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O patrocínio da CEF a clubes de futebol

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O PATROCÍNIO DA CEF A CLUBES DE FUTEBOL:

UMA ANÁLISE SOB O PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA

Florianópolis 2014

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O PATROCÍNIO DA CEF A CLUBES DE FUTEBOL:

UMA ANÁLISE SOB O PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel.

Orientador: Prof. Henrique B. Souto Maior Baião

Florianópolis

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Cumpre aqui dar crédito àqueles cuja contribuição tornou esse

trabalho possível, a começar pelo professor Henrique B. Souto Maior

Baião, pela orientação proporcionada, mas, sobretudo, pelas aulas

ministradas durante a graduação que em mim despertaram o gosto pelo

Direito Administrativo. Grato também à Unisul, pela estrutura e suporte

oferecidos ao longo de todo o curso. Agradeço à minha estimada avó,

Esther, que desde muito antes de minha escolha pela carreira jurídica,

depositou em mim confiança inabalável e amor incondicional. A meus

pais, Silvio e Maria Zaíde, cuja criação e exemplo fizeram de mim o

homem que sou hoje. Por fim, agradeço à minha mulher, Carolina, pelo

carinho, incentivo, companheirismo e compreensão quando toda vez

que, em virtude deste trabalho, lhe dediquei menos do que lhe cabia.

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A presente monografia, na área do Direito Administrativo, investigou os recentes patrocínios da Caixa Econômica Federal a clubes de futebol, tendo por base de pesquisa os princípios da Administração Pública, em especial o da moralidade administrativa. Foram também alvo de pesquisa as atribuições e limites das empresas públicas, com particular análise à lei instituidora da CEF. Em termos metodológicos fui utilizada a monografia como procedimento, com método dedutivo e pesquisa do tipo bibliográfica à legislação, doutrina, jurisprudência, pareceres emitidos por instituições nacionais e artigos em meio físico e digital. Os resultados do cotejo dos conceitos definidos no desenvolvimento da pesquisa apontaram para a ilegalidade dos patrocínios referidos, uma vez que configuram afronta à moralidade administrativa, entre outros princípios norteadores da Administração Pública.

Palavras-chave: Direito Administrativo, Moralidade administrativa, Caixa Econômica

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1 INTRODUÇÃO ... 10

2 NOÇÕES GERAIS SOBRE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ... 12

2.1CONCEITO ... 12 2.1.1 Critério subjetivo ... 13 2.1.2 Critério objetivo ... 13 2.1.3 Considerações complementares ... 14 2.2PRINCÍPIOS ... 15 2.2.1 Legalidade ... 16 2.2.2 Impessoalidade ... 16 2.2.3 Publicidade ... 17 2.2.4 Finalidade ... 18 2.2.5 Continuidade ... 18 2.2.6 Autotutela ... 19 2.2.7 Segurança jurídica ... 19

2.2.8 Supremacia do interesse público ... 20

2.2.9 Razoabilidade ... 21

2.2.10Eficiência ... 21

2.2.11Motivação ... 22

2.3MORALIDADE ADMINISTRATIVA ... 22

2.3.1 Evolução histórica ... 24

2.3.2 Moralidade administrativa no direito brasileiro hodierno ... 25

3 NOÇÕES GERAIS SOBRE A ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA ... 28

3.1ADMINISTRAÇÃO DIRETA ... 28

3.2ADMINISTRAÇÃO INDIRETA ... 30

3.2.1 Autarquias ... 31

3.2.1.1 Autarquias de regime especial ... 34

3.2.2 Fundações ... 35

3.2.2.1 Fundações públicas ... 36

3.2.2.2 Fundações privadas ... 36

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4 O PATROCÍNIO DA CEF A CLUBES DE FUTEBOL ... 46 4.1A HIPÓTESE LICITATÓRIA ... 46 4.1.1 Licitação ... 47 4.1.1.1 Princípios ... 48 4.1.1.1.1Igualdade ... 48 4.1.1.1.2Legalidade ... 49 4.1.1.1.3Impessoalidade ... 50 4.1.1.1.4Moralidade e probidade ... 50 4.1.1.1.5Publicidade ... 50

4.1.1.1.6Vinculação ao instrumento convocatório ... 51

4.1.1.1.7Julgamento objetivo ... 51 4.1.1.1.8Adjudicação Compulsória ... 52 4.1.1.2 Modalidades ... 53 4.1.1.2.1Concorrência ... 53 4.1.1.2.2Tomada de preços ... 54 4.1.1.2.3Convite ... 55 4.1.1.2.4Concurso ... 56 4.1.1.2.5Leilão ... 56 4.1.1.2.6Pregão ... 57

4.1.2 A obrigatoriedade de licitação nos contratos da CEF com os clubes de futebol ... 58

4.2O CASO CORINTHIANS ... 60

4.3O PATROCÍNIO E A MORALIDADE ADMINISTRATIVA... 63

5 CONCLUSÃO ... 66

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho é desenvolvido na área do Direito Administrativo e se ocupa de investigar o patrocínio da Caixa Econômica Federal a clubes de futebol sob o espectro do princípio da moralidade administrativa.

Em 2012 a Caixa Econômica Federal, a exemplo do que o BMG havia feito anos antes, iniciou uma série de patrocínios a clubes de futebol, veiculando sua marca nos uniformes destes. A princípio, em valores modestos e com times de pouca expressão no cenário nacional, o foco logo mudou no ano seguinte, quando contratos vultosos foram firmados com clubes tradicionais, ao ponto de, pelo valor de R$30.000.000,00 (trinta milhões de reais), ser celebrado o maior patrocínio da história do futebol brasileiro entre CEF e Sport Club Corinthians Paulista.

Seguido ao descontentamento popular daqueles que consideraram tal investimento inócuo ou dos que sentiram seu clube desprestigiado por não receber semelhante injeção de capital por parte da empresa pública, adveio o desagrado jurídico, materializado na ação popular erigida por Antônio Pani Beiriz, clamando pela ilegalidade do contrato entre CEF e SCCP e pedindo sua anulação.

O processo, ainda em fase de tramitação, não é capaz de responder por ora sobre a legalidade ou não do patrocínio, de modo que até o momento da confecção deste trabalho, tal questionamento permanece em aberto.

A isso soma-se o tema da moralidade administrativa, que no Direito Administrativo brasileiro – ramo relativamente jovem de nosso arcabouço jurídico e campo de agudos debates doutrinários – ainda encontra resistência, de sorte sua investigação é tão bem vinda quanto necessária.

Ainda, denota-se que o volume de dinheiro público movimentado pelos fatos expostos não pode ser ignorado, de modo que uma pesquisa sobre esse investimento é de grande importância num país cuja ingerência do poder público sobre o erário é alvo de duras críticas.

Nesse sentido se configura o escopo do trabalho: definir, de acordo com as disposições normativas e o estudo do princípio da moralidade administrativa, se o investimento da CEF em exposição de imagem com clubes de futebol é legítimo. Na consecução deste objetivo os esforços de pesquisa serão ordenados em três sentidos, quais sejam: investigar o princípio da moralidade administrativa, estabelecendo seus vieses juridicamente aplicáveis; perquirir o conceito de empresa

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pública, com vistas a definir os limites de ação e prerrogativas da Caixa Econômica Federal; e confrontar os resultados das atividades anteriores em síntese capaz de ajudar a responder o questionamento principal.

Para tal, elegeu-se o método de abordagem dedutivo em procedimento monográfico com técnica de pesquisa bibliográfica baseada na consulta à legislação e jurisprudência brasileira, pareceres oficiais de instituições nacionais, doutrina e artigos de periódicos especializados, em meios físico e eletrônico.

A presente monografia se apresentará na forma de cinco capítulos, dos quais o primeiro é esta introdução, que se ocupa de delimitar o tema, objetivos e métodos da pesquisa.

No capítulo seguinte será realizado estudo sobre as noções gerais da administração pública, conceituando-a sob o critério objetivo e subjetivo e apresentando cada um de seus princípios norteadores, com atenção especial ao princípio da moralidade administrativa, ao qual se prestará análise minuciosa.

