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Capítulo 2 O Esporte e o Lazer como Direitos Sociais

2.3. O Ministério do Esporte: em que base se constituiu?

A criação do Ministério do Esporte foi envolvida por contradições e disputas, apresentando aspectos positivos e negativos. Como já tratado em tópicos anteriores, o setor esportivo é constituído por vários grupos, sendo estes marcados por diferenças acerca das abordagens ideológicas, filosóficas e políticas do fenômeno esportivo. De um lado, os grandes empresários na defesa do interesse privado, do esporte de alto rendimento, do esporte espetáculo, e do lazer na visão mercadológica, visando unicamente o lucro; do outro, um grupo constituído na defesa do interesse público, do esporte e do lazer enquanto direitos sociais, por tanto, entendendo-os como de responsabilidade do Estado. E ainda, diante de toda essa disparidade, houve disputa pela titularidade do Ministério do Esporte entre os partidos políticos - Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e Partido dos Trabalhadores (PT), dado que podemos confirmar na citação que segue.

Especificamente na área do esporte e lazer, vamos encontrar um ministério fatiado entre as forças do PT e do PCdoB com seus modos de governar, inviabilizando internamente a condução de uma política cultural unitária, com disposição coletiva para o enfrentamento dos interesses dos grandes empresários do esporte que, como aves de rapina, se apropriam dos parcos recursos destinados à pasta. Dessa forma, essas forças apresentam-se sem disposição para enfrentar um modo de governar, cujas práticas políticas estão conduzindo a destruição de instâncias partidárias e o aparelhamento de órgãos do governo pelos interesses de um ou outro partido (TAFFAREL e SANTOS JÚNIOR, 2009, p. 8-9).

Em meio às disputas estabelecidas, a pasta do Ministério do Esporte foi entregue ao comando do PCdoB, que destinou à época a pasta ao deputado federal pelo Distrito Federal membro do PCdoB, Agnelo dos Santos Queiroz Filho. Esse parlamentar apresentava certo envolvimento com as questões ligadas ao esporte que chegavam a Câmara e ao Congresso. O mesmo permaneceu a frente do Ministério do Esporte até o ano de 2006. Com a sua saída, quem assumiu foi o então Secretário Executivo do Ministério do Esporte, Orlando Silva, também membro do PCdoB, que permaneceu até outubro de 2011. O atual ministro do Ministério do Esporte é o deputado Aldo Rebelo (PCdoB), que assumiu o cargo devido o Orlando Silva ter sido acusado de corrupção. Mais adiante trataremos dessa situação.

Ao mesmo tempo em que a criação de um ministério específico para discutir o esporte, com orçamento próprio, reforça a concepção de que o esporte e o lazer são de responsabilidade do Estado, e isso reflete de forma extremamente positiva na sociedade, a falta de infraestrutura e os orçamentos insuficientes refletem de forma negativa. Essas

situações ficaram expressas nas dificuldades para efetivação das políticas de esporte e lazer, assim como nas disputas internas para aceitação de alguns dos programas e projetos do ministério.

O PT ficou com a coordenação de uma secretaria, a Secretaria Nacional de Desenvolvimento de Esporte e Lazer - SNDEL, quem a assumiu a época foi o prof. Lino Castellani Filho (2003-2006), acompanhado por militantes do PT que possuíam experiências em administrações populares. Quem o sucedeu foi Rejane Penna Rodrigues, também membro do PT.

[...] se por um lado, a pluralidade de interesses constitui-se como força propulsora do movimento de institucionalização e universalização do esporte, por outro, configura-se, também, como um fator desvirtuador do fenômeno esportivo, reduzindo-o, muitas vezes, a mero instrumento para a realização de fins externos a ele, os quais, no limite, podem comprometer sua própria existência. Nessa trajetória, a presença do Estado não é uma presença monolítica, unidirecional ou coerente. Ao se ocupar do esporte, o Estado incorpora, em sua atuação, as tensões e contradições que permeiam a instituição esportiva, além de se apresentar como um espaço no qual o esporte estabelece diferentes padrões de relacionamento com outras instâncias de poder, também organizadas no interior da esfera pública. Tais variações têm inspirado diferentes abordagens relativas à ação do Estado no setor esportivo (LINHALES, 1996, p. 24).

