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Baseado nas análises do sistema de saúde nacional do médico e deputado Jamil Murad, elaboradas com a participação de jornalistas e profissionais da saúde e que, “incluiu levantamentos de dados em órgãos oficiais, visitas a hospitais e unidades básicas, entrevistas com profissionais e estudiosos da área de saúde”74, os rumos da saúde no âmbito nacional são preocupantes. Também, de acordo com RIZZOTTO (2000), percebemos que toda esta realidade da assistência à saúde nacional, ou do Terceiro Mundo, vem sendo articulada e desenhada detalhadamente pelo Banco Mundial há mais de 20 anos tendo como meta a utilização do setor da saúde para a redução da pobreza.

Certamente, ao relatar a dramática situação da saúde pública no Brasil, em particular na capital do Estado de São Paulo, ficará mais claro que esse conjunto de medidas políticas e econômicas, cujos pressupostos são do liberalismo clássico e afetam a sociedade como um todo, não trarão “saúde”, principalmente aos desprivilegiados, como propõem os liberais. A reportagem analisa a importância do complexo do Hospital das Clínicas (HC-USP - São Paulo/SP), denominado “Quarteirão da Saúde”75, e que, ameaçado pela crescente privatização, também representa o iminente colapso do sistema público de saúde no Brasil. Esta medida, como parte da política neoliberal, resulta das transformações nas relações de produção desde meados da década de 60 e, mais recentemente, vem reorganizando formalmente o funcionamento de instituições públicas tendo como metas a desnacionalização da economia, a desindustrialização, a política de privatização da saúde e criação de um pacote médico-assistencial mínimo para os excluídos miseráveis.

O que hoje ocorre com o HC-USP é resultado da contínua implantação do conjunto de políticas neoliberais (“anti- sociais”) em curso desde a década de 70 e avalizada pelos sucessivos governos. Trata-se, mais uma vez, de um “novo” governo apenas com uma “roupagem” diferente, isto é, ele mantém uma linha de ação que é radicalmente a mesma que permitiu a criação do PAS (Plano de Atendimento à Saúde). Além do desemprego, da

74 MURAD, Jamil. Privatização da dor. São Paulo, agosto, 1997, p.5.

75 Ibidem , p.5 . O “quarteirão da saúde” é formado por: Faculdade de Saúde Pública e Nutrição, Centro de Saúde, Instituto Adolpho Lutz, Hospital Emílio Ribas, Instituto de Medicina Tropical, Faculdade de

alteração nas leis trabalhistas e do direito à aposentadoria, - interferentes diretos no poder aquisitivo -, o governo neoliberal vem querendo acabar com o direito de todos os brasileiros à saúde. Priorizando a assistência básica – com aval de vários setores ligados às atividades médicas tanto de ensino quanto de assistência, o governo federal pode disponibilizar importantes serviços públicos médico-hospitalares, para o setor privado76.

Segundo MURAD (1997, p5), “Essa política chega aos limites da crueldade: quer privatizar até a dor e fazer da doença e do sofrimento humanos um negócio lucrativo”.

O complexo hospitalar das “Clínicas”, patrimônio público, atende anualmente milhões de pessoas. Em 1996 foram 931 mil consultas ambulatoriais, 30 mil cirurgias, 57 mil internações. Entretanto, no bojo das medidas neoliberais, está o atendimento desigual à saúde, privilegiando os que podem pagar (convênios e particulares). Embora a relação convênios-órgãos públicos seja de mercado, é ilegal a discriminação do atendimento em função do poder aquisitivo: quem pode e quem não pode pagar. Em geral, nos serviços públicos de saúde existem placas indicando: pacientes “SUS” e pacientes “Particulares e Convênios”. E o privilégio vai mais além: há prioridade no atendimento de quem paga (fura-fila), e até exclusividade nos quartos de internação.

