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3 Modelação numérica e estimativa de emissões

3.1 O modelo meteorológico MM5

O modelo Fifth Generation NCAR/Penn State Mesocale Model, vulgarmente denominado MM5, é um modelo meteorológico não hidrostático, com coordenadas sigma

terrain-following, destinado a simular ou prever circulações atmosféricas à escala regional

(Dudhia, 1993). Este modelo foi desenvolvido pelo National Center for Atmospheric Research (NCAR), nos Estados Unidos da América, como um modelo comunitário de meso-escala, o qual tem sido continuamente melhorado e testado pelos seus utilizadores, quer nas universidades, quer em laboratórios governamentais. Os melhoramentos incluídos ao longo do tempo no modelo reflectem-se, hoje em dia, na sua capacidade de executar

nestings múltiplos, assumindo dinâmica não hidrostática, permitindo a assimilação de

dados nas 4 dimensões, e incluindo uma miríade de opções físicas de cálculo da camada limite, parametrização de cúmulos, esquemas radiativos, esquemas explícitos de humidade, entre outros (URL 2).

A informação necessária para a aplicação do MM5 refere-se a dados de topografia e uso de solo, análise meteorológica em grelha proveniente de um modelo de escala global ou regional (vento, temperatura, humidade relativa, pressão média ao nível do mar, entre outros parâmetros meteorológicos) e dados meteorológicos observados (radiossondagens e dados de superfície). O modelo é constituído por vários módulos que têm como finalidade transformar dados existentes em diferentes bases, de terreno e meteorológicas de escala global, em formato requerido pelo modelo MM5.

A Figura 3.1 resume de forma esquemática os módulo numéricos que constituem o sistema MM5. O programa TERRAIN interpola os dados de topografia e uso do solo para a grelha de cálculo especificada, na projecção geográfica que melhor se adequa à região do globo onde se pretendem os resultados de simulação. O prognóstico a ser elaborado pelo módulo meteorológico tem de incluir condições iniciais e fronteira, usualmente resultantes de modelos de previsão numérica globais. Estes dados deverão ser interpolados horizontalmente para os níveis isobáricos da grelha anteriormente calculada. Esta etapa é executada através do programa REGRID. Contudo, frequentemente esta interpolação não fornece o detalhe necessário, e os dados meteorológicos interpolados podem ser melhorados com observações da rede de estações superficiais e de radiossondagens. Atendendo a que o modelo MM5 utiliza coordenadas verticais sigma é necessário interpolar verticalmente os dados meteorológicos, fornecidos em níveis isobáricos, para as coordenadas sigma (programa INTERPF). Finalmente, o módulo meteorológico MM5 resolve numericamente as equações da conservação da quantidade de movimento, massa, energia e humidade, fornecendo como resultados campos tridimensionais de temperatura, velocidade e direcção do vento, humidade relativa, pressão ao nível do mar e altura geopotencial. TERRAIN REGRID INTERPF pregrid regridder MM5 Definição de domínios Dados meteorológicos Interpolação à malha do MM5 Conversão de coordenadas verticais TERRAIN REGRID INTERPF pregrid regridder MM5 Definição de domínios Dados meteorológicos Interpolação à malha do MM5 Conversão de coordenadas verticais

A descrição anterior pretende apenas resumir a interligação entre os vários módulos usados no sistema de modelação MM5. Para se poder compreender melhor as necessidades de dados de entrada associadas aos módulos que compõem o sistema MM5, e às opções possíveis de tomar na sua execução, ir-se-á aplicar maior detalhe na sua descrição.

O programa TERRAIN interpola horizontalmente a topografia e as classes de uso do solo a partir de dados globais em grelha latitude-longitude para os domínios de meso-escala seleccionados. Para tal, há que definir todos domínios de meso-escala a considerar em cada corrida, ou seja, as malhas de grelha grosseira e de grelhas de maior resolução (finas), e de que forma elas irão interagir posteriormente na simulação de prognóstico meteorológico. Esta interacção entre domínios pode ser unidireccional ou bidireccional. Na primeira a informação do domínio de resolução grosseira é passada ao domínio de maior resolução através das condições fronteira impostas a este, enquanto que na interacção bidireccional, para além da passagem da informação através das condições fronteira há uma substituição dos resultados obtidos no domínio mais bem resolvido pelos resultados do domínio menos bem resolvido sobre as áreas que possuem em comum. Este programa também calcula alguns campos de constantes necessários para o sistema de modelação: latitude e longitude, factores de escala dos mapas associados aos domínios e parâmetro de Coriolis.