O terceiro capítulo versará sobre noções gerais da organização administrativa, definindo o que são administração pública direta e indireta, bem como os entes pertencentes à segunda, em especial a empresa pública, categoria a qual pertence à Caixa Econômica Federal, que também será alvo de detida investigação.

No penúltimo capítulo serão levantadas hipóteses jurídicas sobre a ilegalidade do patrocínio da CEF aos clubes de futebol, ora como fruto do cotejo entres os estudos realizados nos capítulos anteriores, ora em conceitos a serem desenvolvidos no próprio capítulo.

O quinto e último capítulo se prestará ao fechamento da pesquisa realizada, com a discussão de seus resultados e outra considerações finais pertinentes.

Realizadas as necessárias colocações introdutórias, passa-se à pesquisa propriamente dita.

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2 NOÇÕES GERAIS SOBRE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Inicia-se esta pesquisa com uma exposição preliminar sobre a Administração Pública, seu conceito e princípios, com o escopo de oferecer base sólida à investigação e desenvolvimento da definição de moralidade administrativa. Assim, os tópicos subseqüentes apresentarão análises discretas sobre numerosos aspectos da Administração Pública, para somente ao fim deste capitulo esmiuçar o estudo do princípio da moralidade administrativa.

2.1 CONCEITO

Etimologicamente, o vocábulo administração importa sentido de servidão, conforme leciona Oswaldo Aranha Bandeira de Mello (2007 apud DI PIETRO, 2012, p. 49) ao demonstrar como uma das hipóteses de origem da expressão a junção da preposição latina ad com o verbo ministro, tendo este o significado de servir/executar para outrem.

Nesta esteira, segue a autorizada opinião de Ruy Cirne Lima (2007, p. 37), distinguindo administração e propriedade ao asseverar:

A palavra administração, nos quadros do direito privado, designa geralmente a atividade do que não é proprietário – [...] Opõe-se a noção de administração à de propriedade nisto que, sob administração, o bem se não entende vinculado à vontade ou personalidade do administrador, porém, à finalidade impessoal a que essa vontade deve servir. [...] Em direito público, designa também, a palavra administração a atividade do que não é senhor absoluto.

Ainda no mesmo sentido, arvora-se Hely Lopes Meirelles (2012, p. 66) quando dissocia governo e administração, elencando o primeiro como atividade política, discricionária e independente, e o segundo como atividade neutra, hierarquizada e normalmente vinculada à lei ou norma técnica. Desse modo, administração seria o meio pelo qual o governo dá corpo às suas decisões, daí impende seu caráter servil. A esse respeito, Meirelles observa:

A Administração é o instrumental de que dispõe o Estado para pôr em prática as opções políticas do Governo. Isto não quer dizer que a Administração não tenha poder de decisão. Tem. Mas o tem somente na área de suas atribuições e nos limites legais de sua competência executiva, só podendo opinar e decidir sobre assuntos jurídicos, técnicos, financeiros

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ou de conveniência e oportunidade administrativas, sem qualquer faculdade de opção política sobre a matéria. (MEIRELLES, 2012, p. 66).

Uma vez compreendido o conceito genérico de administração pública, faz-se necessária sua conceituação jurídica, assunto sobre o qual se debruçaram muitos autores, valendo-se de diversos critérios. Entretanto, a mais autorizada doutrina pátria é uníssona ao conceituar em critério objetivo e subjetivo os mais completos espectros de estudo da administração pública.

2.1.1 Critério subjetivo

Sob o critério subjetivo, também chamado orgânico ou formal, a administração pública classifica-se de acordo com os órgãos que a executam. Nas palavras da jurista Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012, p. 58), administração pública em sentido subjetivo é “o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a lei atribui o exercício da função administrativa do Estado.”

Tal concepção pode revelar-se obscura sem o adequado entendimento da alegoria jurídica de separação dos poderes, levando à falsa conclusão de que administração pública em sentido subjetivo é simplesmente o Poder Executivo. Impressão esta que se eliminará em breve.

2.1.2 Critério objetivo

Em sentido objetivo, denominado também funcional ou material, a administração pública classifica-se conforme a natureza da atividade exercida por determinado órgão. Di Pietro (2012, p. 55) conceitua em critério objetivo a administração pública da seguinte forma:

Em sentido objetivo, a Administração Pública abrange as atividades exercidas pelas pessoas jurídicas, órgãos e agentes incumbidos de atender concretamente às necessidades coletivas; corresponde à função administrativa, atribuída preferencialmente aos órgãos do poder executivo. Nesse sentido, a Administração Pública abrange o fomento, a polícia

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Note-se que a professora Di Pietro assevera que a função administrativa é atribuída preferencialmente, e não exclusivamente, ao Poder Executivo, o que remete ao questionamento do item anterior, a ser dirimido no seguinte.

2.1.3 Considerações complementares

Como mencionado retro, a compreensão da alegoria da separação dos poderes constitui elemento vital para o entendimento da função administrativa e do próprio conceito de administração pública. Isto porque a própria expressão separação induz à falaciosa idéia de que os poderes estão de alguma forma suspensos e hermeticamente dissociados uns dos outros.

Na verdade, os poderes comunicam-se, em equilíbrio, na tradicional composição dos freios e contrapesos1 presentes na vasta maioria das constituições ocidentais, sob a máxima de Montesquieu (1974, p. 236): “só o poder limita o poder”.

Assim, nenhum dos três poderes detém monopólio sobre qualquer função, senão mera preponderância. Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 34) é claro ao discorrer sobre o tema:

Eis, pois, que, de acordo com tais formulações, tanto Legislativo quanto Judiciário, como Executivo, exerceriam as três funções estatais: de modo normal e típico aquela que lhes corresponde primacialmente – respectivamente, legislar julgar, e administrar – e em caráter menos comum (ou até mesmo em certas situações muito invulgares como ocorre no processo de impeachment), funções, em princípio, pertinentes a outros órgãos do Poder. À vista disto, jamais se poderia depreender, com segurança, se uma atividade é legislativa, administrativa ou jurisdicional pelo só fato de provir do corpo Legislativo, Executivo ou Judiciário [...].

Destarte, fica claro que administração pública em sentido subjetivo, não se constitui somente do Poder Executivo e, tampouco dos atos por ele emanados em sentido objetivo.

Uma vez dominado o conceito, tanto genérico quanto jurídico, de administração pública, passa-se à análise dos princípios que a regem, com maior ênfase àquele que é objeto principal desta pesquisa.

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2.2 PRINCÍPIOS

Princípios, em acepção genérica, “são as preposições básicas, fundamentais, típicas que condicionam todas as estruturações subseqüentes. Princípios, nesse sentido, são os alicerces da ciência.” Como bem conceitua José Cretella Júnior (1997 apud DI PIETRO, 2012, p. 63, grifo da autora).

Diogenes Gasparini esclarece que, em Direito, via de regra, os princípios não são positivados, quando muito, apenas mencionados, a exemplo do artigo 37 da CRFB/88. Tendo em conta o caráter basilar dos princípios, conforme demonstrado no parágrafo supra, quando transportados ao meio jurídico constituem-se em elementos fundamentais de um sistema normativo, irradiando sua teleologia ao conjunto de normas a eles afetas (GASPARINI, 2012).

Assim, dada sua importância, o respeito aos princípios é medida de maior prevalência do que o respeito à própria norma, sendo sua afronta verdadeiro ato teratológico, como bem explica Celso Antônio Bandeira de Mello (2004 apud GASPARINI, 2012, p. 61):

[...] violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.

No tocante aos princípios que norteiam a administração pública, é possível vê-los em maioria, de forma incomum, presentes no corpo normativo, tanto no artigo 37 da CRFB/88 que elenca legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, quanto o artigo 2° da Lei 9784/99 que lista complementarmente finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica e interesse público.

Será sobre alguns desses princípios, e alguns outros, uma vez que o rol acima não é exauriente, que se prestará ligeira análise nos tópicos subseqüentes, com particular extensão e detença ao princípio da moralidade, que será investigado em seção distinta.