Os dirigentes – médicos ou não - afirmam “que o mercado dita as regras do jogo”, embora na constituição de 1988 conste que a assistência à saúde no SUS deva ser prestada com igualdade, sem preconceitos e privilégios de qualquer espécie. Uma das afirmações

76 RIZZOTTO (2000). A reforma do sistema hospitalar como parte das mudanças propostas pelo Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE - 1995), foi dimensionada de acordo com um Sistema Nacional de Demanda, com uma secretaria federal e subsecretarias estaduais e/ou diretorias municipais. Este sistema de demanda conta com verbas do orçamento da união para o SUS e orçamentos estaduais e municipais. De acordo com esta organização, as “AIH” (Autorização de Internação Hospitalar) seriam distribuídas a cada prefeitura, de acordo com o número de residentes no município e o perfil epidemiológico. Necessidades além dos recursos oferecidos ficariam sob responsabilidade do próprio governo municipal (por exemplo, credenciamentos e pagamentos suplementares). Desde então, para resolver o problema da procura por serviços hospitalares, o Ministério da Saúde recomendava a prática de consórcios intermunicipais e interestaduais e a transformação de hospitais estatais em organizações sociais, isto é, entidades públicas não estatais de direito privado, com autorização legislativa para celebrar contratos de gestão com o poder executivo e assim participar do orçamento. Uma tendência atual dos hospitais públicos diante da falta de recursos financeiros também é a transformação em fundações públicas de direito privado, possibilitando autonomia administrativa e financeira para melhor gerenciamento. Infelizmente não há espaço neste trabalho para um maior detalhamento de como foi reorganizada a assistência hospitalar municipal, estadual e federal e sua relação com a assistência primária, secundária e terciária, porém, é importante mostrar alguns dados do IBGE (1999) sobre a área hospitalar, a mais lucrativa do setor da saúde: total de leitos privados = 341.427 (70,4%); total de leitos públicos = 143.518 (29,5%) do montante de leitos disponíveis para internações no Brasil.

contraditórias desses dirigentes refere-se à privatização como instrumento para aumentar a receita. MURAD (1997) mostra claramente quanto são pequenos os recursos provenientes dos convênios: em 1995 o Hospital das Clínicas (H. C. USP) recebeu 238 milhões de reais, enquanto os convênios “pagaram” pelos serviços prestados, 1,17 milhão de reais. Uma parceria desigual onde 98% das verbas do H.C. USP provém de recursos públicos, entretanto, o privilégio no atendimento é do paciente particular ou conveniado. É provável que estes itens estejam pouco desatualizados. Mesmo assim, decorridos 4 anos da data de publicação do estudo, podemos afirmar que nenhuma mudança efetiva foi adotada para impedir o progressivo desmanche do SUS e da assistência à saúde gratuita universal, igualitária. Sabidamente, há décadas, o respaldo à qualidade da assistência à saúde vem da integração entre ensino-pesquisa e assistência de várias áreas.

Nas estatísticas apresentadas por MURAD observamos que as despesas com saúde no Estado de São Paulo, nos últimos dez anos, mantém-se numa mesma faixa enquanto cresceram os gastos com despesas totais. A população entre 1990-1996 cresceu 10% e o governo federal, até 1997, não havia reajustado a tabela de pagamentos do SUS: com uma inflação em 1994 de até 80% pagava-se dois reais por uma consulta. No primeiro ano do governo de Fernando Henrique Cardoso foram anunciados gastos com saúde de 83 reais/habitante que, logo desmentidos, totalizavam 55,33 reais/habitante.

De acordo com RIZZOTTO (2000, p.159), ao contrário do que afirma o Banco Mundial,

“(...) em 1990 o Brasil investiu em recursos públicos, apenas 88 dólares per capita, e em 1998 115,3 dólares per capita...Países em condições econômicas semelhantes ao Brasil investem bem mais que este valor em saúde, já nos países desenvolvidos o gasto per capita varia de 800 à 2000 dólares. Em termos de PIB, o Brasil gasta com saúde pouco mais de 3%, já nos países ditos desenvolvidos, este valor chega a12% do PIB. (dados do Conselho Nacional de Saúde e do Ministério da Saúde)(...).

Em geral, o dinheiro destinado à saúde não chega, integralmente, aos serviços públicos.

“(...) pode-se dizer, ainda, que o endividamento externo foi exponenciado nos anos 90, pois a dívida externa brasileira evoluiu de um total de 64 bilhões de dólares em 1980, para 145,66 bilhões em 1994, no início do Plano Real, chegando hoje aos 241,34 bilhões... No orçamento de 2000, a saúde foi contemplada com 5,99% do orçamento, ao passo que para pagar a dívida externa (juros, encargos e amortizações) previu-se cerca de 44% do

Parte da verba é utilizada noutros setores do orçamento geral e, o exemplo mais recente disso foi o imposto sobre movimentação financeira (CPMF). A redução dos investimentos do Estado na saúde causa a deterioração do sistema, levando à sua ineficiência. Entretanto, nas mãos ardilosas da iniciativa privada – entre outros instrumentos de controle e regulação o maneged care -, a ineficiência e o custo elevado da assistência são interpretados como mau gerenciamento e recebem apoio oficial.

