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2 OS PERCURSOS DE MERCANTILIZAÇÃO DA FINLANIDADE

2.1 IMPRESSÕES SOBRE A VIDA NA COLÔNIA ATÉ 1942

2.1.5 O início da prática comercial da hospedagem

A ideia embrionária de hospedagem remunerada foi desenvolvida com mais força por Toivo Uuskallio em Penedo diante da crise financeira na qual vivia a colônia. A

42 Segundo Eva Hildén (1989), os membros dessa diretoria eram: Vaino Nurmi; Toivo Asikainen; Erkki Lala; e Lauri Tammela

81 recepção de hóspedes se tornou uma opção para ajudar a amenizar a situação. Além do Casarão, há relato de um casal de imigrantes finlandeses que recebiam hóspedes em sua casa como uma alternativa econômica de sobrevivência. Contudo, não se sabe dizer ao certo de quem foi o protagonismo da atividade.

A primeira residência dos imigrantes finlandeses em Penedo, o Casarão, foi transformada em uma hospedaria. Eva Hildén (1989) relata que, inicialmente, quem gerenciava a Casa Grande como pousada era o casal Aura e Erkki Lalla. Além de pertencerem à comissão para o reequilíbrio financeiro de Penedo, o casal tinha experiência nesta área, por ter trabalhado nesse setor na Finlândia.

Naquele período, a hospedagem era vendida juntamente com os serviços de alimentação. Estavam inclusos na estada café da manhã, almoço e jantar (AMPULA, 1997; VALTONEN, 1998). Conta Hildén (1989) que a diária no Casarão era de dez mil réis por dia e que, em geral, os hóspedes gostavam dos quartos e da comida. Apreciavam principalmente a limpeza. Segundo a autora, a maior parte dos visitantes vinha das cidades com alta densidade demográfica. O motivo para se hospedarem em Penedo era a busca por um lugar tranquilo, para descanso.

Em 1934, o controle de Toivo Uuskallio sobre os imigrantes estava estremecido diante das dificuldades financeiras (HILDÉN, 1989; VALTONEN, 1998). Parte dos imigrantes começou a construir suas casas por conta própria e a sair do Casarão. A disponibilidade de quartos vagos no imóvel permitiu que a atividade de hospedagem fosse ampliada.

Nessa descrição sobre o início da prática de hospedagem em Penedo, cabe indagar, para melhor entendimento da questão: como os hóspedes encontraram Penedo? O que motivou a ida das pessoas ao local? Conforme nos diz Marc Boyer (1999), nenhum lugar é turístico por natureza; trata-se de uma construção cultural.

De acordo com o relato de Eila Ampula (2016), Toivo Uuskallio inicialmente captava pessoas para irem visitar Penedo. A escolha não era sem critérios. Segundo ela, Uuskallio procurava investidores para o projeto Penedo no Rio de Janeiro. Uma de suas práticas comuns era o envio dessas pessoas para conhecer a fazenda. Nas palavras de Ampula, “ele [Toivo Uuskallio] ficou mais de vinte anos lá pelo Rio e o trabalho dele era procurar pessoas influentes, pessoas ricas, e jogar aquele papo” (2016, p. 90).

Conta ela, em entrevista dada a Gustavo Praça, que Toivo Uuskallio era persuasivo e conseguia convencer as pessoas a dar dinheiro para a causa de Penedo. Um exemplo relatado é a história de um homem conhecido pelo nome de Cunha. Segundo

82 ela, Uuskallio o convenceu a dar tudo o que tinha de bens materiais e a ir morar em Penedo:

Tinha um tal de Cunha que era um homem muito rico e acabou dando tudo o que tinha. Não sei como começou, mas deu casas, terrenos, e acabou morando aqui com a mulher e três filhos e passando necessidade. Já morreram todos (AMPULA, 2016, p. 90).

Ainda sobre a questão da hospedagem, Eila Ampula faz uma denúncia:

Naquele Casa Grande, D. Liisa [esposa de Toivo Uuskallio] já começou a receber hóspedes pagantes. Só que, destes hóspedes, o Uuskallio já havia recebido o pagamento de antemão [pela hospedagem]. D. Liisa inventava pratos praticamente do nada. Durante anos, os mantimentos eram comprados fiado, no armazém do “Cesário”. Como diz Boris Casoy: “uma vergonha”. E assim se foram passando os dias (AMPULA, op. cit., p. 26).

No trecho acima, Ampula mostra a visão pejorativa que tinha de Toivo Uuskallio. A interpretação do caráter dele é um dos pontos sensíveis dos relatos de memória. Muitos não gostavam de Uuskallio por conta das questões referentes à distribuição de terras em Penedo e à devolução de quantias emprestadas para o projeto; outros, por acreditarem que ele privilegiava alguns grupos na colônia43.

Nilo Valtonen (1998) confirma em suas memórias que Toivo Uuskallio era o responsável por trazer hóspedes a Penedo. Ele afirma que Uuskallio solicitava com frequência empréstimos para diversas pessoas na cidade do Rio de Janeiro. Como forma de pagamento, enviava seus credores para se hospedarem no Casarão.

A esposa de Toivo Uuskallio, Liisa Uuskallio, relata de forma saudosa aquele período, mas reconhece que foi uma época de dificuldades:

Era tudo muito alegre, naquele tempo, sem cachaça, sem bebida. Vinha muita gente com crianças passar férias e, às vezes, ficavam quatro ou cinco num mesmo quarto. Hoje, é uma pessoa só no apartamento. Acho que, depois daquela luta toda que enfrentamos e que foi uma escola de vida para todos nós, todos, hoje, nós velhos [imigrantes que vieram em 1929], agradecemos, porque houve melhoras, uma vida mais fácil (UUSKALLIO, 1994, p. 139).

Ela conta que o primeiro hóspede do Casarão foi um senhor chamado Francisco Escobar Araújo, que era um militar de “alta patente”: general. A motivação da estada dele era emagrecer. Acreditava nisso por Penedo denominar-se uma colônia vegetariana. Liisa

83 Uuskallio o descreve como alguém “velho” e “gordo”. Depois que esteve ali pela primeira vez, manteve a frequência de suas estadas (UUUSKALLIO, op. cit.).

Sérgio Fagerlande (2007) discorda do protagonismo da Casa Grande na recepção de hóspedes. Ele afirma que a primeira pensão a funcionar na fazenda foi a do casal Emyl e Lydia Reiman. Foram um dos primeiros a sair do Casarão e a construir sua própria casa. Eles alugaram um dos seus dois quartos ao cônsul finlandês Kalle Aapro. Este trabalhava na embaixada da Finlândia no Rio de Janeiro. O autor não dá detalhes de como o cônsul achou os Reiman e porque decidiu se hospedar lá. Não existem também explicações sobre essas questões com relação aos demais hóspedes dos Reiman.

FIGURA 17

Supostos hóspedes em frente à casa dos Reiman. Fonte: Álbum Asikainen44.

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