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O papel dos instrumentos de cooperação econômica regional

Da IIRSA ao COSIPLAN: Desafios da Integração Física da América do Sul

5. O papel dos instrumentos de cooperação econômica regional

Um dos projetos da API que é de grande interesse para o Brasil é a rodovia Boa Vista–Georgetown, em virtude do con-traste entre o baixo custo do investimento e a magnitude dos benefícios que trará aos estados do noroeste. Mas, conforme

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notou o estudo da FIESP (2012), o governo da Guiana não tem capacidade endividamento para executar a obra: “As diversas al-ternativas financeiras aventadas até agora, com esquemas tradi-cionais de financiamento, mostraram-se inviáveis.” (FIESP, 2012, p. 179)

Para lidar com impasses deste tipo, o COSIPLAN anun-ciou, em novembro de 2011, por ocasião do lançamento da API, a criação de três grupos de trabalho, um dos quais sobre “Meca-nismos de Financiamento e Garantias.”5 Uma providência que poderia auxiliar as discussões desse grupo seria a de examinar os instrumentos desenvolvidos pelo Asian Development Bank (ADB) nos últimos 20 anos. Ao contrário do BID, que se con-centra no financiamento de projetos nacionais, o ADB tem se dedicado, desde a sua criação em 1966, à promoção da inte-gração econômica dos países asiáticos, com foco na busca de soluções para dois tipos de problemas: [a] contornar as restri-ções fiscais das economias pequenas; [b] desenhar projetos que possibilitem a formação de parcerias público-privada (PPP).

O atual perfil de integração econômica dos países asi-áticos pode ser descrito como uma rede de cadeias produtivas fragmentadas no âmbito da firma e integradas verticalmente no âmbito regional (Tavares, 2012). Nesta rede, seis economias operam como plataformas exportadoras de bens manufatura-dos parcialmente em países vizinhos: China, Cingapura, Coreia do Sul, Hong Kong, Japão e Malásia. Não por acaso, estes países estão entre os oito líderes mundiais na movimentação de contê-ineres, como mostra o gráfico 2.

5 Os outros dois grupos de trabalho tratarão de: [a] integração ferroviária sul-americana; [b]

telecomunicações.

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Gráfi co 2 – Movimentação de Contêineres: Principais Países em 2008

Milhões de TEUs

Fonte: http://data.worldbank.org

Para que este processo de divisão regional do trabalho se tornasse viável, foi necessário, entre outros requisitos, que a in-fraestrutura de transportes dos países menores acompanhasse o ritmo de modernização das economias líderes. O ADB cumpriu um papel central na superação deste desafi o através do apoio a um conjunto de iniciativas que se tornaram conhecidas como corredores regionais, conforme descreve o portal do banco sobre este tema (http://beta.adb.org/countries/gms/main). De fato, a ideia de corredor regional é equivalente à de eixo de integração, posto ambas estão orientadas pelo princípio de economias de aglomeração.

Como notou Srivastava (2011), o desenvolvimento de um corredor regional pode ser decomposto em cinco estágios caracterizados pelas seguintes questões: (i) infraestrutura de transporte; (ii) facilitação de comércio; (iii) logística; (iv) de-senvolvimento urbano; (v) densidade econômica. Os estágios não são necessariamente sequenciais, e suas fronteiras

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co são bem definidas. Contudo, as questões (iii) a (v) não po-dem ser enfrentadas adequadamente se as duas primeiras não estiverem minimamente resolvidas.

Existem atualmente diversos corredores regionais em ope-ração, com distintos graus de superposição geográfica e estágios de desenvolvimento, como por exemplo: [a] o chamado triângulo do crescimento formado por Indonésia, Malásia e Tailândia; [b]

Coreia do Sul – Japão, cujo eixo central é formado pelas transações entre Seul, Busan, Okinawa e Kyushu; [c] Hong Kong e Taiwan;

[d] Guandong e Fujian, províncias do sul da China que lideram o crescimento de um corredor mais amplo, o da Grande Sub- região do Mekong, que inclui Birmânia, Camboja, Laos,Tailândia e Vietnam (http://beta.adb.org/countries/gms/main).

Embora o estágio de integração econômica dos países asiáticos seja muito mais avançado do que o da América do Sul, e os estilos de inserção internacional sejam radicalmente distin-tos, a experiência do ADB contém uma lição importante para o COSIPLAN. Uma das dificuldades que os governos enfrentam ao formular projetos comuns na área de infraestrutura é o de encontrar soluções que atendam aos interesses nacionais de to-dos os participantes do empreendimento. Conforme mostra o modelo de Krugman (1991), determinadas combinações entre economias de aglomeração e redução de custos de transporte tendem a promover o desenvolvimento de algumas regiões em detrimento de outras. Nas palavras de Carciofi (2008), isto im-plica “un escenario de negociación compleja, donde rara vez los costos y beneficios son iguales para cada país, y donde los recur-sos económicos y políticos a disposición de cada parte también son asimétricos.” (p. 62) Os projetos apoiados pelo ADB revelam que a solução desta equação é factível, desde que suas variáveis sejam devidamente explicitadas.

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6. Conclusão

Com exceção de dois projetos na área de energia (o ga-soduto do nordeste argentino e a linha de transmissão Itaipu–

Yacyereta), a API constitui um programa de transportes que visa aumentar a participação de ferrovias e hidrovias na ma-lha logística da América do Sul. Independentemente de outros objetivos estratégicos, isto Mi VHULD VX¿FLHQWH SDUD MXVWL¿FDU R esforço de coordenação entre os governos. Como vimos, os montantes de investimentos requeridos são relativamente mo destos e os benefícios são inequívocos. Além de corrigir distor-ções históricas da geografia econômica do continente, criaria condições para o surgimento de novos atores interessados na unificação dos mercados regionais, e redefiniria os fundamen-tos dos tratados de integração vigentes entre esses países.

Ao lado das questões discutidas neste trabalho, os cro-nogramas dos projetos da API poderão ser prejudicados por diversos outros fatores, como, por exemplo, licenciamento ambiental, dificuldades nos processos de licitação, atrasos na liberação de verbas, disputas judiciais advindas da desapropria-ção de áreas, e reassentamento de populações atingidas pelas obras. Uma das atribuições explícitas do COSIPLAN é cuidar da solução de tais problemas, que são usuais em qualquer ação governamental no setor de infraestrutura. Entretanto, o desem-penho da API dificilmente será distinto daquele alcançado pela AIC se não forem superados os impasses abordados nas seções anteriores. As providencias requeridas não são triviais, mas ple-namente exequíveis, conforme atesta a experiência dos países asiáticos nas últimas duas décadas.

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