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2.2.1 Legalidade

Cuida-se aqui do princípio tido como a essência do Estado de Direito (MELLO, 2007, p. 96), consagrando a inafastabilidade da administração pública, bem como toda sua atividade, dos ditames da lei. Gasparini (2012, p. 61) conceitua dito vínculo de maneira cristalina quando diz que o campo de ação da administração pública “é bem menor que o do particular. De fato, este pode fazer tudo que a lei permite e tudo que a lei não proíbe; aquela só pode fazer o que a lei autoriza e, ainda assim, quando e como autoriza.”

Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 97) vai além ao desvelar o viés teleológico do princípio da legalidade ensinando que:

[...] ele é a tradução jurídica de um propósito político: o de submeter os exercentes do poder em concreto – o administrativo – a um quadro normativo que embargue favoritismos, perseguições ou desmandos. Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada, pois, pelo Poder Legislativo [...] garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a concretização desta vontade geral.

Dessa forma, tem-se o princípio da legalidade como mais do que uma idéia que norteia a administração pública, mas como verdadeira base política sobre a qual se assenta o Estado.

2.2.2 Impessoalidade

Gasparini (2012, p. 62) define o princípio da impessoalidade ao lecionar que “a atividade administrativa deve ser destinada a todos os administrados, dirigida aos cidadãos em geral, sem determinação de pessoa ou discriminação de qualquer natureza.”

Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 110) preleciona as vedações deste princípio, o que aqui oportunamente se transcreve:

Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis. Simpatias ou animosidades pessoais, políticas ou ideológicas não podem interferir na atuação administrativa e muito menos interesses sectários, de facções ou grupos de qualquer espécie. O princípio em causa não é senão o próprio princípio da igualdade ou isonomia.

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O conceito de impessoalidade não se encerra no disposto acima para Di Pietro, que abrange sua perspectiva em consonância com José Afonso da Silva, cujo entendimento é de que “os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade administrativa da Administração Pública.” (SILVA, 2003 apud DI PIETRO, 2012, p. 68). Assim, para a jurista, a impessoalidade administrativa deve ser aplicada tanto para com aos administrados quanto para com a Administração (DI PIETRO, 2012, p. 68).

2.2.3 Publicidade

Trata-se o princípio da publicidade do dever de ampla divulgação dos atos realizados pela Administração Pública, guardadas as exceções previstas em lei. (DI PIETRO, 2012, p. 72). Não é elemento formativo do ato, mas sim requisito de eficácia e moralidade. Por tanto, atos ilegítimos não se convalidam com a publicação e tampouco os legítimos podem dispensá-la sem comprometer sua exeqüibilidade. (MEIRELLES, 2012, p. 96).

Como colocado, o princípio da publicidade não é aplicado universalmente, tendo suas ressalvas previstas legalmente, as quais Diogenes Gasparini (2012, p. 65) elenca no fragmento transcrito:

A essa regra escapam os atos e as atividades relacionados com a segurança nacional (art. 5º, XXXIII, da CF). os ligados a certas investigações, a exemplo dos processos disciplinares, de determinados inquéritos policiais (art. 20 do CPP) e dos pedidos de retificação de dados (art. 5º, LXXII, b, da CF), desde que prévia e justificadamente sejam assim declarados pela autoridade competente.

Ressalta-se ainda o alerta de Hely Lopes Meirelles (2012, p. 97) de que a publicidade “abrange toda atuação estatal, não só sob o aspecto de divulgação oficial de seus atos como, também, de propiciação de conhecimento da conduta interna de seus agentes.” Não obstante, “sob pena de lesar os princípios da impessoalidade, finalidade e moralidade, a publicidade não poderá caracterizar promoção pessoal do agente público.” (MEIRELLES, 2012, p. 100).

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2.2.4 Finalidade

O princípio da finalidade trata da exigência de que o ato administrativo seja praticado sempre com vistas ao interesse público ao qual se destina, estando o administrador defeso de valer-se de qualquer escopo diverso (MEIRELLES, 2012).

Em conformidade com o princípio da legalidade, a finalidade é de particular relevância, eis que esta vigia aquela, como nota-se da lição de Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 103): “por isso se pode dizer que tomar uma lei como suporte para a prática de ato desconforme com sua finalidade não é aplicar a lei; é desvirtuá-la; é burlar a lei sob pretexto de cumpri-la.”

E mais, a necessidade do princípio da finalidade cinge-se justamente na falsa observância da legalidade através de abjetas hermenêuticas, como bem coloca Mello (2007, p. 104):

Na verdade, só se erige o princípio da finalidade em princípio autônomo pela necessidade de alertar contra o risco de exegeses toscas, demasiadamente superficiais ou mesmo ritualísticas, que geralmente ocorrem por conveniência e não por descuido do intérprete.

Isto posto, tem-se a dupla função do princípio da finalidade, assegurar a primazia do interesse público (MEIRELLES, 2012) e salvaguardar o princípio da legalidade (MELLO, 2007), consubstanciada numa só.

2.2.5 Continuidade

De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012, p. 71), “por esse princípio entende-se que o serviço público, sendo a forma pela qual o Estado desempenha funções essenciais ou necessárias à coletividade, não pode parar.” Por isso, greves em serviços como saúde, transporte, justiça e combate a incêndios eram até pouco tempo atrás, completamente vedadas. Há, no entanto, hoje, em virtude do artigo 37, VII, da CRFB de 1988, o entendimento que às greves de servidores públicos aplica-se o disposto na Lei 7873/89. (DI PIETRO, 2012).

Gasparini (2012, p. 71) aponta também que é por exigência do princípio da continuidade que:

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[...] veda-se àquele que contrata com a Administração Pública a possibilidade de valer-se da exceção de contrato não cumprido, prevista no art. 476 do Código Civil, quando a Administração Pública, sem ter cumprido sua obrigação, exige a satisfação de obrigação de quem com ela contratou.

Assinale-se que continuidade não significa em si atividade ininterrupta, porém regular, dentro de sua normalidade. José Cretella Júnior (1972 apud GASPARINI, 2012, p. 72) faz esta oportuna observação ao dizer que a continuidade “não significa que todos os serviços devem funcionar de maneira permanente, porque muitos deles são por natureza intermitentes, [...], mas significa que o serviço deve funcionar regularmente, isto é, de acordo com sua natureza [...]”.

2.2.6 Autotutela

A autotutela, como princípio de direito administrativo, é definida como a faculdade/obrigação de que dispõe a Administração Pública para controlar os próprios atos, com a prerrogativa de anular os ilegais ou revogar os inconvenientes ou inoportunos, sem qualquer interferência do Poder Judiciário. (DI PIETRO, 2012).

Gasparini (2012, p. 73) leciona com acuidade as circunstâncias em que o ora apresentado princípio se faz valer, bem como o modo pelo qual se executa:

Se, por erro, culpa, dolo ou interesses escusos de seus agentes a atividade do Poder Público desgarra-se da lei, divorcia-se da moral, ou desvia-se do bem comum, é dever da Administração invalidar, espontaneamente ou mediante provocação, o próprio ato, contrário à sua finalidade, por inoportuno, inconveniente, imoral ou ilegal.

Dito poder da Administração encontra albergue nas súmulas 3462 e 4733 do STF.

2.2.7 Segurança jurídica

O princípio da segurança jurídica, antes de administrativo, é princípio geral de Direito, cujo conteúdo foi adaptado ao norteamento da Administração

2 A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.

3 A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais,

porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

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Pública e consagrado no artigo 2º da Lei 9784/99, mais precisamente no inciso XIII de seu parágrafo único ao vedar expressamente a “aplicação retroativa de nova interpretação.”

