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O Programa Bolsa Família: natureza, peculiaridades e resultados

Mapa 2- Área urbana do município de Bagre-Pará

3 UMA ESTRATÉGIA POLÍTICA DE ENFRENTAMENTO À

3.2 O Programa Bolsa Família: natureza, peculiaridades e resultados

Os programas sociais criado na década de 90 visavam garantir à população mais vulnerável o acesso às políticas públicas, com o objetivo de diminuir as desigualdades e quebrar o ciclo de perpetuação da pobreza. Em 09 de janeiro de 2004 pela Lei nº 10.836 foi instituído o PBF, com a finalidade de unificar os diversos programas que já existiam (como: Auxílio Gás, Bolsa Alimentação, Bolsa Escola e Cartão Alimentação) e que não estavam conseguindo responder satisfatoriamente aos objetivos propostos de concessão de benefícios às famílias pobres do Brasil.

Definido como, “um programa de transferência diretamente às famílias pobres e extremamente pobres, que vincula o recebimento do auxílio financeiro ao cumprimento de

compromissos (condicionalidades) nas áreas de Educação e Saúde” (BRASIL; MDS, 2006, p. 13), o PBF tem o objetivo de erradicar a pobreza e promover a segurança alimentar e nutricional dos beneficiários.

Assim, apesar de seu objetivo central ser o combate à pobreza e à fome, o PBF é uma política complexa, que integra a distribuição de renda com o estímulo ao acesso à rede de serviços públicos, em especial, de saúde, educação e assistência social – através da exigência do cumprimento das condicionalidades –, promovendo, assim, a intersetorialidade, a complementaridade e a sinergia das ações sociais do poder público. Com isso, a política pretende combater a pobreza em duas frentes: combinando objetivos de curto prazo, mediante a distribuição de renda às famílias situadas abaixo e na linha da pobreza, com objetivos de longo prazo, através do investimento na aquisição de capital social e humano das crianças e adolescentes, atuando, assim, na pobreza intergeracional, ou seja, esse movimento pretende atuar por diversos meios em suas diferentes etapas atacando a pobreza de hoje e a de amanhã (ÁVILA, 2013).

Para alcançar seus objetivos, o PBF se pauta na articulação de três dimensões essenciais à superação da fome e da pobreza:

a) Promoção do alívio imediato da pobreza por meio da transferência direta de renda às famílias;

b) Reforço ao exercício de direitos sociais básicos na área da saúde, educação e assistência social, por meio do cumprimento das condicionalidades, o que contribui para que as famílias consigam romper o ciclo da pobreza entre gerações; e

c) Articulação de oportunidades para o desenvolvimento das famílias, por meio de ações que promovam a superação da situação de vulnerabilidade e pobreza pelos beneficiários do PBF. São exemplos dessas ações: programas de qualificação profissional, de geração de trabalho e renda, de melhoria das condições de moradia, de alfabetização de adultos, de educação de jovens e adultos, além da tarifa social de energia elétrica, de fornecimento de registro civil e demais documentos e da isenção de taxas em concursos públicos federais. (MDS, 2010, p. 108).

As condicionalidades são os compromissos assumidos tanto pelas famílias beneficiárias do PBF, quanto pelo poder público para ampliar o acesso dessas famílias a seus direitos sociais básicos. Se por um lado as famílias devem assumir e cumprir esses compromissos para continuar recebendo o benefício, por outro lado, as condicionalidades responsabilizam o poder público pela oferta dos serviços públicos de saúde, educação e assistência.

Segundo Weissheimer (2006, p. 15) “o cumprimento das condicionalidades pelos beneficiários fará com que essas famílias ascendam do grupo de pobreza do qual fazem parte”. As condicionalidades exigidas pelo PBF são: a realização de exames pré-natal (para as

gestantes); o acompanhamento médico periódico para atualização de vacinas e manutenção de peso e altura adequados (para crianças de 0 a 6 anos) e matrícula regular e frequência de, no mínimo 85% das aulas no ensino fundamental (para as crianças de 7 a 15 anos), e, para os jovens, no mínimo 75% das aulas do curso em que estão matriculados (ensino fundamental ou médio).

