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O LIVRO EM GERAL 1 Noção e definição de livro e de documento

O livro e o documento

21 O LIVRO EM GERAL 1 Noção e definição de livro e de documento

1. Definição geral

Livros. Fica entendido que este termo genérico abrange os manuscri- tos e impressos de toda espécie que, em números que alcançam vários milhões, foram compostos ou publicados na forma de volumes, periódi- cos e publicações de arte, constituindo em seu conjunto a memória ma- terializada da humanidade, na qual, dia a dia, foram registrados os fatos, as ideias, as ações, os sentimentos e os sonhos, quaisquer que sejam, que tenham impressionado o espírito humano.

Os livros tornaram-se, por excelência, os organismos de conservação, concentração e difusão do pensamento, sendo necessário considerá-los como instrumentos de pesquisa, cultura, ensino, informação e recreação. Ao mesmo tempo, são o receptáculo e o meio de transporte das ideias.

O desenvolvimento da produção, o preço barato e a excelência das edições, a variedade dos assuntos tratados, a reimpressão de obras im- portantes, em curtos intervalos de tempo, a partir de conjuntos cada vez mais completos e mais bem ordenados, são circunstâncias que contri- buem para o aumento da importância do papel social do livro.

Ao lado dos livros propriamente ditos, há uma multidão de documen- tos de toda espécie que não foram publicados ou que não se destinam à publicação.

A definição mais geral que se pode dar de livro e documento é: um su- porte, feito de determinado material e com determinada dimensão, even- tualmente resultado de determinada dobragem ou de montagem em rolo, onde se colocam os signos representativos de certos dados intelectuais. 2. Os documentos menores

O menor documento é uma inscrição, o marco miliário que leva o nome de uma localidade e a distância em quilômetros. O poste que mos- tra ‘pare’ ou redução de velocidade, uma simples figura convencional da sinalização (círculo, triângulo, barreira fechada). E, menos que isso, tem-

-se o sinal que os escoteiros traçam a giz nas árvores ou nas pedras; em papel é o cartão de visita, um nome às vezes seguido de um título profis- sional e um endereço; o selo postal é minúsculo e menores ainda são os cupons de desconto e todas as etiquetas pequenas.

3. O bíblion

A partir de agora existe um termo genérico (bíblion, bibliograma ou documento) que abarca ao mesmo tempo todas as espécies: volumes, brochuras, revistas, artigos, mapas, diagramas, fotografias, estampas, pa- tentes, estatísticas, até mesmo discos fonográficos, negativos de vidro e películas cinematográficas.

O bíblion será para nós a unidade intelectual e abstrata, mas que pode- mos encontrar, concreta e realmente, assumindo diferentes formas. O bí- blion pode ser imaginado como se fosse o átomo (íon) em física, a célula em biologia, o espírito em psicologia, o agregado humano (o sócion) em sociologia. O átomo propiciou uma representação cada vez mais precisa, com base na qual se realizam todas as pesquisas e discussões. (Foi Bohr quem apresentou a primeira imagem do átomo.)

a) No cosmos (conjunto das coisas) o livro ou documento assume lu- gar entre as coisas corpóreas (não incorpóreas), artificiais (não naturais), e que tem uma utilidade intelectual (não material).

As criações materiais são produtos ou meios de produção. Há: a) os meios de produzir coisas úteis e consumíveis (as máquinas) ; b) os meios para produzir fenômenos naturais, abstração feita de qualquer preocupa- ção com a utilidade (os aparelhos) ; c) os meios de medir os fenômenos (os instrumentos). O livro é um meio de produzir utilidades intelectuais.

b) As coisas mantêm com os documentos relações de diversas espécies: 1° Relação entre coisas com significado e coisas sem significado, o que constitui o próprio fundamento da documentação.

2° As próprias coisas tratadas como objetos de documentação quando, na condição de espécime ou amostra, figuram nas coleções documentá- rias (museus, exposições).

