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O papel da Indústria cultural na encenação da beleza

A cultura de massa, adverte Lipovetsky (2009, p. 258), teve uma função histórica determinante, “reorientar as atitudes individuais e coletivas, difundir novos padrões de vida”. A “extrema personalização” da qual fala Vigarello (2006), a “ruptura que diz respeito à identidade” passa também pelos mecanismos da produção, disseminação e consumo da cultura massiva. Seus temas mais centrais ajudaram muito fortemente na afirmação de uma “nova figura da individualidade moderna”, essencialmente ligada ao sentido de realização privada e de bem-estar. “Propondo, sob formas múltiplas, modelos de autorrealização existencial e mitos centrados na vida privada, a cultura de massa foi um vetor essencial do

individualismo contemporâneo paralela e mesmo anteriormente à revolução das necessidades” (LIPOVETSKY, 2009, p. 259). A contribuição da cultura de massa, argumenta, é paradoxal, mas efetiva no impulso da autonomia subjetiva, para “generalizar os desejos de afirmação de si e de independência individual”. Aquilo que é apresentado na cultura de massa - em tudo que tem de variabilidade, da apresentação de novos modelos culturais e existenciais, para todas as camadas sociais - permitiu o compartilhamento de novas referências para as pessoas, criando um estímulo para que vivessem mais de acordo com perspectivas individuais, liberando-se de regras tradicionais e reportando-se mais a si mesmas nas decisões do como viver. A cultura de massa proporciona um meio pelo qual os indivíduos puderam se desprender de raízes demasiadamente rígidas, “de promover um Ego que dispõe mais de si mesmo” (LIPOVETSKY, 2009, p. 260). Há um processo de individualização que é acelerado pela cultura de massa porque ela oferece escolha e diversidade, o que Lipovetsky (2009, p. 261) acredita, “só pode suscitar mais pequenas diferenciações, possibilidades de afirmar preferencias mais ou menos personalizadas”, de tal modo que não é possível uma separação justa do crescimento explosivo do individualismo contemporâneo do crescimento explosivo da mídia.

Uma importância maior é dada à informação. Há uma torrente informativa despejada sobre os telespectadores, uma “primazia do presente” que produz tal ritmo televisual que tudo acelera-se, acaba-se com o tempo “morto”, algo sempre está sendo oferecido na tela acesa. O consumo desse incessante fluxo informativo tem um efeito “centrípeto”, aquele que converge para o sujeito, que centra-se nele, fazendo-os observarem-se melhor, gerirem “‘racionalmente’ seu corpo, sua beleza, sua saúde, a zelar mais atentamente por si próprios” (LIPOVETSKY, 2009, p. 263) já que são alertados, por este fluxo ininterrupto das notícias, sobre as últimas doenças, remédios, problemas políticos, econômicos e sociais; e leva os sujeitos a desenvolverem o uso crítico da razão, ainda que de modo simples ou pouco sistemático. “Quanto mais os indivíduos são informados, mais se encarregam de sua própria existência, mais o Ego é objeto de cuidados, de autossolicitudes, de prevenções” (LIPOVETSKY, 2009, p. 263).

É neste processo de consumo da cultura de massa, neste consumo que promove o desenvolvimento de um raciocínio individual e incentiva, por isso, a individualização, que o fluxo de imagens da beleza proporá um modelo de autorrealização, um modelo através do qual será possível “sentir-se bem” consigo mesmo. “A indústria cultural ensina às mulheres que cuidar do binômio saúde-beleza é o caminho seguro para a felicidade individual” (DEL

