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O laboratório didático de ciências na superação das visões distorcidas de

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CAPÍTULO 3. CIÊNCIA E TECNOLOGIA E DISTORÇÕES DO SENSO

3.5. O laboratório didático de ciências na superação das visões distorcidas de

Aprender pode se tornar mais prazeroso quando os conhecimentos prévios dos alunos são valorizados em sala de aula. Essa forma de aprender tão discutida atualmente faz uma crítica à modalidade de ensino tradicional presente no sistema educacional de boa parte das escolas da rede básica de ensino.

Pelizzari et al (2002) chama a atenção para o processo mecânico de aprender apenas por repetição que segundo ele não privilegia o contexto do aluno e nem tão pouco o conhecimento é construído. Apresentam a visão David Ausubel sobre o conceito de aprendizagem significativa que pode ser resumido em uma valorização daquilo que o aluno aprende fora do contexto escolar, ou seja, os conhecimentos prévios que os mesmos levam a escola e que contribuem para o seu aprendizado.

Por ser coletiva a elaboração do conhecimento na visão de sua teoria cognitiva e construcionista, Ausubel busca explicar como o ser humano consegue transformar e armazenar informações alinhando esses conhecimentos prévios na construção de novos conhecimentos.

Mas, para que essa aprendizagem significativa aconteça são necessárias duas condições: A primeira é que o aluno queira aprender. Não há como aprender

pelo outro. Se ele decidir memorizar, sua aprendizagem será apenas mecânica. A segunda é preciso que aquilo que ele quer aprender seja potencialmente significativo.

As proposições de Ausubel partem da consideração de que os indivíduos apresentam uma organização cognitiva interna baseada em conhecimentos de caráter conceitual, sendo que a sua complexidade depende muito mais das relações que esses conceitos estabelecem em si que do número de conceitos presentes. Entende-se que essas relações têm um caráter hierárquico, de maneira que a estrutura cognitiva é compreendida, fundamentalmente, como uma rede de conceitos organizados de modo hierárquico de acordo com o grau de abstração e de generalização.

As atividades experimentais realizadas nas escolas, muitas vezes não trazem esses elementos com significado para os alunos e nem tão pouco os mesmos se motivam a construir conhecimentos, mas apenas em memorizar e repetir procedimentos com intuito de provar a veracidade de uma lei. Nas universidades isso não é diferente. Boa parte dos laboratórios em áreas de ciências exatas segue esse ritmo com seus estudantes. São voltados apenas para o acúmulo de informações (CARVALHO et al,2010; CARVALHO et al, 2013).

A autora citada anteriormente faz menção direta às práticas experimentais no ensino de Física, trazendo classificações elaboradas por pesquisadores em ensino de ciências. (Pella, 1969 apud Carvalho, 2010) analisa as práticas experimentais de acordo com os graus de liberdade do professor em relação ao problema, a hipótese, ao plano de trabalho, a obtenção de dados e as conclusões de acordo com a tabela:

Quadro 4: Graus de liberdade do professor/aluno em aulas de laboratório

Fonte: Carvalho et al, 2010. P. 55.

GRAU I GRAU II GRAU III GRAU IV GRAU V

Problema P P P P A Hipóteses P P P A A Plano de trabalho P P A A A Obtenção dos dados A A A A A Conclusões P A A A A

Fazendo a análise dessa tabela, percebe-se que no grau I, o aluno só tem apenas a liberdade de obter dados numa atividade experimental, o restante é fornecido pelo professor. No grau II, o estudante consegue tirar as suas próprias conclusões a partir dos dados obtidos.

Mas, Carvalho dá ênfase nesse grau a uma mudança conceitual no problema proposto para o aluno. No grau III de liberdade, o professor não determina mais o plano de trabalho a ser realizado pelo estudante. Ele adquire autonomia para organizar sua própria metodologia na resolução do problema. No grau IV os estudantes elaboram as próprias hipóteses e todo resto. Eles recebem apenas o problema. E no grau V até o problema eles propõem e desenvolve todo plano de trabalho.

Trabalho semelhante ao citado anteriormente, é o de Borges (2002), que critica a forma como as atividades de laboratório vêm sendo utilizada nas escolas e nas universidades. Para ele, existem paradigmas impregnados na formação do professor conforme discutido no capítulo I desse trabalho, que contribui para que algumas visões apareçam em sua prática, o que distanciam aspectos relevantes na aprendizagem de ciências. Entre esses aspectos estão o grau de abertura, os objetivos da atividade e a atitude do estudante conforme quadro abaixo:

Quadro 5-Laboratório tradicional X Atividades investigativas

Aspectos Laboratório tradicional Atividades investigativas

Quanto ao grau de abertura

Roteiro pré-definido

Restrito grau de abertura

Compromisso com o resultado

Liberdade total no planejamento Objetivo da atividade Comprovar leis Explorar fenômenos

Atitude do estudante Compromisso com o resultado

Responsabilidade na investigação Fonte: (BORGES, 2002.p. 22) disponível em https://periodicos.ufsc.br/index.php/fisica/

Quanto ao grau de abertura no laboratório tradicional, o roteiro de atividades é definido pelo professor, e fica restrito a ele. As atividades são previamente elaboradas e o aluno precisa apenas repeti-las para comprovar leis científicas. Essa atitude por vezes retira a liberdade do aluno em discutir com o professor as estratégias de resolução da atividade proposta e o mesmo apenas repete procedimentos.

