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3. METODOLOGIA DA PESQUISA

3.3. O “locus” da pesquisa

Esta pesquisa foi realizada em uma escola pública estadual localizada no interior do Estado de São Paulo. A escola oferece o ciclo II do ensino fundamental (6º ao 9º anos) e Ensino Médio regular e técnico, através da parceria com uma escola técnica estadual que oferece, no período noturno, cursos descentralizados de “Técnico Jurídico” e “Técnico em Informática”.

Em termos de estrutura, a escola constitui-se como a maior unidade de ensino do município, com três prédios exclusivos para atividades didáticas e mais um prédio administrativo. Possui biblioteca referência no município com cerca de vinte mil títulos a disposição da comunidade local. Possui laboratório de ciências,

que atualmente está desativado. No espaço físico funciona uma sala de vídeo. Possui duas quadras poliesportivas, refeitório e palco para apresentações culturais.

Em termos de recursos humanos, a escola possui uma diretora e uma vice diretora, três professores coordenadores pedagógicos, uma gerente educacional (antigamente denominada secretária) dez agentes de organização escolar e uma professora que ocupa a função de “Mediador de Conflitos”, além de uma equipe docente constituída de 28 professores efetivos e um número variável de professores contratados. A escola atualmente ministra aulas para quase mil alunos entre os dois níveis de ensino, nos três períodos letivos.

Distante dos áureos tempos, em que o ensino oferecido pela unidade escolar era referência entre os municípios da região, nas últimas décadas, concomitantemente ao processo de democratização do acesso a educação promovido pelos agentes políticos em todo o Brasil, a escola começou a acumular diversos problemas e desafios a ela imputados, bem como teve que se adaptar ao atual cenário social e político.

Assim, como as demais escolas públicas estaduais de São Paulo, essa unidade escolar passou por transformações politico/pedagógicas, dentre elas a recente política de matrículas dos estudantes. Por uma nova regulamentação estadual, as matrículas dos alunos deveriam obedecer à área de “jurisdição da escola”. Assim, após a implantação da norma, a escola, por estar localizada na periferia da cidade, passou a atender muitos alunos com perfil socioeconômicos caraterizado pela alta vulnerabilidade social familiar, enquanto as outras duas escolas do município atendiam, na grande maioria, alunos com menor vulnerabilidade social. Além deste fato, concorreu para o crescimento dos desafios do ensino o fato de a escola ser a única entre três municípios vizinhos a oferecer o ensino médio no período noturno (reconhecidamente caracterizado por maiores taxas de evasão) e a única escola pública a oferecer o ensino prisional (em quatro unidades prisionais das cidades circunvizinhas) e a educação de jovens e adultos.

Os problemas surgiram na década de 90, mais precisamente, a partir do ano de 1998, ano marcado pela criação do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – SARESP. Nos primeiros anos de implantação

desta política de avaliação em larga escala, juntamente com a política de meritocracia e responsabilização dos resultados, as escolas passaram a ser oficialmente e extra-oficialmente classificadas em termos do rendimento dos seus estudantes em provas realizadas ao final de um ciclo de ensino. Esta unidade escolar, embora lograsse êxito em diversos projetos educativos, ganhasse prêmios em concursos educativos e formasse os estudantes para a continuidade dos estudos, alguns deles em universidades públicas, quando comparada com outras unidades escolares do município, no que se refere ao índice obtido por ela nas provas, acabava na grande maioria das vezes ocupando o último lugar, principalmente motivado pela alta taxa de repetência e evasão escolar.

O impacto causado pela incidência dos sistemas de avaliação foi bastante negativo, durante anos, pois além da natural decepção da equipe escolar quando do anúncio do resultado, havia também uma espécie de preconceito criado na sociedade local, que passou a designar a escola como “escola de malandro”. Como efeito negativo disso, escolas do município passaram a transferir alunos cujo comportamento ou rendimento escolar estivessem abaixo do esperado, para esta unidade escolar. Os próprios alunos da escola internalizaram essa condição e ajudavam a sustentar a imagem negativa da escola perante a sociedade.

Os resultados também vieram acompanhados de muita pressão dos órgãos superiores ligados à secretaria da educação. Por vários anos a escola foi incluída na lista das “escolas prioritárias”, termo usado para designar aquelas escolas que sofreriam uma intervenção do estado na gestão educacional. Os profissionais da escola passaram por diversos cursos, oficinas e sua ação educativa passou a ser acompanhada pelos agentes ligados à secretaria da educação.

Este cenário começou a ser revertido recentemente, a partir do ano de 2009, quando a escola obteve o menor índice do rendimento da sua história (IDESP = 1,9). No ano seguinte ao do resultado negativo, a escola, a exemplo de muitas outras escolas do estado, passou a se preocupar em elaborar e desenvolver estratégias para lidar com esses sistemas de avaliação em larga escala de maneira a conseguir obter maiores índices nos exames de avaliação realizados pelo governo. Nesta época a escola e seus professores passaram a realizar atividades curriculares voltadas para o (supostamente) aperfeiçoamento de habilidades e competências

importantes para melhorar o desempenho dos estudantes nas provas. A ação pedagógica de muitos professores (principalmente os de língua portuguesa e de matemática) passaram a repercutir essa preocupação com os resultados dos exames, mais do que com o cumprimento das atividades pedagógicas do currículo. Entre as ações constavam a aplicação de simulados, a realização de encontros com a família para conscientizar os filhos da importância da prova, da iniciativa de premiar alunos que obtiverem bons resultados. No ano seguinte ao de 2009, o primeiro resultado positivo criou uma condição favorável para que esta prática continuasse na escola.

Paralelamente a isso, os projetos (muitos deles interdisciplinares) nunca deixaram de ser realizados. Os professores da unidade sempre tiveram bastante liberdade para desenvolverem ações diferenciadas, apoiados pela diretoria de ensino e pelos supervisores. A escola continuou participando de projetos educativos e de concursos educativo/culturais, inclusive com alunos ganhando prêmios.

Foi nessa época, que a unidade escolar foi convidada a integrar o quadro de escolas participantes do Projeto “Observatório da Educação com Foco em Matemática e Iniciação à Ciência”. O convite deveu-se a dois fatores: a) a escola ter obtido índices baixos de desempenho nas avaliações realizadas; b) o fato de o professor de Física da escola integrar o grupo de pesquisa do Pólo UNESP junto ao Observatório e, em contato com a participação de outras escolas, propor o convite para a unidade escolar na qual encontra-se lotado.

Atualmente, a escola tem conseguido melhorar os índices obtidos nas últimas edições da avaliação em larga escala. De 2009 até 2013, a escola atingiu a meta estipulada pelos proponentes do SARESP. No entanto ainda resta a discussão com os professores da mudança de uma condição de trabalho criada nestes últimos anos caracterizada por uma aceitação resignada aos procedimentos e critérios de execução das avaliações externas e uma aparente mudança de direção na sua prática pedagógica, voltada mais para a obtenção de resultados positivos nas avaliações externas e menos na aprendizagem dos alunos e no cumprimento do currículo. A análise das entrevistas realizadas com as professoras participante dessa pesquisa, apresentadas na próxima seção, nos ajudará a compreender melhor esse fenômeno.