PRIORE, 2000, p. 92). A edificação do monumento do Mito da Beleza não se dá sem as revistas femininas de meados do século XX, nem sem a indústria audiovisual. Dito simplesmente: não se dá sem a cultura de massa. A compreensão tanto da beleza e suas exigências, quanto do modo como são apresentados e interpretados os corpos hoje passa pelas telas cintilantes, pelas fotografias impressas, pela cultura de massa. “Não é possível compreender as principais representações do corpo neste século a não ser encontrando a sua fonte ou seu meio de transmissão, tanto sua origem como sua vulgarização, sobre a tela do espetáculo de massa” (BAECQUE, 2011, p. 481). O Mito da Beleza precisa de uma cultura de massas das mulheres para efetivamente se concretizar. Ocupado em entender o mecanismo de Hollywood nesse processo, Morin (1989, p. 28) nos diz que “o star system não se contenta em fazer a arqueologia das belezas naturais. Criou, ou renovou, toda uma arte da maquiagem, dos figurinos, do comportamento, dos gestos, da fotografia e, quando necessário, da cirurgia que aperfeiçoa, conserva e mesmo fabrica a beleza” (MORIN, 1989, p. 28). A primeira onda do feminismo tirou as mulheres de dentro de casa e as levou ao mercado de trabalho e o Mito da Beleza é uma reação à segunda onda do feminismo, mas a partir dos primeiros anos do século XX a ligação da beleza e do bem-estar como um objetivo dominante na vida das mulheres já estava se estabelecendo, certamente ainda não com o poder avassalador de hoje. A Indústria Cultural, de modo geral, foi parte essencial desse movimento, de construir a ideia de que a mulher precisava estar bonita, ainda que “levasse uma vida de homem”, ou seja, que trabalhasse fora; que estar bela e magra era resultado de investimento pessoal, dedicação e mérito próprio. O discurso das revistas dessas primeiras décadas falavam de um cotidiano, vivido pelas mulheres, que era constituído de um aspecto duplo, que associava uma vida produtiva no trabalho fora de casa com cuidados para manterem-se belas. “Daí os novos artigos sobre a ‘maneira de permanecer bonita o dia inteiro’, esses anúncios melindrados por alguma ligação imaginária entre ‘ociosidade’ e ‘cuidados de beleza’. A ‘mulher que trabalha’ deve ser ‘também agradável de ver’ ao chegar e sair do trabalho” (VIGARELLO, 2006, p. 147). A cultura de massa também foi essencial no estabelecimento e sedimentação dos modos como os corpos são visualizados hoje, na produção e distribuição de suas imagens.

Como devem ser os modelos de aparência dos corpos das mulheres é uma lição que aprende-se cedo. A história da Bela Adormecida é já bem antiga, a versão mais conhecida, dos Irmãos Grimm, foi publicada em 1812. O filme da Walt Disney baseado nessa versão, com algumas adaptações, é de 1959. Em todas elas, a princesa que dorme é Aurora, uma princesa muito bonita. Wolf (1992) diz que as meninas aprendem de modo bastante prematuro que

histórias acontecem a mulheres bonitas. Se Aurora tem como um dos seus dons a beleza e é salva pelo amor de um príncipe que encantou-se com a jovem, estando ela sem falar, sem mexer-se, sem conversar, na cultura de massa da mulher adulta, é a mulher bonita, seja ela interessante ou não, uma mulher inteligente ou não, que tem uma conversa interessante ou não, que vive as histórias. É com ela que as histórias acontecem. E se mulheres adultas já entenderam que a Bela Adormecida é um conto de fadas, ainda não conseguem entender que as modelos que estão em programas de televisão, nos blogs de moda, nas páginas das revistas são também personagens com muita pouca relação com a vida real. As modelos das revistas femininas são as “heroínas da cultura de massa da mulher adulta”, são elas que as mulheres comuns geralmente “mencionam primeiro quando pensam no mito” (WOLF, 1992, p. 80).

A verdade é que as revistas femininas acompanharam o percurso que as mulheres vinham fazendo para liberar-se da Mística Feminina, bem como o avanço e sedimentação do Mito da Beleza. Assim que a emancipação das mulheres, a partir de meados do século XX, começou a gerar preocupação, “foi aperfeiçoada a produção em massa de imagens de beleza dirigidas às mulheres” (WOLF, 1992, p. 81). No Brasil as revistas femininas de maior circulação foram criadas nesse momento. A revista Nova nasceu em setembro de 1973, voltada para mulheres que trabalham fora, das classes A, B e C, com idade de 18 a 49 anos. Em abril de 2015 a revista mudou o nome para Cosmopolitan, focando-se mais ainda nos temas beleza e carreira. A mudança unificou o nome da revista em 61 países, que têm 100 milhões de leitoras , no Brasil a média de circulação mensal em 2014 foi de 184 mil 71

exemplares . Outra revista de ampla repercussão nacional, Claudia, foi lançada em 1961, 72

voltada para o comportamento feminino, hoje ocupa a posição número 1 de revistas mensais no Brasil, acumulando uma circulação média mensal de 419 mil exemplares em 2014 . Sua 73

história é emblemática. Criada com uma proposta feminista que auxiliava as mulheres a perceber os excessos do patriarcado, abandona esse discurso em 1980 e passa a focar-se em temas como beleza e o trabalho fora de casa. Naturalmente, não é possível deixar as meninas sem seu condicionamento. A revista Capricho, voltada para as adolescentes é lançada em 1952, publicando fotonovelas, mas em 1981 assume os contornos contemporâneos, de traduzir o mundo feminino para as adolescentes, incluindo-as desde cedo nos temas que

