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O PATROCÍNIO E A MORALIDADE ADMINISTRATIVA

No documento O patrocínio da CEF a clubes de futebol (páginas 64-72)

4 O PATROCÍNIO DA CEF A CLUBES DE FUTEBOL

4.3 O PATROCÍNIO E A MORALIDADE ADMINISTRATIVA

A discussão sobre a legalidade do patrocínio da CEF aos clubes de futebol – vez que, como já exposto deste trabalho, a moralidade administrativa é princípio jurídico e sua não observância tem status de ilegalidade – passa,

17 BRASIL. Tribunal Regional Federal da Quarta Região. Acórdão em agravo de instrumento nº

5005442-53.2013.404.0000. Sport Club Corinthians Paulista e Antônio Pani Beiriz. Relator: Cândido Alfredo Silva Leal Júnior. Acórdão, 24 mai. 2013. Disponível em:

<https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_publico&doc=4136940 1924265351110000000561&evento=41369401924265351110000000273&key=8985397b7ac45b92b 4b256dde44711c9b78b970aec12cbd95d0b451cfb4aa88c>. Acesso em 21 mai. 2014.

obrigatoriamente pela definição das prerrogativas de seu regime jurídico. Isto porque a liberdade para contratar publicidade não informativa é exclusiva de pessoas jurídicas de Direito Privado, estando vedada esta prática às pessoas jurídicas de Direito Público, na forma do artigo 37, §1º da Constituição Federal.

Assim, repisa-se o que já foi trabalhado no segundo capítulo deste trabalho com a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 187):

O traço nuclear das empresas estatais, isto é, das empresas públicas e sociedades de economia mista, reside no fato de serem coadjuvantes de misteres estatais. Nada pode dissolver este signo insculpido em suas naturezas, Dita realidade jurídica representa o mais certeiro norte para a intelecção destas pessoas.

No sentido da orientação acima, o desembargador Cândido Alfredo Silva Leal Júnior entende que a Caixa Econômica Federal é justamente aquilo que veicula em seus recentes anúncios publicitários: mais que um banco. Transcreve-se trecho de seu voto abaixo:

A Caixa não é um banco comercial como o são os demais bancos comerciais. A Caixa é uma empresa pública federal e, nessa condição, está submetida a um estatuto distinto, com algumas obrigações e alguns direitos que a tornam diferente dos demais bancos comerciais.18

Tanto as obrigações, quanto os privilégios da CEF, preconizados em sua lei instituidora foram elencados no capítulo anterior. Realiza-se aqui simples levantamento das suas mais relevantes prerrogativas, quais sejam; o monopólio dos depósitos judiciais feitos na Justiça Federal, a gestão do FGTS, do Sistema Financeiro da Habitação, das loterias e o monopólio das operações de penhor civil.19 Frisa-se em separado que a Caixa administra também o fundo de programas sociais do Governo Federal, tais como o Bolsa Família, que apenas em 2013 distribuiu R$6,1 bilhões.20

18 BRASIL. Tribunal Regional Federal da Quarta Região. Acórdão em agravo de instrumento nº

5005442-53.2013.404.0000. Sport Club Corinthians Paulista e Antônio Pani Beiriz. Relator: Cândido Alfredo Silva Leal Júnior. Acórdão, 24 mai. 2013. Disponível em:

<https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_publico&doc=4136940 1924265351110000000561&evento=41369401924265351110000000273&key=8985397b7ac45b92b 4b256dde44711c9b78b970aec12cbd95d0b451cfb4aa88c>. Acesso em 21 mai. 2014.

19 Lei 7.973 de 28 de março de 2013, art. 5º.

20 CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Relatório da administração 2013. Disponível em:

<http://downloads.caixa.gov.br/_arquivos/caixa/caixa_demfinanc/Relatorio_da_Administracao_3T13.p df>. Acesso em 30 mai. 2014.

Destarte, inegável o forte vínculo entre CEF e o Governo Federal, ao ponto de não poucas vezes aquela ser vista como longa manus deste. Mais do que isso, pelo exposto tem-se longe de dúvidas o regime jurídico híbrido da CEF, e que dada a natureza de seus objetivos, não pode se dar ao sabor de gastos perdulários com publicidade não informativa, em dissonância com o artigo 37, §1º da Constituição Federal e o conceito de boa administração, caro ao princípio da moralidade administrativa.

