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O ler e escrever na escola: sob o olhar da academia

No documento CD 1 PED Elida Maria F Costalonga (páginas 62-66)

A área de alfabetização, conforme se constata na literatura, tem sido um local de encontro de muitos estudiosos: pedagogos, psicólogos, professores, fonoaudiólogos, pediatras, lingüistas, semiólogos, enfim, profissionais e pesquisadores de diversas áreas têm debruçado sobre a problemática do ensino e da aprendizagem da escrita. Em referência à relação criança/linguagem escrita, quer se trate de aquisição do objeto-linguagem escrita, quer se considere transmissão, construção, assimilação, ou apropriação, para além da

episteme que informa a abordagem que cada um desses conceitos permite a todos, estão no círculo do debate frente à problemática dos múltiplos processos envolvidos na entrada da criança no mundo da escrita.

A interpretação e explicação desse processo têm mobilizado muitas inteligências, muitos olhares, muitas horas de dedicação e estudo, dentre os quais destacamos GONTIJO (2001), 2003), na discussão sobre novas perspectivas para a alfabetização de crianças; LEMOS (2005) e ABAURRE (2005) acerca da aquisição da escrita; NASCIMENTO (2005) que discute alfabetização como objeto de estudo numa perspectiva processual ; ROJO (2005) e KLEIMAN (2005) que debatem as controvertidas relações entre Alfabetização e Letramento. No que diz respeito especificamente aos trabalhos com textos na escola, gostaríamos de destacar as contribuições de MUGRABI (2002, 2003, 2004) e MUGRABI e FAUNDEZ (1999, 2003) os quais, em oposição as abordagens que, no ensino da linguagem escrita privilegiam as unidades micro (sílaba, palavra, frase), consideram o texto como a unidade de base de toda comunicação, posição também adotada por nós, e em razão disso, defendem uma abordagem da língua41 em que a construção de textos assim como os impactos de situações de comunicação deveriam ser priorizados como objetos de ensino.

Sabemos que as contribuições sobre o assunto não se esgotam nas obras/autores aqui citados. Entendemos que a riqueza do debate está na diversidade das abordagens que se põe na mesa, sempre significando tentativas de interpretação do real, espaço em que são geradas as condições de base para instauração do diálogo. Falamos de diálogo como de debate de idéias, a partir de distintos pressupostos teórico-práticos, de diferentes pontos de vista. Uma academia que se abre à vida da vida (Morin, 1999a) e ao conhecimento do conhecimento (Morin,1999b) não pode prescindir do debate plural em que semelhantes, mas também divergentes posições epistemológico-metodológicas sirvam para dimensionar nossos conhecimentos, mas também nossa ignorância científica.

Além dessas contribuições citadas, vários outros olhares, de diferentes pontos de vista, têm se voltado para as questões correlatas ao ler e escrever nos primeiros anos da escolarização infantil. Porém, no que diz respeito à formação do professor que trabalha

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nesse campo, apesar se identificar no meio acadêmico um crescente interesse no assunto, de acordo com estudo realizado por André (2002, p.13) pouco se sabe sobre os avanços nas práticas.

a análise do conteúdo de 115 artigos publicados em dez periódicos nacionais, de 284 dissertações e teses produzidas nos programas de pós-graduação42 em educação e de 70 trabalhos apresentados no GT Formação de Professores da ANPED, na década de 90, permitiu identificar uma significativa preocupação com o preparo do professor para atuar nas séries iniciais do ensino fundamental”[...] “as diversas fontes analisadas mostram um excesso de discurso sobre o tema formação docente e uma escassez de dados empíricos para referenciar práticas e políticas educacionais.

Segundo Hannah Arendt (2003, p.238), “a escola é a instituição que interpomos entre o domínio privado do lar e o mundo para fazer a transição da criança – da família para o mundo”. O papel do professor, nesse contexto deveria ser, colocar-se face à criança, e, em nome da escola e dos adultos que já estão nesse mundo há mais tempo, “dizer-lhe: Isso é o nosso mundo.” Considerando-se que, na nossa sociedade, esse encontro professor/criança, pode dar-se na Educação Infantil ou diretamente no Ensino Fundamental, onde quer seja, o professor que se depara com a criança que chega pela primeira vez na escola, agregado ao compromisso, enquanto parte da comunidade adulta, de dizer à criança: “este é o nosso mundo”, cabe-lhe a dupla tarefa de dizer-lhe, em nome de uma sociedade letrada: Isso é a Escrita: um sistema complexo de símbolos e signos. Ele faz parte do processo de pensamento, conhecimento e comunicação dos humanos entre si, na História.