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, por ter colaborado no anteprojeto da lei acima referida oferece imprescindíveis considerações a respeito deste princípio:

O princípio se justifica pelo fato de ser comum, na esfera administrativa, haver mudança de interpretação de determinadas normas legais, com a consequente mudança de orientação, de caráter normativo, afetando situações já reconhecidas e consolidadas na vigência de orientação anterior. Essa possibilidade de mudança é inevitável, porém gera insegurança jurídica, pois os interessados nunca sabem quando sua situação será passível de contestação pela própria Administração Pública. Daí a regra que veda a aplicação retroativa. (DI PIETRO, 2012, p. 85)

A jurista ainda ressalva a necessidade de aplicar tal princípio com parcimônia, sob pena de perpetuar a teratologia de não permitir a anulação de atos administrativos eivados na ilegalidade, o que, assevera Di Pietro, nada tem a ver com mudança de interpretação, devendo-se sim retroagir diante de tais situações, uma vez que atos ilegais não geram direitos. (DI PIETRO, 2012).

2.2.8 Supremacia do interesse público

A supremacia do interesse público sobre o privado é, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 93), “princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência”. Seu sentido é sintetizado por José Cretella Júnior (1974 apud GASPARINI, 2012, p. 74) ao declarar que “no embate entre o interesse público e o particular há de prevalecer o público.”

No entanto, tal supremacia não se confunde com tirania sobre o direito privado, como bem alerta Gasparini (2012, p. 74):

A aplicabilidade deste princípio, por certo, não significa o total desrespeito ao interesse privado, já que a Administração deve obediência ao direito adquirido, à coisa julgada e ao ato jurídico perfeito, consoante prescreve a Lei Maior da República (art. 5º, XXXVI). De sorte que os interesses patrimoniais afetados pela prevalência do interesse público devem ser indenizados cabalmente.

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Hely Lopes Meirelles (2012, p. 109) arremata ensinando que a supremacia do interesse público “é o motivo da desigualdade jurídica entre a Administração e os administrados, mas essa desigualdade advém da lei, que, assim, define os limites da própria supremacia.”

2.2.9 Razoabilidade

O princípio em apreço preleciona que a Administração, quando do exercício da discricionariedade, deve observar critérios aceitáveis de racionalidade, além de estar em sintonia com o bom senso do cidadão médio equilibrado e com a finalidade do ato que exerce. (MELLO, 2007).

Nesse sentido repousa o entendimento de Gasparini (2012, p. 78), cuja definição é de transcrição obrigatória:

A lei, ao conceder ao agente público o exercício da discricionariedade, não lhe reservou, em absoluto, qualquer poder para agir a seu gosto, ao contrário, impôs-lhe o encargo de agir tomando a melhor providência à satisfação do interesse público a ser conseguido naquele momento. [...] Em suma: nada que esteja fora do razoável, do sensato, do normal, é permitido ao agente público, mesmo quanto atua no exercício de competência discricionária.

Concebido para deter eventuais excessos nas situações de discricionariedade na Administração Pública, o princípio da razoabilidade não se limita a estas, podendo também ser aplicado a qualquer outra atividade administrativa para verificar sua validade. (MEIRELLES, 2012).

2.2.10 Eficiência

O princípio da eficiência, chamado pelos italianos de princípio da boa administração, exige da Administração Pública, bem como de seus agentes, a execução de suas atribuições com rapidez, perfeição e rendimento, sem perder vistas ao princípio da legalidade. (GASPARINI, 2012, p. 76)

Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 117/118) guarda opinião conservadora sobre este princípio, considerando-o juridicamente inaplicável, conforme se demonstra no trecho a seguir:

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Trata-se, evidentemente, de algo mais que desejável. Contudo, é juridicamente tão fluido e de tão difícil controle ao lume do Direito, que mais parece um simples adorno agregado ao art. 37 ou um extravasamento de uma aspiração dos que buliram no texto.

Di Pietro (2012, p. 85) empresta maior importância à eficiência, contudo, alerta que esta “se soma aos demais princípios impostos à Administração, não podendo sobrepor-se a nenhum deles, especialmente ao da legalidade, sob pena de sérios riscos à segurança jurídica e ao próprio Estado de Direito.”

2.2.11 Motivação

O princípio da motivação exige da Administração Pública a exposição dos motivos de fato (fundamentação circunstancial) e de direito (fundamentação jurídica) para prática de qualquer ato administrativo, devendo tal exposição ser prévia ou contemporânea ao ato que ensejou. (GASPARINI, 2012).

A não observância do disposto acima tem sérias conseqüências, como afirma Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 109):

Assim, atos administrativos praticados sem a tempestiva e suficiente motivação são ilegítimos e invalidáveis pelo Poder Judiciário toda vez que sua fundamentação tardia, apresentada apenas depois de impugnados em juízo, não possa oferecer segurança e certeza de que os motivos aduzidos efetivamente existiam ou foram aqueles que embasaram a providência contestada.

Com efeito, Hely Lopes Meirelles (2012, p. 106) bem leciona ao colocar que “esses motivos afetam de tal maneira a eficácia do ato que sobre eles se edificou a denominada teoria dos motivos determinantes, delineada pelas decisões do Conselho de Estado da França e sistematizada por Jèze.”

2.3 MORALIDADE ADMINISTRATIVA

Cumpre antes mesmo da abordagem per se do princípio da moralidade administrativa, traçar algumas considerações sobre a relação entre direito e moral, como base para as análises vindouras.

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Primeiramente, ao que são elementos distintos, não estão completamente dissociados. Lição ilustrada por Fernando Couto Garcia (2003), senão veja-se:

Na sociedade moderna, não se pode confundir o Direito com a Moral. Portanto, uma norma moral não é, apenas por ser norma moral, válida dentro do sistema jurídico. No entanto, o fechamento operativo do sistema não significa isolamento causal e "não se pode negar a circunstância de que as fundamentações éticas e jurídicas possam coincidir."

Além disso, ao se discorrer sobre direito e moral deve-se ter em mente a possibilidade de abordar dois casos distintos. Pois, pode-se investigar o diálogo do direito com a moral convencional ou com a moral crítica. Moral convencional é o fenômeno social pelo qual um conjunto de juízos de valor e normas de comportamento são criados e respeitados por um dado grupo social, sendo variável no tempo e espaço. Moral crítica, por sua vez, é a medida crítica dos atos humanos, mais especificamente das instituições humanas, tais como o direito e o Estado. (BARBOZA, 2002). Em que pese tal diferenciação, moral convencional e moral crítica não são institutos diametralmente distintos, ao contrário, comunicam-se, partilham conteúdos. (WAICK, 2009).

Tratar-se-á aqui sobre a relação entre direito e moral crítica, a qual, segundo Márcia Noll Barboza (2002, p. 56), se expressa por dois argumentos, o da legitimação e o dos princípios.

Sob o argumento da legitimação, do qual é autor Jürgen Habermas, defende-se que o Direito, mesmo dispondo de critérios institucionais autônomos, tem seus discursos, eminentemente jurídicos, abertos à argumentação moral, sendo isso inclusive o que lhe legitima. (BARBOZA, 2002). A esse respeito o próprio autor exemplifica:

Os princípios morais do direito natural transformaram-se em direito positivo nos modernos Estados constitucionais. Por isso, a lógica da argumentação permite ver que os caminhos de fundamentação, institucionalizados através de processos jurídicos, continuam abertos aos discursos morais. (HABERMAS, 1997 apud BARBOZA, 2002, p. 59-60).

Pelo argumento dos princípios, cujo criador é Robert Alexy, afirma-se que os ordenamentos jurídicos, bem como as normas que deles fazem parte e as decisões que emanam, possuem o objetivo intrínseco de correção. Soma-se a esta premissa a de que todos os ordenamentos jurídicos não rudimentares possuem

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princípios, sendo estes compostos no plano moral. Alexy defende que nos casos onde as normas positivas não forem suficientes para alcançar a correção já mencionada, deverá o magistrado valer-se dos princípios, incorporando em última análise, a moral ao direito. (BARBOZA, 2002)

Tecidas as necessárias considerações sobre direito e moral, passa-se ao estudo específico da moralidade administrativa.