3° As coisas criadas, modelos e mecanismos para demonstração cien- tífica, educativa ou publicitária.

4° As marcas de todos os tipos colocadas nos objetos, que servem para sua identificação e sinalização.

5° A aplicação por analogia de métodos da documentação à adminis- tração das próprias coisas (documentação administrativa).

c) Os escritos têm a propriedade expressa no adágio scripta manent verba volant. Os escritos permanecem e as palavras voam. Mas, do ponto de vista do rigor do pensamento, pode-se propor em termos latinos este outro adágio, em que os termos se distribuem gradativamente

Verba divagantur Scripta concentrant Constructiones coordinant Mechanica logicant *

1) A palavra pode divagar. Palavras, o vento as leva. Como a palavra é sucessiva, ela pode ser traduzida simplesmente por uma série de pon- tos, cuja ligação material, por ser simplesmente sonora, é tão leve que ela pode flutuar em todos os sentidos.

2) Os escritos concentram o pensamento de quem os produz. Eles estão na superfície. Nós os lemos, e a eles podemos voltar, de trás para * As palavras divagam

Os escritos concentram As construções coordenam / As máquinas são lógicas. Ver os quatro parágrafos seguintes. [n.e.b.]

a frente. As ligações lógicas da verdade, se não forem reais, podem ser facilmente detectadas.

3) As construções, estereogramas tridimensionais, coordenam estri- tamente as ideias. Pelas omissões e ênfases, pelas três direções da ideia, que devem ser concordantes, que permitem um controle fácil, já fica mais difícil aventurar-se em desdobramentos superficiais e mal estudados.

4) As máquinas, enfim, são lógicas por excelência. Elas não saberiam entrar e se manter em movimento a não ser pelo funcionamento rigoro- samente exato, concordante e simultâneo de todas suas peças.

d) O documento oferece da realidade uma imagem de sexta derivação. Temos, de fato, os seguintes termos intermediários: 1° o mundo (ou a realidade em si); 2° os sentidos do homem que percebem o mundo exata e completamente ; 3° a inteligência, que elabora os dados sensoriais; 4° a língua, instrumento social de comunicação; 5° a ciência, ou conhecimen- tos coletivos; 6° o documento composto pela inteligência e para expres- sar a ciência.

Cada um de seus intermediários é uma causa de deformações e atritos que absorvem a energia intelectual.

Todo esforço deve ser feito: a) para suprimir ou atenuar as deforma- ções e os atritos intermediários; b) para criar meios de perceber ou repre- sentar a realidade.

4. Definições literárias de livro

O homem passa, o livro permanece. – O livro leva às gerações futuras luz, con- solação, esperança e força (Milton). – A imprensa é a artilharia do pensamento (Rivarol). – O livro forma um círculo distinto, de modo algum barulhento, mas sempre vivo, na intimidade do qual se repousa à vontade (Montaigne). – Os livros realizam a conversa impressa (Ruskin). – Os livros são amigos mudos que falam aos surdos (provérbio flamengo). – A realização humana mais poderosa, a mais vantajosa para uma sociedade, é colocar ao alcance de todos os tesouros arma- zenados nos livros (Carnegie). – A literatura é o sopro vital da civilização, o sal do corpo social (Wells). O livro é a paixão de espalhar suas ideias pelo mundo e compartilhá-las com todos os homens (Suarès).

O que é o livro para nos atrair a tal ponto que por ele nos apaixonamos quando o conhecemos? Um livro é uma voz que ouvimos, uma voz que nos fala, que conquista nossa confiança, principalmente quando se insinua mais calmamente, mais intima- mente; é o pensamento vivo de uma pessoa distante de nós no espaço e no tempo. É uma alma, uma alma da qual ninguém pode prever o destino e a duração, que muitas vezes vai perto ou distante, não sabemos aonde, no universo conhecido, comuni- car-se com outras almas, levar-lhes suas belezas e também suas feiuras, a verdade e o erro, ah!, com frequência. Uma alma que prende, quase sempre, por causa de seu contato intimo, a sós, com a outra alma que ela toca, capaz, por conseguinte, de torná-la magnífica e sublime, perversa ou desprezível. E, portanto, a alma que reclama cuidados delicados, alma que exige atenções especiais de todos aqueles que a cercam e lhe proporcionam seu entusiasmo. (Gabriel Beauchesne.)

