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O homem, inspirado pela curiosidade e embebido de uma necessidade de compreender sua origem, busca no estudo da história as respostas de suas inquietações. Segundo Le Goff (2003, p. 9), desde

seu nascimento nas sociedades ocidentais [...], a ciência histórica define-se em relação a uma realidade que não é nem construída

nem observada como na matemática, nas ciências da natureza e nas ciências da vida, mas sobre a qual se 'indaga', se 'testemunha'.

A ciência histórica, diferentemente das ciências exatas e da natureza, busca nos vestígios deixados pela sociedade, elementos que ajudem na construção do conhecimento histórico. O historiador utiliza estes vestígios e se coloca na situação de um "investigador que se esforça para reconstruir um crime no qual não assistiu"(BLOCH, 2001, p. 69). Influenciado por sua subjetividade, o historiador é desafiado a seguir um método que o aproxime de uma objetividade. Este método é uma operação histórica e "se refere à combinação de um lugar social, de práticas 'científicas' e de uma escrita" (CERTEAU, 1982, p. 65). O compromisso do historiador com a objetividade histórica não anula o lugar social da história, mas deve condenar posições que confundem ciência histórica e empenho político. (LE GOFF, 2003). A "operação histórica" (CERTEAU, 1982, p. 65) deve inspirar na busca de novos vestígios, novos questionamentos para os já existentes, e principalmente, trazer á tona novos elementos para a constituição do saber histórico, porém sem o intuito de se fazer da constituição um "empenho político".

Nessa metodologia que o historiador se propõe a seguir, a pesquisa histórica é a "prática científica" (CERTEAU, 1982) e enriquece a elaboração do conhecimento histórico. Segundo José Honório Rodrigues (1978, p. 273),

a pesquisa quer servir à história, e para isso ela deve ser seletiva e compreensiva, tal como a própria história. A pesquisa está à procura de documentos e dos fatos. Os mesmos documentos podem fornecer respostas novas às perguntas novas.

A descoberta de um novo documento pode trazer novos elementos para o conhecimento histórico de um período, assim como um mesmo documento também ao receber nova leitura e/ou nova interpretação. Conforme Bloch (2001, p. 75), "o passado é, por definição, um dado que nada mais modificará. Mas o conhecimento do passado é uma coisa em progresso, que incessantemente se transforma e aperfeiçoa". Ou seja, o historiador não pode reviver o passado, mas pode reconstruir novas visões sobre este passado através de novos conhecimentos, novos olhares ou novos vestígios.

Este trabalho traz para o conhecimento da historiografia um novo documento histórico, fruto de pesquisa em diversos acervos documentais no Brasil e em Portugal. A transcrição paleográfica deste documento fornece à historiografia novo material de uma época, bem como abre a possibilidade de novos questionamentos e interpretações. Mas acima de tudo, este trabalho propõe uma discussão sobre a pesquisa histórica e a necessidade de recorrer às fontes documentais, tão enfatizada por Rodrigues (1978, p. 273), mas muitas vezes esquecida. Tanto no Brasil, quanto em Portugal, há muitos arquivos com documentos sobre a história do Brasil que jamais foram trabalhados pela historiografia. Há, também, obras que publicaram documentos históricos que foram equivocadamente transcritos, exigindo novas edições com a devidas correções.21

Conforme atenta ACIOLI (2003, p. 01),

problemas sérios têm sido enfrentados por historiadores que se fiam cegamente nas publicações de textos raros, comuns nos livros e revistas de História. O confronto dos originais com as suas transcrições tem demonstrado quão viciadas são muitas destas edições, por vários erros de leitura paleográfica.

Portanto, este trabalho destaca a importância da pesquisa histórica e do retorno à fontes originais. Estes erros de leitura paleográfica não deve desanimar o historiador contemporâneo, como salienta Le Goff, mais que a constatação da manipulação da constituição do saber histórico

não deve desembocar num ceticismo de fundo a propósito da objetividade histórica e num abandono da noção de verdade em história; ao contrário, os contínuos êxitos no desmascaramento e na denúncia das mistificações e das falsificações da história permitem um relativo otimismo a esse respeito.

Este trabalho de leitura paleográfica de um documento inédito por nunca ter sido publicado que proponho trazer à luz procura obedecer os métodos estabelecidos pela historiografia contemporânea acerca da pesquisa histórica, respeitando as

21

Ver ALMEIDA, Gisele C. C. de. “Correspondência Ativa” de Varnhagen - Análise da edição.

Anais do XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP-USP. São

Paulo, 08 a 12 de setembro de 2008, com o título Disponível em: http://www.anpuhsp.org.br/sp/downloads/CD%20XIX/PDF/Autores%20e%20Artigos/Gisele%20Alm eida.pdf

normas definidas pela Comissão de Sistematização e Redação do II Encontro de Normatização Paleográfica em 1993 e definidas como Normas Técnicas para a Transcrição e Edição de Manuscritos. Contudo, algumas mudanças foram feitas para adequar a leitura deste documento. Pois como defendia Rodrigues como um dos princípios fundamentais do trabalho do historiador é "que nenhum historiador, por mais ilustrado que seja, é uma autoridade que devamos seguir cegamente" (RODRIGUES, 1978, p. 275). Que este trabalho abra o caminho para novos estudos e questionamentos na historiografia, na paleografia e até mesmo na filologia.

II. A trajetória do autor e a construção de uma obra

A trajetória de Francisco Adolfo de Varnhagen é fundamental para inserir o manuscrito no contexto no qual foi escrito. Apesar de não haver datação cronológica, o texto informa sobre acontecimentos contemporâneos ao autor, sugerindo uma interpretação da provável época que foi escrito. E o estudo da trajetória do autor pode trazer à luz a época com a qual dialogava.

A. Francisco Adolfo de Varnhagen: um alemão, um português, um

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