“(...) Fazendo a crítica ao modelo médico hospitalocênctrico e defendendo a necessidade de “inversão do modelo”, o Ministério da Saúde tem assumido como política estratégica para mudança do padrão assistencial, a implantação de programas como o PACS (Programa dos Agentes Comunitários de Saúde)77 e o PSF (Programa

Saúde da Família), que dariam centralidade à atenção básica em saúde. Creio não ser necessário mostrar aqui as semelhanças entre o Programa dos Agentes Comunitários de Saúde e a proposta do “trabalhador comunitário de saúde”78 do Banco Mundial (...)”(RIZZOTTO 2000, p216).

Assim, o mau gerenciamento e a falta de recursos criam possibilidades do governo transferir, em parceria ou não, as responsabilidades com a saúde pública às “organizações sociais” -entidades privadas- que passam a assumir a direção e determinar os recursos para saúde. Ao venderem seus serviços e buscarem recursos no mercado, essas associações privadas, talvez garantam assistência somente a quem paga. Resultado: uma assistência pobre para os pobres, “garantida” pelo Estado reduzido, e outra rica para os ricos, como definiu o Banco Mundial em ambos os casos.

“(...) Além dos programas de agentes comunitários e de saúde da família, grande parte das ações do governo dirigidas para a área da assistência e gestão dos serviços de saúde, estão circunscritos a projetos financiados por organismos internacionais, conseqüentemente, submetidos às condições expressas nos seus contratos de empréstimos, refiro-me aos projetos REFORSUS, VIGISUS E AIDS/DST. Tais contratos, antes de serem firmados, passam por processos de negociações entre técnicos dos

77 De acordo com dados do Ministério da Saúde de 2000, existiam 114.793 agentes comunitários cobrindo 50% da população. São trabalhadores de saúde sem qualificação e seu número vem crescendo progressivamente desde 1994 (29.098). O PSF cobre 22% da população, quase 37 milhões de pessoas, e realiza atividades além daquelas previstas em decorrência da falta de hierarquização dos níveis de assistência.(Cf em Anexos - Evolução do número de agentes comunitários de saúde e equipes de saúde

da família no Brasil de 1994-2002).

78 De acordo com as propostas do Banco Mundial (1975, p.49), os recursos humanos que atuariam em serviços públicos deveriam originar-se da própria comunidade, facilitando a permanência e o maior conhecimento da população. Eles receberiam formação elementar e simplificada, suficientes para executarem atividades de prevenção, cuidados materno infantis, planejamento familiar e orientações voltadas para o meio ambiente. “(...) Las reformas de los sistemas de salud orientadas a extender la

bancos internacionais e representantes do Ministério da Saúde e, pela aprovação do Congresso Nacional... Em assinando os contratos e aceitando as condicionalidades do banco financiador, estas são apresentadas para sociedade como decisões e inovações de órgãos nacionais e não como imposição externa(...)”(RIZZOTTO 200, p.219-220)79

A redução do papel do Estado na prestação de serviços públicos, em qualquer esfera da sociedade, respalda-se, segundo seus teóricos e dirigentes, na necessidade de transformar as instituições estatais em organizações mais competitivas e, portanto, que sigam as leis de mercado. Entretanto, como equacionar assistência à saúde e lucro?

Modelos como do governo de Tatcher (Inglaterra) que implantaram um modo de assistência pública - denominado “quango”: quasi autônomas non- governamental

organizations -, têm servido de referência ou, guia, para os governantes, inclusive

brasileiros. Hoje são mais de 5.000 destas organizações, cuja receita é da ordem de 70 bilhões de dólares, onde os

“(...) quangocratas são geralmente nomeados por interesses políticos ou amizade, não se sentem servidores públicos e, as quango, são menos sujeitas ao controle externo. Com isso, os problemas de nepotismo, uso de interesses pessoais, má gestão, inadequada aplicação de recursos e, mesmo a corrupção, se mantém(...)” 80.

