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O mundo do trabalho sob a insígnia do toyotismo

2 TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO

2.2 Toyotismo

2.2.9 O mundo do trabalho sob a insígnia do toyotismo

A partir da exploração desses aspectos, tidos como fundamentais para o modelo toyotista, podemos perceber uma série de aproximações referentes tanto ao modo de produção predominante em um momento anterior como as transformações progressivas que temos presenciado no mundo do trabalho. Como mencionado anteriormente, o êxito da disseminação deste modelo em escala mundial se dá majoritariamente por sua capacidade de adaptação a diferentes contextos e modos de produção.

No que diz respeito aos aspectos convergentes entre o modelo toyotista e o modelo fordista-taylorista, Alves (2011) situa a busca da utilização "científica" do trabalho vivo, tendo o controle da subjetividade dos trabalhadores como uma das grandes preocupações no processo de produção capitalista. Como relatado durante a descrição do modo de produção fordista-taylorista, este primava pela mecanização do gesto físico dos operários, "deixando livre o cérebro para outras ocupações" (ALVES, 2011, p. 63). Não havendo uma captação subjetiva predominante do trabalho pelo capital, os trabalhadores teriam maiores possibilidades de empregar sua inteligência e iniciativa, sub-utilizadas no local de trabalho, em outros âmbitos.

40 Os dispositivos organizacionais toyotistas, no entanto, buscaram reverter esse processo através da exigência da intervenção ativa do trabalhador na produção. Ao invés de permitir que apenas o gesto físico fosse captado no processo produtivo, segundo os preceitos do toyotismo a mecanização passaria a atingir tanto os corpos como as mentes dos homens produtivos. A adoção dessa nova perspectiva, referente ao controle da subjetividade, fez com que o envolvimento dos trabalhadores nos procedimentos técnico-organizacionais da produção de mercadorias fosse tido como imprescindível para a manutenção deste modo de produção.

É importante ressaltar que todo o processo de implantação de um novo modo de produção, mesmo que permeado por valores e ideais da própria cultura japonesa, só alcançou sucesso de fato no Japão em decorrência do contexto atravessado pelo país na época, como já aludido anteriormente em citação: "Funcionou no Japão apenas porque estávamos dispostos a fazê-lo." (OHNO, 1997, p. 31-32).

A disposição a romper com modelos tradicionais se deveu em grande parte pela crítica situação econômica japonesa decorrente do período pós-guerra, mas outro imprescindível fator para o desenvolvimento do toyotismo, como referido por Antunes (1995), foram as numerosas derrotas do sindicalismo combativo no Japão durante a década de 1950. Tais acontecimentos abriram espaço para a criação do chamado "sindicalismo de empresa". O movimento sindical foi, então, subordinado à lógica empresarial, a troco de benefícios como emprego vitalício para uma parcela dos trabalhadores e ganhos salariais vinculados aos índices de produtividade.

O surgimento e implementação de novas estratégias organizacionais e econômicas têm estado intimamente ligados à situações de crise. No caso japonês, notamos que a deterioração da situação econômica resultou em um enfraquecimento de seu movimento sindical em diversas frentes, o que abriu espaço para a implantação de um modo de produção intensificado e promotor da flexibilização funcional, que situamos como a qualidade polivalente de sua atividade prescrita, dos trabalhadores inseridos nesse contexto produtivo.

Para o contexto brasileiro, o movimento de reestruturação produtiva como um todo, que caracterizamos como a adoção de novos modos de organização da produção, dentre esses a implantação do modelo toyotista e de novas tecnologias, teve como alguns de seus principais reflexos a redução salarial e o aumento do trabalho em tempo parcial. De acordo com Alves (2011), tais desdobramentos são decorrentes de uma tendência a flexibilização da contratação salarial, de maneira a facilitar processos admissionais e demissionais, no sentido de potencializar as respostas empresariais as demandas de mercado. Nesse sentido, temos que

41 "o espírito do toyotismo incentiva a instabilidade salarial ou a constituição de uma nova precariedade do trabalho que permita, de forma ampla, a contratação de trabalho parcial ou trabalho temporário." (idem, 2011, p. 51).

Como afirma Antunes (1999), a assimilação do modelo toyotista se estendeu a todas as grandes empresas, inicialmente no ramo automobilístico e posteriormente para o setor industrial e diversos ramos do setor de serviços. Aliado a esse movimento, a incorporação de novas tecnologias no meio produtivo resultou na expansão do chamado desemprego estrutural, que atinge o mundo em escala global (idem, 1995).

Nesse contexto, gera-se uma situação de instabilidade que atinge tanto trabalhadores que procuram se empregar, como aqueles já empregados. Para estes, inicia-se um processo de adaptação as novas condições de trabalho, bem como de conivência para com práticas organizacionais que em uma situação de estabilidade não seriam admitidas. A explicação para tal conduta se deve, segundo Antunes (1999) ao risco representado pela perda do emprego:

A possibilidade de perda de emprego, ao mesmo tempo em que empurra o trabalhador para a aceitação desses novos condicionantes, cria uma base desfavorável para o capital nesse processo de 'integração' na medida em que o trabalhador se vê constantemente sob a ameaça do desemprego. (ANTUNES, 1999, p. 83)

Concluímos este segmento do trabalho apontando a importância de revisitar criticamente os discursos promovidos e reforçados pelo modo de produção toyotista, já amplamente difundido no contexto mundial, cujos mecanismos tendem a se apresentar como artifícios manipulatórios de manutenção do controle no processo produtivo (ALVES, 2011). Por outro lado, não pensamos que tal modelo representa a única força que vem impulsionando diversos países, dentre os quais o próprio Brasil, em processos de reformas produtivas e ideológicas.

Retomando nosso percurso histórico interrompido na crise que assolou as décadas de 1970 e 1980, tendo estas sido marcadas por profundas reestruturações e mudanças nos campos econômico e social, a seara política foi palco do surgimento de um movimento que apostava nos novos ideais de flexibilização e competitividade como instrumentos na promoção de extensas reformas estatais. Os cortes em gastos sociais e a redução do poder de organizações trabalhistas constituíam suas principais bandeiras, sendo o excessivo encaminhamento de verbas para subsídios e benefícios populares, bem como a suposta rigidez promovida pelos sindicatos em suas lutas por garantias de benefícios, responsabilizados pelo crescimento da inflação e estagnação dos baixos lucros.

42 brasileira, passaremos a analisar algumas de suas principais características. Sua influência, especialmente notória durante a década de 1990 no contexto brasileiro, é simbolizada pelas ações do presidente Fernando Henrique Cardoso, que serão investigadas pormenorizadamente mais adiante. Dessa forma, iniciaremos a apreciação do modelo neoliberal.