Tavares et al. (2009, p. 27) avaliam as condicionalidades como elementos que proporcionam aos beneficiários condições de mudança de vida:

O estabelecimento de condicionalidades faz com que o programa se constitua numa política de longo prazo, que visa proporcionar aos beneficiários as condições para a geração autônoma de renda no futuro, por meio do investimento em capital humano .Assim, além de buscar aliviar a pobreza no curto prazo por meio da transferência direta de renda, a política procura alterar estruturalmente a situação socioeconômica.

A contribuição do PBF para a diminuição da pobreza e para a ampliação dos cuidados com a saúde e com a educação vem sendo muito estudada ao longo de seus 11 anos de implementação e esses estudos (PIRES; LONGO, 2008; PEREIRA, 2011; MOCELIN, 2011) apontam para a diminuição da extrema pobreza e para o aumento do poder de compra do beneficiário já que, como é transferência direta de renda os beneficiários podem se comportar como agentes econômicos no mercado de modo que o beneficio não alcança só a família beneficiária, sim todo um contexto das redes de relações, por meio das quais ele (beneficiário), pode paulatinamente mitigar os efeitos de sua condição de pobreza.

Quadro 1- Benefícios, valores e público alvo do Programa Bolsa Família

Benefício Valor Público Alvo

Benefício Básico

(BB) R$ 85,00

Famílias consideradas extremamente pobres, cada família poderá receber apenas um benefício básico.

Benefício Variável

(BV) R$ 39,00

É pago a famílias pobres ou em extrema pobreza que tenham em sua composição, crianças e adolescentes entre 0 a15 anos, gestantes ou nutrizes. Cada família poderá receber até 05 benefícios variáveis, ou seja, até R$ 195,00 reais.

Benefício Variável

Jovem (BVJ) R$ 46,00

Pago a todas as famílias do Programa que tenham adolescentes de 16 a 17 anos frequentando a escola. Cada família poderá receber até 02 BVJs, ou seja, até R$ 92,00. OBS: uma adolescente que receba o Benefício Variável vinculado ao adolescente (BVJ) poderá também receber o Benefício Variável Gestante, ou seja, R$ 39,00 + R$ 46,00

Benefício Variável de Caráter Extraordinário

(BVCE)

Valor do Benefício calculado caso a caso

Pago a famílias em que a migração para o Bolsa Família dos programas remanescentes (auxílio- gás, bolsa escola, bolsa alimentação e cartão alimentação) tenham causado perdas financeiras.

Benefício de Superação de Extrema pobreza na

primeira infância

Seu valor não é fixo e sim variável, uma vez que tem caráter de complemento da renda já recebida pelo benefício básico e corresponderá

ao valor necessário para que a soma da renda familiar atual supere R$

85,00.

Pago às famílias que já fazem parte do Programa mas, que ainda permaneçam em situação de extrema pobreza e que tenham em sua composição familiar crianças de 0 a 6 anos, para completar os valores do PBF para as famílias cuja renda mensal ainda seja inferior R$ 85,00 por integrante da unidade familiar.

Fonte: SAGI/MDS (2016).

Para receber a concessão do benefício o chefe da família tem que demonstrar através da renda familiar situação econômica vulnerável, evidenciando sua situação de pobreza. A pobreza e a assistência aos pobres sempre exigiram o estabelecimento de critérios que definam quem é pobre, consequentemente, quem é merecedor de ajuda e direito à assistência social. Assim, classificam-se os pobres pelo mérito ou “valor da necessidade” (SPOSATI, 2008, p. 7), fato que exige uma separação entre aqueles que “merecem” receber e os que não precisam ou não devem receber algum tipo de ajuda, e isso equivale, também, ao acesso a outros tipos de direitos, por exemplo, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) concedido a deficientes (baixa renda) e a idosos que não tenham contribuído diretamente com a Previdência Social e que não teriam como se manter em sua velhice.