O maior personagem que, há três mil anos, talvez faça o mundo falar dele, alter- nadamente, como gigante ou pigmeu, orgulhoso ou modesto, ousado ou tímido, que sabe assumir qualquer forma e todos os papéis, capaz alternadamente de es- clarecer ou perverter os espíritos, de inquietar ou aplacar uma paixão, artesão de facções ou conciliador de partidos, verdadeiro Proteu que nenhuma definição pode capturar: eis o livro. (Egger.)

A humanidade é um homem que vive sempre e que aprende sem cessar. (Pascal.) – In bibliothecis loquuntur defunctorum immortales animae. [As almas imortais falam nas bibliotecas.] (Plínio o Velho.) – Nullus esse librum tam malum ut non aliqua parte prodesset. [Nenhum livro é tão ruim que não tenha alguma parte

útil.] (Plínio o Velho.) – Libri muti magistri sunt. [Os livros são mestres silenciosos.] (Aulo Gélio.)

212 Análise das características do livro e do documento

Da imensa quantidade de livros diferentes existentes, nós extraímos por analogia a noção do livro em geral.

Acontece com o livro o mesmo que acontece com as máquinas. Nos primeiros tempos, cada máquina era considerada como um todo, com- posta de partes que lhe eram próprias. Com raras exceções, os olhos do espírito ainda não distinguiam, nas máquinas, o conjunto de precisão que designamos hoje pelo nome de mecanismo. Uma máquina era um moi- nho, a moagem era um processo, e nada mais. É que, na realidade, é preci- so que o pensamento sobre um assunto dado já tenha avançado bastante para estar em condição de distinguir o que é geral do que é específico naquele assunto; é a primeira distinção entre pensamento científico e pensamento comum (Reuleaux, Cinématique, p. 10.)*

É preciso considerar as características do livro da mesma maneira pela qual o naturalista considera as espécies animais, vegetais e minerais. A concepção de um tipo geral e abstrato, o livro, se destaca da mesma maneira como a zoologia, a botânica e a mineralogia imaginam o animal paralelamente aos animais, a planta paralelamente às plantas, o mineral paralelamente aos minerais. Deve-se examinar sucessivamente:

1° os elementos constitutivos do livro ou documento; 2° suas diversas partes e sua estrutura;

3° as espécies ou famílias de obras.

O exame desses dados tem sua razão de ser em si mesmo e para qual- quer finalidade. Também serve de base para as operações de colação, de bibliografia, de catálogo e de classificação e lhes dá um fundamento cien- tífico e racional.

A determinação das características de um livro é indispensável para reconhecê-lo e identificá-lo. Essa determinação individual somente se conseguirá fazer em função das características gerais.

212.1 Características gerais

O livro pode ser visto de acordo com as seguintes características: 1° a verdade (o verdadeiro); 2° a beleza (o belo); 3° a moralidade (o bem); 4° a originalidade; 5° a clareza (compreensibilidade); 6° o valor econômico (comerciabilidade); 7° a novidade.

Os documentos têm em comum com a palavra a possibilidade de não exprimir a verdade. Eles têm, ademais, a possibilidade de se apresentar sob aparências enganadoras, atribuições falsas a autores errados ou pseu- dônimos, datas falsas, indicações fraudulentas de editor, de impressor, de edição, etc. O erro voluntário e a mentira voluntária podem ser come- tidos pelo autor. A propagação de documentos apócrifos, inventados ou adulterados, e a difusão intencional de informações mentirosas podem ser atos de terceiros. Ambas são suscetíveis de causar dano à verdade em si e às pessoas, físicas ou jurídicas, prejudicando seu prestígio.

