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5. Resultados e discussão

5.4. O processo de implementação do PAIF

5.4.1. O PAIF no CRAS 1

No CRAS 1, foram entrevistados uma agente social e uma assistente social, ambas com formação em Serviço Social. A principal diferença entre as duas é o tempo de experiência na área: enquanto a agente possui 3 anos de experiência de trabalho em assistência social, a assistente social possui 11 anos de experiência, especificamente, de trabalho em CRAS.

Apesar de a assistente social ter apenas 4 anos de experiência no atual CRAS, trabalhou os outros sete anos em um CRAS de outro estado da federação. Assim, ela tem acompanhado as mudanças pelas quais a assistência social tem passado nos últimos anos; avalia que a política está no caminho certo: ela acredita muito no que faz e nos direcionamentos dados pelo PNAS.

atribuição não foi comentada porque nenhum CRAS visitado oferece tais serviços em sua estrutura); participar de reuniões sistemáticas de planejamento de atividades e de avaliação do processo de trabalho com a equipe de referência do CRAS; e participar de atividades de capacitação.

CRAS 1

Agente Social Assistente Social

Formação Ensino superior completo. Formação em

Serviço Social Serviço Especialização em outra área do Social e Pedagogia + conhecimento

Tempo de AS 3 anos 11 anos

Tempo de CRAS 2 anos 4 anos Experiência profissional na área de Assistência Social anterior ao trabalho atual

SEDEST Sempre trabalhou em CRAS, mas em

outro estado da federação. Também já deu aula.

Quadro 10: Perfil dos profissionais do CRAS 1 Fonte: Elaboração própria

O território no qual está localizado o CRAS 1 foi definido de forma bastante simplificada pela agente social, que relatou os problemas de falta de renda, baixa escolaridade e desemprego. Já a assistente social abordou a estrutura das famílias – famílias chefiadas por mulheres, sem a presença de um cônjuge -, mencionou o problema do desemprego, a dificuldade de acesso às políticas públicas e problemas relacionados ao uso de drogas. A grande diferença entre as respostas é que a assistente social coloca a família como ponto de referência a qual estão relacionados todos os demais problemas.

Relacionando as características do território às demandas recebidas pelo CRAS, apresenta-se o quadro abaixo, que sintetiza as percepções da agente social e da assistente social do CRAS 1 sobre esses temas.

CRAS 1

Agente Social Assistente Social

Perfil de risco e vulnerabilidade do território Baixa renda Baixa escolaridade Desemprego

Famílias monoparentais, chefiadas por mulheres, com situação de desemprego e dificuldade de acesso às políticas públicas de modo geral

Uso de drogas Demandas que

chegam ao

CRAS

Benefício de transferência de renda sempre: o Bolsa Família e os benefícios eventuais também.

“A maior demanda é a questão

financeira

O grupo de maior procura é o voltado a atender às famílias que estão fora das condicionalidades do Bolsa Família.

Antes, as famílias iam ao CRAS exclusivamente por causa do benefício de transferência de renda.

Hoje, as pessoas também vão por causa dos benefícios eventuais e buscando acesso aos serviços oferecidos pelo CRAS.

Quadro 11: Características do território e das demandas do CRAS 1 Fonte: Elaboração própria

Pelos dados do quadro, observa-se que, enquanto a agente social se depara com demandas assistencialistas, todas voltadas à solicitação de benefícios, a assistente social comenta que além dessas, existem demandas pelos serviços do PAIF, relacionadas ao acompanhamento das famílias, a atividades de reflexão, à mudança de perspectiva para conseguir lidar com determinadas situações ou superá-las.