Como o PBF se caracteriza como uma política focalizada, não está acessível a todos os brasileiros, foram definidos critérios de elegibilidade, baseados, exclusivamente, na renda familiar per capita mensal. Define-se a renda familiar mensal como “a soma dos rendimentos

brutos auferidos mensalmente pela totalidade dos membros da família, excluindo-se dos cálculos os rendimentos concedidos por programas de transferência de renda” (MDS, 2005, p. 13). Sendo assim, o PBF está destinado às pessoas inscritas no Cadastro Único (CadÚnico), e nele classificadas, como pobres ou extremamente pobres. Pela regulamentação do CadÚnico (Decreto no 6.135/2007), entende-se como de ‘baixa renda’ as famílias com renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo ou a família que possua renda familiar mensal de até três salários mínimos.

O CadÚnico é um sistema de cadastramento constituído base de dados, instrumentos, procedimentos e sistemas eletrônicos que reúnem informações sobre a família (cadastrada) e seus membros. O CadÚnico permite que os governos – federal, estaduais e municipais – conheçam as reais condições de vida dos brasileiros em situação de pobreza e obtenham o diagnóstico socioeconômico das famílias cadastradas.

A concessão do benefício financeiro é atribuição exclusiva do MDS, sendo operacionalizada pela Caixa Econômica Federal e tendo como base dois critérios: a estimativa de pobreza do município e as informações contidas no Cadastro Único. É feita de forma objetiva e impessoal, de acordo com o plano de expansão e disponibilidade orçamentária da política (MDS, 2005). Apesar de ser um programa criado pelo governo federal, a gestão do PBF é descentralizada, isto é, compartilhada entre o governo federal e os governos estaduais e municipais. A Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (SENARC), vinculada ao MDS é instituição responsável pelo Programa e pelas demais iniciativas de transferência de renda. O governo federal envia fundos aos governos municipais que devem na prática, fazer a política funcionar, por intermédio das instituições assistenciais. Ao assinar o Termo de Adesão, o município se compromete a cadastrar os possíveis beneficiários, executar e fiscalizar a política. Além disso, é competência da gestão municipal colocar em prática formas de controle e de participação social, estabelecendo o Conselho do Programa Bolsa Família ou Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS).

Em 2005, o Governo Federal percebeu a necessidade de atualização das informações cadastrais que até então não vinha sendo realizada. Os municípios relatavam que não havia orçamento em seus planejamentos para custear a realização da atualização cadastral, já que precisavam contratar pessoas, comprar equipamentos e custear o deslocamento das equipes para áreas de difícil acesso. Por isso foi criado o IGD-M, que segundo a definição do MDS (2014, p. 15):

O Índice de Gestão Descentralizada Municipal (IGD-M) é um instrumento de promoção e fortalecimento da gestão intersetorial do Programa Bolsa Família (PBF). Corresponde a uma forma de aferir a cobertura cadastral, bem como a qualidade da gestão do Cadastro Único para programas sociais do governo federal (Cadastro Único) e a qualidade e integridade das informações sobre o acompanhamento das condicionalidades das áreas de educação e de saúde.

Os munícipios passaram a receber diretamente no fundo destinado Assistência Social valores referentes à qualidade da gestão pública municipal do PBF que é medida pelo cálculo de quatro fatores: fator 1- operação média aritmética das taxas: Taxa de Acompanhamento de Frequência Escolar (TAFE), Taxa de Cobertura Qualificada de Cadastros (TCQC), Taxa de Atualização Cadastral (TAC). Fator 2 – adesão SUAS). Fator 3 – Comprovação de gastos pelo Fundo Municipal Assistência Social. Fator 4 – aprovação da comprovação de gastos pelo Conselho Municipal de Assistência Social (BRASIL; MDS, 2014).