Uma das primeiras conseqüências das políticas brasileiras de privatização no setor da saúde pública (“políticas de parceria” - década de 90), nos níveis estadual e municipal, e em particular na capital paulista (PAS81 - Plano de Atendimento à Saúde), foi o superfaturamento.

79 A concretização destas propostas reguladoras das agências do capital mundial só tem sido possível graças a participação de intelectuais e cientistas brasileiros junto aos estrangeiros no processo de elaboração dos projetos, afinal, parece necessário algum conhecimento sobre a realidade brasileira. Sem entrar no mérito de quem participa e como participa nestes projetos, o que nós queremos chamar atenção é para o fato de que a educação médica atual deveria privilegiar a formação profissional com outros conhecimentos que permitissem identificar os “tremendos furos” que estas propostas representam para a saúde e a economia do povo brasileiro, ou do Terceiro Mundo, assim como para o próprio avanço da medicina como área específica. Conhecimentos em história, economia, política, filosofia, educação, etc, e o debate com outras áreas, isto é, a prática da interdisciplinaridade de forma radical e diante do mesmo objetivo, talvez subsidiasse a reflexão de médicos e principalmente de alunos de medicina para que, no futuro breve, não se comportassem de forma tão alienada e permissiva diante de questões cruciais para a promoção da saúde. A medicina de modo geral não pode se furtar ao debate de questões econômicas e políticas presentes neste cenário que podem até colocar em risco a soberania da nação. Em particular os programas Reforsus e AIDS/DST merecem ser detalhados. Aliás, os médicos em geral têm sido vítimas dessas determinações estrangeiras que influenciam o mercado de trabalho, sem saber!

80 MURAD(1997, p.20).

As cooperativas privadas ou as organizações sociais- também privadas -, tinham possibilidade de comprar medicamentos sem licitação pública, superfaturar despesas e escapar da fiscalização dos conselhos de saúde. Esse quadro demonstra como o governo incentiva a assistência parcial à saúde, através do modelo “curativo-preventivo”, “escapando-lhe” os aspectos diretamente ligados à determinação e manutenção da saúde como: condições de alimentação, transporte, moradia, salário e meio ambiente, os quais pertencem à outra área governamental admitida como “não tendo relação” direta com a saúde do ponto de vista médico. Isto nós contestamos, pois tais aspectos são considerados prioritários para promoção à saúde efetiva. Ocorre que este desmembramento das funções administrativas determina a perda da visão de conjunto e permitem que algumas atividades, radicalmente interligadas – vigilância, limpeza, alimentação, saúde, etc -, que seriam melhores cuidadas pelo Estado, sejam administradas em parceria, ou transferidas para instituições privadas que não tem a preocupação de integrar as ações de saúde.

Não pretendemos fazer apologia da assistência predominantemente hospitalar, porém, nas condições materiais em que a sociedade se encontra, é equivocada sua redução abrupta e isolada, sem o respaldo de mudanças na estrutura econômica da sociedade82.

Atualmente, uma cidade como São Paulo, com mais de 34 milhões de habitantes, não atende ao preconizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que são quatro leitos por mil habitantes e há uma crescente redução do número de leitos para a população: estão desativados ou são destinados aos convênios e particulares83.

82 SAMPAIO Jr (2001). Segundo o autor, a necessidade de integração social nunca foi tão urgente o que suscita a tomada de um conjunto de medidas ou, reformas – agrária, urbana, educacional, saúde, política de emprego e distribuição de renda, redução da jornada de trabalho, etc. -, que necessitarão de uma reforma política-econômica, prévia ou simultânea, profunda, possibilitando a criação de um Estado Nacional. Certamente, a organização da educação médica não ficará à margem deste conjunto de mudanças e é por isto que a discussão de um novo currículo de medicina que se tornará referência para a educação médica brasileira, deve coincidir com os elementos que alicerçam a construção de uma sociedade menos desigual ou mais integrada como defende Sampaio.

83 De acordo com resumo dos debates do 1o Simpósio Estadual dos Trabalhadores em Saúde Mental - Campinas (20 de outubro de 2001), os leitos de pacientes psiquiátricos foram reduzidos drasticamente sob o pretexto da reintegração social do paciente psiquiátrico. Segundo RIZZOTTO (2000), já em 1995 o então Ministro Bresser Pereira (Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado) dava seqüência às reformas na área da saúde procurando modificar aquela que já era considerada a mais cara: a assistência hospitalar. Segundo ele a oferta de leitos hospitalares no Brasil superava a demanda. Entretanto, segundo uma pesquisa do IBGE (1999) houve uma redução de leitos para internações no Brasil entre 1992-1999 de 27% : de 544.357 baixou para 484.945. Segundo a recomendação da OMS, que habitualmente não é seguida pelo Banco Mundial naquilo que não interessa ao mercado, deve haver 4 leitos /1000 habitantes. Portanto, um déficit de mais de 100 mil leitos no Brasil.