É necessário ressaltar que a variação das respostas provavelmente se dá porque as agentes sociais e assistentes sociais possuem formas de interação distintas com os usuários. Enquanto a agente social é responsável pelo primeiro atendimento, realizado na sala de recepção29, na qual não há muita privacidade para o relato de determinadas situações, a assistente social realiza o acolhimento dos usuários na sala de atendimento30, que é um ambiente privativo e que propicia à família ou ao usuário um clima confortável e de segurança, de forma a deixá-lo confortável para

29 A sala de recepção é o espaço físico do CRAS destinado à espera, transição, encaminhamentos, acolhimento e atendimento inicial de famílias e indivíduos. (BRASIL, 2009b)

30 A sala de atendimento é o espaço físico do CRAS destinado ao atendimento individualizado de famílias e indivíduos. (BRASIL, 2009b)

relatar as situações vivenciadas em maior nível de detalhe. Dessa forma, é normal que as demandas sejam mais destrinchadas no contato que o usuário tem com a assistente social do que naquele estabelecido com a agente social, o que faz com que um mesmo atendimento seja percebido de uma forma pelo agente social e de outra pelo especialista.

Desenvolve-se, assim, o entendimento de que a demanda pelos serviços do PAIF, relatada pela assistente social, seja uma espécie de withinput do processo, ou seja, uma demanda que não chega pronta ao PAIF, mas que se desenvolve à medida que é realizado o acolhimento pelo assistente social e que são apresentados o papel do CRAS, os serviços que são oferecidos, as possibilidades de superação da situação vivenciada. Essa lógica é ilustrada pela figura abaixo:

Figura 7: Entendimento da demanda PAIF ao longo do processo Fonte: Elaboração própria

Essa diferença é importante porque a forma como se percebe o problema impacta a sua estruturação mental e, portanto, a forma de resolvê-lo. Problemas de falta de renda, desemprego e baixa escolaridade, como os que foram percebidos pela agente social poderiam ser tratados apenas por meio da concessão de benefícios. Quando se aborda o mesmo problema sob a ótica da família, como foi feito pela assistente social, faz mais sentido pensar em soluções relacionadas ao fortalecimento daquela família, em termos objetivos e subjetivos. Vale lembrar que a

diferença na forma de formular as respostas quanto ao perfil do território e às demandas apresentadas pode se dar também pela diferença de tempo de experiência de CRAS.

Uma vez que a demanda chega ao CRAS, o que acontece? De acordo com o fluxo de atividades que foi relatado pelos agentes sociais, o processo funciona da seguinte maneira: quando o usuário chega ao CRAS, ele é atendido pelo agente social, que faz o acolhimento31 da pessoa e realiza a escuta qualificada32, que tem como objetivo identificar a demanda que está sendo levada ao CRAS. Dependendo da natureza dessa demanda, o agente faz a abertura e o preenchimento de prontuário, para encaminhamento a um dos especialistas, caso em que agenda um horário para atendimento do usuário com a assistente social ou com a psicóloga.

A agente também realiza solicitações de benefícios – pode ser de 2ª via de documentação gratuita, auxílio natalidade, auxílio funeral, pedidos de primeira cesta emergencial. Para o caso da solicitação de uma segunda cesta emergencial é necessário realizar visita domiciliar, atividade que realiza para auxiliar o trabalho das especialistas33. Nesse trabalho de atendimento ao público, também presta informações e realiza inscrição em cursos. Quando percebe que a demanda do usuário não é de responsabilidade do CRAS, a agente encaminha o usuário para a rede socioassistencial. A figura a seguir ilustra as atividades relatadas pela agente social do CRAS 1:

31O acolhimento ou a acolhida “consiste no processo inicial de escuta das necessidades e demandas trazidas

pelas famílias, bem como a oferta de informações sobre as ações do Serviço, da rede socioassistencial e demais políticas setoriais” (BRASIL, 2012b, p. 17). O acolhimento é uma ação presente em todos os serviços, programas e

projetos socioassistenciais, não sendo exclusivo do PAIF.

32 De acordo com a definição acima, a escuta faz parte do acolhimento e seu nome já traduz o seu significado, o de escutar o que a família ou o usuário tem a dizer sobre a situação que vivencia ou sobre a demanda que está solicitando.

33

A agente também comentou realizar visitas para supervisionar o programa Lar de Cuidados Diurnos. Como essa atividade não tem a ver com a atividade de atendimento ao usuário que chega ao CRAS, não foi inserida no texto.

