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Possíveis visões de ciência e tecnologia encontradas na literatura

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CAPÍTULO 3. CIÊNCIA E TECNOLOGIA E DISTORÇÕES DO SENSO

3.4. Possíveis visões de ciência e tecnologia encontradas na literatura

Durante um bom tempo ciência e tecnologia foram apresentadas na academia e no ambiente escolar de forma bem fragmentadas gerando uma compreensão não holística, mas apenas reducionista de seus conceitos. Essas concepções ainda permanecem fortes na estrutura curricular das escolas, e colaboram para a existência de uma visão por vezes equivocada do que vem a ser ciência e tecnologia e sua relação com o mundo.

Pérez et al (2001) e Cachapuz et al (2011) apontam que as possíveis visões deformadas de ciência e tecnologia são frutos de preconceitos concebidos durante o desenvolvimento do conhecimento. Elas fragmentam e reduzem

completamente em si as mesmas ideias do que é ciência e tecnologia ignorando as possíveis relações com o meio ambiente e a sociedade.

A própria formação do professor, por exemplo, pode colaborar para a propagação dessas distorções uma vez que suas crenças e opiniões são fortemente influenciadas pelos paradigmas de sua formação. Assim não é raro encontrar nas falas de professores de exatas, fragmentos fortes da crença da ciência empírica que aponta para a verdade absoluta.

3.4.1. Visão descontextualizada

Pérez et al (2001) e Cachapuz et al (2011) apontam que nessa visão a tecnologia é vista como mera aplicação dos conhecimentos científicos. Sendo assim, reduz de forma significativa o papel que a ciência e a tecnologia exerceram e exercem no processo de construção do conhecimento.

São esquecidas as complexas relações CTS e são proporcionadas imagens dos cientistas como se fossem seres extraordinários e dotados de super inteligência, enclausurados em torres de marfim e distantes das necessárias tomadas de decisão. Como reação pode-se cair em uma visão excessivamente sociológica da ciência que dilui por completo sua especificidade.

3.4.2. Visão empirista e ateórica.

Na visão empirista o papel da observação e da experimentação são “neutras”, ou seja, não são contaminadas por ideias novas sobre o fenômeno, esquecendo assim o papel essencial das hipóteses. Nessa visão, os conhecimentos provem apenas da experiência sensorial que é a base para compreensão da natureza e a aprendizagem é uma questão de “descobrimento” ou se reduz a prática “dos processos”, com omissão dos conteúdos.

3.4.3. Visão rígida.

Apresenta-se o “método científico” como um conjunto de etapas que se deve seguir mecanicamente. No ensino se ressalta o que se supõe ser um

tratamento quantitativo, um controle rigoroso etc., esquecendo ou inclusive rechaçando tudo o que implica invenção, criatividade, dúvida.

No polo oposto desta visão rígida e dogmática da ciência como descobridora da “verdade contida nos fatos”, se apresenta um relativismo extremo, tanto metodológico (“tudo vale”, não existem estratégias específicas no trabalho científico), como conceitual (não há uma realidade objetiva que permita contrastar a validade das construções científicas: a única base na qual se apoia o conhecimento é o consenso da comunidade de pesquisadores nesse campo).

3.4.4. Visão aproblemática e aistórica.

Os conhecimentos elaborados são apenas transmitidos sem mostrar quais foram os problemas que os precederam e quais foram os processos de sua evolução, as dificuldades etc., e menos ainda as limitações do conhecimento atual ou as perspectivas futuras.

Hoje, a própria escola básica, introduz a importância da resolução de problemas para o aprendizado da ciência como essencial na atividade escolar do estudante, tendo em vista a real necessidade do conhecimento ser problematizado e servir de base para novas descobertas.

3.4.5. Visão exclusivamente analítica.

Ressalta a necessária parcialização dos estudos, seu caráter simplificativo, e esquece os esforços posteriores de unificação e de construção de corpos coerentes de conhecimentos cada vez mais amplos, o tratamento de problemas de fronteira entre distintos domínios que podem chegar a compreensão do todo.

Contra essa visão parcializada têm sido elaboradas propostas de educação integrada das ciências, que tomam a unidade da matéria como ponto de partida, esquecendo que o estabelecimento de tal unidade constitui uma conquista recente e nada fácil da ciência.

3.4.6. Visão acumulativa linear.

Os conhecimentos aparecem linearizados, ignorando as crises, as remodelações profundas. Ignora-se, em particular, a descontinuidade radical entre o tratamento científico dos problemas e o pensamento ordinário. Nessa visão são esquecidas as relações do conhecimento com o contexto histórico e social dos indivíduos, o que o torna muitas vezes distante da realidade do estudante.

3.4.7. Visão individualista, “velada”, elitista.

Os conhecimentos científicos aparecem como obras de gênios isolados, desconhecendo-se o papel do trabalho coletivo, dos intercâmbios entre equipe. A visão individualista se apresenta associada, algumas vezes, a concepções elitistas de ciência.

Ainda, apresenta o trabalho científico como um domínio reservado a

minorias especialmente dotadas de inteligência, transmitindo expectativas negativas para a maioria dos alunos, com claras discriminações de natureza social e sexual (a ciência é apresentada como uma atividade eminentemente “masculina”).

Assim não são realizados esforços para tornar a ciência acessível (começando com tratamentos qualitativos, significativos), nem por mostrar seu caráter de construção humana. O erro do aluno é um equívoco e não uma possibilidade de reflexão para que a aprendizagem ocorra.

Os conhecimentos ainda são apresentados como claros, óbvios, “de sentido comum” esquecendo-se que a construção científica parte precisamente do questionamento sistemático do óbvio.

Cachapuz et al (2005) afirma que é preciso que essas visões sejam superadas e que a comunidade científica como um todo perceba a ciência e a tecnologia enquanto construção humana. Mas, para que isso ocorra o caminho é longo e pode ser superado através da educação científica e tecnológica crítica.

No ensino de Física e Química, é comum o uso do laboratório escolar com o intuito de verificar as leis naturais. Às vezes os resultados dos experimentos, já

são antecipados para os alunos e como consequência disso não existem as discussões prévias para a execução de um experimento proposto pelo professor, cabendo apenas à repetição de regras e procedimentos (BORGES, 2002).

Esse exemplo evidencia que o laboratório escolar pode ser um dos meios para problematização e a investigação, uma vez que o mesmo propicia a argumentação, a crítica e autorregulação da aprendizagem dos alunos, tão necessários quando se pensa na ciência e na tecnologia do mundo contemporâneo. A seguir, será discutida a importância do laboratório didático como meio para ajudar a superar algumas das visões distorcidas da ciência e da tecnologia.

3.5. O laboratório didático de ciências na superação das visões distorcidas de

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