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2 A MULTIMODALIDADE, O GÊNERO DISCURSIVO/ TEXTUAL TIRA E O

2.3 OS CAMINHOS TRILHADOS PELO LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA

2.3.1 O percurso histórico do livro didático de Língua Portuguesa

As mudanças sofridas pelos livros didáticos no decorrer dos anos também atingiram o Livro Didático de Língua Portuguesa – LDP. Neste percurso, os LDPs sofreram mudanças significativas tanto no projeto gráfico quanto nas abordagens metodológicas no ensino da Língua Materna. De acordo com Caiado (2011), o LD caminha ao lado da história da Língua Portuguesa. Os livros didáticos de Língua Portuguesa retrataram as diferentes perspectivas teóricas sobre língua, linguagem, leitura, letramento, gêneros textuais e a função destes que vigoraram nos contextos sociais ao longo do tempo.

Bunzen (2007) destaca as mudanças na seleção dos textos apresentados nos livros didáticos de Língua Portuguesa, que romperam com os exemplares dos anos setenta e oitenta. Apesar de ter havido desde sempre a seleção de textos autônomos, completos, os LDPs têm rompido com a predominância de textos literários que se apresentavam naqueles anos. Este autor relaciona essas mudanças que os LDPs vêm passando a “cinco marcos da própria história da Língua Portuguesa no século XX” (2007, p.45).

O primeiro marco apontado por Bunzen (2007) diz respeito às Leis 5.672 e 5.692 de 1971 que prescreviam um ensino de língua materna voltado para as várias linguagens, que gerou, inclusive, uma alteração no nome da disciplina, que passou a ser Comunicação e Expressão em Língua Portuguesa. Assim, nas décadas de 70 e 80, era comum encontrar em alguns livros gêneros que circulavam na comunicação de massa e na mídia impressa, como notícias e quadrinhos, por exemplo.

O segundo marco trata-se da influência dos estudos da teoria da comunicação também na década de 70, que deu abertura para a análise de textos não literários. Com a visão da língua como instrumento de comunicação, os textos serviam ao propósito de ensinar elementos da comunicação e funções da linguagem, numa abordagem pragmática e utilitária.

O terceiro marco foi a defesa do texto como unidade de ensino nos anos de 1980, o que promoveu uma tentativa de aproximar as aulas e os livros didáticos ao cotidiano por parte dos professores e dos autores, respectivamente. Isso promoveu a presença de uma maior diversidade de gêneros e temáticas nos livros.

Os conceitos de letramento e de gênero discursivo agregados às discussões sobre a relação entre os textos e seu funcionamento nas práticas sociais dentro e fora da escola tiveram papel de destaque nos PCNs de 1998, gerando mudanças significativas nos livros elaborados posteriormente a esses parâmetros de ensino.

O quinto marco apontado é o Programa Nacional de Avaliação do Livro Didático, que foi realizado a partir de 1995 e que também colaborou para a diversidade de gêneros, já que, ao avaliar a qualidade dos textos, considerou quatro aspectos:

a) diversidade de gêneros, de contextos sociais de uso (imprensa. Literatura, ciência), de suportes, de registros e dialetos, etc.; b) as temáticas e sua abordagem; c) os autores e sua diversidade e representatividade; d) aspectos da textualidade (fidelidade ao suporte, extensão, indicação de cortes nos textos fragmentados, etc.). (BUNZEN, 2007, p. 45-46)

Segundo Santos et al. (2007), novas perspectivas teóricas levaram a questionamentos sobre o ensino de língua promovido na rede pública brasileira a partir da década de oitenta. Na década seguinte, com a incorporação do conceito de letramento, esses questionamentos ganharam força. As práticas pedagógicas no ensino de língua foram discutidas e os livros didáticos receberam duras críticas, uma vez que estavam ainda vinculados a práticas tradicionais de ensino e veiculavam os valores das classes favorecidas em detrimento das classes menos favorecidas.

Neste cenário, o LDP foi considerado ineficiente e prejudicial ao ensino da língua materna por vários pesquisadores. Eles apontavam o tradicionalismo e a descontextualização

das atividades propostas pelos livros e que estes materiais demonstravam uma concepção de língua apenas como um código e que promoviam um ensino de leitura e da escrita desvinculado das práticas sociais destas atividades fora do ambiente escolar (SANTOS; ALBUQUERQUE; MENDONÇA, 2007).

O surgimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais da Língua Portuguesa (PCNs), em 1998, ocasionou novas abordagens em torno do ensino desta língua e das concepções de língua, linguagem, leitura, leitor e texto. Este documento sugere que o ensino de Língua Portuguesa tenha o objetivo de desenvolver nos alunos os conhecimentos necessários para que eles possam refletir e utilizar os recursos expressivos da língua em diversos contextos de interação (DIAS, 2010; CAIADO, 2011).

Aparício e Silva (2014) apontam que os PCNs e as avaliações trienais dos livros didáticos, realizadas por meio do PNLD, puseram os gêneros textuais como objeto de ensino, provocando grandes mudanças na elaboração dos LDPs. Autores e editores destes materiais, visando ao atendimento do previsto nos parâmetros e no processo avaliativo do PNLD, passaram a se preocupar com a oferta aos alunos de uma variedade maior de gêneros textuais com os quais os estudantes entram em contato nas diversas situações comunicativas.

Chopin (2004) aponta que uma das mudanças sofridas pelo livro didático diz respeito aos recursos imagéticos e iconográficos deste material. Houve, então, um aumento dos estudos voltados a esta questão, devido ao desenvolvimento de métodos e instrumentos de análise linguística na década de 80 do século XX. Os avanços nos estudos da Semiótica contribuíram para que “a iconografia didática - e a articulação semântica que une o texto e a imagem - tenha sido levada em conta.” (CHOPIN, 2004, p. 559). Antes disso, as imagens eram negligenciadas no processo educativo e nas atividades propostas por livros didáticos, exercendo a função de ilustrar o material. As potencialidades de significação da linguagem visual não eram exploradas, já que os elementos visuais eram vistos apenas como decorativos.

Nessa perspectiva de adaptação dos livros didáticos de Língua Portuguesa às novas abordagens no ensino desta língua e às demandas de aprendizagem dos estudantes no que se refere às práticas sociais de leitura em que se envolvem na contemporaneidade, esta pesquisa propõe-se a investigar como as atividades de leitura propostas para o gênero multimodal tira por três coleções de LDPs aprovadas pelo PNLD 2018 abordam a compreensão deste gênero verbovisual, considerando o desenvolvimento do letramento multimodal. Assim sendo, no próximo capítulo, trataremos da leitura, considerando suas concepções, os aspectos do

processamento textual e as perspectivas teóricas acerca dos letramentos, dos multiletramentos e da leitura de textos multimodais.