Tabela 3.1: Fontes de dados de elevação do terreno*

Resolução Fonte de dados Cobertura

1 grau (111,0 km) PSU/NCAR GLOBAL

30 min. (55,0 km) PSU/NCAR GLOBAL

10 min. (18,5 km) USGS GLOBAL

5 min. (9,25 km) USGS GLOBAL

2 min. (3,70 km) USGS GLOBAL

Mosaicos de 30 segundos

(0,925 km)** GTOPO30 pelo USGS

GLOBAL (33 mosaicos: 40º lon x 50 º lat ou

60º lon x 30 º lat)

*excepto para os dados de mosaico de 30 segundos (GTOPO30), a reconstrução de dados a partir de dados originais foi previamente executada.

**Para mais detalhes com respeito a GTOPO30 ver, http://edcdaac.usgs.gov/gtopo30/gtopo30.asp

Sistematizando, este programa é composto por quatro partes:

1. Dados de entrada que se constituem a partir de bases de dados existentes (ver Tabela 3.1);

2. Interpolação dos dados anteriores em latitude/longitude para a resolução de cálculo dos domínios seleccionados.

3. Ajustamento da interface de nesting e feed back (retro-alimentação);

4. Ficheiros de saída com a elevação de terreno, uso do solo e outros dados terrestres em formato do MM5.

Após este passo, segue-se a aplicação do módulo REGRID. Neste, os dados meteorológicos globais são lidos e transformados num formato intermédio através do subprograma pregrid. Seguidamente, o programa regridder interpola para a grelha do MM5 as variáveis meteorológicas necessárias ao funcionamento do modelo MM5, segundo o método escolhido pelo utilizador e usando a informação previamente calculada pelo programa TERRAIN. Os parâmetros meteorológicos cujos campos deverão fazer parte obrigatoriamente dos ficheiros de entrada do submódulo regridder são a temperatura, as componentes horizontais do vento, a humidade relativa, a altura dos níveis de pressão, a pressão ao nível do mar, a temperatura superficial do mar (SST) e os dados relativos à cobertura de neve (opcional).

O facto de este módulo se apresentar dividido em duas partes torna o MM5 bastante versátil em relação aos dados meteorológicos de entrada originados por modelos globais, quer sejam eles resultantes de modelos climáticos globais, modelos numéricos de prognóstico ou dados de reanálise. Para tal, substitui-se o programa pregrig por outro adequado à fonte de dados com interesse de forma a obter o formato intermédio necessário ao programa regridder. Esta característica modular permitiu desenvolver a interface utilizada na aplicação dos resultados do modelo de circulação global como gerador de condições iniciais e fronteira ao modelo MM5, na avaliação do impacte das alterações climáticas em Portugal que se irá desenvolver no Capítulo 6.

O programa INTERPF transforma os dados de análise/previsão meteorológica na forma adequada para o modelo de meso-escala, isto é, converte os dados armazenados em níveis de pressão para os níveis sigma utilizados pelo modelo MM5. Para tal, é necessário recorrer à interpolação vertical, ajuste físico dos campos e alteração do formato dos dados. O procedimento corrente deste módulo numérico consiste em calcular a pressão à superfície, seguida de uma interpolação das variáveis descritas em coordenadas de pressão para coordenadas sigma hidrostáticas, em que as variáveis u, v e humidade relativa se relacionam linearmente com a pressão enquanto que a temperatura potencial é linear com o logaritmo natural da pressão. Neste sistema de coordenadas verticais, os níveis sigma junto ao solo tendem a seguir o terreno enquanto que para os níveis mais elevados tendem a aproximar-se das superfícies isobáricas.

De forma a minimizar o ruído das condições iniciais remove-se a divergência média integrada, reduzindo movimentos verticais falsos, possivelmente introduzidos nos dados meteorológicos durante o processo de análise dos dados. Seguidamente, calcula-se o estado base, necessário para o cálculo dos níveis sigma não-hidrostáticos, a partir de algumas constantes. Para tal é necessário indicar previamente o valor da temperatura e pressão à superfície, o perfil de temperatura, a expressão analítica para a pressão de referência, a altitude das superfícies sigma não-hidrostáticas, e a informação relativa à elevação do terreno. Por fim, inicializam-se as variáveis necessárias à dinâmica não hidrostática, velocidade vertical e à perturbação da pressão.

