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O problema da história da arte: o domínio técnico e a cadeia causal

No documento U NIVERSIDADEF EDERAL DES (páginas 46-99)

PARTE I Estética

Capítulo 1: O problema da história da arte: o domínio técnico e a cadeia causal

Somente o entendimento correto do progresso ‘técnico’ permite o domínio da história da arte, [...] como um

conteúdo representável por meios puramente empíricos, isto é, sem qualquer valoração estética. (WEBER. 1922 [GAWL], p.482)

A primeira e segunda parte dessa investigação correspondem, intencionalmente, ao que Weber propôs em sua “consideração intermediária” quanto a passagem da esfera estética para a esfera intelectual (cf. Weber. 1922 [GARS I], pp.542-67). Temos assim, na primeira parte, o surgimento do conflito dos valores estéticos com os valores éticos e, na segunda parte, o conflito entre os valores intelectuais e os valores éticos. Ambas tratam, portanto, da relação entre a esfera valorativa e a esfera empírica que será discutida nesse capítulo. Através da leitura de Lukács será também possível compreendermos, a partir dos capítulos dois e três, como esses dois conflitos de valores já predispunham dessa discussão, também segundo a sequência presente na “consideração intermediária”, sobre o problema da teodiceia e os três tipos de solução para esse problema (cf. Weber. 1922 [GARS I], p.571-73).

O propósito desse capítulo é apresentar, segundo o recorte mais específico do tema da técnica e da cultura, como o problema derivado da constatação de um mundo invertido estaria pressuposto tanto segundo uma apreciação materialista como espiritualista. Como verificaremos adiante, temos, na evolução dos meios técnicos, os elementos que permitiram a Weber observar o lado materialista do desenvolvimento. A cultura, por outro lado, incluindo nela os elementos da intelectualização, do desenvolvimento da arte que se liberta dos valores religiosos e do surgimento de uma consciência reflexiva tipicamente moderna, inclui elementos que configuram um processo pertencente à interpretação espiritualista. Partiremos do pressuposto de que Weber compreendia por racionalização os fenômenos ligados mais diretamente às condições materiais, ao domínio técnico, ao

44 cálculo, ao passo que o processo de intelectualização expõe um desenvolvimento reflexivo à parte, seja ético ou estético. Trata-se da busca por dar um sentido ao mundo, segundo sua condição histórica, naturalmente esses processos se encontram em uma disposição muito intrincada e sua separação, só possível em termos teóricos, tem por objetivo estabelecer a especificidade de cada contexto histórico.

A suposição de que Weber apresentaria, em sua “teoria dos valores”, critérios para separar criticamente os valores éticos e estéticos, as necessidades materiais e a constatação empírica, tomará por base a discussão de Weber sobre O sentido ‘livre de valores’ (Wertfreiheit) nas ciências sociológicas e econômicas, que será abordada,

inicialmente, na segunda parte desse capítulo e retomada no quarto capítulo. Antes de abordar esse texto, compete que sejam apresentados alguns antecedentes dessa questão, que se encontram nos comentários de Max Weber sobre a apresentação de Sombart do tema “técnica39 e cultura” (Technik und Kultur). Nessa discussão, identificaremos de

modo mais exato a importância e os limites do lado materialista dos fenômenos históricos, assim, os problemas que estão envolvidos numa apreciação histórica materialista ingênua deverão ficar mais evidentes na parte inicial desse capítulo. Como a discussão foi feita por ocasião de um dos encontros da Sociedade sociológica alemã (Deutsche soziologische

Gesellschaft), caberia muito bem destacar a opinião que Weber destinava a esses eventos e ao futuro da sociologia, opinião pessoal, imperceptível na abordagem teórica, mas também realista e coerente com sua reflexão. Quando Franz Eulenburg lhe perguntou sobre o andamento dessa sociedade, em 11 de outubro de 1910, Weber respondera o seguinte: “sim, apesar de tudo, está prosperando, creio, assim, nos desígnios insondáveis de Deus em favor dessa ciência condenada, a sociologia”. Esse tipo de ironia expressa claramente e com franqueza, certa atribuição de valor que Weber assumia pessoalmente, mas sempre buscou isentar-se nos textos teóricos; para ele a sociologia, ignorando a

