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CAPÍTULO 3 – A CULTURA ESCOLAR E O GINÁSIO DE APLICAÇÃO

3.5 O Grêmio Estudantil e o Clube de Ciências

O Ginásio de Aplicação funcionou desde sua fundação no mesmo prédio onde também funcionava a Faculdade Católica de Filosofia de Sergipe - FAFI. Os alunos do GA conviviam, então, no mesmo ambiente que os acadêmicos da FAFI. Esta proximidade entre os Ginásios e as Faculdades de Filosofia observou-se de forma mais abrangente em outros Estados do que uma mera aproximação física. O contato com professores, que em sua maioria também eram professores das Faculdades, fez despertar em muitos alunos a consciência crítica necessária para que se opusessem ao regime de repressão imposto a partir da Ditadura Militar.

A experiência do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CAP-UFRJ) é um exemplo dessa influência. Estudado por Abreu (1992), esta instituição vivenciou um período de grande efervescência política, especialmente na atuação de seus alunos. Por meio de um estudo histórico-sociológico sobre a instituição, a autora buscou compreender os mecanismos de formação de uma elite intelectual e de uma geração de guerrilheiros atuantes contra a repressão militar.

A participação crítica dos alunos despertada pelas atividades culturais e extra- curriculares, sua mobilização na Caixa Escolar e no Grêmio Estudantil, a formação universitária dos professores e a preocupação com a formação integral do jovem são alguns dos aspectos apontados pela autora como indicadores que notadamente influenciaram a ação política dos alunos formados pelo CAP-UFRJ. (ABREU, 1992)

No GA de Sergipe a atuação dos alunos era mais sentida nas atividades culturais e intelectuais, não se configurando propriamente em ação política engajada que desse sustentação a uma contraposição ao regime ditatorial de forma mais contudente. Segundo a professora Rosália Bispo “eles eram tão ocupados e tão convencidos que eram uma elite que não se envolveram. Eram muito jovens, também, né? Meninos que não tavam assim, politizados. O povo do Atheneu já estava politizado”. (SANTOS, 2008)

Na gestão da professora Rosália foi criado entre os alunos o Grêmio Estudantil do Ginásio de Aplicação. A atuação dos membros do Grêmio não estava ligada diretamente a ações de militância política, pois estas pressupunham uma contraposição à ordem vigente,

onde se observava a ausência de condições sociais e políticas que dificultassem o funcionamento dos estabelecimentos de ensino daquela época.

Os membros do Grêmio Estudantil do Ginásio de Aplicação não participaram de grandes movimentos políticos, mas foram solidários à causa dos alunos do Colégio Estadual Atheneu Sergipense que, na década de 1960, adotaram a greve como mecanismo de contraposição à repressão imposta pelo regime de governo instalado no Brasil e também em Sergipe.

Nós entramos em greve também. Eu era o presidente do grêmio. Nós entramos em greve por solidariedade, porque como nós éramos um bom Colégio do pessoal que tinha dinheiro, a gente não tinha o que reinvidicar. A gente tinha bebedouro, a gente tinha bons banheiros, a gente tinha aula [...] não faltava, a gente tinha excelentes professores, tinha todo o material de ensino. Então, não nos faltava nada! [...] Então, como não tínhamos motivo para entrar em guerra ou em greve, que era uma guerra na época, eu entrei em solidariedade. (BEZERRA, 2008)

Apesar de ser uma instituição particular, onde os alunos tinham todos os recursos disponíveis que davam subsídios para o desenvolvimento de sua aprendizagem, os membros do Grêmio do GA, liderados por seu presidente, Gélio Albuquerque Bezerra, sentiram a necessidade de participar deste movimento de greve dos estudantes secundarista em Sergipe, encabeçado pelos alunos do Colégio Atheneu na década de 1960.

E do capu do fusca de meu pai [...], eu no capu, na porta do GA, né! E fiz um discurso enorme para que a gente entrasse na guerra em solidariedade. Em votação [...], eu ganhei a votação e nós entramos em greve. Quando o GA estampou que eu iria fazer greve contra tudo, né!? E que eu fui [...] no auditório. Se encontrava para discutir os grêmios e os torneios de futebol de salão, [...] a gente ficava notado com outra qualificação. Então, a gente estabelecia respeito. O GA era menosprezado [...] tudo filhinho de papai. Tudo metido a rico! A gente era discriminado por essa elitização que a gente nascia [...] “estabilizou” na medida em que nós fizemos a greve de solidariedade, porque mesmo não precisando de nada, nós nos aliamos a eles. (BEZERRA, 2008)

O Grêmio Estudantil não pode ser apontado como única agremiação dos estudantes do Ginásio de Aplicação. Em decorrência da Orientação Educacional que, conforme já relatado, era desenvolvida pela professora Rosália Bispo dos Santos, o jovem era direcionado para desenvolver aptidões de seu interesse e, dessa forma, aproximar-se ou das ciências humanas ou das ciências exatas. Para os que declinavam para a área das ciências exatas, o Ginásio de Aplicação introduziu, através de seus professores, estudos e trabalhos ligados a diferentes disciplinas.

A preocupação com a aprendizagem prática dos alunos observou-se desde a fundação do Ginásio, onde o Mons. Luciano Duarte providenciou a instalação de um laboratório de Ciências. Segundo Menezes, as experiências realizadas no laboratório do Ginásio de Aplicação eram fundamentais para a articulação dos conhecimentos interdisciplinares adquiridos pelos alunos.

Eu não sei a sigla é Centro de Ciência Integrados, [...] não me lembro bem da sigla não! Mas, que era assim: tinha uma “ala” lá dentro do prédio, onde tinha esse laboratório experimental e que a gente ia muito para lá, né! Assim, como a gente tinha, vamos dizer não recordo que as outras escolas tinham isso, né! [...] para fazer as atividades tipo: você ver uma coisa da aula de Geografia e vai la ver que articulação [...] essa tem! Fazer o experimento não só da aula de Ciências. (MENEZES, 2008)

O centro a que Menezes se reporta é o CECINE – Centro de Ciências Integrados, criado a partir do Clube de Ciências que existiu dentro do Ginásio de Aplicação. Era para onde afluiam os alunos que não tinham habilidades de escrita literária, ou alguma outra habilidade artística, mas que apresentavam afinidade com outros campos do conhecimento.

Esta inovação do Clube de Ciências, reforçada pela apresentação dos trabalhos e experiências dos adolescentes estudantes do Ginásio de Aplicação, também se aproxima do que vemos hoje como prática corrente entre as instituições de ensino e que se denomina Feira de Ciências. Nestes eventos, os alunos são estimulados a desenvolverem projetos, os quais, durante a Feira, são apresentados e defendidos pelos alunos aos participantes do evento.

Segundo Soutelo (2008), neste Centro eram “realizadas experiências, se faziam palestras, exposições, e nós chegamos a criar [...] a partir do Clube de Ciências do GA [...] foi criado um no Colégio Patrocínio São José”. Ou seja, as experiências educacionais desenvolvidas no Ginásio de Aplicação já produziam seus frutos em outros estabelecimentos de ensino secundário da mesma época.