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O poeta em obra: o fazer e o dizer do poeta, seu obrar

Capítulo III Patativa do Assaré: mímesis, contestação e

3.1 O poeta em obra: o fazer e o dizer do poeta, seu obrar

Na publicação intitulada Antologia Poética, Patativa opinou e auxiliou a escolha de seus mais representativos poemas, pouco antes de sua morte, em parceria com o pesquisador Gilmar de Carvalho; e, apesar das dificuldades de se fazer uma justa seleção diante de tão vasta obra, o livro traduz, em resumo, a versatilidade do poeta.178

Propondo uma seleção por obras publicadas e não por temas, a Antologia revela a multiplicidade dos versos de Patativa, que pode ser aqui interpretada como um dos principais elementos identitários de sua poesia.

Segundo a pesquisa dessa Antologia, o primeiro livro do poeta Inspiração

Nordestina surgiu, como já afirmamos anteriormente, da idéia do filólogo e bancário

José Arraes de Alencar, que se impressionou com a qualidade das produções de Patativa ao ouvi-lo na rádio Araripe; esse livro foi publicado em 1956 por Bolsói Editor, do Rio de Janeiro, teve uma 2ª edição em 1967 e ainda uma 3ª edição em 1999 pela UECE.179

Dessa obra foram selecionados catorze poemas, entre os quais o pesquisador destaca A terra é naturá, por abordar o trabalho, a festa e sua dimensão xamânica, além de alertar para urgência da reforma agrária180; e também os poemas O puxadô de roda e

Ingém de ferro por sua característica de elogio às formas solidárias de convivência em

contraposição ao progresso.181 175 Ibidem, p.233.

176 Ibidem, p.234.

177 Parafraseando o autor CIAMPA, Antônio da Costa, A estória do Severino e a história da Severina. Um

ensaio de psicologia social. São Paulo: Brasiliense, 2001, p.155.

178 ASSARÉ, Patativa do. Antologia Poética. Organização e prefácio de Gilmar de Carvalho, 4ª edição,

Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2004.

179 Ibidem, p.20. 180 Ibidem, p.13. 181 Ibidem, p.14.

Pela ordem estabelecida nessa Antologia em 1970 foi publicado Patativa do

Assaré: novos poemas comentados, pela Imprensa Universitária, o livro foi organizado

pelo folclorista cratense J. de Figueiredo Filho, reúne poemas e episódios curiosos da biografia de Patativa.182 Dessa obra foram selecionados dez poemas, entre os quais os famosos e polêmicos, Prefeitura sem prefeito e Caboclo roceiro.

O livro seguinte na Antologia é considerado como aquele que proporcionou à Patativa uma divulgação mais ampla de sua obra, foi uma proposta da Fundação Pe. Ibiapina do Crato, que teve apoio da Editora Vozes de Petrópolis, sendo editado em 1978 é o, hoje famoso, Cante lá que eu canto cá que no momento da elaboração dessa Antologia estava em sua 11ª edição; pouco depois de seu lançamento foi título de um encontro da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) em 1979, evento no qual o poeta foi homenageado.183

Sendo que desse livro, foram escolhidos oito poemas para a Antologia, e o próprio Patativa selecionou poemas como Cante lá que eu canto cá que dá título à obra,

Eu quero que traduz posições políticas, O maió ladrão que revela uma reflexão

filosófica sobre a passagem do tempo184 e Eu e o sertão que discute a relação entre natureza e cultura de forma telúrica, de acordo com os comentários de Gilmar de Carvalho.185

Posteriormente, nessa Antologia, é citado o livro Ispinho e Fulô, publicado em 1988, organizado e prefaciado por Rosemberg Cariry, com apoio da Secretaria de Cultura e Desporto do Estado do Ceará; segundo o organizador da Antologia, sendo esse um livro de marcada conotação política, do qual foram selecionados também dez poemas, obra que passou a fazer parte do catálogo da Vozes e ganhou 3ª edição da UECE em 2000.186 Sendo o poema O agregado e o operário, selecionado pelo próprio Patativa para complementar a sua Antologia e enfatizar suas convicções políticas.187

Gilmar de Carvalho considerou para essa Antologia também as publicações pequenas, mas não menos importantes, de Patativa do Assaré e incluiu uma coletânea dos poetas da pequena cidade de origem do poeta, intitulada Balceiro e organizada por ele mesmo e por seu sobrinho Geraldo Gonçalves de Alencar; esse livro lançou alguns 182 Ibidem, p.94. 183 Ibidem, p.152. 184 Ibidem, p.10. 185 Ibidem, p.13. 186 Ibidem, p.196. 187 Ibidem, p.10.

poemas inéditos de Patativa, bem como “causos” e foi publicado também pela Secretaria da Cultura e Desporto do Estado do Ceará, em 1991, dele foram selecionados apenas dois poemas para compor a Antologia.188