2.3.1 Evolução histórica

A doutrina é uníssona ao congraçar Maurice Hauriou como o criador do conceito de moralidade administrativa ainda no início do séc. XX.4 Ao passo que

respeitáveis vozes do administrativismo, como Antônio José Brandão (1951, p. 457) afirmarem que o termo foi publicado nas decisões do Conselho de Estado Francês em 1917, publicações recentes (BARBOZA, 2002, p. 89) apontam que Hauriou já havia desenvolvido e publicado a noção de moralidade administrativa em 1903 na sua Déclaration de Volonté dans Le Droit Administratif Français, conforme se mostra:

O Conselho de Estado parte da idéia de que a Administração está vinculada por uma certa moralidade objetiva; ela tem uma função a cumprir, e quando os motivos que a impulsionaram não são conformes aos fins gerais dessa função, o Conselho de Estado os declara ilícitos. (HAURIOU, 1903 apud BARBOZA, 2002, p. 90)

Neste momento, apenas o desvio de poder era considerado atentado ao princípio da moralidade administrativa, como bem demonstra José Guilherme Giacomuzzi (2002 apud WAICK, 2009, p. 4):

A idéia de moralidade administrativa foi sistematizada no século XX, na França, por Maurice Hauriou e foi desenvolvida dentro do instituto do

détournement de pouvoir, segundo o qual o fim do ato discricionário deveria

estar vinculado a uma finalidade pública de utilidade ou interesse geral.

Algum tempo depois Hauriou ampliou o alcance da moralidade administrativa, conceituando-a como o “conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da administração.” (BRANDÃO, 1951).

4 Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Hely Lopes Meirelles, Márcia Noll Barboza, Antônio José Brandão e

José Guilherme Giacomuzzi partilham o reconhecimento à Hauriou como pai da moralidade administrativa, havendo apenas pontuais divergências quanto à data da primeira aparição do termo.

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O conceito não tardou em chegar a terras tupiniquins. Com efeito, data de 1930 o marco inicial da moralidade administrativa na legislação brasileira, presente no Decreto nº 19385 que instituiu o Governo Provisório da República como resultado da Revolução. E, ainda que tenha provado o esquecimento na Constituição de 1937, a partir de 1946 retorna ao texto constitucional brasileiro para não mais sair, muito embora, sem grande destaque até a Constituição de República Federativa do Brasil de 1988. (BARBOZA, 2002, p. 97).

2.3.2 Moralidade administrativa no direito brasileiro hodierno

Atualmente, a moralidade administrativa repousa no ordenamento jurídico nacional como princípio constitucional regente da Administração Pública6. Em que pese sua posição de destaque, alguns doutrinadores insistem em destituí-la de seu valor, colocando-a como princípio vinculado ao princípio da legalidade, ou como mera extensão dos princípios da razoabilidade e finalidade.

Curiosamente, a moralidade administrativa enfrenta no Brasil a mesma desconfiança que enfrentou em sua gênese, sobre o que escreveu Hauriou:

Para combater a distinção que fazemos aqui entre a legalidade e a moralidade administrativa, se objeta que a moralidade administrativa não é outra coisa senão o espírito da lei, e que, por conseqüência, o desvio de poder não é outra coisa senão a violação do espírito da lei, caso particular de violação da lei. (HAURIOU, 1927 apud BARBOZA, 2002, p. 92)

Em seu artigo, Fernando Couto Garcia (2003) defende a autonomia do princípio da moralidade administrativa, dissociando-o do princípio da legalidade, como mostra o trecho a seguir:

Ressalto, a título de esclarecimento, que não se trata de afastar a legalidade em si, mas de afastar o princípio da legalidade, o que é bem diverso. A noção de legalidade traduz conformidade ao ordenamento jurídico (sentido amplo) ou conformidade à lei (sentido restrito), enquanto o princípio da legalidade é uma – dentre tantas – normas jurídicas integrantes

5 Consta no art. 7º da referida lei: Continuam em inteiro vigor, na forma das leis aplicáveis, as

obrigações e os direitos resultantes de contratos, de concessões ou de outras outorgas, com a União, os Estados, os Municípios, O Distrito Federal e o Território do Acre, salvo os que, submetidos à revisão, contravenham ao interesse público e à moralidade administrativa. (Grifo nosso)

6 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,

do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

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do ordenamento. A desobediência deste (em situação em que ele incida, obviamente) conduz a uma ilegalidade (desconformidade com o ordenamento jurídico), mas nem toda ilegalidade (desconformidade com o ordenamento jurídico) é resultante de sua desobediência. Assim, uma violação autônoma do princípio da moralidade administrativa (ou seja, uma violação em que outros princípios não foram conjuntamente violados) é uma ilegalidade, embora não seja uma violação do princípio da legalidade. Por isso os dois princípios não se confundem. Por outro lado, o princípio da moralidade administrativa integra a legalidade enquanto conformidade com o ordenamento jurídico, uma vez que é norma deste.

Hely Lopes Meirelles (2012, p. 93) ao analisar a moralidade administrativa, faz um paralelo com o instituto da boa-fé objetiva do Direito Privado, conforme se observa:

De certa forma, a moralidade administrativa se compara à ‘boa-fé objetiva’ do Direito Privado, na qual é vista como uma ‘norma de comportamento leal’ ou um ‘modelo de conduta social, arquétipo ou standard jurídico’, a qual cada pessoa deve ajustar a própria conduta, ‘obrando como obraria um homem reto: com honestidade, lealdade, probidade’.

Em última análise, Meirelles se alinha a Manoel de Oliveira Franco Sobrinho e Henri Welter, para quem a moralidade administrativa está intimamente ligada ao conceito de boa administração, que se define pelo “conjunto de regras finais e disciplinares suscitadas não só pela distinção entre o Bem e o Mal, mas também pela idéia geral de administração e pela idéia de função administrativa.” (WELTER, 1929 apud MEIRELLES, 2012, p. 92). Assim, o bom administrador “é aquele que, usando de sua competência legal, se determina não só pelos preceitos vigentes, mas também pela moral comum.” (SOBRINHO, 1974 apud MEIRELLES, 2012, p. 93).

Com entendimento semelhante, Di Pietro vê no princípio da moralidade uma conexão com o senso comum de honestidade, sem perder de vista seu caráter eminentemente jurídico:

[...] quando o conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de honestidade, retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa-fé, ao trabalho, à ética das instituições. A moralidade exige proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir; entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos; entre as vantagens usufruídas pelas autoridades públicas e os encargos impostos à maioria dos cidadãos. Por isso mesmo, a imoralidade salta aos olhos, quando a Administração Pública é pródiga em despesas legais, porém inúteis, como propaganda ou mordomia, quando a população precisa de assistência médica, alimentação, moradia, segurança, educação, isso sem falar no mínimo indispensável à existência digna. Não é preciso, para

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invalidar despesas desse tipo, entrar na difícil análise dos fins que inspiram a autoridade; o ato em si, o seu objetivo, o seu conteúdo, contraria a ética da instituição, afronta a norma de conduta aceita como legítima pela coletividade administrada. (DI PIETRO, 1988 apud WAICK, 2009, p. 10).

Alguns doutrinadores traçam também o caminho inverso, conceituando negativamente o princípio da moralidade administrativa a partir a definição de improbidade administrativa, vez que esta, por estar regulada na Lei 8.429/92, oferece contornos mais precisos de sua natureza, em tese oportunizando dizer o que a moralidade administrativa não é. Por força da referida lei, atos ímprobos são aqueles que provocam enriquecimento ilícito, causam prejuízo ao erário ou atentam contra os princípios da Administração Pública. Contudo, dada a abertura da última hipótese, não apenas os atos contra a moralidade administrativa, mas contra qualquer dos princípios insculpidos no artigo 37 da Constituição podem ser considerados ímprobos. (DI PIETRO, 2012).