Informações disponíveis em: <http://www.meioemensagem.com.br/home/midia/noticias/2015/04/01/Revista- 71

Nova-vira-Cosmopolitan-no-Brasil.html>. Acesso em: 21 mar. 2016.

Dados disponibilizados pela Associação Nacional de Editores de Revista. Disponível em: < http://aner.org.br/ 72

dados-de-mercado/circulacao/>. Acesso em: 22 mar. 2016.

Disponível em: < http://aner.org.br/dados-de-mercado/circulacao/>. Acesso em: 22 mar. 2016. 73

“importam” no mundo feminino: a beleza e como cultivar o interesse dos homens e lidar com eles. Não coincidentemente é a partir de meados dos anos 1970 que as revistas passam a dizer às mulheres o quanto a beleza era fundamental, justamente quando a segunda onda do feminismo ameaçou desorganizar todo o sistema já estabelecido. Com o avanço das revistas, resultado de pesados investimentos publicitários, bem como o aumento do poder aquisitivo, a beleza pode ser “democratizada”. Se as revistas hoje concentram-se no universo da beleza e da carreira das mulheres é porque o serviço doméstico deixou de ter apelo de venda e anúncios do mais novo detergente para louças provocavam muito menos apelo consumista do que o mais novo creme com retinol do mercado, o produto que quando fornecido à pele “desempenha um papel importante no processo de renovação celular e desencadeia outros benefícios importantes para a saúde e a beleza” , assim nos dizem. Na matéria que fala sobre 74

os benefícios do retinol, segue-se uma galeria com sugestão de 16 produtos que estão no mercado que têm o “ingrediente de ‘ouro’ para frear os danos na pele”, produtos de gigantes mundiais do setor de dermocosméticos e maquiagens, como Sephora, Anna Pegova, La Roche-Posay, Vichy, Sisheido e L’Oréal Paris. Wolf (1992, p. 88) é muito clara: quando “a Mística Feminina evaporou, tudo o que restava era o corpo”. Pensando na lógica da representação do corpo a partir do desenvolvimento das possibilidades técnicas de produção de imagens, Michaud (2011, p. 563) chega à conclusão semelhante: “O corpo parece, nestas condições, o último ponto de ancoragem a que é possível apegar-se”.

As mudanças sociais que se apresentaram como resultado da primeira onda do feminismo e o impacto gerado pelo esfacelamento da Mística Feminina fez com que as vendas de revistas femininas sofressem uma queda entre 1965 e 1980, o conhecimento tradicional das revistas entrou em colapso, já que as mulheres estavam interessadas em outros assuntos. A focalização do interesse das revistas não mais pela alta moda ou pelo universo doméstico, fez com que as atenções voltassem para o corpo das mulheres, um espaço que a história mostrou, era um campo fértil para uma colonização violenta. “Destituídas de sua antiga autoridade, objetivo e ganho publicitário, as revistas inventaram - de forma quase inteiramente artificial - uma nova atração” (WOLF, 1992, p. 88). Criou-se uma “cultura de substituição”, colocando no centro das atenções um “problema” até aquele momento inexistente, o “estado natural da mulher e sua elevação ao posto de o dilema existencial feminino. […] A lucrativa ‘transferência de culpa’ foi ressuscitada bem na hora” (WOLF,

Disponível em: <http://mulher.uol.com.br/beleza/noticias/redacao/2015/06/23/seis-razoes-para-voce-investir- 74

1992, p. 88). A “transferência de culpa” foi a salvação econômica das revistas e a mídia então assumiu “a função ilusória exigida pela mentira vital da época e formou o mito da beleza contra a aparência das mulheres” (WOLF, 1992, p. 89). Poucos produtos da indústria cultural foram tão eficazes no processo de disseminar os ideias do Mito da Beleza quanto as revistas femininas, que juntando-se à indústria do audiovisual formaram uma dupla muito difícil de ser abatida. No entanto, mesmo assumindo que as revistas tenham tido um papel enorme na construção do mito - e mesmo de crítica à ele em um movimento “ambivalente”, como diz Wolf (1992, p. 93), raramente se reconhece que as revistas também disseminaram ideias feministas.