O MM5 é o modulo do sistema de modelação meteorológica propriamente dito que executa a previsão numérica, podendo ser usado num amplo espectro de estudos teóricos e em tempo real, incluindo aplicações tanto em simulações de previsão como assimilação de dados em monções, furacões e ciclones. Para as escalas mais pequenas, meso-beta e meso-gama (2-200 km), o MM5 pode ser utilizado em estudos que envolvam sistemas convectivos de meso-escala, nomeadamente sistema frontais, brisas de mar e terra, circulações de montanha e vale, e ilhas de calor urbano. A formulação física para as variáveis básicas não hidrostáticas consideradas no modelo, em coordenadas

terrain-following (x,y,σ) são pressão, quantidade de movimento (componentes x, y e z) e

termodinâmica. Existem também equações de prognóstico para outras variáveis meteorológicas, nomeadamente vapor de água e nuvens. As opções físicas possíveis de seleccionar relacionam-se com as parametrizações no cálculo de variáveis relacionadas com processos cuja escala é inferior à resolução da malha, ou seja, processos da camada limite, nomeadamente, difusão vertical, cúmulos, humidade, radiação e esquemas superficiais. Os esquemas de cúmulos representam os fluxos verticais e de precipitação devidos a nuvens convectivas de escala inferior à da simulação pretendida. Desde que a resolução da malha seja suficientemente grande (menor ou igual a 5 km) para resolver os movimentos ascensionais e descensionais não é necessário explicitar qualquer parametrização de cúmulos. Caso contrário existem várias opções aplicáveis a diferentes resoluções de grelha e situações de aplicação, como por exemplo, nos trópicos.

Os esquemas de microfísica tratam das nuvens e precipitação à escala de resolução da simulação. Fornecem como resultados as tendências de temperatura, os valores associados a todas as variáveis relacionadas com a humidade, a quantidade de precipitação não convectiva à superfície, e ainda indicam ao esquema radiativo a informação resultante sobre as nuvens.

Os esquemas radiativos representam os efeitos radiativos na atmosfera e à superfície da terra. O resultado do esquema aplicado irá fornecer os valores dos fluxos de radiação de pequeno e grande comprimento de onda aos esquemas de superfície que, por seu lado, irá determinar a temperatura do solo.

Os esquemas de opções físicas para a camada limite representam os fluxos verticais devidos aos fenómenos de turbulência que ocorrem na camada limite atmosférica. Distinguem-se entre si pela forma como tratam a camada limite com características instáveis. Fornecem como resultados tendências de calor, quantidade de movimento, humidade e efeitos de atrito. O seu cálculo está intimamente relacionado com os resultados produzidos pelo esquema de superfície.

A escolha das parametrizações dos diferentes processos é por vezes dependente entre si, reflectindo a interligação que existe entre os processos e, consequentemente entre os esquemas opcionais (Figura 3.2).

Cumulus Radiação Superfície Camada limite “Saída de nuvens” Microfísica Fracção de nuvens Efeitos das nuvens Fluxo de pequeno e grande comprimento de onda Emissão da superficíe/albedo Fluxos superficiais de calor latente e sensível Temperatura, humidade e vento à superfície Cumulus Radiação Superfície Camada limite “Saída de nuvens” Microfísica Fracção de nuvens Efeitos das nuvens Fluxo de pequeno e grande comprimento de onda Emissão da superficíe/albedo Fluxos superficiais de calor latente e sensível Temperatura, humidade e vento à superfície

Figura 3.2: Interacção directa entre as parametrizações físicas do MM5.

O modelo MM5 tem vindo a ser usado em Portugal em diferentes domínios de aplicação: • em previsão numérica do estado do tempo, pelo Centro de Geofísica da

Universidade de Lisboa (URL 3), pela Universidade de Aveiro (URL 4) e pelo

Instituto Superior Técnico (URL 5);

• em estudos sobre o potencial eólico em Portugal, pelo Instituto Nacional de

Engenharia, Tecnologia e Inovação (URL 6),

• na regionalização de padrões climáticos resultantes de alterações climáticas (Borrego et al., 2004);

• como agente forçador de modelos oceanográficos (Leitão et al., 2003; Ferreira e Miranda, 2005);

• em estudos de qualidade do ar (Monteiro et al., 2004; Ferreira et al., 2004, Salmim, 2005).

No que se refere à sua avaliação este modelo foi validado sobre Portugal em diferentes condições sinópticas (Carvalho et al., 2002; Aquilina et al., 2005).

No Capítulo 5 apresenta-se a descrição e os resultados de aplicação do modelo MM5 a três domínios nested recorrendo aos dados de reanálise do Centro Europeu de Previsão do Tempo a Médio Prazo (ECMWF), a cada seis horas. Os dados de entrada resultam das simulações do modelo de circulação geral MUGCM, com ajuste das condições iniciais e fronteira a cada 24 horas, também sobre três domínios.