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3. A POLÍTICA ENERGÉTICA NACIONAL

3.2. O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA E A POLÍTICA ENERGÉTICA NACIONAL

Grande parte dos princípios do Direito Administrativo encontra-se positivada, implícita ou explicitamente, na Constituição Federal. Revelam eficácia jurídica direta e

imediata e exercem a função de diretrizes superiores do sistema, vinculando a atuação dos operadores jurídicos na aplicação de normas.

A Administração Pública é, portanto, informada por diversos princípios gerais, destinados, de um lado, a orientar a ação do administrador na prática dos atos administrativos e, de outro lado, garantir a boa administração, seja na correta gestão dos negócios públicos seja na utilização dos recursos públicos baseado no interesse coletivo, com o que também se assegura aos administrados o seu direito a práticas administrativas honestas e probas71.

A doutrina administrativista clássica costuma fazer distinção entre a Administração Pública, no sentido formal e material. O primeiro sentido seria Administração Pública como o conjunto de órgãos instituídos para consecução dos objetivos do Governo. Já em sentido material, como o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral, numa acepção operacional, seria o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços do próprio Estado ou por ele assumido em benefício da sociedade em geral. Em suma, pode- se dizer que a Administração Pública é todo o aparelhamento do Estado preordenado à realização de seus serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas72.

A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência conforme expressa o artigo 37 da Constituição Federal. Outros princípios se extraem dos incisos e parágrafos do mesmo artigo,

71 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 650. 72 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. Malheiros, 1999. p. 60.

como o da licitação, o da prescritibilidade dos ilícitos administrativos e o da responsabilidade das pessoas jurídicas (inc. XXI e §§ 1.º a 6.º)73.

Considerando o alcance de tais princípios básicos do caput do artigo 37 da carta magna, tem-se que a legalidade impõe ao administrador o dever de só atuar em conformidade com os ditames normativos, não havendo liberdade, ou seja, ao administrador somente se permite o que a lei autoriza. A moralidade administrativa, por sua vez, se relaciona com o conceito da boa administração com base na moral comum. Já a impessoalidade tem o escopo de evitara a satisfação de interesses pessoais ou privados, para que a Administração Pública esteja sempre voltada para o interesse coletivo. A publicidade corresponde à obrigatoriedade de divulgação oficial do ato administrativo para conhecimento público e início de seus efeitos. Por fim, a Emenda Constitucional 19, de 04 de junho de 1998, fez-se acrescer o princípio da eficiência que, antes, achava-se incluído dentre os deveres do administrador público, impondo-lhe agora o encargo de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e buscando o melhor resultado possível.

Antes de procedermos a análise do princípio da eficiência que é cerne deste estudo, cabe acentuar que cada um dos princípios que regem a Administração Pública se constituem mutuamente e não se excluem, não sendo jamais eliminado pelo ordenamento jurídico. Pois devemos destacar a sua função programática, que fornece as diretrizes situadas no ápice do sistema a serem seguidas por todos os aplicadores do direito74.

Quanto a aplicação dos princípios mencionados faz mister mencionar que trata-se de princípios incidentes não apenas sobre os órgãos que integram a estrutura central do Estado,

73

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 650.

74 MADEIRA, José Maria Pinheiro. Administração Pública centralizada e descentralizada. 2 ed. Rio de Janeiro:

incluindo-se aqui os pertencentes ao Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário, mas também de preceitos genéricos igualmente dirigidos aos entes que em nosso país integram a denominada Administração Indireta, ou seja, autarquias, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as fundações governamentais ou estatais.

Para o presente estudo é importante mencionar que as Agências Reguladoras enquanto autarquias em regime especial estão sujeitas a obediência dos princípios que regem a administração, inclusive ao princípio da eficiência, que passamos a tecer considerações a seguir.

Incorporado pela Emenda Constitucional nº 19 de 1998, o princípio da eficiência põe em relevância o resultado das atividades administrativas, garantindo que os serviços prestados pelo Poder Público consigam satisfazer os interesses do bem comum. Este princípio pode ser explicado como a concretização, por parte dos entes públicos, dos anseios populares, da melhor forma que as condições materiais possibilitem, atendendo às necessidades coletivas de forma eficaz75.

