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INTRODUÇÃO 33 1.1 O TERRITÓRIO EM QUESTÃO

1.2 O PROBLEMA DA PESQUISA

Formulou-se como problema da pesquisa entender de que modo o direito à Educação Infantil das crianças que vivem no campo no município de Pinhão-PR é percebido pelas famílias e de que maneira é cumprido pelos órgãos governamentais.

As questões que derivam desse problema podem ser assim formuladas: há conhecimento das famílias que vivem no campo sobre o direito de a criança frequentar os Centros Municipais de Educação Infantil? Se sim, como compreendem esse direito? Qual a importância atribuída por elas aos Centros Municipais de Educação Infantil? Existe

3CMEI – Centro Municipal de Educação Infantil, denominação utilizada nessa região.

por parte dessas famílias interesse em que as crianças frequentem o CMEI? O que dizem as autoridades sobre o direito de a criança que vive no campo frequentar a Educação Infantil? Como esse direito, pautado nas políticas educacionais nacionais, é implementado por meio das políticas públicas municipais?

Para responder às questões, consideramos que as metodologias qualitativas são as mais indicadas, especialmente o estudo de caso com inspiração etnográfica.

A pesquisa pode ser considerada como a construção de um caminho para compreender uma realidade ou um objeto de estudo, sendo este embasado em determinados pressupostos epistemológicos e teóricos, portanto, sempre inacabado e com determinada filiação teórica e política.

Com base nessa concepção, apresento aqui nossa opção por fazer uma pesquisa qualitativa, utilizando o estudo de caso de inspiração etnográfica.

Segundo Bogdan e Biklen (1982) (apud Lüdke e André, 2013 p.13), a pesquisa do tipo qualitativo “envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo que o produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes”.

Em meio a vários tipos de pesquisa de abordagem qualitativa, destacam-se alguns: relatos de experiência, história de vida, pesquisa histórica, pesquisa-ação. Entre esses, a pesquisa do tipo etnográfico e os estudos de caso têm tido um papel de destaque, sendo este último o que se mostrou mais adequado para este trabalho.

Sarmento define o estudo de caso com base em Miles e Huberman (1994):

Estudos de definição espacial, que incidem em indivíduos, papéis sociais, pequenos grupos, organizações, comunidades ou “contextos” ou em nações; e estudos de definição temporal, que incidem em episódios ou situações, acontecimentos ou períodos limitados de tempo. (apud SARMENTO, 2003, p.138).

O estudo de caso permite a investigação específica de uma instituição, um sujeito, uma família ou uma comunidade, utilizando diferentes técnicas de pesquisa. É importante considerar os diferentes pontos de vista de todos os componentes envolvidos no contexto da pesquisa, com o objetivo de apreender a totalidade, descrevendo-a

com a complexidade que a pesquisa exige para uma situação concreta, a qual não pode ser atingida por uma análise estatística.

Com relação à abordagem etnográfica utilizada na pesquisa, esta não pode ser entendida apenas como uma técnica de coleta de dados, mas sobretudo como uma relação de aproximação com a teoria antropológica, solicitando ao pesquisador rigor em suas análises, com conhecimento das discussões e das concepções teóricas desse campo, como afirmam Ezpeleta e Rockwell:

Ao adotar a etnografia no campo da pesquisa educacional, é importante não aceitá-la como uma simples técnica, mas como uma opção metodológica, no sentido de que todo método implica uma teoria. Retomar essa tradição antropológica exige que se faça consciente uso da teoria, em vez de negar a presença de pressupostos teóricos da descrição. (1989 p. 35). Foi nos anos de 1970 que o uso de etnografias em pesquisas educacionais teve seu início, com berço nos EUA e Inglaterra, revelando uma aproximação entre a Antropologia e a Sociologia qualitativa, que rompia com os paradigmas dominantes até então, os quais tinham como base a Psicologia experimental e a Sociologia quantitativa.

O uso da etnografia provocou várias discussões teóricas sobre a utilização dessa abordagem nas diferentes linhas de pesquisa. A pesquisa etnográfica é comparada a uma janela, utilizada pelo antropólogo para através dela observar as relações e tipos de comportamento de um determinado grupo, tendo como objetivo explicá- los numa perspectiva cultural mais ampla.

Geertz (1989, p. 15), antropólogo norte-americano contemporâneo, atualiza essa relação entre a abordagem teórica e a descrição etnográfica:

Em antropologia ou, de qualquer forma, em antropologia social, o que os praticantes fazem é a etnografia. E é justamente ao compreender o que é etnografia ou mais precisamente o que é a prática da etnografia, é que se pode começar a entender o que representa a análise antropológica como forma de conhecimento. Devemos frisar, no entanto, que essa não é uma questão de métodos. Segundo a opinião dos livros-textos, praticar etnografia é estabelecer relações, selecionar

informantes, transcrever textos, levantar genealogias, mapear campos, manter um diário, e assim por diante. Mas não são essas coisas que definem o empreendimento. O que define é o tipo de esforço intelectual que ele representa: um risco elaborado para uma "descrição densa", tomando emprestada uma noção de Gilbert Ryle. Segundo Lüdke e André (2013), a pesquisa etnográfica possui algumas características, dentre as quais podemos destacar:

