúde ecológica (KOPROSKI, MANGINI e GOLDAMMER, 2010).

Para Coutinho (1990) e França (2000), entre 20 e 30% do Cerrado são queimados anualmente. A elevada incidência de fogo nesse ecossistema tem sido relacionada com efeitos prejudiciais ao ambiente, tais como: redução da diversidade; erosão e empobrecimento do solo; poluição atmosférica, mudanças climáticas em escala regional e global decorrentes das emissões de gases de efeito estufa, que influenciam o balanço radiativo e hidrológico e produzem efeitos importantes no equilíbrio climático e biogeoquímico do planeta (CRUTZEN e ANDREAE, 1990; MUELLER-DUMBOIS e GOLDAMMER, 1990; ANDREAE, 1991). Por outro lado, a completa exclusão do fogo também produz efeitos indesejáveis, como a redução de diversidade e alteração na composição florística e fisionômica da vegetação (PIVELLO e NORTON, 1996; MOREIRA, 1996; COUTINHO, 2000).

De acordo com Ramos-Neto (2000), existem poucas descrições dos regimes de queima em cerrados. França (2000), identificou que entre 70 a 75% da área queimada no Cerrado ocorreram no período seco. Para Ramos-Neto (2000), não se deve considerar um regime único para todas as áreas de cerrado, pois regiões próximas podem apresentar regimes de queima diferenciados, influenciados pela cobertura vegetacional e suas características climáticas e topográficas. No entanto, existe um consenso entre pesquisadores sobre a ocorrência da estação de queima entre os meses de maio e setembro-outubro. Coutinho (1990), considera possível a ocorrência de fogo no período úmido, principalmente em áreas com ausência de fogo ou chuva por longos períodos. Ramos-Neto (2000), identificou a ocorrência de fogo no período úmido no Parque Nacional das Emas, verificando que durante a época das chuvas existia uma grande variação na extensão da área queimada, sendo que a maioria dos incêndios atingia pequenas áreas, quando comparados com ocorrências em períodos de seca.