Destarte, pode-se afirmar que a moralidade administrativa, embora guarde elementos conexos com a moral convencional, é princípio constitucional, e como tal, jurídico. Arvorada em aspectos objetivos, desde a máxima romana non omne quod licet honestum est (nem tudo o que é legal é honesto), ela não se sub-roga a qualquer outro princípio norteador da Administração Pública, como é da embasada opinião de Fernando Couto Garcia:

Com base nestas premissas é possível afirmar que o princípio da moralidade administrativa, apesar do nome, é um princípio jurídico. Esta conclusão apóia-se em vários motivos. O primeiro é que a Constituição não tem poder para ditar normas morais, mas apenas normas jurídicas. O segundo é que o princípio da moralidade serve como referência para comunicar o que é lícito e o que é ilícito, e não o que é bom e o que é mau. Como princípio jurídico que é, a moralidade administrativa gera, obviamente, efeitos jurídicos. (GARCIA, 2003)

Vencida a tarefa de investigação sobre o conceito de moralidade administrativa, o que não significa esgotamento do tema, eis que as análises aqui feitas não se propõem definitivas. É mister dar seguimento à linha de pesquisa proposta, passando ao estudo da organização administrativa.

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3 NOÇÕES GERAIS SOBRE A ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA

A organização administrativa reflete a estrutura e a forma de governo do próprio Estado. No caso do Brasil, uma federação e um Estado Democrático de Direito conformado pela união dos estados-membros, municípios e o Distrito Federal, todos com autonomia político-administrativa, vê-se que sua administração corresponde claramente a esses conceitos estruturais. (MEIRELLES, 2012).

O Estado brasileiro, para a consecução das atividades administrativas a si atribuídas pela Constituição, tem duas alternativas de procedimento: ou atua pessoalmente, através de seu poder central e de órgãos a ele pertencentes e hierarquicamente a ele subordinados; ou atua por meio de pessoas jurídicas distintas, por ele criadas, com ressalvado grau de autonomia para realizar as ditas atividades. (MELLO, 2007).

Tais alternativas, denominadas respectivamente, administração direta e administração indireta, são os objetos de estudo do presente capítulo, com ênfase as pessoas jurídicas componentes da segunda, em especial as empresas públicas, categoria na qual se enquadra a Caixa Econômica Federal.

3.1 ADMINISTRAÇÃO DIRETA

De acordo com o Decreto-Lei 200/67 a administração direta, em âmbito federal, constitui-se “dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios” (art. 4º, I). No entanto, a administração é constituída de órgãos, e não propriamente de serviços, o que torna falho seu conceito normativo, sendo mais apropriado dizer que administração direta “é o conjunto dos órgãos integrados na estrutura administrativa da União”. (MEIRELLES, 2012, p. 813).

A doutrina é assente em condenar a técnica legislativa do Decreto-Lei 200/67, cujos problemas não se encerram na conceituação da administração direta, sobre ele Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 152) tece duras críticas:

Não é difícil perceber que o decreto-lei em exame, desde o seu ponto de partida, ressente-se tanto de impropriedades terminológicas quanto de falhas em seus propósitos sistematizadores, levando a crer que foi elaborado por pessoas de formação jurídica nula ou muito escassa, como

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soía ocorrer ao tempo da ditadura militar instalada a partir de 1964 e cujos últimos suspiros encerrar-se-iam em 1986.

Como visto, sendo os órgãos constituintes da administração direta integrantes da própria estrutura administrativa do Estado, tem-se que não são pessoas jurídicas distintas, servindo apenas como entes totalmente subordinados ao poder central e que desempenham funções específicas. É o que se chama desconcentração, “uma distribuição interna de competências dentro da mesma pessoa jurídica” (DI PIETRO, 2012, p. 466), “uma técnica administrativa de simplificação e aceleração do serviço dentro da mesma entidade” (MEIRELLES, 2012, p. 390, grifo do autor).

Na desconcentração, toma-se a administração pública como uma grande pirâmide cujo topo (chefe do poder executivo) emana suas funções e diretrizes até a base, distribuindo obrigações a cada um dos elementos abaixo (DI PIETRO, 2012). Sobre este fenômeno, Celso Antônio Bandeira de Mello (2012, p. 146) faz a seguinte reflexão:

O fenômeno da distribuição interna de plexos de competências decisórias, agrupadas em unidades individualizadas, denomina-se desconcentração. Tal desconcentração se faz tanto em razão da matéria, isto é, do assunto (por exemplo, Ministério da Justiça, da Saúde, da Educação, etc.), como em razão do grau (hierarquia), ou seja, do nível de responsabilidade decisória conferido aos distintos escalões que corresponderão aos diversos patamares de autoridade (por exemplo, diretor de Departamento, diretor de Divisão, chefe de Seção, encarregado de Setor). Também se desconcentra com base em critério territorial ou geográfico (por exemplo, delegacia regional da Saúde em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro etc.). A aludida distribuição de competências não prejudica a unidade monolítica do Estado, pois todos os órgãos e agentes permanecem ligados por um sólido vínculo denominado hierarquia.

Assim, conforme exposto pelo autor, através da desconcentração, os serviços e responsabilidades administrativas são pulverizados dentro do próprio aparelho estatal, aos mencionados órgãos da administração direta, sem comprometer seu caráter uno, vez que o elo de hierarquia o garante. Este elo se traduz na relação de total autoridade do ente desconcentrador para o desconcentrado, a hierarquia, nesse sentido, comporta ao ente superior poder de comando, fiscalização, revisão, punição e delegação ou avocação de competência (MELLO, 2007). Situação diversa do que acontece aos membros da administração indireta, conforme ver-se-á abaixo.

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3.2 ADMINISTRAÇÃO INDIRETA

A administração indireta, ainda segundo o Decreto-Lei 200/67, conforma-se de quatro entidades com personalidade jurídica própria, quais conforma-sejam; autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas (art. 4º, II). Doutrinariamente, Hely Lopes Meirelles (2012, p. 813) conceitua administração indireta como “o conjunto dos entes (personalizados) que, vinculados a um Ministério, prestam serviços públicos ou de interesse público.” Tais entidades têm sua gênese na técnica administrativa denominada descentralização (MEIRELLES, 2012).

“A descentralização pressupõe pessoas jurídicas diversas: aquela que originariamente tem ou teria titulação sobre certa atividade e aqueloutra ou aqueloutras às quais foi atribuído o desempenho das atividades em causa” (MELLO, 2007, p. 147). Ou seja, “o poder público (União, Estados ou Municípios) cria uma pessoa jurídica de direito público ou privado e a ela atribui a titularidade e a execução de determinado serviço público” (DI PIETRO, 2012, p. 468).

Esse processo dá-se somente por via de lei e engloba alguns aspectos universais ao ente descentralizado, tais como, a atribuição de personalidade jurídica, capacidade de autoadministração com relativa independência do ente descentralizador, patrimônio próprio, capacidade específica limitando-o à realização do serviço público para o qual foi criado e, finalmente, sujeição a controle por parte da entidade descentralizadora. (DI PIETRO, 2012).

Ressalta-se que, nesse caso, não se opera a relação de hierarquia comum à desconcentração. O controle exercido pelo ente descentralizador é muito mais tênue, “designa o poder que a Administração Central tem de influir sobre a pessoa descentralizada. Assim, enquanto os poderes do hierarca são presumidos, os do controlador só existem quando previstos em lei e se manifestam apenas em relação aos atos nela indicados.” (MELLO, 2012, p. 147).

Ainda, sobre o controle exercido sobre os entes descentralizados, Hely Lopes Meirelles (2012, p. 815) leciona:

O legislador procurou garantir a autonomia dessas entidades através de normas impeditivas de sua burocratização, de modo a lhes conceder ampla liberdade de ação na consecução de seus fins. Assim é que as considera

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tempo que opõe limites à supervisão ministerial, que não poderá ferir mas

deverá assegurar sua autonomia administrativa, operacional e financeira. Cumpre salientar que, embora realizado pelo doutrinador supracitado, o uso do termo autonomia para referir-se à prerrogativa de ente da administração indireta deve ser evitado. Isto porque em âmbito jurídico o vocábulo autonomia tem o sentido de poder criar as próprias leis, o que não corresponde com o caso em tela. Assim, é mais apropriado o uso da expressão autoadministração, que transmite a idéia de competência para gerir o próprio patrimônio e seu modus operandi para o alcance de seus objetivos, tudo em concomitante observância às leis instituídas pelo ente central. (DI PIETRO, 2012).