Nos municípios, é a instituição de assistência social, geralmente a Secretaria Municipal de Assistência Social, ou algo similar, o órgão responsável pela gestão do programa Bolsa Família, e cabe ao gestor municipal um papel fundamental de controle, estabelecimento das diretrizes do programa e gestão dos benefícios. O gestor municipal tem poder de decisão sobre onde e como será o cadastramento; de inclusão e exclusão no Sistema de Gestão de Condicionalidades do Programa Bolsa Família (SICON); de interrupção temporária ou permanente do benefício, além de ter acesso às informações do Cadastro Único das famílias beneficiadas. A alteração cadastral é uma das principais ações do município no processo de gestão dos benefícios, que consiste em bloqueio, desbloqueio cancelamento, reversão do cancelamento e suspensão dos benefícios.

Como é de competência dos governos municipais, a execução e fiscalização do PBF , a implementação do Programa ocorrerá de uma forma específica, de acordo com a estrutura da assistência social que cada município possui. O resultado dessa gestão descentralizada é que os processos relacionados com o funcionamento do PBF diferem de cidade para cidade.

Em termos de cobertura, o atendimento do PBF é inferior apenas à educação pública, ao Sistema Único de Saúde e à Previdência Social. Ao analisar os dados e o período de implementação do programa, impossível não notar a expansão gradual do orçamento e do público alvo, além de modificações nos valores pagos e acréscimo de novas metas. Estimado, em 2003, em 11.206.212 o número de pobres e extremamente pobres em todo o Brasil, o Bolsa Família, já no ano de sua criação, atendeu a 3,6 milhões de famílias, com um orçamento de R$ 4,3 bilhões. Com uma meta inicial de 11,2 milhões de famílias, em 2004, o PBF já estava presente em 5.533 municípios (com 99,5% de cobertura), chegando a 6.571.842

famílias e tendo o orçamento ampliado para R$ 5,3 bilhões. Em 2005, atingiu 100% dos municípios brasileiros, chegando a 8 milhões de famílias e com um orçamento de R$ 6,5 bilhões. No final de 2006, a meta inicial é atingida – são 11.120.363 famílias atendidas –, fato que exigiu a ampliação do orçamento para R$ 8,3 bilhões e o estabelecimento de novas metas (ÁVILA, 2013).

A tabela 4 apresenta a série histórica do quantitativo de famílias e valor empregado pelo PBF no Estado do Pará e no município de Bagre de 2009 a 2015, e demonstra que seguindo a tendência do país o número de beneficiários e de valor empregado só aumentou.

Tabela 4- Famílias atendidas e valor total empregado no PBF, no Estado do Pará e município de Bagre – 2009 a 2015

Estado/Município Ano Número de Famílias Valor Empregado

Pará 2009 635.204 714.241.108,00 2010 680.804 860.577.255,00 2011 772.311 1.065.765.009,00 2012 813.367 1.374.529.852,00 2013 860.572 1.658.481.264,00 2014 887.426 1.896.916.071,00 2015 890.127 1.957.280.555,00 Bagre 2009 1.997 2.135.839,00 2010 2.095 3.029.284,00 2011 2.349 3.845.812,00 2012 2.779 6.303.790,00 2013 2.927 9.350.094,00 2014 2.954 10.057.354,00 2015 2.864 10.284.724,00

Fonte: FAPESPA (2015a).

O maior investimento em transferência de renda e o aumento do número de famílias beneficiadas mais pobre tendo acesso ao benefício, principalmente nas regiões mais vulneráveis, confirmam que os programas de transferência de renda constituíram-se no Brasil como alternativa para o combate à miséria tanto imediata, quanto intergeracional. (BRASIL; MDS, 2006)