As reflexões de Linhales se fazem presentes nas disputas internas que se estabeleceram no Ministério do Esporte no momento de elaboração e implementação dos programas e projetos desse ministério. Os dirigentes ligados ao PCdoB compreendiam que o Ministério do Esporte deveria ter apenas um programa social, que seria o Programa Segundo Tempo, a fazer presença no plano plurianual 2004-2007 denominado de ―Brasil: um País de Todos‖. No entanto, os dirigentes do PT que coordenavam a SNDEL queriam apresentar também o Programa Esporte e Lazer da Cidade – PELC. Após muitos embates, os petistas conseguiram fazer com que o referido programa também fosse apresentado pelo Ministério do Esporte. De acordo com Castellani Filho (2007, p. 01), ―O PELC teve seu nascimento anunciado – para efeito de presença no plano plurianual 2004-2007 [...] – no último minuto da data estabelecida pelo Ministério do Planejamento [...]‖.

No entanto, da forma como trata o referido autor, ao nosso entendimento, o embate político e de interesses particulares das forças políticas presentes no Ministério do Esporte tinha apenas começado.

O esforço feito para nascer foi apenas uma pequena amostra daquele que precisou se desenvolver para não sucumbir diante da vontade ministerial de

dar vida a apenas um projeto social que viesse a demarcar, de forma inequívoca, a presença de uma determinada força política à frente do Ministério do Esporte que não aquela responsável pela sua elaboração e execução. Se não isso, como explicar que um programa voltado exclusivamente para jovens no âmbito escolar20 ganhasse prioridade junto a um outro que abarcava todos os segmentos etários, envolvidos em ações intergeracionais, nos próprios lugares onde construíam suas vidas? (CASTELLANI FILHO, 2007, p. 01, grifos do autor).

A disputa política já se faz presente há muito tempo nos espaços que o esporte ocupa tanto no que se refere ao interesse público como ao privado. No embate dessas disputas, a criação do Ministério do Esporte trouxe também mudanças positivas em alguns órgãos que debatem o rumo do esporte no nosso país. Estamos nos referindo a mudanças na composição do Conselho Nacional de Esporte, que fez com que esse órgão se tornasse uma instância mais democrática, abarcando os diferentes setores da sociedade civil que tenham relação com o esporte. Dentre as mudanças, uma delas foi a inclusão da presença do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte – CBCE, entidade que discute o esporte em todas as suas dimensões. A composição do CNE ficou sendo a seguinte:

I. Ministro de Estado do Esporte – presidente; II. Secretário-Executivo do Ministério do Esporte; III. Secretário Nacional de Esporte de Alto Rendimento; IV. Secretário Nacional de Esporte Educacional;

V. Secretário Nacional de Desenvolvimento de Esporte e de Lazer; VI. Representante do Comitê Olímpico Brasileiro – COB;

VII. Representante do Comitê Paraolímpico Brasileiro – CPB; VIII. Representante da Comissão Nacional de Atletas – CNA;

IX. Representante do Fórum Nacional de Secretários e Gestores Estaduais de Esporte e Lazer;

X. Representante dos Secretários e Gestores Municipais de Esporte e Lazer; XI. Representante dos Clubes Sociais;

XII. Representante do Conselho Nacional de Educação Física – CONFEF; XIII. Representante do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte – CBCE; XIV. Representante da Comissão Desportiva Militar Brasileira – CDMB;

XV. Representante da Organização Nacional de Entidades Nacionais Dirigentes de Desporto – ONED;

XVI. Representante da Confederação Brasileira de Futebol – CBF; e

XVII. Seis Representantes do desporto nacional, a serem indicados pelo Ministro de Estado do Esporte.

Como é possível percebermos, essa composição abrange representantes das entidades ligadas ao esporte nas suas diferentes dimensões, porém é preciso ter conhecimento que se tem presente forças que são contrárias e que, para defender os interesses de forma corporativa, estabelecem disputas acirradas pelo poder, principalmente voltadas ao esporte de alto rendimento, com o foco nos interesses econômicos. Segundo Linhales (1996, p. 18), ―A trajetória do esporte é, marcadamente, influenciada por variados resultados, decorrentes de conflitos protagonizados por diferentes atores sociais, dentre eles, o Estado‖.