A exposição acima, embora conceda elementos basilares, não oferece um vislumbre completo da administração indireta. Uma vez que, embora as categorias de entes a ela pertencentes compartilhem os aspectos originários já comentados, cada uma possui características próprias e peculiaridades distintas, as quais serão tratadas nos tópicos a seguir.

3.2.1 Autarquias

Em sede etimológica, autarquia deriva da junção de dois elementos de origem helênica, autós (próprio) e arquia (comando, governo), significando autogoverno, comando próprio. (GASPARINI, 2012). Tratam-se, pois, nas palavras de Hely Lopes Meirelles (2012, p. 391), de “entes administrativos autônomos, criados por lei específica, com personalidade jurídica de Direito Público interno, patrimônio próprio e atribuições estatais específicas.”

A definição, embora sintética, é precisa. O artigo 37, XIX, da Constituição Federal exige lei específica para a criação de autarquias. A iniciativa para sua elaboração é exclusiva ao chefe do Poder Executivo, na forma do artigo 61, § 1º, II, e, também da Constituição. Por certo, infere-se logicamente que a extinção de uma autarquia realiza-se também somente por lei, uma vez que, pelo princípio da legalidade, um ato administrativo não poderia revogar algo disposto em lei. Note-se que a norma em comento não se prestará unicamente a dar gênese à autarquia, mas também definirá um leque de aspectos a ela relativos, o qual expõe Diogenes Gasparini (2012, p. 375):

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Essa lei deve, substancialmente, prescrever a criação da autarquia (fica criada ou é criada), indicar sua sede, seus objetivos, seu patrimônio ou como será posteriormente constituído pelo Executivo, sua estrutura básica organizacional (órgãos, executivo e deliberativo, e cargos), forma de nomeação dos dirigentes, o regime estatutário de seus servidores.

Sua personalidade jurídica de direito público, ainda que esquecida na definição disposta no artigo 5º, I, do Decreto-Lei 200/67, em mais um equívoco legislativo desta norma, é lembrada no artigo 2º do Decreto-Lei 6016/43 e no artigo 41, IV, do Código Civil. Tal característica das autarquias é talvez a principal, como sugere o comentário de Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 153-154):

Exatamente por serem pessoas de Direito Público é que as autarquias podem ser titulares de interesses públicos, ao contrário de empresas públicas e sociedades de economia mista, as quais, sendo pessoas de Direito Privado, podem apenas receber qualificação para o exercício de atividades públicas; não, porém, para titularizar as atividades públicas.

E justamente por titularizar uma atividade pública típica é que as autarquias demandam elevado grau de desenvoltura, traduzido na sua competência de autoadministração. Hely Lopes Meirelles (2012, p. 393-394) discorre sobre:

A autarquia, sendo um prolongamento do Poder Público, uma longa manus do Estado, deve executar serviços próprios do Estado, em condições idênticas às do Estado, com os mesmos privilégios da Administração-matriz e passíveis dos mesmos controles dos atos administrativos. O que diversifica a autarquia do Estado são os métodos operacionais de seus serviços, mais especializados e mais flexíveis que os da Administração centralizada.

Com efeito, o regime de pessoal atribuído às autarquias não é outro senão o estatutário, com abertura de cargos na forma de lei e ingresso por meio de concurso público de provas e títulos, ressalvados os cargos de direção, cuja nomeação é prerrogativa do Poder Executivo. (GASPARINI, 2012).

O patrimônio próprio faz também parte do conjunto de elementos que dão forma à autoadministração das autarquias, vez que uma gestão administrativa independente seria de pouca valia sem uma gestão financeira igualmente independente (MELLO, 2012). Assim, o controle administrativo e financeiro ao qual a autarquia submete-se, respectivamente, do ministério ao qual está vinculada e do competente Tribunal de Contas, cuida meramente de garantir que as iniciativas e

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gastos da autarquia estejam direcionados à consecução do serviço público para o qual foi concebida. Além é claro, da prerrogativa da administração central para definir os dirigentes de suas autarquias. (DI PIETRO, 2012).

Se por um lado, tal liberdade garante à autarquia a possibilidade de realizar o serviço público a ela outorgado com mais presteza do que a administração central seria capaz, por outro, também a torna completamente responsável por seus atos e obrigações. Assim afirma Diogenes Gasparini (2012, p. 378):

A Administração Pública a que pertence a autarquia não responde pelas suas obrigações. Também não responde pelos danos causados pela autarquia a terceiros, decorrentes de sua atuação ou do comportamento lesivo de seus servidores. A autarquia é pessoa de direito, e como tal deve responder pelas obrigações assumidas e pelos danos que causar a alguém.

Destarte, os danos causados pela autarquia a terceiros são de sua exclusiva responsabilidade e passíveis de compensação no judiciário, onde, se ressalte, a autarquia atua de modo idêntico à administração central, sendo detentora de suas mesmas prerrogativas. (GASPARINI, 2012). Note-se ainda, que esta benesse é uma entre outras tantas garantidas à autarquia, conforme assevera Hely Lopes Meirelles (2012, p. 396):

As autarquias brasileiras nascem com os privilégios administrativos (não políticos) da entidade estatal que as institui, auferindo também as vantagens tributárias e as prerrogativas processuais da Fazenda Pública, além dos que lhes forem outorgados por lei especial, como necessários ao bom desempenho das atribuições da instituição.

Dentre os privilégios mencionados, cumpre elencar alguns de destaque, quais sejam: processo especial de execução e impenhorabilidade de seus bens, preconizado nos artigos 100 e 109 da CRFB/88 e artigos 730 e 731 do CPC, juízo privativo, disposto no artigo 109 da CRFB/88, reexame necessário em segundo grau de jurisdição, garantido no artigo 475, I e II do CPC, e, por fim, prazos dilatados, na forma do artigo 188 do CPC.

Assim, tem-se finalizada a exposição dos caracteres relativos às autarquias genéricas. Todavia, um conjunto peculiar de autarquias que é mencionado esparsamente na legislação brasileira merece análise detida, à qual se procede abaixo.

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3.2.1.1 Autarquias de regime especial

Autarquia de regime especial, ou simplesmente autarquia especial, era denominação antigamente dada de forma quase exclusiva às universidades públicas, cuja independência administrativa superava a dos outros entes autárquicos. Tal circunstância se dava em virtude da liberdade de pensamento e orientação pedagógica atinente a essas instituições e pelo fato de seus dirigentes serem escolhidos em processo democrático interno à comunidade universitária, com mandatos fixos e curtos, diminuindo a interferência da administração central. (MELLO, 2007).

Entretanto, atualmente, outras autarquias gozam de regimes diferenciados pelo elevado grau de independência se comparadas às suas contrapartes genéricas. Tratam-se das agências reguladoras, às quais faz referência Hely Lopes Meirelles (2012, p. 400-401):

Com a política governamental de transferir para o setor privado a execução de serviços públicos, reservando ao Estado a regulamentação, o controle e a fiscalização desses serviços, houve a necessidade de criar, na Administração, agências especiais destinadas a esse fim, no interesse dos usuários e da sociedade. Tais agências têm sido denominadas de agências

reguladoras e foram instituídas como autarquias sob regime especial, com o

propósito de assegurar sua autoridade e autonomia administrativa.

São exemplos destes entes a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), a ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações) e a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Para Celso Antônio Bandeira de Mello (2007), as agências reguladoras brasileiras, cujo nome foi inspirado em instituições estadunidenses (tais como a CIA – Central Intelligence Agency), delas também emprestam suas características e, sobretudo, seu caráter independente. Todavia, a discrepância entre os sistemas constitucionais de ambos os países faz com que as semelhanças entre suas agências não se estenda muito além da denominação.

Isto porque, conforme Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012) as agências reguladoras estadunidenses têm ampla margem de independência aos três Poderes do Estado, a ver, competência para elaboração normativa sobre o serviço que fiscalizam, resolução de conflitos entre os delegatários e usuários deste serviço, e inalterabilidade de suas decisões por autoridades fora do órgão.