Se o tom de revistas como a Nova Cosmopolitan brasileira, à exemplo de sua irmã norte-americana observada por Wolf (1992, p. 90-91), tem um tom “otimista, individualista, estimulante” que diz às leitoras que nada deve impedir as mulheres de estar em sua melhor forma, que fala sem rodeios sobre a sexualidade feminina e o prazer individual que deve permear as relações amorosas e sexuais, acabam por ter a finalidade de “simbolizar a liberação sexual da mulher”, por outro lado, o tom de subserviência ao Mito da Beleza está por toda parte. Esse tom pró-feminista é derrubado por artigos que falam de cirurgias plásticas, da dieta da moda e dos mais novos lançamentos da indústria cosmética para manter a pele jovem e viçosa, “essas publicações vendem a versão mais letal do mito da beleza que o dinheiro pode comprar”. As mulheres da classe trabalhadora, mulheres comuns que não estavam nem nas trincheiras das lutas políticas femininas, nem nas universidades discutindo o assunto, tiveram contato, através dessas publicações, com uma série de ideias que balançavam a estrutura já montada de um patriarcalismo penoso. “As personalidades das revistas estão divididas entre o mito da beleza e o feminismo exatamente da mesma forma que as mentes das suas leitoras” (WOLF, 1992, p. 93). Ainda que reconheçam que as modelos que estampam as capas dessas publicações exibem corpos quase impossíveis de serem copiados, essas revistas representam a “cultura de massa das mulheres”, uma cultura de massa orientada para a mulher que não encontra outras perspectivas muito diferentes nos outros produtos da indústria cultural. Um homem lendo uma revista especializada para o mundo masculino, ainda que seja uma revista cujo tema maior seja o Mito da Beleza dirigido aos homens, como a Men’s Helth - produzida em 38 edições mundiais, tem tiragem mensal de 1,85 milhões de publicações, é lida por 12 milhões de leitores e foca suas atenções em exercícios, alimentação e sexualidade -, ela é apenas uma perspectiva entre tantas outras, afinal, não podemos esquecer que o discurso público, nas mais variadas esferas, é um discurso masculino. Vendo

um predomínio de temas econômicos, políticos e sociais na análise de múltiplas programações de rádios populares em Quito, em 1995, Mata diz que não é possível deixar de lado uma perspectiva de gênero. Que uma prática de produção de sentido está “sujeita a normas, condições e hábitos culturais, ou seja, não é natural nem imutável […], fruto de um certo desenvolvimento histórico-social que tampouco é neutro” (MATA, 1996, p. 67, tradução nossa) . O que é considerado relevante para o discurso da mídia de massa, das falas “sérias” 75

do jornalismo, por exemplo, é uma relevância definida culturalmente, socialmente, que reproduz, no âmbito da linguagem, diferenças historicamente estabelecidas e que fixam no âmbito masculino, tudo aquilo que importa. A fala feminina, inclusive suas temáticas - os âmbitos familiares, afetivos e pessoais, por exemplo -, é desvalorizada já que é entendida como uma fala menor. A enunciação digna de valor e atenção pública e coletiva é a fala masculina, na qual são reconhecidos os elementos que garantem sua importância: clareza, racionalidade, normas e decisões. “A linguagem comum da era industrial resultou carente de gênero… estendendo-se a imposição de uma linguagem sem gênero, uma linguagem neutra ou humana, que consistentemente domina a fala masculina” (MATA, 1996, p. 70, tradução nossa) . 76

