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Capítulo II – A INTEGRAÇÃO DA ECONOMIA DO ANTIGO NORTE DE GOIÁS À

2.3 As modificações na estrutura produtiva

2.3.3 O mercado de trabalho agrícola

O avanço e a consolidação da pecuária como atividade fundamental da economia norte goiana, juntamente com as alterações na base técnico-produtiva de algumas áreas tiveram efeitos diretos sobre as relações de trabalho local. Essas transformações ocorreram com pesados custos sociais, dentre os quais, verificaram-se, com frequência, a expulsão dos produtores de suas terras e a proletarização do trabalhador rural.

Desse modo, simultaneamente às modificações ocorridas na organização agrária do norte de Goiás houve alterações nas relações de trabalho. Como ressaltou Graziano da Silva (1978, p. 96), “dentre as transformações que o capital tende a provocar na agricultura à medida que vai se apossando do processo de produção está a criação de um contingente de trabalhadores assalariados”. De fato, a análise da questão da mão-de-obra, segundo as diversas categorias de pessoal ocupado, revelou alterações bastante significativas na composição desse contingente no setor agropecuário, com elevação do número de trabalhadores assalariados e parceiros, bem como tendência a diminuição dos empregos familiares.

Como pode ser observado na Tabela 2.24, a categoria “responsáveis e membros não remunerados da família” era numericamente a mais expressiva em todo o período, apesar de mostrar participações relativas declinantes. Tais dados indicam não apenas a importância fundamental desse tipo de trabalho na agricultura regional, mas também o baixo desenvolvimento das forças produtivas, materializado em relações de trabalho não tipicamente capitalistas.

Tabela 2.24 - NORTE DE GOIÁS: Pessoal Ocupado - 1970-1985

Categorias 1970 % 1975 % 1980 % 1985 %

Responsável e membros não

remunerados da família 136.171 89,2 153.017 80,6 178.988 75,6 177.497 74,1 Empregados Permanentes 9.272 6,1 11.558 6,1 27.817 11,7 22.776 9,5 Empregados Temporários 5.775 3,8 18.891 10,0 26.976 11,4 27.956 11,7 Parceiros 885 0,6 4.762 2,5 1.942 0,8 4.966 2,1 Outra Condição 595 0,4 1.575 0,8 1.089 0,5 6.289 2,6 TOTAL 152.698 100 189.803 100 236.812 100 239.484 100 Fonte (dados brutos): IBGE - Censos Agropecuários (1970, 1975, 1980, 1985). Elaboração própria.

Apesar da predominância do trabalho familiar, o trabalho assalariado elevou significativamente sua participação na composição da mão-de-obra regional, passando de pouco mais 15 mil empregados, em 1970, para mais de 50 mil, em 1985. O grande destaque foi para os empregados temporários, que na década de 1970 apresentaram crescimento de 16,7% ao ano e trajetória ascendente em todo o período.

A crescente demanda de empregados assalariados temporários relacionava-se à expansão das áreas produtivas dos estabelecimentos agrícolas, uma vez que a pecuária quase não necessitava de trabalhadores dessa categoria. Assim, se em 1970 os empregados temporários representavam 3,8% da mão-de-obra agrícola da região, após a expansão da agricultura mercantil esses trabalhadores ampliaram sua participação para mais de 11%. Contudo, o baixo crescimento verificado entre 1980 e 1985 sinalizava para o uso mais intensivo de técnicas agrícolas e de mecanização, diminuindo ou até mesmo eliminando parte dos trabalhadores temporários.

No que diz respeito ao trabalhador assalariado permanente, ainda que fosse verificada a relação de livre compra e venda da força de trabalho, dadas as incipientes relações capitalistas de produção, o que prevalecia eram variadas formas de submissão do trabalho ao capital, como o agregado, o colono, o morador, o “vaqueiro” etc. A demanda por esse tipo de trabalhador era mais comum na pecuária, uma vez que as grandes extensões de terras requeridas para essa atividade possibilitavam a permanência de antigos produtores, sem que houvesse a expropriação completa do trabalhador. Os assalariados permanentes que de fato vendiam sua força de trabalho estavam relacionados a um contingente de mão-de-obra mais especializada, em condições de executar tarefas relacionadas com operação de máquinas e a administração dos estabelecimentos. Esse tipo de trabalhador era encontrado, principalmente, nas grandes propriedades de lavoura.

A parceria alternou períodos de expansão e retração da força de trabalho. Segundo Graziano da Silva (1978), embora a parceria não fosse uma relação de trabalho tipicamente capitalista, sua expansão estava relacionada à diminuição de assalariados permanentes nos estabelecimentos rurais, uma vez que eles e seus dependentes se encarregariam do processo produtivo. Isso pode ser comprovado com os dados da Tabela 2.24, pois nos períodos de baixo crescimento ou diminuição dos empregados permanentes (1970-1975 e 1980-1985) os trabalhadores parceiros cresceram a taxas expressivas (40% e 20,7% ao ano, respectivamente). Por outro lado, entre 1975 e 1980, período em que os empregados permanentes cresceram 19,2% ao ano, os parceiros acusaram crescimento negativo de 16,4% ao ano. Houve casos, ainda, em

que a parceria se apresentou sob a forma de pequena produção camponesa, relativamente independente, onde o proprietário da terra se encarregava da venda do produto do parceiro.

Por fim, os empregados enquadrados na categoria “outra condição” não fornecem elementos suficientes para se fazer uma análise detalhada do tipo de trabalhador que a compunha. Informações constantes dos Censos Agropecuários, do IBGE, diziam respeito às pessoas cujo regime de trabalho diferia dos grupos anteriores, tais como agregados, moradores etc.

Conforme mencionado acima, acredita-se que muitos desses trabalhadores foram classificados como empregados assalariados permanentes, em virtude das fracas relações capitalistas de produção. Entre 1970 e 1980, tiveram participação insignificante, não perfazendo 1% do total de trabalhadores pesquisados. De modo geral, seguiram a mesma tendência dos trabalhadores parceiros e o movimento inverso dos trabalhadores assalariados permanentes, ou seja, entre 1970/1975 e 1980/1985 cresceram 21,5% e 42% ao ano, respectivamente. Porém, entre 1975 e 1980, a taxa de crescimento foi de -7,1% ao ano. Note que em 1985 a elevação do número de trabalhadores na categoria “outra condição” foi expressiva, passando a representar 2,6% do total, ultrapassando os trabalhadores parceiros.

Em suma, o aumento do trabalho assalariado (permanente ou temporário) foi tomado como um dos possíveis indicadores de um processo capitalista de produção, indicando um aumento do número de pessoas totalmente despossuídas dos meios de produção. Ainda assim, prevaleciam as relações de trabalho não tipicamente capitalistas, como o trabalho familiar, a parceria, os moradores, etc.