E ainda que considerado o disposto no artigo 5º da Lei 7973/13, atribuindo à CEF a missão de fomentar o desporto nacional, na forma de aplicações não reembolsáveis ou parcialmente reembolsáveis, tem-se claro que o patrocínio em cifras nunca antes alcançadas no futebol brasileiro ao clube considerado mais rico do país é completamente desconexo da melhor exegese do dispositivo legal.21

Nada disso fosse suficiente, resta por fim a argumentação do advogado Antônio Pani Beiriz na ação popular que move contra CEF e SCCP, de que é no mínimo conspícuo que pouco tempo depois do término do mandato do presidente com icônica ligação ao SCCP, e com o país sob o comando de sua sucessora, se promova tamanha injeção de dinheiro público – ainda que sob as vestes de um contrato em tese proveitoso a ambas as partes – no referido clube por parte de uma instituição com capital 100% público.

Não é dizer, em nenhuma medida, que os fatos acima discorridos eivam o contrato de perfídia, mas simplesmente assinalar que o dito patrocínio levanta hipóteses desnecessárias sobre a higidez da instituição Caixa Econômica Federal. No que se colhe do adágio popular: “À mulher de César não basta ser honesta, tem que parecer honesta.”

21 BRASIL. Juízo Federal da 6ª Vara Federal de Porto Alegre. Decisão interlocutória em ação popular

nº 5065814-42.2012.404.7100. Antônio Pani Beiriz, Sport Club Corinthians Paulista, Caixa Econômica Federal – CEF, Jorge Fontes Hereda e União – Advocacia Geral da União. Magistrado: Altair Antônio Gregório. Decisão, 28 fev 2013. Disponível em:

<https://eproc.jfrs.jus.br/eprocV2/controlador.php?acao=acessar_documento_publico&doc=71136206 1418437481180000000005&evento=711362061418437481180000000009&key=124e7ebdb0311640 a67740c424b6ea5f4e47926b8d9d1f2a9d1240c55e44065e>. Acesso em 21 mai. 2014.

5 CONCLUSÃO

A pesquisa realizada procurou investigar o patrocínio da Caixa Econômica Federal a clubes de futebol, definindo sua legalidade ou não. Para tanto, fez-se necessário o estudo da principiologia administrativa, com ênfase no princípio da moralidade administrativa, e da organização administrativa, com minúcia na conceituação jurídica de empresa pública. Nesse sentido foi possível delimitar as funções e prerrogativas da CEF, oportunizando um embasado juízo sobre a situação problema.

Metodologicamente o trabalho arvorou-se na típica trindade dos trabalhos de conclusão de curso da instituição de ensino ao qual está vinculado, qual seja, método dedutivo, procedimento monográfico e do tipo pesquisa bibliográfica, valendo-se da lei, doutrina, jurisprudência, pareceres técnicos de instituições nacionais e artigos especializados em meio físico e eletrônico.

A legislação tocante à situação problema provou-se desconexa em alguns pontos e carente noutros, o que em parte contribui à própria gênese do problema de pesquisa e justifica o trabalho realizado. A jurisprudência ainda não enfrentou questão semelhante senão o próprio caso citado na pesquisa, que até o momento não foi julgado. Já a doutrina, embora não trate especificamente da problemática, oferece elementos para dirimi-la, vez que muitos dos conceitos trabalhados têm entendimentos pacíficos.

Os estudos realizados apontam de forma bastante conclusiva para a ilegalidade dos contratos de patrocínio entre CEF e os clubes de futebol, em flagrante desrespeito à moralidade administrativa e também a outros princípios norteadores da Administração Pública.

Nesse sentido, dada a morosidade do processo legislativo brasileiro, o impasse caminha para uma solução jurisprudencial, onde o entendimento dos julgadores dará, em última instância, sentido para os dispositivos legais conflitantes e incompletos.

Embora o trabalho tenha alcançado seus objetivos, logrando oferecer respostas contundentes ao questionamento formulado, não se pretende definitivo. Bem sabe-se que o campo do Direito Administrativo, em específico a aplicação de seus princípios e o regime jurídico das entidades da Administração Pública indireta, são espaços para discussões ainda mais densas, às quais este trabalho não se

prestou por não serem apropriadas a seu recorte temático e o tempo de pesquisa disponível.

Por fim, cumpre ressaltar que a natureza dessa pesquisa coaduna-se com o objetivo cidadão de uma Administração Pública transparente e honesta, ciente, no entanto, de que tais conceitos só abandonam o campo da abstração quando interiorizados à ação cotidiana de cada indivíduo. Em última análise, a mudança começa em cada um de nós.

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______. Juízo Federal da 6ª Vara Federal de Porto Alegre. Decisão interlocutória em ação popular nº 5065814-42.2012.404.7100. Antônio Pani Beiriz, Sport Club

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