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Por outro lado, no Brasil, a independência das agências reguladoras se encontra adstrita a rígidos preceitos constitucionais, já que, a criação de normas, mesmo sobre aspectos técnicos do serviço regulado, não pode contrariar lei vigente, respeitando o princípio da legalidade, e a resolução de conflitos limita-se à via administrativa, podendo a qualquer tempo ser levada a juízo pelo princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário. (DI PIETRO, 2012).

Com efeito, o fator diferenciador das agências reguladoras brasileiras é sua autonomia diferenciada ante o Poder Executivo, uma vez que seus dirigentes gozam de incomum estabilidade tendo mandato fixo. No entanto, mesmo esta independência é relativa, vez que os dirigentes de autarquias especiais também são escolhidos pelo Executivo. (MELLO, 2007).

3.2.2 Fundações

Não existe entre as entidades da administração indireta outra que provoque tamanho pugilato doutrinário quanto a fundação. A discussão central gira em torno de sua natureza jurídica e as conseqüências dela decorrentes. (DI PIETRO, 2012). Nomes da mais autorizada doutrina têm posições diametralmente opostas, como Hely Lopes Meirelles (2012), para quem qualquer fundação é pessoa de Direito Privado, e Celso Antônio Bandeira de Mello (2007), cuja visão é de que todas as fundações são pessoas de Direito Público. Em que pese ao posicionamento destes autores, é mais razoável a suposição de que existam as duas espécies de fundações, uma vez que exemplos de ambas podem ser encontrados no ordenamento jurídico brasileiro, como lecionam Diogenes Gasparini (2012) e Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012).

Contudo, pública ou privada, o conceito de fundação é único, definindo-se nas palavras de Clóvis Beviláqua (1936 apud MEIRELLES, 2012, p. 404) como uma “universalidade de bens personalizada, em atenção ao fim, que lhe dá unidade.” Diogenes Gasparini (2012, p. 384) destrincha cada elemento desta definição no trecho colacionado:

O patrimônio, substrato econômico da fundação, é o complexo de relações jurídicas pertencentes a determinado sujeito. Personalizado, porque sobre ele incidem normas jurídicas, tornando-o sujeito de direito e obrigações.

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Afetado a um fim significa destinado ou consagrado a perseguir um objetivo, quase sempre de natureza educacional, cultural ou científica.

Desse ponto em diante, por fins didáticos, este tópico subdividir-se-á em dois para melhor apresentação de cada espécie de fundação.

3.2.2.1 Fundações públicas

Subsidiariamente ao conceito apresentado alhures, fundação pública é, segundo Diogenes Gasparini (2012, p. 384, grifo do autor), “o patrimônio público personalizado segundo regras de Direito Público – destinado à persecução de finalidades de interesse da coletividade”.

Como pessoa de Direito Público atrelada a uma finalidade determinada pela administração pública, a fundação pública em nada se singulariza frente à autarquia, compartilhando o mesmo modo de criação e extinção, regime jurídico, sujeição ao controle, prerrogativas e responsabilidades. Sendo inclusive considerada por muitos doutrinadores como espécie autárquica. Nesse sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 179) assevera:

Uma vez que as fundações públicas são pessoas de Direito Público de capacidade exclusivamente administrativa, resulta que são autarquias e que, pois, todo regime jurídico dantes exposto, como o concernente às entidades autárquicas, aplica-se-lhes integralmente.

Com efeito, análises mais detidas sobre os caracteres da fundação pública são redundantes, vez que se repetem ao já exposto sobre autarquias. Nesta esteira, passa-se ao escrutínio das fundações privadas, cujas características são deveras distintas de sua contraparte pública.

3.2.2.2 Fundações privadas

Em derivação do conceito genérico disposto anteriormente, Diogenes Gasparini (2012, p. 518, grifo do autor) define fundação privada como “o patrimônio público personalizado segundo as regras do Direito Civil, destinado à persecução de finalidades de interesse da coletividade.”

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Novamente percebe-se como fator germinante a dotação patrimonial – que nesse caso pode ser semipública e semiprivada – porém, desta vez, sob o regime de Direito Privado, ainda que, alerte-se, ela nunca se sujeita totalmente a esse ramo do direito, vez que foi instituída pelo Estado (DI PIETRO, 2012).

Já em sua criação, surge outra distinção, de acordo com o artigo 37, XIX, da Constituição Federal, a lei instituidora da fundação privada apenas autoriza sua criação, mas não a cria de fato. O nascimento jurídico da fundação privada só ocorre com a lavratura da escritura pública de instituição e a competente inscrição no Registro Civil de Pessoas Jurídicas. (MEIRELLES, 2012). Sobre o processo de formação da fundação privada, cita-se Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012, p. 493):

Na fundação, o instituidor faz a dotação de determinada universalidade de bens livres, especificando o fim a que se destina e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la; o seu estatuto é feito pela pessoa por ele designada ou pelo Ministério Público, a quem compete velar pela fundação. O papel do instituidor exaure-se com o ato da instituição; a partir do momento em que a fundação adquire personalidade jurídica, ela ganha vida própria. O instituidor nenhum poder mais exerce sobre ela; seu ato é irrevogável. As alterações estatutárias têm que ser feitas por deliberação dos administradores da fundação, com observância do artigo 67 do novo Código Civil. O patrimônio da fundação destaca-se do patrimônio do fundador e com ele não mais se confunde. Na fundação, o instituidor, por um ato de liberalidade, destaca bens do seu patrimônio pessoal, desviando-os de um objetivo de interesse privado, para destiná-ldesviando-os a um fim de interesse público.

No que toca ao seu patrimônio, que é particular, admite-se a princípio sua alienação, oneração e penhora na forma da lei instituidora. Todavia, por executar serviço de interesse coletivo, ressalva-se essa liberdade em atenção ao princípio da continuidade, estando vedada a alienação, oneração ou penhora dos bens necessários ao cumprimento do serviço público. (GASPARINI, 2012).

O controle sobre a fundação privada é exercido pela administração pública, “pelo competente Tribunal de Contas no que respeita aos aspectos contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial de sua administração [...]. Por fim, também são fiscalizadas pelo Ministério Público.” (GASPARINI, 2012, p. 519).

Quanto ao regime de pessoal, adota a Consolidação das Leis do Trabalho com ingresso por meio de concurso público de provas e títulos. Tem responsabilidade objetiva sobre os danos que seus funcionários causarem a terceiros com o devido direito de regressão em caso de dolo ou culpa, nesses casos,

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a administração pública criadora da fundação responde subsidiariamente. (GASPARINI, 2012).

3.2.3 Sociedades de economia mista

A sociedade de economia mista é elemento do gênero que a doutrina denomina de empresas estatais, do qual também faz parte a empresa pública, com a qual partilha diversas similaridades e algumas marcantes diferenças. Conceitua-se, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p. 183-184, grifo do autor) como:

[...] a pessoa jurídica cuja criação é autorizada por lei, como um instrumento de ação do Estado, dotada de personalidade de Direito Privado, mas submetida a certas regras especiais decorrentes desta sua natureza auxiliar da atuação governamental, constituída sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto pertençam em sua maioria à União ou entidade de sua Administração indireta, sobre remanescente acionário de

propriedade particular.

Na ampliação de cada minudência da definição supra se fará a completa exposição dos principais caracteres da sociedade de economia mista. A começar por sua criação, cujo processo se repete ao da fundação, conforme aponta Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012, p. 504, grifo da autora):

[...] em se tratando de entidades de direito privado, como a sociedade de economia mista, [...] a lei não cria a entidade, tal como o faz com a autarquia, mas apenas autoriza a criação, que se processa por atos constitutivos do Poder Executivo e transcrição no Registro Público.

Dotada de personalidade de Direito Privado, a sociedade de economia mista pode ser instituída para a consecução de um serviço público ou para a exploração de atividade econômica, em ambas as situações admite lucro, devendo de fato produzi-lo em prol de seu crescimento e para captar maiores recursos privados. No entanto, o lucro não é seu objetivo principal, ainda que explore atividade econômica, vez que a atuação do Estado nesta esfera é legítima tão somente na hipótese de relevante interesse coletivo ou imprescindível à segurança nacional, na forma do artigo 173 da Constituição Federal. (MEIRELLES, 2012).

Referências

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