Para alguns doutrinadores eficiência não é um conceito jurídico, mas econômico, e diante disso não qualificaria normas, mas sim atividades. Traz a idéia de fazer acontecer com racionalidade, o que implica medir os custos que a satisfação das necessidades públicas importam em relação ao grau de utilidade alcançado. Assim, pode-se dizer que o princípio da eficiência, orienta a atividade administrativa no sentido de conseguir os melhores resultados

75 AGRA,Walber de Moura. Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

com os meios escassos de que se dispõe e a menor custo. Rege-se, pois, pela regra de consecução do maior benefício com o menor custo possível76.

Em nosso ordenamento, há também um viés não econômico do princípio da eficiência, que se liga com a gestão com equilíbrio e ponderação da coisa pública. Pois a efetivação do princípio da eficiência deve ser mensurada também em termos dos custos sociais de determinadas estruturas e práticas administrativas e sua repercussão sobre a formação de uma consciência de ação coletiva, de interesse público, dos cidadãos77.

Visto antes da Emenda Constitucional como uma faceta do princípio da boa administração, já consagrado no direito italiano, o princípio de eficiência traz a exigência de que toda a atividade administrativa seja executada com agilidade e rapidez de modo a não deixar prejudicados os interesses coletivos. Além de impor a execução dos atos administrativos baseados nas melhores técnicas e conhecimentos adequados que deverão proporcionar o melhor resultado possível.

De maneira mais sintética temos que o princípio da eficiência administrativa estabelece que toda ação administrativa deve ser orientada para concretização material e efetiva da finalidade posta pela lei, segundo os cânones jurídico-administrativo78.

Outros autores têm resistência em aceitar a eficiência como princípio administrativo constitucional, considerando-o como simples conseqüência de uma boa administração, servindo a sua nomeação no art. 37, após a Emenda Constitucional 19/1998, apenas como

76 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 655. 77 BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2002. p 183. 78

FRANÇA, Vladimir da Rocha. Eficiência Administrativa na Constituição Federal. Revista Eletrônica sobre a

Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº10, junho/julho/agosto, 2007.

adorno. Entre eles está Celso Antônio Bandeira de Mello que aponta que não há nada a dizer sobre o principio da eficiência. Trata-se de algo mais do que desejável, contudo, é juridicamente tão fluido e de tão difícil controle ao lume do Direito, que mais parece um simples adorno agregado ao art. 37 ou o extravasamento de uma aspiração dos que burilam no texto. Afirma que tal princípio não pode ser concebido senão na intimidade do princípio da legalidade, pois jamais suma suposta busca de eficiência justificaria postergação daquele que é o dever administrativo por excelência79.

Isso porque a eficiência como pressuposto básico da atuação administrativa não constitui nenhuma novidade no plano legal, pois já se tinha essa idéia no bojo do Decreto-lei nº 200/67, com a orientação no sentido de que toda a atividade administrativa deverá estar submetida ao controle de resultado nos artigos 13 e 25, V, bem como o sistema de mérito no artigo 25, VII e a recomendação de demissão ou dispensa do servidor comprovadamente ineficiente ou desidioso no artigo 100. Além de prever a supervisão ministerial à administração indireta tendo como objeto assegurar, essencialmente, a eficiência administrativa do artigo 26, III.

Todavia, acredita-se que ao colocar a eficiência no plano constitucional, à condição de princípio básico da atividade administrativa, buscou-se dar destaque ao desejo de maximizar sempre os resultados em toda e qualquer atuação do Poder Público, impondo-se uma atuação dentro de padrões aceitáveis de presteza, perfeição e rendimento.

Portanto, este princípio deve ser interpretado juntamente com a qualidade dos serviços prestados pelos entes estatais, agilizando o atendimento dos interesses coletivos sem descurar

79 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17 Edição. São Paulo: Malheiros

da excelência das atividades realizadas. A eficiência tomada no sentido exclusivo de rapidez é inadmissível, devendo, para a verificação do cumprimento constitucional, ser conjugada com o princípio da razoabilidade, verificando-se se os fins se adequam aos meios80.

Ser eficiente, portanto, exige primeiro da Administração Pública o aproveitamento máximo de tudo aquilo que a coletividade possui, em todos os níveis, ao longo da realização de suas atividades. Significa racionalidade e aproveitamento máximo das potencialidades existentes. Mas não só isso. Em seu sentido jurídico, a expressão também deve abarcar a idéia de eficácia da prestação, ou de resultados da atividade realizada. Uma atuação estatal só será juridicamente eficiente quando seu resultado quantitativo e qualitativo for satisfatório, levando-se em conta o universo possível de atendimento das necessidades existentes e os meios disponíveis81.

