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3 COMPREENSÃO LEITORA: A COMPLEXIDADE DO PROCESSAMENTO

3.4 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS ACERCA DA LEITURA DE TEXTOS

3.4.1 A teoria da aprendizagem multimídia

As produções textuais orais e escritas, frequentemente, utilizam outras linguagens, não se restringindo ao uso de linguagem verbal. Apesar desse uso comum em diferentes situações de interação social, os estudos da Linguística acerca dessa combinação de linguagens empregada em diversos textos e a construção de sentidos a partir dessa combinação são recentes. Assim, também são recentes as pesquisas em relação ao ensino-aprendizagem de línguas tomando esses textos (multimodais) como objeto de estudo no processo educativo e na formação de leitores proficientes. Durante bastante tempo, as atenções estiveram centradas no modo verbal. Várias teorias foram desenvolvidas, mas poucas trataram dos outros códigos pelos quais nos comunicamos. Anteriormente, mesmo sendo conhecidos, os códigos não verbais não receberam tanta atenção quanto no contexto atual dos estudos da linguagem. O surgimento do computador e das tecnologias da informação e da comunicação tornou mais frequente a combinação da linguagem verbal com elementos não verbais, como a música, as imagens estáticas e em movimento, os elementos gráficos etc. Isso afetou significativamente as atividades de produção e recepção de textos, que se constituem por essas diferentes linguagens em várias situações comunicativas. No sentido de melhor entender as discussões vigentes em torno dessa integração de linguagens verbal e não verbal, apresentamos nesta seção uma das teorias que tratam dessa integração, a Teoria da Aprendizagem Multimídia.

A Teoria da Aprendizagem Multimídia foi proposta por um grupo de estudiosos liderados por Richard Mayer. Essas pesquisas tinham como objetivo tentar observar como estudantes aprendiam por meio da integração de linguagem verbal e não verbal. Essa teoria tinha como interesse aplicar os conhecimentos na implementação de materiais didáticos para facilitar a aprendizagem, porém ela traz também relevantes considerações sobre a leitura de textos constituídos por combinação de linguagens verbal e não verbal, denominados por este

grupo de multimídias. Essa contribuição em torno da leitura deve ao fato de que esta atividade é um dos meios pelos quais se aprende e não há efetiva aprendizagem sem haver compreensão.

Moreno e Mayer (2000) e Mayer (2005) apresentam em suas pesquisas estudos nos quais fizeram testes de retenção de informação e resolução de problemas com o objetivo de observar como funciona a aprendizagem dos multimídias (multimodais). A partir destes testes, apresentaram doze princípios, a saber:

1. Princípio da multimídia: os estudantes aprendem melhor por meio de texto verbal escrito ou oral e imagens que somente por meio de texto verbal.

2. Princípio da contiguidade espacial: os alunos aprendem melhor quando há proximidade entre as palavras e as imagens.

3. Princípio da contiguidade temporal: há melhor aprendizagem quando há simultaneidade na apresentação das palavras e das imagens.

4. Princípio da coerência: os alunos aprendem melhor quando materiais que não tem relação com o conteúdo são excluídos.

5. Princípio da modalidade: os estudantes aprendem melhor quando a narração é combinada com a animação, no lugar do acesso somente ao texto escrito.

6. Princípio da redundância: os alunos aprendem melhor quando há uso de narração e animação do que quando se usa narração, animação e texto escrito.

7. Princípio das diferenças individuais: o design multimídia tem maior utilidade para estudantes com menos conhecimento prévio e maior habilidade espacial.

8. Princípio da Sinalização: os alunos aprendem mais quando as informações importantes aparecem destacadas e quando a multimídia apresentada está estruturalmente organizada com os elementos mais relevantes.

9. Princípio da Personalização: os alunos aprendem melhor a partir de aulas multimídia em que as palavras são organizadas no formato de conversação, em vez do estilo formal.

10. Princípio da voz: Os alunos aprendem melhor quando a narração possui um tom amigável em aulas multimídia, em vez de voz mecânica associada a uma máquina. 11. Princípio da imagem: o estudante aprende melhor a partir de aulas multimídias, a

imagem do orador deve ser adicionada à tela.

12. Princípio da segmentação: as pessoas aprendem melhor a partir de uma aula multimídia em que o conteúdo é apresentado em segmentos em vez da apresentação como uma unidade contínua.

Estes apontamentos indicam que a leitura de textos multimídias/multimodais tem particularidades quando comparada à leitura de textos verbais, considerando a organização espacial do texto verbal e da imagem. Destaca-se também a abrangência desses princípios no tocante à diversidade de gêneros multimodais, uma vez que englobam não somente os impressos, mas também os digitais, do ambiente virtual.

O termo multimídia é entendido por Mayer (2005) como a apresentação de modo integrado de palavras e elementos pictográficos. Assim, há uma equivalência com o termo multimodal. As palavras consideram a linguagem verbal nas modalidades oral e escrita e os elementos pictográficos abarcam fotos, ilustrações, desenhos, formas etc., sendo estes elementos não verbais dinâmicos (em movimento) ou estáticos.

As pesquisas desenvolvidas por Moreno e Mayer (2000) e Mayer (2005) que testaram esses princípios estavam voltadas à cognição. De acordo com essas pesquisas, os seres humanos possuem dois canais de processamento da informação, um processa os elementos verbais e o outro, os elementos não verbais. Cada canal apresenta uma limitação, assim, a aprendizagem é mais eficiente mediante uso dos dois canais, já que, dessa forma, ultrapassaria a limitação que cada um deles apresenta.

Essa abordagem cognitiva para tentar compreender a leitura de textos multimodais não pode, entretanto, desconsiderar o fato de que esta atividade envolve uma gama de conhecimentos prévios que os indivíduos armazenam em sua memória e que são social, cultural e historicamente construídos por meio de suas experiências e interações. Sendo assim, esses conhecimentos prévios, sejam eles de mundo, linguísticos ou textuais, fornecem a base para que a compreensão aconteça. “Assim, selecionamos os materiais que são relevantes para a leitura, organizamos e formamos uma representação mental e integramos tais informações com base nas nossas experiências sociais, históricas, culturais, linguístico-textuais, discursivas e cognitivas.” (BARROSO, 2013, p. 37)

Essa teoria entende que, para acontecer uma aprendizagem efetiva, deve haver uma seleção de informações relevantes, uma organização dessas informações e a integração delas. Desta forma, a compreensão de um texto multimodal está atrelada à integração entre os materiais verbais e os não verbais que constituem o texto. Na recepção destes textos, o leitor seleciona, dentre os elementos verbais e os não verbais, aqueles de maior relevância, como por exemplo palavras-chave, indicadores de ações e expressões faciais; organiza o material verbal e o não verbal em modelos mentais; e faz correspondência entre esses materiais, integrando o imagético ao verbal (PAES DE BARROS, 2005, 2009; BARROSO, 2011).

Considerando a relevância da integração entre os elementos verbais e não verbais que constituem os textos multimodais para sua efetiva compreensão, conforme apontam os estudos aqui mencionados, teceremos, na próxima seção, algumas considerações sobre as relações semânticas que se estabelecem entre as linguagens verbal e não verbal, segundo suas cargas informativas, a partir dos estudos de Santaella (2012).