Estão incluídos também nessa Antologia versos publicados e lançados numa caixa de cartolina, em 1993, contendo folhetos de Patativa e intitulado Cordéis que foram publicados primeiramente pela gráfica Lira Nordestina de Juazeiro do Norte, levantados por uma pesquisa do Programa Editorial da Secretaria de Cultura e Desporto; esse mesmo material ganhou publicação como livro pelas Edições UFC, em 1999, quando o poeta recebeu o título de Doutor Honoris Causa dessa Universidade.189 Desses cordéis foram escolhidos cinco para compor a Antologia e, segundo Gilmar de Carvalho, o preferido de Patativa seria Brosogó, Militão e o Diabo.190

Na 1ª Bienal do Livro de Fortaleza, em 1994, foi lançado o livro Aqui tem coisa de Patativa do Assaré e que também está incluído nessa Antologia, o mesmo fez parte do Programa Editorial da Secretaria de Cultura e Desporto do Estado do Ceará, integrando a rubrica Obras Raras e de Referência; já em 1995 esse mesmo livro foi republicado pela UECE, com substituição de prefácio, orelhas e texto de quarta-capa.191 Dessa obra foram selecionados quatro poemas, incluindo Mote e glosas que revelam sua vertente de violeiro e Menino de Rua que canta o drama do menor abandonado.192

O último livro incluído nessa Antologia, é a obra Balceiro 2, organizada por Geraldo Gonçalves de Alencar que contém versos de Patativa, bem como registro de desafios em motes e glosas, entre os dois poetas primos; foi publicado pela Secretaria da Cultura e Desporto do Estado do Ceará em parceria com a editora paulista Terceira Margem, em 2001.193 Desse apenas dois poemas foram incluídos na Antologia.

Visando discutir os elementos identitários encontrados na obra do poeta, analisar os seus versos e sua possível relação com a elaboração de uma poética resistente ou de uma resistência poética, é que esse capítulo pode aproveitar-se dessa Antologia Poética e também dos comentários tecidos pelo organizador da obra.

188 Ibidem, p.230. 189 Ibidem, p.236. 190 Ibidem, p.10. 191 Ibidem, p.306. 192 Ibidem, p.14. 193 Ibidem, p.320.

O dizer de Patativa, seus versos, traduz seu fazer humano em historicidade, considerando-se que o momento de elaboração dessa Antologia aproxima-se do fim de sua existência, enquanto homem, mas não enquanto poeta; momento em que pôde olhar sua obra, indicar e/ou excluir suas próprias produções consideradas mais ou menos significativas em todo seu “obrar” de poeta.

A opção pela multiplicidade, tanto de temas como de formas poéticas, apontam para o desejo do poeta de revelar-se como ser múltiplo, como poeta-em-obra multifacetado e em constante transformação de si e de sua obra.

Ele faz questão de selecionar e retomar àqueles em que se mostra sua versatilidade, seja pela assimilação do conhecimento poético erudito, pela dicção camoniana e o uso de uma gramática culta; como no caso do poema O Inferno, o

Purgatório e o Paraíso, como lembra Gilmar de Carvalho; seja pela abrangência de

temas abordados por ele em sua vasta obra: cotidiano, sertão, política, progresso, humor, religiosidade, amor, cidadania, a própria poesia e a morte; seja pela sua origem como violeiro que se eternizou em motes e glosas ou pelo poeta de bancada que com suas releituras mostrou antigas histórias sob o enfoque sertanejo nordestino.

Além das obras citadas nessa Antologia, há ainda algumas já citadas em capítulos anteriores dessa dissertação como Digo e não peço segredo (2001), organizada por Luiz Tadeu Feitosa; e outras descobertas que não encontramos citadas pelos pesquisadores de Patativa com os quais tivemos contato que são Ao pé da mesa (2001), com prefácio de Gilmar de Carvalho traz motes e glosas de Patativa e outros poetas de Assaré, além de Balceiro Três (2003) que também traz versos, repentes, motes, glosas e sonetos de Patativa e parcerias com outros poetas de Assaré e foi publicada depois da morte de Patativa do Assaré.

Se Patativa, incluindo-se na tradição de poeta nordestino, enquadra-se de alguma forma nesse contexto e, assim sendo, faz-se mímesis de um tempo, de uma poética; seu obrar de poeta reconstrói pela multiplicidade e pela variedade de temas e de formas de produzir poesia uma atitude de contestação, seu fazer e seu dizer poético de homem pobre, mas consciente de seu tempo e de seu papel, traduzem resistência aos desígnios injustos impostos ao povo sertanejo como naturais ou divinos. Enfim, através dessa obra antológica Patativa e o organizador mostram-nos um poeta sempre novo e nunca

totalmente definível; uma poética em constante transformação, construção e desconstrução de temas, de imagens e de formas de traduzir-se.