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Esquema 2: Contínuo +/ agregação ao DSM do verbo e +/ ao cenário de referência da

2 FIXANDO O OLHAR: mirando as ENIs

2.1 Semântica da enunciação

2.1.3 O nome próprio e alguns de seus determinantes

Gary-Prieur (1994) e Guimarães (2012) analisam as estruturas denominadas Nomes Próprios. A primeira afirma que essas estruturas constituem polêmica nos estudos linguísticos quando se

9 Disponível em: https://www.ofuxicogospel.com.br/2017/12/gisele-nascimento-mk-rogerio-gentil-musica- gospel.html/

manifestam na estrutura: um antropônimo posposto a um nome comum, ambos integrantes de um sintagma nominal com determinação definida.

Na perspectiva da autora, casos como “o rio Tietê” em As margens do rio Tietê estão inundadas constituiriam um uso não referencial do nome próprio, ou seja, não seria o nome próprio o responsável pelo ato de referência. Para ela, exemplos como o anterior estariam em uma etapa intermediária entre o emprego referencial do nome próprio e seu emprego atributivo. Para nós, à primeira vista, isso também parece ocorrer em (1) e (1’), em que o foco de referência deixa de ser ‘Paris”, mas volta-se para “da minha infância”.

Guimarães (2012) também considera que o nome próprio se apresenta como vinculado ao objeto que nomeia. O sentido do nome próprio não é nem o modo de apresentar um objeto nem o resultado dos modos de se referir a um objeto que o nome próprio denota. Nesse ponto em que encontramos esta diferença temos que levar em conta que o nome próprio tem sentido e que este é constituído enunciativamente por relações de linguagem, por reescriturações.

Guimarães (2002) afirma que “pensar o nome próprio de pessoa, nos coloca diante da relação nome/coisa, na qual se considera que se está diante dos casos em que se tem um nome único para um objeto único.” Portanto, se faz necessário repensar essa ideia da relação da linguagem com o mundo e com o sujeito. Para ele, na verdade, um nome próprio único para uma única pessoa é nada mais nada menos que uma construção de nome que determina sobrenome e vice- versa. Em João Pedro da Silva a construção morfossintática desse nome se dá como relações de determinação em que o João Pedro é o que pertence à família da Silva e que dentre todos os da Silva eu estou me referindo ao João Pedro e não a outra pessoa. Isso mostra que a construção do nome se dá por relações linguísticas e não uma relação direta entre palavra e objeto/ser no mundo. Já o funcionamento do nome se dá no processo social de subjetivação, pois o nome é dado pelos pais; é deles a obrigação legal de o fazer, e o fazem segundo seu desejo e/ou preferência. A escolha desse nome se dá por um agenciamento específico (nome de santos, de celebridades, de heróis, que estejam “na moda” no momento, homenagem a um ente familiar etc.). E esse agenciamento enunciativo específico é afetado pela memória desses dizeres. Assim em Bruno Fernandes das Dores de Souza os sobrenomes determinam Bruno, do mesmo modo Bruno particulariza um indivíduo dentre os membros da família Fernandes das Dores de Souza. Mas a construção de um nome opera enunciativamente também no processo de identificação social do indivíduo. O nome que é dado pelo lugar social de pai é alterado no processo da vida social em que o indivíduo está e acaba por se modificar. Assim, Bruno Fernandes das Dores

de Souza tornou-se Bruno, ex-goleiro do Flamengo, assassino de Elisa Samúdio. É um outro lugar de enunciação que renomeia o que havia sido nomeado pelo lugar de pai. Então, a nomeação de uma pessoa não é unívoca. O trabalho de enunciação é capaz de nomear/renomear objetos e/ou seres. Portanto, “a designação deve, em um universo dado, produzir a unicidade, a inequivocidade da referência” (GUIMARÃES, 2002, p.40).

Numa família não se dá o mesmo nome duas vezes, etc. Aqui se poderia inclusive lembrar que quando se dá o nome de alguém ao seu próprio filho, acrescenta-se, ao final, Filho ou Júnior. (...)

O processo enunciativo da designação significa, então, na medida em que se dá como um confronto de lugares enunciativos pela própria temporalidade do acontecimento. (GUIMARÃES, 2002, p.40)

Assim, as pessoas não são pessoas em si. O sentido do nome próprio é que lhes constitui. O João em

(27) João, que é pão-duro, tem muito dinheiro guardado.

(28) João, que é econômico, tem muito dinheiro guardado.

embora seja o mesmo, se constitui de forma diferente em função da forma como foi enunciado. E isso é marcado na ENI que acompanha esse nome próprio.

Portanto, a constituição da referência se dá em função da cena enunciativa em que está ocorrendo. Essa atualização é, inclusive, responsável por desfocar o referente. Ele, embora o mesmo, é diferente, como vimos também em

(1) “A Paris da minha infância não existe mais.”

(1’) Paris não existe mais.

Essa dualidade, para nós, pode ser esclarecida se se fizer uma análise com os olhos da Semântica da Enunciação, usando os conceitos de referencial, pertinência enunciativa e Formação Nominal apresentados nessa teoria.

Sabemos que a aposição em nomes próprios ocorre por diferentes razões e em diferentes gêneros textuais, mas Bjorge (2003) sustenta que em notícias essa incidência é maior, porque esse gênero textual tem que ser breve, mas, ao mesmo tempo, necessita passar o maior número de informações possíveis aos seus interlocutores, a fim de identificar com justeza a quem esses nomes próprios efetivamente se referem. Assim, constituem o nome próprio e o aposto dele

uma unidade de significação. Além disso, a aposição pode também focar o que se quer destacar em relação ao referente de maneira breve como as notícias requerem. Como exemplo teríamos a situação comunicativa na qual notícias sobre uma grande estátua erigida no trevo de Três Corações em homenagem ao Pelé estejam sendo veiculadas e uma delas diz: Pelé, o rei do futebol, foi homenageado com uma grande estátua na entrada da cidade; nela, a ENI destaca uma referência em relação ao nome Pelé que o fez merecedor de uma grande estátua – ser o rei do futebol. Na outra notícia temos: Pelé, nascido em Três Corações, foi homenageado com uma grande estátua na entrada da cidade em que o que fez Pelé ser merecedor da estátua, na entrada daquela cidade e não em outro lugar, foi o fato de ele ser natural de Três Corações. Essa diferença está marcada na ENI e não no antecedente dela, como deveria ser pela natureza de Pelé, ou seja, um nome próprio.

Feitas essas considerações, iremos agora tratar de dois conceitos cruciais para nosso trabalho: o de Formação Nominal (FN) e o de Referencial.