a)o significado da descoberta ou da redescoberta do problema no campo: muitas vezes o pesquisador parte de um quadro teórico inicial, o qual serve de base para pesquisa, porém fica atento a novos elementos que possam surgir, pois “o conhecimento não é algo acabado, mas uma construção que se faz e refaz constantemente”. (LÜDKE e ANDRÉ, 2013, p. 18);

b)o acompanhamento do pesquisador no contexto pesquisado é importante para que ele compreenda e interprete os fatos, percepções, comportamentos e interações entre os atores sociais do grupo observado;

c)a realidade mostra-se de modo a evidenciar a inter-relação dos seus componentes, o que pede do pesquisador um profundo mergulho com o objetivo de compreender os significados das regras, dos costumes, dos gestos e convenções do grupo observado; d)a utilização de diversos métodos para realização da coleta de

dados, os quais são obtidos em diferentes fontes e em momentos diferentes, com o objetivo de validar ou não as hipóteses; e)oportunizar ao leitor associar dados da pesquisa às suas

experiências pessoais, estabelecendo relações entre a situação estudada e outros contextos, gerando assim novas ideias e compreensões;

f)coleta de dados primários que possibilitem esclarecer os diferentes pontos de vistas dos participantes, com base na premissa de que "a realidade pode ser vista sob diferentes perspectivas, não havendo uma única que seja mais verdadeira". (LÜDKE e ANDRÉ, 2013 p. 20).

Em síntese, o que caracteriza um estudo de caso de cunho etnográfico é um estudo de uma unidade com limites bem definidos, que preencha os requisitos da etnografia.

Sabendo que a escolha do tipo de pesquisa adequa-se à concepção teórico-metodológica e ao objeto de estudo do(a) pesquisador(a), a

opção pelo estudo de caso com inspirações etnográficas deve-se ao fato dessa metodologia de pesquisa corresponder ao objetivo central deste trabalho. Esse estudo, realizado de maneira detalhada sobre um determinado universo, definido e historicamente situado, nos proporciona a descoberta de novas formas de entendimento da realidade ao mesmo tempo em que possibilita a outros(as) leitores(as) ampliar e aprofundar os aspectos comuns e recorrentes do objeto de estudo em diferentes contextos. (LÜDKE e ANDRÉ, 2013)

Com relação à capacidade de generalização, Lüdke e André (2013) apontam que a descrição densa, ou seja, o fornecimento de informações detalhadas do contexto de estudo é fundamental para que o leitor possa fazer uma análise entre as semelhanças e diferenças, elementos que permitem fazer a comparação ou a transferência da situação estudada para outras situações.

No caso da pesquisa em pauta, a escolha pelo estudo de caso deve-se à especificidade desse município inserido no território, o único em que há uma Instituição de Educação Infantil no campo, além das possibilidades que ele oferece de trabalhar com diferentes fontes, tais como documentos, entrevistas, questionários e observações, especialmente no que concerne à compreensão do significado atribuído pelas famílias ao direito à Educação Infantil das crianças do campo. Cabe ressaltar que as informações recolhidas serão sempre relacionadas ao contexto social, político e econômico que define as políticas educacionais nacionais para a Educação Infantil do Campo e sua implementação no município de Pinhão. A relação entre a realidade local e o contexto político nacional será um eixo articulador presente em todo o trabalho.

O trabalho de campo deste estudo foi realizado por um período de nove meses, entre janeiro e outubro de 2015.

Foram utilizados os seguintes instrumentos de pesquisa:

a).levantamento de referências bibliográficas que abordam as questões relacionadas com o tema da pesquisa, seguido da análise e sistematização do conteúdo dessas referências;

b) análise documental: Projeto Político-Pedagógico (PPP) e Regulamento Interno do Centro Municipal de Educação Infantil; c) visitas às casas de famílias que vivem no campo, em localidades

ao redor do CMEI pesquisado, para realização de entrevistas com as famílias das crianças de 0 a 5 anos de idade. Ao todo, foram realizadas quarenta entrevistas, nas casas dessas famílias, nas mais diversas localidades do município de Pinhão:

assentamentos, acampamentos, vilas rurais e pequenas propriedades. Cumpre destacar que somente as mães foram entrevistadas, porque, no dia e horário das visitas, os pais não se encontravam em casa; muitos trabalham fora da cidade, inclusive; d) além das entrevistas, foram aplicados questionários aos pais

durante uma reunião pedagógica realizada no CMEI, com o objetivo de atingir um maior número de pais ou responsáveis pelas crianças que frequentam o centro;

e) também foram realizadas seis entrevistas com profissionais do CMEI (direção, professores, funcionárias), uma entrevista com o prefeito municipal, uma entrevista com a assistente social que atende a região do CMEI, uma entrevista com o funcionário da Secretaria de Educação do Estado do Paraná e uma entrevista com um membro do Conselho Tutelar do município de Pinhão; f) organização de um diário de campo – durante e após cada visita

foi feito um registro detalhado do que vimos, ouvimos e percebemos, com o objetivo de registrar impressões imediatas que ficaram armazenadas para análises posteriores.

Como parte da pesquisa, foi realizado levantamento bibliográfico em algumas fontes de pesquisa, o qual contribuiu para revelar o baixo número de produções referentes às crianças pequenas que vivem no campo.

1.3 LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO SOBRE A TEMÁTICA