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O processo de adequação institucional de Portugal à União Europeia

4. O processo de europeização da segurança e defesa a partir do caso

4.5. O processo de adequação institucional de Portugal à União Europeia

O desejo de Portugal em integrar a UE foi marcado por uma intensa negociação que não abriu mão dos seus objetivos políticos relacionados à soberania nacional, à OTAN e aos interesses estratégicos com os países lusófonos traçados durante a transição democrática. Segundo Correia (2006, p. 85), a Comissão para a Integração Europeia foi criada em 1977 após a candidatura à UE e ficou subordinada diretamente à presidência do Conselho de Ministros, demonstrando a grande vontade política de Portugal de se adequar o quanto antes em pertencer à União. Ainda na mesma administração, o Conselho de Ministros para

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a Integração Europeia68 foi criado com o objetivo de verificar os parâmetros das negociações com as Comunidades Europeias, assegurando, assim, mais harmonia na convergência dos objetivos propostos para a integração europeia (Correia, 2006, p. 41). Além dessas novas estruturas, a Comissão Interministerial das Comunidades Europeias (CICE)69 e a Direcção-Geral das Comunidades Europeias (DGCE) tiveram sua origem para garantir o sucesso da adesão, mesmo antes de sua efetivação. Como registou Magone (2006, p. 25), a reestruturação do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) português teve início em 1985 e perdurou até o dia anterior da adesão à UE.

O momento posterior a sua adesão serviu para a adaptação às normas vigentes da Comunidade Europeia. Este período permitiu que Portugal se valesse das externalidades positivas da integração, mas, por outro lado, percebeu-se também que as principais decisões eram tomadas por países mais desenvolvidos, nomeadamente, estabelecidos pelo eixo Berlim-Paris. Esta condição era, em certa medida, decorrente da posição geopolítica portuguesa e da extrema dependência à OTAN.

Dentro deste contexto, a diplomacia portuguesa adotou uma postura de cautela e de manutenção de seus objetivos nacionais, a partir de uma visão intergovernamental na solução dos seus problemas. A pouca maturidade das organizações governamentais portuguesas gerou receio em algumas instituições europeias que temiam pela falta de comprometimento lusitano na rápida integração à Comunidade (Teixeira & Hermenegildo, 2015, p. 68). Assim, o governo passou a adotar estratégias mais participativas a fim de demonstrar o seu envolvimento com o novo projeto político, no entanto, não abandonou a sua vocação atlântica e o apoio ao Reino Unido, por entender ser um aliado seguro e tradicional.

A reforma de 1994 do MNE foi importante, pois criou a figura do então director-geral de política externa, que segundo Correia (2006, pp. 51–52), passou a ser o centro nevrálgico do Ministério, coordenando os diversos assuntos com destaque aos ligados à PESC e à CPLP, estratégicos para o Estado português. Todas as ações adotadas nas reformas administrativas se caracterizaram pelo alinhamento das instituições e da legislação

68 O Conselho de Ministros para a Integração Europeia foi aprovado no Decreto-Lei n.º 185/79, de 20 de

Junho, em função da reestruturação do Decreto-Lei n.º 306/77, de 3 de Agosto, que instituiu a Comissão para a Integração Europeia (Correia, 2006, p. 41).

69 A Comissão Interministerial das Comunidades Europeias integrava a Direção-Geral dos Assuntos

Consulares e das Comunidades Portuguesas (DGACCP) do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Governo português e coordenava a matéria de política de emigração e de comunidades portuguesas no estrangeiro (Decreto-Lei n.o 526/85, do Ministério dos Negócios Estrangeiros, 1985).

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nacionais em convergência ao Acquis Communautaire70, como os mecanismos da PESC

que já vinham sendo articulados com a participação de facto, mas não de direito no enquadramento da cooperação política europeia. Eventos externos como a reunificação alemã, a fragmentação da União Soviética e a aprovação do Tratado de Maastricht também contribuíram para uma posição mais europeia, criando a vertente euro-atlântico na política externa portuguesa.

Outra adequação importante ocorreu no Ministério da Defesa Nacional, na medida em que as forças armadas portuguesas tiveram de adequar as capacidades militares e passaram a atuar também em missões em proveito da UE, concomitantemente com as demais organizações (ONU e OTAN). Nesse sentido, Barroso (1998, p. 122), destacou o facto de Portugal ser favorável à identidade europeia de segurança e defesa com o uso dos meios da OTAN ainda pela UEO e acreditar no facto de que a UE pudesse ter uma política de defesa comum e mesmo uma defesa comum em pouco tempo.

Recentemente, o Conceito Estratégico de Defesa Nacional (2013), o programa Defesa 202071 e a Diretiva Estratégica do Estado-Maior-General das Forças Armadas 2018-202172 vêm apresentando as transformações necessárias para fomentar a adaptação das forças armadas para a ação externa da Defesa Nacional.

Segundo José Alberto Azeredo Lopes (2016), então Ministro da Defesa de Portugal, outra mudança ocorrida após o Tratado de Lisboa se referia à valorização do parlamento nacional na consolidação do projeto europeu, que deu origem, a partir de 2012, às Conferências Interparlamentares para acompanhamento e aprofundamento das cooperações da PESC e da PCSD. Essa medida passou a incluir mais um ator nas discussões do tema e vem contribuindo para reduzir o défice democrático das decisões nesta dimensão.

Portugal ainda realizou revisões em sua Constituição para se adequar à legislação da UE. Inicialmente foi retirado o viés ideológico e dado mais flexibilidade económica ao mercado

70 Termo que representa todos os tratados, legislação, acordos internacionais, normas, sentenças judiciais,

disposições sobre direitos fundamentais e princípios contidos nos tratados que estabelecem a base comum de direitos e obrigações que ditam a relação e vinculam todos os EM à UE. (Acervo Comunitário, 2017)

71 A Defesa 2020 constitui um programa de modernização das Forças Armadas portuguesas criado em 2013

para atender às novas necessidades da Defesa Nacional. Ela estabelece estruturas mais atuais, operacionais e sustentáveis, dentro de um quadro conceptual e legislativo de acordo com a capacidade orçamentária do país (Ministério da Defesa Nacional, 2015, p. 5).

72 Documento elaborado pelo EMGFA junto com a Marinha, o Exército e a Força Aérea que estabelece as

orientações estratégicas tuteladas pela política e pela documentação estratégica de defesa nacional em vigor. Contém as perspetivas de gestão estratégica, os temas estratégicos, representando as grandes ideias-chave orientadoras do processo de execução estratégica e os objetivos estratégicos portugueses (Chefe do Estado- Maior-General das Forças Armadas, 2018).

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e, posteriormente, realizada a abertura do sistema económico com novas privatizações (Assembleia da República, 2018).

Todas essas transformações internas foram feitas e ainda vêm sofrendo ajustes quando necessário, de modo a adequar as instituições domésticas portuguesas às novas necessidades exigidas no nível europeu para que a transição ocorresse com menos percalços e o relacionamento institucional entre o EM e a UE fosse harmonizado.

Dessa forma, evidenciou-se mais um aspeto do processo de europeização da PESC que vem contribuindo para uma melhor sinergia na relação EM com a UE.