39 Praticamente todas as traduções que foram feitas do texto, tanto para o inglês como para o francês

optaram por traduzir “Technik” por “tecnologia”. É evidente que o termo Technik, está mais próximo de técnica do que de tecnologia, e também é certo que temos em alemão o termo “Technologie”, que não é empregado em nenhum lugar do texto. Ainda assim, essa escolha se justificaria, nas traduções inglesas e francesas, porque na primeira metade do texto se discute justamente questões de tecnologia industrial. A insistência em traduzir esse termo por técnica, se deve ao fato de que seria um erro guiar-nos por essa primeira conotação, sendo que o tema principal da leitura conduz para uma reflexão sobre a cultura, sobre a arte, ou seja, traz em voga a ideia antiga de técnica como techne (τέχνη), isto é, a arte no seu sentido antigo. A partir de seu avanço, na modernidade, surgem diversos sentidos, mas o termo empregado deve ser sempre o mais genérico e não confundido com o conceito moderno de tecnologia. Além disso o mesmo termo é empregado com muita frequência no texto de Weber O sentido ‘livre de valores’ (Wertfreiheit) nas ciências sociológicas e econômicas, no qual a tradução por tecnologia resultaria desastrosa. É indispensável buscarmos alguma constância nas traduções dos conceitos, mesmo em textos diferentes, pois o contrário faz com que muitas vezes ignoremos a forte afinidade entre eles.

45 isenção dos juízos valorativos por ele idealizada, mostrar-se-ia de fato condenável, tanto segundo um padrão de cientificidade que lhe imputavam, como de um ponto de vista ético, por seu caráter valorativo sempre limítrofe. De fato a sociologia interessava a Weber muito mais pelos problemas que ela fornecia do que por seu valor científico promissor.

No texto que abordaremos um pouco mais adiante (O sentido ‘livre de valores’ nas ciências sociológicas e econômicas), Max Weber adapta uma discussão que originalmente se voltara para a economia política, trazendo-a ao campo histórico e sociológico, e toma como exemplo, como foi dito, a história da arte. É importante destacar que o tema estético estava na origem dos interesses de Georg Simmel pela sociologia e já representava um padrão de sociologia, que, para Weber, ignorava muitos dos problemas dos conflitos valorativos. O próprio desenvolvimento de um estudo sobre a estética em Lukács se mostra decisivo para a presente abordagem, por apresentar elementos próprios desse debate. Essa estética que inicialmente estaria seguindo, muito provavelmente, os pressupostos neokantianos de Rickert, seria uma alternativa à leitura da filosofia da vida de Simmel e Dilthey. Embora Lukács tenha sido aluno do curso de Simmel sobre o tema, o qual impactou profundamente seus primeiros escritos e sendo ele também leitor de Dilthey, o desenvolvimento inicial e posterior de sua estética implicaria um rompimento e assumiria várias considerações críticas de Weber e dos neokantianos de Baden a essas correntes de pensamentos, identificadas com a Lebensphilosophie, com o lado unilateralmente espiritualista, da teoria das visões de mundo.

A cadeia causal histórica na discussão de 1910 sobre a técnica e a cultura

Nos comentários de Max Weber sobre o tema: técnica e da cultura de 1910, verificaremos algumas questões, que foram retomadas em diversos escritos de Weber, em especial no referido texto sobre O sentido ‘livre de valores’ nas ciências sociológicas e econômicas, bem como nos comentários introdutórios e intermediários aos Ensaios

reunidos de sociologia da religião. Nessa leitura e discussão de 1910, embora suas implicações visassem questionar certos pressupostos compartilhados pela sociedade sociológica alemã de forma mais geral, dentre os quais devemos incluir a interpretação

46 de G. Simmel, o alvo mais direto de Weber era, de fato, a interpretação de Werner Sombart.

A análise crítica que Weber fez de Sombart, seguia três pontos fundamentais: (1) o conceito equivocado de “técnica”; (2) uma interpretação arbitrária de Marx e (3) o problema das valorações na ciência. As três questões mostram-se em uma sequência e são inseparáveis. O conceito de técnica requer de Marx uma autoridade teórica, que, segundo Weber, seria arbitrária por ignorar o fato de que essa concepção em Marx era apresentada de modo ambíguo e não como uma definição universal. Essa arbitrariedade do sentido de “técnica” revelaria, por sua vez, uma valoração, que para Weber seria uma forma enviesada de interpretação histórica e, portanto, inaceitável:

É algo por si mesmo evidente que aquilo que se quer entender pelo conceito de “técnica” é arbitrário e muito duvidoso [Zweifelhaftes]. No meu entendimento Marx não deu uma definição do conceito de técnica. Existe, no entanto, segundo Marx, algo que diz muito, quando alguém analisa de modo exato e pedante, como nós devemos fazê-lo, e parece não somente estar repleto de contradição [widerspruchsvoll], mas realmente é algo repleto de contradição, trata-se do conteúdo de um trecho citado com muita frequência: ‘O moinho de mão requer o feudalismo o moinho a vapor requer o capitalismo’ (WEBER. 2001 [ThK], p.450; 1910 p.45)40

Podemos supor, de forma bastante certa, que Max Weber estaria citando Marx de memória, uma vez que apresenta essa frase sem exatidão literal. Como acabamos de ler, Weber cita Marx nos seguintes termos: “O moinho manual requer o feudalismo, o moinho a vapor requer o capitalismo”41, no entanto, em sua fonte original, teríamos o seguinte “o

moinho manual dá uma sociedade com senhor feudal, o moinho a vapor uma sociedade com capitalista [ou capitalismo] industrial”42 (MARX, [Elend] 1998 MEW4, p.130).

Devemos notar o fato interessante de Weber saber de memória alguns trechos de Marx, pois estávamos diante de uma apresentação oral e, além disso, o fato do professor

40 Es ist selbstverständlich an sich etwas Willkürliches und sehr Zweifelhaftes, was man unter dem Begriff »Technik« verstehen will. Marx gibt eine Definition des Begriffs Technik meines Wissens nicht. Es steht aber bei Marx, bei dem sehr Vieles steht, was, wenn man genau und pedantisch, wie wir es tun müssen, analysiert, nicht nur widerspruchsvoll scheint, sondern wirklich widerspruchsvoll ist, unter anderem eine oft zitierte Stelle des Inhalts: Handmühle bedingt Feudalismus, Dampfmühle bedingt Kapitalismus. 41 “Handmühle bedingt Feudalismus, Dampfmühle bedingt Kapitalismus.”

42A versão alemã da miséria da filosofia saiu pela tradução de Karl Kautsky em 1892, traz o trecho do

seguinte modo: “Die Handmühle ergibt eine Gesellschaft mit Feudalherren, die Dampfmühle eine

Gesellschaft mit industriellen Kapitalisten.” Na versão original francesa, que foi provavelmente a versão

lida por Weber, sendo que Tönnies e ele se referem ao título em francês, também difere do que Weber cita: “Le moulin à bras vous donnera la société avec le suzerain; le moulin à vapeur, la société avec le capitaliste

industriel” (MARX. 1896, p.151) essa versão francesa de 1896 apresenta, tal como em alemão, a expressão “capitaliste”, contudo em outras traduções francesas encontramos “capitalisme”, mostrando-se mais próxima da citação de Weber, embora seja também pouco literal.

47 mediador, F. Tönnies, reconhecer prontamente, e explicar ao público “isto está na Misère

de la philosophie”, o que Weber por sua vez confirma e acrescenta: “exatamente, uma

obra de fase prévia”. Ora, embora não esteja apresentando o trecho de forma literal, Weber afirma que se o analisarmos com exatidão e precisão, notaremos, pois, não um sentido unívoco, mas algo ambíguo, duvidoso, (Zweifelhaftes); isso porque não fica claro se é a sociedade feudal que se dá a partir do surgimento do moinho manual ou o moinho manual que só surge condicionado pela já existente sociedade feudal. A afirmação de Weber indica igualmente que ele reconhecia algo bastante particular da compreensão dialética de Marx, o sentido histórico de contradição, pois afirma que isso não seria algo que nos parece totalmente contraditório (widerspruchsvoll), mas de fato é contraditório. Para Weber, há um sentido dúbio em Marx e podemos supor que isso não implica uma desconstrução do pensamento de Marx. Ao contrário, para Weber, essa forma contraditória, não sendo algo fortuito, mostra-se de fato como expressão exata do que é

realmente contraditório na história quando pensada em termos de causalidade.

