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O ozono como gás de efeito de estufa e a sua interacção com o clima

2 O sistema climático e as alterações no clima

2.3 O ozono como gás de efeito de estufa e a sua interacção com o clima

Para além dos gases de efeito de estufa homosféricos, a atmosfera tem na sua constituição espécies químicas cujas concentrações são reguladas preferencialmente à escala regional e cujo efeito no balanço radiativo pode ser directo ou indirecto, como por exemplo, os aerossóis e o ozono.

O ozono não é emitido para a atmosfera de forma directa, é um composto secundário cuja concentração troposférica é afectada pelas emissões dos gases seu precursores,

nomeadamente os óxidos de azoto (NOx), o CO, os compostos orgânicos voláteis (COV) e

o CH4. Por outro lado, na estratosfera são as substâncias que removem o ozono aí presente,

como por exemplo, os CFC, o N2O, os compostos de brometo, o NOx e o CH4, que

determinam a sua concentração. Os níveis de ozono estão intimamente relacionados como poder oxidante da troposfera (Figura 2.9) e afectam, indirectamente, os gases de efeito de

estufa quimicamente activos, como é o caso do CH4 e HCFC (UE, 2003). O facto de o

ozono ser um gás quimicamente activo, com um tempo de vida na troposfera relativamente curto, e que depende da distribuição de gases fonte (na troposfera) e de gases que o consomem (na estratosfera), induz uma variação temporal e espacial forte no forçamento radiativo devido a variações na sua concentração e torna a sua interacção com o clima muito complexa e difícil de analisar.

Tal como se observou para as concentrações de gases bem misturados na atmosfera, as

variações da concentração de ozono e dos seus precursores (NOx, CO e COV) têm sido

importantes desde o Século XVIII. Contudo, as estimativas feitas em relação a estes gases e a sua interacção com o clima baseiam-se sobretudo em resultados de modelos globais devido à falta de dados observados em termos históricos, e por isso mesmo têm um carácter especulativo.

Todavia, há muitas medições que permitem caracterizar algumas tendências. Muitos estudos mostram que o ozono troposférico aumentou entre 7-12 DU (Dobson Unit, em inglês) desde a era pré-industrial, sobretudo no Hemisfério Norte e que as concentrações de fundo de ozono duplicaram e triplicaram na Europa, desde os finais do Século XIX (UE, 2003). Observações mostram também diferenças regionais no aumento das concentrações, os Estados Unidos apresentam menores aumentos do que a Europa ou o Japão (Brasseur 2003 e UE, 2003). Por outro lado, na segunda metade do Século XX as concentrações de ozono parecem ter duplicado às latitudes médias do Hemisfério Norte. Contudo, não se têm verificado alterações significativas na concentração de ozono troposférico nas baixas latitudes, mas têm vindo a decrescer na troposfera livre das altas latitudes desde o início dos anos 1980, o que se poderá explicar pela diminuição de ozono na estratosfera (UE, 2003).

Para averiguar o possível impacte das alterações climáticas globais na qualidade do ar, nomeadamente a relacionada com o ozono troposférico em Portugal, é necessário conhecer a sua evolução ao longo do tempo. Uma parte do trabalho desenvolvido nesta dissertação ir-se-á focalizar na evolução temporal das concentrações de ozono, e seus precursores, e quais o fenómenos temporais que mais contribuem na sua variabilidade (Capítulo 4). Dada a importância que as condições meteorológicas têm na dispersão de poluentes ao nível do

solo, as séries temporais em análise foram também correlacionadas com parâmetros representativos da estrutura vertical da atmosfera. Correlações mais significativas no Inverno, em relação às concentrações de ozono, juntamente com indicações prévias obtidas em trabalhos anteriores (Barros, 1999), conduziram a um estudo mais detalhado das condições dinâmicas que levam à intrusão de ozono estratosférico junto à superfície (Capítulo 5).

Embora as variações das concentrações de ozono à escala global induzam alterações no clima, foi dada mais importância, no trabalho desenvolvido, ao mecanismo contrário, ou seja, ao impacte das alterações climáticas no ozono troposférico, pois é ao nível regional que se vai avaliar o impacte de cenários climáticos na qualidade do ar.

Os efeitos das alterações climáticas sobre o balanço do ozono global poderão afectar processos que se podem agrupar segundo a classificação emissão/remoção, produção/destruição química e transporte:

• nas emissões de precursores biogénicos e antropogénicos de ozono e na remoção destes gases;

• na alteração da química troposférica, pela alteração da capacidade oxidante da atmosfera e pela taxa de produção/remoção de ozono;

• no transporte de ozono.

Pelas razões anteriormente apontadas, os estudos do possível impacte das alterações climáticas sobre o balanço do ozono evidenciados no relatório técnico da Comissão Europeia (UE, 2003) e em Brasseur et al. (2003) consideram-se especulativos. Apesar deste facto, os modelos globais químicos constituem um meio imperioso na quantificação dos possíveis impactes e a eles se tem recorrido para esse fim. Os resultados obtidos a partir de estudos realizados nesta área estão resumidos na Tabela 2.3. Nesta, pode observar-se o provável impacte das alterações climáticas em alguns processos quantificados por modelos globais. Embora o IPCC (2001) classifique o nível de conhecimento científico baixo a muito baixo, neste domínio da ciência atmosférica, os possíveis efeitos estão avaliados em pequeno (< 1 %), médio (1-5 %) ou grande (> 5 %). Os impactes das alterações climáticas far-se-ão sentir não somente na distribuição das concentrações do ozono na atmosfera, mas também influenciarão toda a atmosfera através de alterações na química, dinâmica, radiação e emissões superficiais. Desta forma, prevê- se que a troposfera superior e a baixa estratosfera sejam especialmente sensíveis às alterações climáticas, contudo, não é claro como responderão e quais serão as consequências globais das suas respostas.

Como se referiu, as emissões de precursores de ozono, e de outros gases indirectamente relacionados com a fotoquímica troposférica, constituem um dos factores que modelam a distribuição de gases de efeito de estufa resultantes das actividades antropogénicas e biogénicas. A importância relativa da fonte varia consoante o constituinte atmosférico. No

caso do CH4, CO, compostos de enxofre e de NOx, a importância das fontes

antropogénicas é superior à das biogénicas. Por outro lado, as fontes biogénicas são as

Tabela 2.3: Impacte de alterações em processos relacionados com o clima nos níveis de ozono (UE, 2003).

Processo/Actividade Impacte no ozono global

troposférico (sinal)

Actividade humana- emissões de combustíveis fósseis Pequeno (0)

Queima de biomassa Médio a grande (±)

NOx emitido pelo solo Médio (0)

NOX produzido em trovoadas Médio a grande (+)

Emissões naturais de CH4 Médio a grande (+)

Emissões naturais de COV Médio a grande (+)

Emissões oceânicas de gases com enxofre Pequeno (0)

Química heterogénea em sais marinhos Pequeno (-)

Química heterogénea em poeiras minerais Pequeno-médio (-)

Compostos organo-halogenados Desconhecido (-)

Alterações na deposição seca Médio (0)

Alterações na deposição húmida Pequeno a médio (–)

Efeito da meteorologia na produção e remoção de ozono Grande (-)

Cobertura nebulosa Pequeno (-)

Alterações na troca estratosfera-troposfera induzidas pelas variações no clima Grandes (+)

Alterações nos padrões de tempo Desconhecido (0)