O neoliberalismo e a globalização, componentes do desenvolvimento capitalista mundial do século XX, determinam medidas políticas e econômicas com particularidades inerentes a cada região do planeta. Para coordenar e assegurar a implantação efetiva dessas medidas principalmente no “mundo em desenvolvimento” que é o mais miserável, existem os órgãos supranacionais – “ guardiões do capital” -, como FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Banco Mundial, entre outros84. Num relatório de 1993, o Banco Mundial recomendava que a ação estatal na área da saúde se restringisse à assistência primária85: consulta médica, pré-natal, saúde da mulher e da criança, radiografias de pulmão e exames menos onerosos. Segundo MURAD (1997, p.29), “uma espécie de ‘cesta básica’ de saúde para o pobre”.

Doenças mais graves, que exigissem um tratamento mais caro como câncer, problemas cardíacos, diálise..., ou que necessitassem de equipamentos sofisticados,

84 IANNI, O. A era do globalismo. 3a ed. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1997.

85 CHAVES, M., REIS ROSA, A. orgs. “Educação médica nas Américas - O Desafio dos anos 90“, 1990, Cortez Ed., São Paulo. Chaves, Mário M.; Rosa, A. R. (org.). O Projeto EMA (Educação Médica nas Américas) desenvolvido em conjunto por vários países americanos - México, América Central e América Latina – tinha como proposta básica aprimorar o ensino médico através de uma maior integração às atividades realizadas nas unidades básicas de saúde (cf. em Anexos – Ações segundo as categorias,

propostas nos planos de ação das associações e escolas (América Intermédia e América do Sul) “. Além

disso, estava embutida a intenção de atenuar os efeitos da especialização médica possível a partir da divisão do trabalho capitalista e dos avanços científicos-tecnológicos sempre explorados pela indústria no período das duas grandes guerras e principalmente no pós-guerra do século XX. A rigor, entendemos que os resultados destas medidas econômicas, políticas, educacionais trouxeram benefícios indiretos para a expansão e acumulação capitalista, assim como, ideologicamente, serviram para atenuar-escamotear os efeitos da exclusão social provocada pelo "novo liberalismo" no Terceiro Mundo, que é um grande gerador de doença. Com isto permaneceu a matriz da medicina burguesa, só que de modo menos oneroso, isto é, tratando dos pacientes doentes e das suas complicações, nos respectivos locais onde vivem, e não mais atuando na perspectiva das doenças dentro dos hospitais. E o que continua intocável diante de tantas mudanças é a falta de questionamento das raízes das doenças. O Projeto EMA dentro da sua proposta de vincular ensino-serviço médicos nas unidades básicas de saúde nas décadas de 80 e 90 do século XX, e, com isto, tentando “empurrar” a medicina para junto da realidade do Terceiro Mundo de forma efetiva, sugeriu, naquela ocasião:

1) Refletir sobre o futuro da educação médica, com base nos avanços tecnológicos e nas mudanças sociais dos últimos decênios, definindo, em linhas gerais, o perfil do médico para o século XXI. 2) Analisar a situação atual da educação médica, com uma visão crítica construtiva, identificando

problemas e dificuldades, assim como ações para solucionar;

3) Formular um plano de médio prazo, organizando as ações propostas em forma seqüencial, de acordo com prioridades e os recursos disponíveis;

4) Identificar ações contidas nesse plano, cuja implementação pudesse ser facilitada por mecanismos de cooperação internacional.

Acreditamos que este modelo de educação médica não pode ser tomado como principal ou prioritário. Por outro lado, gostaríamos de chamar a atenção para o cunho ideológico que algumas propostas talvez tenham tido e, paralelamente, a sua importância no estabelecimento de um quadro concreto e favorável à implantação das políticas neoliberais, demonstrando as várias implicações do desdobramento do sistema

deveriam ficar ao encargo dos planos de saúde privados, apesar de apenas 25% dos