Se retornarmos ao sentido original desse trecho de Marx sobre a relação entre técnicas produtivas e os detentores dos meios de produção, verificaremos que, no contexto da Miséria da filosofia, Marx estava justamente nos conduzindo à conclusão da crítica da interpretação dialética de Hegel segundo a fórmula tese, antítese e síntese, ou pior, afirmação, negação, negação da negação, que, segundo Marx, conduzia Proudhon a constatar algo negativo e positivo nos avanços técnicos (tema central dessa discussão de Weber), indicando que Proudhon tomara Hegel de maneira muito simplista e acreditava que se poderia simplesmente negar os aspectos negativos, chegando, assim, à solução dos problemas da miséria humana. Marx argumentava, justamente, que não há tal fórmula para a dialética. A divisão do trabalho parece ter ‘causado’ a fábrica moderna, por outro lado, não havia divisão do trabalho, tal como a conhecemos, antes do capitalismo. Marx critica Proudhon e os economistas por universalizarem a lógica capitalista, considerando- a a forma mais natural das relações de produção:

Os economistas procedem de modo muito peculiar. Para eles só existem dois tipos de instituições, artificiais e naturais. As instituições do feudalismo são instituições artificiais, dado que as da burguesia são as naturais. Com isso eles se assemelham aos teólogos que também dividem as religiões de duas maneiras. Qualquer religião que não seja

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a deles é uma invenção humana, valendo-se de que sua própria religião é uma revelação de Deus. (MARX. [Elend] 1998 MEW4, p.139) 43

A crítica de Marx a Proudhon, bem como sua crítica à economia política, tinham ainda em vista aquele princípio visto na introdução, segundo o qual a crítica religiosa deve converter-se em crítica do Estado, do direito, da sociedade capitalista. Marx denunciava a cegueira que atingia os economistas que não percebem que aquilo que lhes parece leis naturais, ou coisas eternas, não passava de criações humanas muito recentes. Elas não permitem estabelecer uma lógica que explica todo desenvolvimento histórico, mediante esse padrão supostamente “natural”, que não existia, por exemplo, no feudalismo.

A pregunta, que nos colocamos, face a essa dificuldade em compreender a origem histórica do que parece, aos olhos dos economistas, uma disposição natural, seria: como surgiram então, as fábricas? Devemos seguir a lógica de que a divisão do trabalho cria a fábrica, ou, ao contrário, que a fábrica cria a divisão das funções e ordena a sociedade? Vejamos como Marx nos responde esse enigma:

Como é que este local de trabalho, a fábrica, surgiu? Para responder a essa pergunta temos de examinar como a indústria manufatureira de fato se desenvolveu. Eu falo aqui daquela indústria que não é ainda a grande indústria moderna, com suas máquinas, mas também já não é mais a indústria doméstica da idade média. Não queremos entrar muito em detalhes: introduziremos apenas os principais pontos para mostrar que com fórmulas ninguém faz história. (MARX. [Elend] 1998 MEW4, p.151) 44

Como veremos, nesse ponto Weber pensava de forma muito semelhante a Marx. Para Marx, temos uma falha em estabelecer um princípio de mudança histórica, de transformação dos meios técnicos e sua respectiva ordenação das relações sociais; a lógica da explicação causal se contradiz ao tentar determinar relações de causa-efeito na história, segundo fenômenos gerais, tal como visto nos problemas teóricos do mundo invertido, para Weber, os que ignoram esse tipo de problema são epígonos de Kant.

43 Die Ökonomen verfahren auf eine sonderbare Art. Es gibt für sie nur zwei Arten von Institutionen, künstliche und natürliche. Die Institutionen des Feudalismus sind künstliche Institutionen, die der Bourgeoisie natürliche. Sie gleichen darin den Theologen, die auch zwei Arten von Religionen unterscheiden. Jede Religion, die nicht die ihre ist, ist eine Erfindung der Menschen, während ihre eigene Religion eine Offenbarung Gottes ist.

44 Wie ist diese Werkstatt, die Fabrik, entstanden? Um diese Frage zu beantworten, haben wir zu prüfen, wie die eigentliche Manufakturindustrie sich entwickelt hat. Ich spreche hier von jener Industrie, die noch nicht die moderne große Industrie mit Ihren Maschinen ist, die aber bereits weder die Industrie des Mittelalters noch die Hausindustrie mehr ist. Wir wollen nicht zu sehr ins Detail eingehen; wir wollen nur einige Hauptpunkte feststellen, um zu zeigen, wie man mit Formeln noch keine Geschichte macht.