No entanto, não têm sido bem assim que as coisas têm funcionado. Quando se trata de discutir práticas de ensino da língua materna, nossa tendência inicial é focarmos o professor. Esquecemos que, particularmente no que diz respeito à alfabetização, temos algumas tradições na organização interna das escolas brasileiras que antecedem e ultrapassam o ensino-aprendizagem da linguagem escrita propriamente dito, as quais, tanto os alunos, como os professores, quando chegam na escola, ali já encontram em funcionamento. A situação encontrada e que faz parte da tradição da escola, já diz algo das concepções e sentidos que se configuram o ensino-aprendizagem da escrita que ali se realiza. Em outras palavras, a forma como a escola se organiza para alfabetizar, revela o seu olhar institucional a sua concepção de educação e sociedade, e, por conseguinte o

compromisso que assume (e em que medida e/ou em que direção) com as crianças que ali se encontram e tantas outras que chegam a cada ano.

Antes da escola, a chegada de crianças no mundo, através do nascimento, reafirma de modo permanente para a sociedade novas (e velhas) exigências educacionais, dentre as quais destacamos a necessidade que se renova e se complexifica de cuidar política e socialmente da formação profissional dos professores da Educação Básica, notadamente daqueles que atuam na infância. Nesse sentido, lembra Arendt (2003) que em todas as utopias políticas desde a Antiguidade parece natural iniciar um novo mundo, através da educação, com aqueles que são por nascimento e por natureza novos. Nessa perspectiva, a criança não é apenas um novo ser, mas um ser humano em formação: nesse sentido, ao mesmo que ela partilha o estado de vir-a-ser comum a todos os seres vivos. Porém, enquanto humano, seu devir histórico é diferenciar-se, qualitativamente , na medida em que através da educação e de sua ação na cultura, sua natureza vai se transformando em uma natureza historicizada, socialmente constituída.

Enquanto os gestores de políticas públicas e grupos de especialistas e professores discutem, dada a provisoriedade da infância – uma etapa temporária e de transição para a vida adulta - muitas crianças estão chegando à adolescência, sem que a escola lhes tenha assegurado os conhecimentos de leitura e escrita, de que necessitam para prosseguir, incluindo-se com êxito nos graus subseqüentes da escola e na vida profissional e social. Uma evidência desse fato pode ser observada no crescente número de “classes de aceleração”. Parece-nos, que, quando os especialistas e administradores se dão conta de que elas não são mais crianças, organizam “classes de aceleração” como se desenvolvimento humano pudesse ser mecanicamente controlado, e de fora, apressado. Contraditoriamente, tal medida político-pedagógica, acaba por expor, com maior clareza,, as fragilidades de diversas origens do Sistema Educacional Brasileiro.

As dificuldades de leitura e escrita, historicamente, “um incômodo” na Educação Básica, têm chegado à Educação Superior, e em alguns casos, até na pós-graduação. Parece-nos haver um certo consenso geral de que todo o Sistema Educacional desse país precisa passar por mudanças profundas.

Sabemos que a escola brasileira e a educação ali praticada têm se confrontado com enormes dificuldades de acompanhar e de participar da produção de conhecimentos no mundo. Um fato, porém, não pode ser ignorado por todos os educadores: a escola brasileira ainda não conseguiu se organizar adequadamente para “responder a necessidade de formar seres humanos para uma sociedade em constante mutação. De modo mais específico, podemos dizer que o desenvolvimento das Ciências da Educação não tem produzido o impacto que poderia alcançar na construção de uma Educação mais eficaz e mais eficiente.” (Faundez e Mugrabi, 2003, p. 1- tradução nossa).

6. A escola, o ler e escrever do ponto de vista dos discursos avaliadores

No documento CD 1 PED Elida Maria F Costalonga (páginas 62-66)