Já no laboratório por investigação na visão de Borges (2002), a proposta é que a haja liberdade no planejamento sem perder de vista a organização das atividades. Essa liberdade implica no diálogo com os alunos sobre que mecanismos, meios etc serão necessários para a resolução do problema proposto pelo professor que a priori não dispõe de uma solução rápida e imediata. É preciso articulação no planejamento para que ações sejam discutidas e articuladas com os alunos de forma que ambos sintam-se envolvidos no processo que será iniciado com a proposta do planejamento.

Quanto aos objetivos, o laboratório tradicional visa apenas comprovar leis científicas, sem mencionar quais foram as variáveis que estiveram presentes nos fenômenos, e quais as relações entre elas. Boa parte do ensino de Física ainda funciona dessa forma, não só no ensino básico, mas também no ensino superior. E por vezes perde-se a oportunidade de melhorar as compreensões de teorias bem como o processo histórico que lhes deram origem e assim a curiosidade é esquecida e consequentemente vários alunos não demonstram interesse pela ciência construída ao longo de anos.

Enquanto no laboratório por atividades investigativas, o principal objetivo é explorar em discussões a natureza dos fenômenos. E são nessas discussões que novas formas de ver a natureza respaldada pela teoria podem aparecer e viabilizar a participação ativa dos alunos no processo de formalização e elaboração do conhecimento científico. O potencial criativo dos alunos pode ser estimulado no ambiente escolar e a sala de aula transforma-se em um espaço dialógico-reflexivo, onde o professor tem o papel primordial entre o aluno e o conhecimento.

Quanto à atitude do estudante no laboratório tradicional, é perceptível que o mesmo possui apenas compromisso com o resultado obtido, sabendo muitas vezes de antemão o resultado da experiência realizada. No entanto, esse

procedimento não estimula a ação investigativa na busca de respostas para o fenômeno em estudo e o estudante torna-se passivo ao conhecimento apresentado. O professor é o detentor de todo o procedimento de experimentação e não sobra espaço para a argumentação do aluno no ambiente escolar.

No laboratório por investigação, o estudante inicia uma busca incessante por respostas para o fenômeno que se apresenta. Ele não possui de imediato as soluções que procura, pois necessita traçar um plano de ação para o problema proposto pelo professor. É nesse plano de ação que várias habilidades podem aparecer entre elas a autonomia, a segurança na execução atividade autorregulada, ou seja, a capacidade de gerenciar seu próprio aprendizado. Tais habilidades são necessárias para que o aluno construa sua capacidade argumentativa e crítica.

Em Carvalho et al (2010) percebe-se uma argumentação, próxima aquela que Borges (2002) apresenta, quando reconhece que as salas de aulas precisam ser problematizadas e as atividades investigativas devem se tornar constantes no ambiente escolar, sem fugir da realidade onde a escola está inserida. Nessa perspectiva, alternativas devem surgir para minimizar as práticas pedagógicas de professores orientadas pelos paradigmas de sua formação.

A autora supracitada anteriormente indica caminhos que viabilizam os processos de investigação científica a partir de características epistemológicas presentes implicitamente na ciência e na escola. Essas características podem ser potencializadas a partir de discussões de grupos que acreditam que a ciência precisa estar no meio social do indivíduo.

No quadro seguinte, Carvalho (2010) aponta as direções possíveis para que ciência e escola, numa relação de unicidade, colaborem para que o espaço escolar seja dinâmico e a cultura científica possa está presente no cotidiano do estudante.

Quadro 6 - O trabalho implícito com os aspectos do conhecimento

científico em sala de aula.

Na ciência Na escola

Situação problemática, que pode ter sua origem em outras investigações,

necessidades pessoais, tecnológicas etc.

Proposição de uma situação-problema para ser investigada, geralmente já elaborada pelo professor.

Construção de hipóteses para serem contrastada. Elaboração de estratégias de contrastação, incluindo, se

necessário, planejamento e realização de experimentos.

Construção de hipóteses, teste dessas hipóteses. Reformulação de hipóteses, observações de variáveis.

Interpretação dos resultados, a partir das hipóteses formuladas, dos conhecimentos teóricos e dos resultados de outras investigações.

Interpretação dos resultados, discussão do que foi observado, o que demandar relações como outros resultados e/ou novas análises e hipóteses.

Lado humano e vivo da ciência, relacionado a aspectos sociais e políticos e a sociedade e tecnologia.

Estabelecimento de relações entre disciplinas e conhecimentos.

Comunicação do trabalho realizado: encontros, intercâmbios, artigos e congressos.

Comunicação do trabalho em relatórios, discussão entre estudantes e

professores. Com uso de

argumentação, escrita com destaque para o lado social da construção do conhecimento.

Fonte: Carvalho et al (2010.p.117).

No próximo capítulo será apresentada a metodologia que constitui esse trabalho de investigação de campo, bem como o percurso utilizado para a investigação do problema inicial da pesquisa. Para isso tomamos como referencial os trabalhos de ensino por investigação de Borges (2002) e Carvalho et al (2010) que versam sobre a problematização em sala de aula bem como o ensino mediado pelo processo de investigação. Aspectos do laboratório investigativo proposto anteriormente serão utilizados nas atividades que compõem esse trabalho, bem como a utilização do Ciclo da Experiência de George Kelly, presente em seus trabalhos.

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