49 Segundo essa lógica causal simplista, ou escolhemos que foi a máquina que criou o operário ou os operários que criaram as máquinas, negando como as fases históricas, feudalismo, capitalismo etc. são interpenetradas, transitórias e a passagem de uma para outra se dá por um processo lento de inversão, que dura séculos e se dá de forma bastante acidentada; não ocorre sem conflitos ou segundo uma causa determinante simples. Por isso uma grande parte de O capital se destinou à difícil compreensão histórica da passagem da manufatura à maquinaria, porque não há um movimento lógico e claro que explique por si mesmo essa passagem. E conclui Marx: “o que Sr. Proudhon não sabe é que a história toda não é outra coisa que uma transformação contínua da natureza humana” (MARX. [Elend] 1998 MEW4, p.160)45. O que nos interessa para as

considerações de Weber é, precisamente, esse caráter contínuo e a dificuldade de se estabelecer uma lógica causal, conduzindo-nos, ao final à constatação da transformação na natureza humana, do que parece por ele naturalizado, do mundo humano, nas palavras de Weber, do “tipo humano” de cada época.

Como veremos, Weber tinha justamente esse problema em vista ao revisar a leitura da Miséria da filosofia. Weber menciona, com bastante frequência, essa ideia de uma “cadeia causal histórica”46 e, conforme será argumentado, essa expressão kantiana

de Weber possui um sentido bastante específico que deve ser entendido nos termos críticos de sua fundamentação filosófica. Os diferentes textos em que Weber empregou esse termo, darão consistência à presente interpretação, que será progressivamente desenvolvida nos próximos capítulos. Antes de adentrarmos nessas questões, acompanhemos o argumento de Weber sobre a relação entre a história da arte e a evolução dos meios técnicos.

Weber considerava que “o assim denominado ‘materialismo histórico’, tornou-se hoje algo completamente obscuro quanto ao seu sentido próprio”, referindo-se não mais a Marx, mas à apropriação teórica dessa concepção. Nesse sentido Weber nos dá um exemplo, que permitirá posteriormente verificarmos com muita precisão o que ele diagnosticava. Segundo Weber: “Stammler o interpretou de tal modo que deixaria Marx

45Herr Proudhon weiß nicht, daß die ganze Geschichte nur eine fortgesetzte Umwandlung der menschlichen Natur ist.

46 Tanto em Economia e Sociedade, como nos seus textos teóricos: Estudos críticos sobre a lógica no campo das ciências da cultura e O sentido ‘livre de valores’ (Wertfreiheit) nas ciências sociológicas e econômicas.

50 absurdamente assombrado”47. Propondo semelhante crítica, Weber também menciona

como Sombart compreendia a técnica, como “a maneira de processar bens-materiais”48 e

acrescenta a essa concepção a definição de seu colega, o professor Staudinger, que entendia por técnica um procedimento no qual “se pode prever o bem final que se quer produzir”49 (cf. Weber. 2001 [ThK] p.451; 1910 p.48), novamente Weber demonstra, a

esse respeito, uma compreensão muito mais coerente com a reflexão marxista do que essa definição ingênua de técnica, que falha por não converter a crítica da teologia em crítica da economia. Assim, explica Weber, com certa ironia, como aquilo que se denomina técnica possui um sentido rigorosamente contrário a essa ideia geral:

Essa concepção pode se aplicar ao ato de andar, comer, e qualquer tipo de procedimento, mas será que ela realmente se aplicaria à máquina tecelã, a fiandeira e a todos os trabalhadores incultos [ungelernten Arbeiter] que as manipulam em nossas fábricas sem qualquer entendimento [unverstandene] dessas máquinas? Aplicar-se-ia aos cálculos dos industriais, mas não a estes. [...] Chegamos ao ponto de reconhecer que o conceito de ‘técnica’ deveria ser muito mais específico do que, como eu já disse, se apresenta na concepção materialista da história com muita frequência – embora não sempre – excluindo as relações de propriedade. Mas deixemos a discussão da concepção materialista da história para outra ocasião. (WEBER. 2001 [ThK], p.451; 1910, p.48)50

O materialismo criticado por Weber é aquele, típico dos economistas-teólogos, que consideram a técnica algo que possui sentido por si mesma, e não a compreendem como um meio, excluindo da realidade histórica as relações entre os proprietários dos meios de produção e os que possuem apenas a força de trabalho, o que daria seu sentido

No documento U NIVERSIDADEF EDERAL DES (páginas 46-99)

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