No nosso entendimento, a criação do ME se apresentou como um aceno na direção de atender as reivindicações históricas da classe trabalhadora. Apesar dos avanços significativos acontecidos no âmbito do esporte e do lazer no nosso país, temos a lamentar alguns fatos por demais comprometedores na forma de fazer política que envolve inclusive o Ministro do Esporte Orlando Silva (PCdoB). No passado mês de outubro, tornaram-se públicas uma série de denúncias vinculadas com a existência de favorecimentos ilícitos na hora de assinar convênios com Organizações Não Governamentais (ONGs), prestadoras de serviços para a execução de programas do ministério. As mesmas fazem referência ao desvio de verbas públicas, que estaria acontecendo desde o ano de 2008, de acordo com investigações desenvolvidas pelas autoridades policiais.

A mídia em geral começou a divulgar denúncias e cenas de acusações de desvio de verbas públicas, que segundo os denunciantes, estaria sendo transferidas do ME para ONGs, dirigidas por membros do próprio PCdoB. Em matéria divulgada pelo jornal Folha de São Paulo21, intitulada ―Programa dá verba federal a ONGs ligadas ao PCdoB‖, é apresentado que já em 2008, por conta dessas acusações, as suspeitas de favorecimento do partido tinham sido encaminhadas à CPI das ONGs no Senado, mas por conta do governo ter maioria, as investigações foram travadas.

Outro caso também dessa mesma natureza, afirma a reportagem, foi identificado no interior de São Paulo com a ONG Bola pra Frente, que é dirigida por Karina Valéria Rodrigues, ex-jogadora da seleção brasileira de basquete e também filiada do partido do até

21 Informação retirada da matéria publicada no jornal Folha de São Paulo, caderno de políticas, página A4, em 17 de outubro de 2011.

então Ministro do Esporte. As investigações realizadas demonstram que a referida ONG recebeu um repasse de 8.5 milhões do programa do ME denominado Segundo Tempo.

O valor repassado para a ONG administrada por uma filiada ao partido era superior à soma dos repasses feitos pelo ME no mesmo período a 23 prefeituras do estado de São Paulo. A mesma reportagem diz que em abril do ano passado, acusações da mesma natureza, envolvendo filiados ao PCdoB e repasse do programa Segundo Tempo, foram à tona pela operação desenvolvida pela polícia civil do Distrito Federal – Operação Shaolin - quando foram presos cinco suspeitos de envolvimento com os desvios de verbas públicas.

Nesse ano de 2011, exatamente no mês em que estávamos concluindo nossos estudos, a revista Veja, do dia 17 de outubro, divulgou uma reportagem cujo teor se referia a uma acusação feita por parte de um dos acusados na Operação Shaolin, realizada no ano de 2010. O policial militar João Dias Ferreira (também filiado ao PCdoB), acusa Orlando Silva de participar diretamente de um esquema de desvios de recursos através do mesmo programa e também de repassar a maioria das verbas públicas para ONGs administradas por pessoas pertencentes a seu partido político. O então ministro, nesta mesma data, em entrevista coletiva a imprensa, negou as acusações e afirmou serem elas ‗mentiras e calúnias‘, além de apresentar as medidas adotadas para a apuração de todos os fatos; ele solicitou ao ministro da Justiça abertura de inquérito pela Polícia Federal, a mesma ação foi realizada junto a Procuradoria Geral da República, solicitou audiência junto a Comissão de Ética Pública da Presidência da República22.