Quando um homem lê a Men’s Health ele lê apenas uma perspectiva, violenta, sem dúvida, dentro de uma cultura de massa que, em geral, tem uma fala masculina, mas é apenas uma perspectiva. Já uma mulher, não. “Essas publicações são tudo o que a maioria das mulheres têm como acesso à sua própria sensibilidade de massa” (WOLF, 1992, p. 92). A posição das revistas ao incentivar o mito da beleza é uma posição econômica e tem relação direta com os anunciantes, mas ao mesmo tempo que publicam conteúdos que são favoráveis às mulheres em muitos aspectos, eles compõem um “índice de beleza”, pelo qual as leitoras “se medem”. “A reação do sistema baseado na beleza é disseminada e reforçada pelos ciclos de ódio a si mesmas provocados nas mulheres pela propaganda, pelas fotografias e matérias sobre a beleza nessas revistas” (WOLF, 1992, p. 96). Os anunciantes determinam a face do mito que aparece nas revistas, nos diz Wolf, mas certamente é razoável estender suas considerações para âmbitos no qual o mito só cresce e que à época que Wolf escreveu ainda não tinham tomado proporções massivas, como a internet de modo geral e as redes sociais de modo específico. Podemos dizer que os anunciantes dão os contornos do mito do sistema

sujeta a normas, condiciones y hábitos culturales, o sea, no naturales ni inmutables […] fruto de un cierto 75

desarrollo histórico-social que tampoco es neutro.

El lenguaje común de la era industrial resultó carente de género… tendiéndose a la imposición de un lenguaje 76

geral da cultura de massas. O conteúdo de uma emissão massiva destinada às mulheres reúne um todo, que inclui tanto anúncios, imagens e matérias de como deve ser uma mulher bonita, como deve se comportar uma mulher, quanto inclui esse conteúdo que é ambivalente e que efetivamente oferece algum poder e liberdade para as mulheres, quando dizem à elas, por exemplo, que exigir de uma relação sexual espaço para seu gozo é uma demanda justa e razoável. Esse todo é interpretado, de modo equivocado, como sendo uma mensagem coerente das revistas, por exemplo, dizendo como uma mulher deve ser, quando na verdade, se as mulheres estivessem mais atentas ao mito, poderiam facilmente separar o conteúdo útil do prejudicial.

A mulher modelo desenvolvida pela cultura de massa tem a aparência da

boneca do amor. As publicidades, os conselhos estão orientados de modo

bastante preciso para os caracteres sexuais secundários (cabelos, peitos, boca, olhos), para os atributos erógenos (roupas de baixo, vestidos, enfeites), para um ideal de beleza delgado, esbelto - quadris, ancas, pernas (MORIN, 1997, p. 141).

Não é desse modo que as mulheres devem ser. Esse é o modo que o mercado quer que as mulheres desejem ser, para que possam vender cirurgias, cremes anti-idade e remédios para emagrecer. Esse é o modo como a indústria por trás disso quer que as mulheres desejem ser. Editores não podem publicar certos tipos de conteúdo simplesmente porque há um consenso de que certas perspectivas não ajudam o Mito a crescer e manter-se firme. Certas matérias afastam anunciantes, “os editores ainda não são capazes de escolher matérias e testar produtos como se o mito não pagasse as contas” (WOLF, 1992, p. 101). Do mesmo modo e dentro da mesma lógica econômica e política a televisão e a telenovela devem apresentar certos modelos de aparência femininos, incentivar mulheres a serem de determinado modo e garantir que aquele é o melhor corpo e rosto que podem ter e devem ter. Ainda que as lutas feministas permitiram reorganização das narrativas nas telenovelas, dando às mulheres, por exemplo, o papel de protagonistas vilãs, a contra-ofensiva só permite que elas tenham uma determinada aparência e sejam escravas disso. Vilãs são personagens que seguem brutalmente e com desejos intensos seus objetivos até o final, algumas delas só recuando ou vacilando em nome de um dos elementos mais intensos da constituição do feminino de acordo com a distribuição cultural de papéis sociais: a maternidade. Foi a maternidade que fez Nazaré vacilar, que fez Carminha regenerar-se, que fez Yolanda lutar. Mas nem sempre a maternidade é suficiente nessas narrativas. Foi a impossibilidade de manter-se bonita e rica que parou Constância, foi a dependência da beleza e da elegância, do “parecer” de que fala Sibilia (2008), que a escravizou e que construiu sua punição ao final de Lado a Lado.

O aumento da quantidade de tempo que as pessoas passam à disposição do consumo de massa intensifica tudo, tanto a concorrência visual, quanto as exigências dos anunciantes. Em