Identificação da demanda Demandas

Encaminhamento da demanda para um dos especialistas em assistência social

Encaminhamento da demanda para a rede socioassistencial Solicitações de benefícios

Inscrição em cursos

Realização de visitas domiciliares Agente Social CRAS 1 Acolhimento Escuta qualificada Prestação de informações Abertura e preenchimento de prontuários

Figura 8: Atividades relatadas pela agente social do CRAS 1 Fonte: Elaboração própria

Como demonstrado, nem todas as demandas que chegam ao CRAS são resolvidas no âmbito desse equipamento público. Algumas são encaminhadas para outras organizações da rede socioassistencial; outras, como no caso das pessoas que apenas precisam de informação ou de inscrição em cursos, são resolvidas no momento do atendimento. De todas essas possibilidades de ação, destaca-se a de encaminhamento da demanda para um dos especialistas em assistência social, pois é ela que desencadeará o trabalho mais próximo dos profissionais do CRAS com a família ou com o usuário.

Uma vez que a demanda é encaminhada ao especialista, o que acontece? No caso do CRAS 1, foi entrevistada apenas uma especialista, que atua como assistente social. A entrevistada relatou de forma sistemática suas atividades: acolhimento, realização de atendimentos individualizados a partir da demanda espontânea que chega ao CRAS, que pode gerar atividades de acompanhamento ou não; realização de atendimentos em grupo, em que é responsável pelo planejamento, pela execução e pela avaliação do trabalho realizado; e mapeamento e articulação da rede socioassistencial do território. Em relação a esta última atividade, esclarece: “essa questão da rede não é só feita pelo coordenador porque a gente também tá ali, todo dia ligando, todo dia encaminhando pra algum lugar, fazendo esses contatos, isso também é mapeamento e articulação da rede”. A figura a seguir ilustra as atividades relatadas pela assistente social do CRAS 1:

Acolhimento

Atendimentos individualizados Acompanhamentos

Atendimentos em grupo

Mapeamento e a articulação da rede socioassistencial do território Demandas Assistente

Social CRAS 1

Figura 9: Atividades relatadas pela assistente social do CRAS 1 Fonte: Elaboração própria

As atividades de atendimento se diferenciam das de acompanhamento, visto que estas constituem atividades contínuas, de mediações periódicas, enquanto aquelas podem ou não estar inseridas dentro de atividades de acompanhamento. Os atendimentos podem ser realizados de forma pontual – participação em uma oficina, por exemplo -, sem estar vinculado a um acompanhamento periódico para avaliação de sua situação.

A assistente social do CRAS 1 também comentou de atividades de busca ativa: “desde o ano passado, com a questão do Busca Ativa do DF Sem Miséria, a gente vai em pelo menos duas escolas por mês”. Nessas ocasiões, apresenta-se o CRAS, fala-se sobre sua importância e apresentam-se os serviços oferecidos, de forma a estimular a demanda pelos benefícios e serviços oferecidos pelo CRAS. Também comentou de atividades relacionadas ao fortalecimento e consolidação do papel do CRAS frente aos outros órgãos da rede socioassistencial, visando diminuir o número de encaminhamentos que são feitos de maneira equivocada, tanto pelo CRAS para outros órgãos quanto de outros órgãos para o CRAS. Com essas atividades de alinhamento com a rede, “o CRAS acaba sendo referência34 e contrarreferência35, mas de forma muito mais positiva”. Essas atividades de alinhamento da demanda, tanto em relação à sociedade quanto em relação à rede, são importantes no sentido de definir o papel do CRAS e de delinear o desenho do PAIF, amadurecendo a concepção da nova política de assistência social nesse território.

34 Referência é o encaminhamento dos casos mais complexos que chegam ao CRAS para os órgãos da rede socioassistencial especializados.

35 Contrarreferência é o encaminhamento de casos para o CRAS por parte de órgãos da proteção social especial, para que sejam inseridos em programas, projetos, serviços e benefícios da proteção básica.