A novidade marca toda a documentação, bem como toda a vida con- temporânea. O jornal, a telegrafia sem fio e o filme correm contra o tem- po para oferecer ao público insaciável o máximo de informações no me- nor prazo possível.

* Reuleaux, F. Cinématique: principes fondamen-

taux d’une théorie générale des machines.

212.2 Qualidades e defeitos dos livros

As qualidades de um livro-documento correspondem aos três critérios superiores: verdadeiro, belo e bom. Diz-se, por exemplo, que um balanço é verdadeiro ou falso, as falsas cartas pontifícias, a boa imprensa boa, os belos livros.

Em um conjunto de livros, as variações individuais oscilam em torno de uma média (flutuações). Um grande número tem um valor médio: são pouco numerosos os verdadeiros livros ruins, muito raros os livros supe- riores. Em um gráfico ou tabela estatística encontramos a curva em forma de sino ou curva de frequência (polígono de Quetelet).

Os defeitos de um livro são: erros, peso, forma desordenada de expo- sição, confusão do essencial com o acessório, lacunas e desatualização.

212.3 O livro, capital e ferramenta

O livro é um capital de ideias que se acumula e se mantém em reserva. O homem acumula ideias e fatos, assim como acumula produtos.

O livro é uma arma, uma ferramenta.

“Martinho Lutero, que julgamos mal porque teimamos em conside- rá-lo um teólogo, foi sobretudo um patriota alemão, o maior ideólogo contestado desse país. Ele maneja o panfleto em lugar da cimitarra, pois conhece a arte de armar os nobres contra os clérigos.” (Peladan.)*

212.4 Unidades, múltiplos e submúltiplos

A unidade física, a matéria do documento, é marcada tanto pela con- tinuidade material de sua superfície (p. ex: a superfície de uma carta, de um jornal), quanto por uma ligação material entre várias superfícies (p. ex: as folhas encadernadas de um livro), ou por uma ligação imaterial (p. ex: os diversos tomos de uma mesma obra).

A unidade intelectual é o pensamento.

Como em todas as coisas, podemos distinguir também no documento: 1° a unidade; 2° as partes; 3° sua totalidade; 4° uma pluralidade de unida- des; 5° a totalidade de unidades.

Vimos, acima, o que se pode considerar como unidade intelectual. Existem múltiplos e submúltiplos das unidades materiais e intelectuais.

Toda coisa considerada em sua própria ordem é posta no degrau de uma escala cujos dois extremos são o nada de um lado e a totalidade do outro. Na escala dessa série, escolhe-se mais ou menos arbitrariamente uma unidade de onde se possa proceder nas duas direções, ascendente e descendente. No que concerne à documentação, a unidade será o livro, seus múltiplos serão os conjuntos formados pelo livro, como as coleções (bibliotecas), e seus submúltiplos serão as divisões, como suas partes (capítulos, etc).

212.5 Equação do livro

De forma condensada e se referindo às seguintes tabelas de elementos e da estrutura do livro, a definição geral pode ter a forma de uma equação enumerando os fatores:

Onde: livro = elementos (elementos materiais + elementos gráficos + elementos linguísticos + elementos intelectuais) : Estrutura (encaderna- ção + frontispício + preliminares + corpo da obra + tabelas + apêndices).

* Joséphin Peladan (1858–1918). Escritor fran- cês. [n.e.b.]

E (M + G + L + 1) L = ——————————— S (r + f + p + c + t + a)

Expressando, assim, a determinação de um espaço (lugar) e de um tempo (data) e os dados relativos ao autor, a equação se completa deste modo:

E L = —— × e × t S

Francesco Lumachi (Nella repubblica del libro, Firenze, F. Lumachi, 1907, p. 190) apresenta para o livro a seguinte fórmula, que não é com- pleta:

de: A = autor; t = tipografia; e = editor; l = livreiro; P = público; L = livro.

22 ELEMENTOS QUE COMPÕEM O LIVRO E O