Várias outras denuncias de irregularidades nos convênios dos programas do Ministério do Esporte foram feitas pelos veículos de imprensa após esta que nos referimos anteriormente. Vale ressaltar que tudo isso está acontecendo em meio à construção de dois megaeventos esportivos que serão sediados no nosso país, a Copa do Mundo FIFA 2014 e os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos Rio 2016, e que também então envoltos de diversas polêmicas nacionais e internacionais. Enfim, as defesas públicas proferidas pelo ministro não impediram que sua reputação fosse atingida nacional e internacionalmente e que sua força política fosse diminuindo, então, o mesmo acabou sendo levado a deixar a pasta; conforme já foi dito anteriormente, no dia 31 de outubro do corrente ano, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB), assume a pasta de ministro do Ministério do Esporte.

22 Informações divulgadas na matéria ―A verdade será estabelecida‖ do sait oficial do ME, 17 de outubro de

2011. Disponível em < http://www.esporte.gov.br/ascom/noticiaDetalhe.jsp?idnoticia=7606> acesso 18 de outubro de 2011.

Pelas circunstâncias desse processo está acontecendo concomitante com o momento em que estamos concluindo nosso estudo, a discussão foi pautada aqui a título de informação apenas, pois não temos como realizar uma análise crítica apurada dos fatos que literalmente, está acontecendo. Mesmo reconhecendo as limitações supracitadas, chama a atenção que a pessoa indicada para substituir Orlando Silva no ME seja do mesmo partido – PCdoB. Ao pertencer a esse mesmo partido, pressupõe-se que a forma de fazer política mantenha a mesma perspectiva.

Outro fato que nos chamou atenção foram os três novos nomes dos secretários para compor a pasta, apresentados no dia 14 de novembro do ano corrente pelo atual ministro. Para ocupar a secretaria executiva foi nomeada a economista Paula Pini23, que desde 1998 ocupa o

posto de especialista para o desenvolvimento urbano no Banco Mundial. De acordo com a reportagem do jornal Folha de São Paulo24, o ministro em entrevista citou a experiência de

Paula Pini na área de mobilidade urbana como um dos critérios para a nomeação e afirmou que "Vários dos projetos que ela coordenou no banco estavam relacionados à mobilidade urbana, que é o que vamos precisar para a Copa e para as Olimpíadas".

Para a chefia da assessoria internacional, Aldo Rebelo nomeou o diplomata Carlos Henrique Cardim, que há poucos meses era embaixador do Brasil na Noruega e Islândia. Para ocupar a Secretaria Nacional de Esporte, Educação, Lazer e Inclusão Social foi nomeado o vice-almirante reformado Afonso Barbosa, afastado da Marinha desde 2007.

A mesma reportagem trazia a informação de que Cardim e Barbosa trabalharam nos governos de José Sarney (1985-1990), Fernando Henrique Cardoso (1995-1998 e 1999-2002) e Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006 e 2007-2010), e também que Afonso Barbosa ocupava, até a indicação, um cargo na diretoria da Bunge Brasil. E afirmava que, de acordo com o ministro, os três são ligados ao PCdoB, mas nenhum é filiado ao partido. A reportagem também ressaltava as palavras do ministro em relação às nomeações: "Para as nomeações eu segui critérios técnicos, políticos, administrativos, de capacidade intelectual, de experiência de vida, de compromisso com o interesse público e também de afinidade pessoal‖.

Na nossa avaliação, todos eles focados na Copa 2014 e no desenvolvimento do esporte de alto rendimento apenas.

23 De acordo com reportagem do sait oficial do Ministério do Esporte, a referida economista foi nomeada, mas

por questões pessoais não tomou posse, quem assumiu seu lugar foi Luis Fernandes – o mesmo foi secretário-

executivo do Ministério da Ciência e Tecnologia (2004/2006) e presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) de 2007 a 2011. Disponível em: < http://www.esporte.gov.br/ascom/noticiaDetalhe.jsp?idnoticia=7862> Acesso em 07 de dezembro de 2011.

24 Reportagem do jornal Folha de São Paulo divulgada no dia 14 de novembro de 2011, intitulada ―Aldo Rebelo

troca cúpula do Ministério do Esporte‖. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/1006477-aldo- rebelo-troca-cupula-do-ministerio-do-esporte.shtml> Acesso em 15 de novembro de 2011.