Neste momento cumpre fazer uma distinção ente eficiência e eficácia que por alguns autores é confundida. Apesar de eficiência e eficácia serem palavras consideradas sinônimas em seu significado comum, elas apresentam diferentes significado científico. Os dois significados podem coincidir, ou não. E de acordo com a ciência da Administração eficiência não é o mesmo que eficácia. A eficiência não se preocupa com os fins, mas simplesmente com os meios. O alcance dos objetivos visados não entra na esfera de competência da eficiência; é um assunto ligado à eficácia. Podemos então inferir que o conceito jurídico de eficiência pode ser elaborado à luz desse conceito administrativo. A eficiência refere-se aos meios, enquanto a eficácia está relacionada com os resultados. A distinção entre eficiência e

80 AGRA,Walber de Moura. Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

p. 329.

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CARDOZO, José Eduardo Martins. Princípios Constitucionais da Administração Pública :de acordo com a Emenda Constitucional n.º19/98. In MORAES, Alexandre. Os 10 anos da Constituição Federal. São Paulo: Atlas, 1999. p. 166.

eficácia na Ciência do Direito seria feita de maneira similar a classificação na doutrina civilista de obrigações de meio e obrigações de resultado82.

Tem-se, pois, que a idéia de eficiência administrativa não deve ser apenas limitada ao razoável aproveitamento dos meios e recursos colocados à disposição dos agentes públicos. Deve ser construída também pela adequação lógica desses meios razoavelmente utilizados aos resultados efetivamente obtidos, e pela relação apropriada desses resultados com as necessidades públicas existentes.

O princípio da eficiência é uma realidade, responsável por um esforço de superação do formalismo característico da maioria dos ordenamentos jurídico-administrativos.

Porém o direito administrativo brasileiro ainda é formalista e permeado pela herança da formação autoritária. A racionalidade administrativa e a eficiência das prestações do Estado não eram, até pouco, valores juridicamente consagrados para a ação administrativa e, não obstante o ordenamento infraconstitucional reconhecer o princípio da eficiência acrescentado pela EC 19/98, a cultura jurídica dominante não o acolheu, ainda, no cotidiano de sua atividade83.

Os princípios da publicidade, impessoalidade, legalidade e moralidade têm ligação simbiótica com o princípio da eficiência, devendo ser aferidos de forma conjunta. Uma vez concretizados, eles servem para aumentar a eficiência da administração pública no preenchimento das demandas sociais. Portanto todos os princípios devem ser interpretados de

82 AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. O princípio da eficiência no direito administrativo. Revista Diálogo

Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, nº. 14, junho-agosto, 2002. Disponível na Internet:

<http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 20 de julho de 2008.

forma sistêmica, potencializando os resultados governamentais, sem nenhum grau de hierarquização entre eles84.

Um último comentário deve ser feito no tocante a aplicação do princípio da eficiência juntamente com o princípio da legalidade. É importante deixar claro que o princípio da eficiência não visa mitigar ou ponderar o princípio da legalidade, mas sim embeber a legalidade de uma nova lógica, determinando a insurgência de uma legalidade finalística e material e não mais uma legalidade meramente formal e abstrata85.

A Administração não deve apenas cumprir a lei, mas sim deve buscar a forma mais eficiente de cumprir a lei, deve buscar ainda, entre as soluções teoricamente possíveis, aquela que, diante das circunstâncias do caso concreto, permita atingir os resultados necessários à melhor satisfação do interesse público. Os novos tempos inspirados no princípio da eficiência são marcados pela administração participativa, pelas decisões negociadas, pela conciliação de interesses, pelo respeito às peculiaridades de cada caso e pela razoabilidade na aplicação da lei86.

Por fim, não se pode negar o aspecto normativo do princípio da eficiência, nem negar que a sua introdução é importante como consagração constitucional da necessidade de ponderação entre meios e fins, objetivando diminuir a distância que hoje afasta o direito

84 AGRA,Walber de Moura. Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

p. 329

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ARAGÃO, Alexandre Santos. O Princípio da Eficiência. Revista Eletrônica de Direito Administrativo

Econômico. Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº. 14, nov./dez., 2005, jan. 2006. Disponível na

Internet:<http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 20 de julho de 2008.

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DALLARI, Adilson Abreu. Privatização, eficiência e responsabilidade. In: NETO, Diogo de Figueiredo Moreira (coord). Uma avaliação das tendências contemporâneas do direito administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p.220.

administrativo da ciência da Administração Pública no Brasil e incrementar a dimensão material da ação administrativa87.